SÃO PAULO – Em um país onde parece haver mais cisnes negros do que brancos, o que não tem faltado é trabalho para os gestores de fundos. Após a um tanto quanto inesperada saída de Sergio Moro do ministério da Justiça nesta sexta-feira (24), o mercado financeiro começa a projetar cenários do que pode acontecer com o governo — e com a economia — daqui para a frente.
Para Ivo Chermont, economista-chefe da Quantitas e convidado do Coffee & Stocks desta segunda-feira (27), a renúncia do ex-juiz coloca uma série de perguntas à mesa. Clique aqui para entrar agora no grupo do Stock Pickers no Telegram e ser avisado de todas as entrevistas.
“Será que Bolsonaro vai entregar verbas e cargos para o Centrão, naquilo que seria o velho toma lá dá cá, que ele não iria ceder? Será que dá para fazer isso sem extrapolar o gasto fiscal? É possível ter Paulo Guedes e Centrão convivendo no mesmo ambiente com gastos tendo que crescer? Será que o Centrão prefere negociar com governo Bolsonaro ou com governo Mourão?”
De acordo com Chermont, ainda é cedo para responder a essa infinidade de dúvidas. Mesmo assim, não há dúvida de que o acontecimento de sexta representa a queda de um dos eixos de sustentação do governo Bolsonaro.
“O Moro, junto com o Paulo Guedes, sempre foram os pilares do governo Bolsonaro. O primeiro representava a ética anti-petismo e o segundo, o liberalismo econômico”, afirmou.
Ainda que a renúncia do ex-ministro possa enfraquecer a popularidade do presidente, o economista estima que a probabilidade de um impeachment hoje esteja abaixo de 50%. Segundo ele, a aproximação de Bolsonaro com o Centrão e a dificuldade de manifestações de rua em um cenário de isolamento social devem jogar a favor do atual governo.
“O Covid, por mais irônico que pareça ser, ajudou Bolsonaro. As pessoas não vão às ruas, reduz-se o espaço para manifestações”, disse.
O economista argumenta que, para que se sustente, basta que um governante tenha apoio da sociedade ou do Congresso. “O governo Temer, por exemplo, fez reformas extremamente impopulares, mas tinha o Congresso na mão”, lembra, acrescentando que o impeachment da ex-presidente Dilma se deu pela ausência de ambas as bases de apoio.
E como fica Paulo Guedes?
O economista-chefe da Quantitas acredita que o recente alinhamento de Bolsonaro ao Centrão possa significar uma perda de ingerência do ministro da Economia no governo — ainda que ele siga no comando da pasta.
“O Paulo Guedes não precisa sair para perder a influência no governo. O poder dele pode ser minado ao longo do tempo, tal como foi com Joaquim Levy no governo Dilma. Nos parece um equilíbrio instável”, ressaltou.
Apesar de concordar que o poder de atuação do ministro esteja fragilizado com o cenário de pandemia e o caos político, Chermont acredita que sua permanência no governo tenha uma importância muito mais do que simbólica para o mercado.
“O técnico ainda é mais importante. Existe uma esperança que o governo Bolsonaro faça acordo com deputados sem que o fiscal seja extrapolado. PG e sua equipe dão um pilar de sustentação fiscal importantíssima para o governo. É quando a sustentação fiscal cai, que as crises começam”.
Está barato?
Embora não acredite que o novo cenário político seja motivo para uma pressão vendedora na Bolsa, Chermont defende que o investidor cobre “um pouquinho mais de prêmio” com o novo fator de risco.
Mesmo assim, ressalta, a Quantitas permanece “construtiva” com o mercado de ações brasileiro, sobretudo por conta do juro real baixo e pelos indicadores das empresas.
“Não é o ambiente pré-Covid, mas acho que até 85 mil pontos tem muita coisa descontada”, afirmou. Na última sexta-feira (24), o Ibovespa fechou com queda de 5,45%, aos 75.330 pontos.
O “otimismo cauteloso”, portanto, segue como uma máxima entre os gestores que têm participado do Coffee & Stocks. “Com todas essas instabilidades e longe de eu dizer que estamos em um cenário positivo, eu acho que é o juro baixo e o mundo que norteiam a decisão de investimento no Brasil”
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