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O câncer colorretal, antes associado predominantemente a pessoas mais velhas, têm atingido um número crescente de jovens. Esse é um dos principais assuntos do Março Azul deste ano, campanha que serve para conscientizar a população sobre a doença.
Uma pesquisa publicada no BMJ Oncology em setembro de 2023 encontrou evidências que a incidência de câncer precoce em jovens adultos (ou seja, com menos de 50 anos), cresceu globalmente em 79% entre 1990 e 2019.
As mortes decorrentes da doença aumentaram 28% nesse mesmo grupo. A análise dos cientistas cobriu 29 tipos de câncer em 204 países.
Além disso, uma pesquisa publicada na revista científica The Lancet pela American Cancer Society (ACS) em outubro de 2024 aponta que a taxa de câncer colorretal em adultos jovens está aumentando em diversos países, especialmente em nações de alta renda.
No Brasil, os dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA) mostram que, no triênio de 2023-2025, o país deve registrar cerca de 45.630 novos casos da doença por ano.
Campanhas como o Março Azul desempenham um papel fundamental na conscientização da população. “Quanto maior a informação verdadeira e clara chegar, maior será a prevenção e a cura”, disse Lucas Nacif, cirurgião gastrointestinal e membro do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD).
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Incidência entre jovens adultos
A pesquisa feita pela ACS observa alguns aspectos que podem explicar esse aumento entre adultos com menos de 50 anos.
Uma delas é a suspeita sobre o impacto do estilo de vida com a dieta rica em carne e alimentos processados em países de alta renda do ocidente.
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O Mauro Donadio, oncologista da Oncoclínicas&Co, especialista em tumores do aparelho digestivo e tumores neuroendócrinos, acredita que algumas das possíveis razões para o aumento incluem a epidemia de obesidade, fatores alimentares, o efeito de antibióticos no microbioma intestinal e aumento da presença de mutações germinativas associadas ao câncer.
Os cientistas perceberam que o câncer colorretal aumentou entre adultos de 25 a 49 anos em 27 países, incluindo nações não ocidentais como Japão e países menos ricos como Turquia, o que também sugere que o estilo de vida ocidental pode não ser o único fator responsável pela tendência.
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A pesquisa também aponta poluentes ambientais como um possível fator de contribuição para o aumento dos casos.
“Há uma mudança no perfil epidemiológico, principalmente por conta do estilo de vida e da alimentação.”
Ele ressalta ainda que “o alto nível de poluição nos grandes centros parece estar influenciando muito no aumento desses números”.
Porém, vale frisar que o aumento não parece estar ligado a melhorias no rastreamento da doença, pois a maioria dos países só testa rotineiramente pessoas a partir dos 50 anos.
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Sintomas silenciosos
Entre os principais fatores de risco estão o consumo excessivo de carne vermelha e processada, dieta pobre em fibras, tabagismo, alcoolismo, obesidade e histórico familiar.
Além disso, doenças inflamatórias intestinais, como a doença de Crohn e a colite ulcerativa, aumentam a chance de desenvolver o câncer colorretal.
Os primeiros sintomas podem muitas vezes passar despercebidos. Segundo Nacif, dor ou desconforto abdominal, perda de peso sem razão aparente, cansaço e fraqueza são alguns deles.
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Outros sintomas são anemia por deficiência de ferro, sangramento retal, alteração nos hábitos intestinais e obstrução ou até mesmo perfuração intestinal, já em casos mais avançados.
“Cerca de 20 a 30% das pessoas descobrem a doença mais tardiamente e isso pode ser atribuído à ausência de sinais e sintomas típicos de “bandeira vermelha” (ou seja, sangramento retal, anemia, mudança nos hábitos intestinais, diarreia, massa abdominal)”, disse Donadio.
Ele explica que os pacientes mais jovens normalmente têm sintomas não específicos, e por isso o diagnóstico acontece tende a acontecer mais tarde.
Outros fatores de risco
Nacif destaca que além de uma dieta gordurosa, hipercalórica e pobre em fibras, outros fatores como o consumo de álcool e tabagismo também entram na conta para entender quais são os riscos de câncer.
“Aliar uma alimentação saudável com a prática regular de exercícios físicos é o mais recomendado”, disse.
O especialista explica que a constipação intestinal e a presença de pólipos são fatores igualmente importantes, já que eles podem “formar pequenos aglomerados de células que perderam o controle de sua capacidade de se duplicar e se fixam na parede do intestino”.
Ele ainda reforça que apesar da maioria dos pólipos ser benigna, eles devem ser retirados, já que muitos tumores se formam a partir de alguns tipos de pólipo.
Além disso, o histórico familiar também deve ser considerado. “Cerca de 30% das pessoas diagnosticadas com câncer colorretal têm histórico da doença entre os parentes”, afirmou.
Quem possui doenças hereditárias, como síndrome de Lynch, polipose adenomatosa familiar e polipose MUTYH, também devem acompanhar regularmente a situação intestinal.
O alerta serve para quem tem doença de Crohn e colite ulcerativa, pois há risco aumentado para desenvolver neoplasia maligna de cólon.
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Prevenção e importância da colonoscopia
A colonoscopia é considerada a principal ferramenta para a detecção precoce da doença. “Principalmente pelo fato de os estágios iniciais não apresentarem sintomas, a colonoscopia consegue detectar casos milimétricos”, enfatiza Nacif.
Donadio reforça a necessidade de ampliar o rastreamento, já que ele reduz a mortalidade pela doença, “pois é capaz de detectar e tratar lesões em estágio muito inicial ou até mesmo as lesões pré-malignas”.
Antes, a recomendação oficial no Brasil era a de iniciar o rastreamento aos 50 anos. Muitos países optaram por mudar a idade do início para os 45, e o Brasil agora passa a antecipar também.
“Todas as sociedades recomendam o rastreio acima de 45 anos e, em alguns casos específicos, acima de 40 anos ou 10 anos antes do familiar ter apresentado câncer”, explica Nacif.
Mesmo com a recomendação, ainda há resistência à realização do exame. “As pessoas podem resistir à triagem de colonoscopia por medo, desconforto e falta de acesso ao exame”, afirma Donadio.
O tratamento do câncer colorretal varia de acordo com o estágio da doença e pode incluir cirurgia, quimioterapia, radioterapia e imunoterapia.
“Doenças localizadas devem ser operadas e, quando se identificam fatores de risco que aumentam a chance de recidiva da doença, o tratamento quimioterápico (adjuvância) pode ser recomendado mesmo após uma cirurgia curativa.”
A escolha do método de tratamento então depende do estágio, de características moleculares, comorbidades e até mesmo preferências do paciente.