Tarcísio critica “incentivo negativo” de reforma tributária, mas reitera que não aumentará ICMS

Para governador, estados foram colocados em dilema entre prejudicar setores econômicos em momento delicado ou abrir mão de dinheiro no futuro

Marcos Mortari

Tarcísio de Freitas (Foto: Divulgação/Cleiby Trevisan)
Tarcísio de Freitas (Foto: Divulgação/Cleiby Trevisan)

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O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), manifestou, nesta segunda-feira (11), preocupação com o comportamento da arrecadação do estado, mas reiterou decisão de sua gestão por não elevar a alíquota de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). As declarações foram dadas durante o evento “Fórum Político”, realizado pela XP Investimentos.

No painel, ele disse que o governo paulista tem arrecadado “cada vez menos” e que “não há razão” estrutural para acreditar que a situação vai melhorar em um horizonte de curto prazo.

Somado a isso, o governador pontua que a proposta de reforma tributária sobre o consumo (PEC 54/2019) aprovada pelas duas casas do Congresso Nacional criou um “incentivo negativo” para que estados elevem suas alíquotas de ICMS para garantirem um patamar de arrecadação na migração de sistema tributário.

O texto foi aprovado no Senado Federal com alterações e retornou para análise da Câmara dos Deputados. Para ser levado à promulgação, ele precisa do aval de parlamentares das duas casas na mesma versão de mérito.

“Criamos uma proxy ruim na reforma tributária. Temos um período de transição em que a divisão do bolo vai se dar pela participação de cada ente em uma fotografia que vai ser tirada no período de 2024 a 2028″, afirmou.

“Isso incentiva entes a aumentar alíquota”, disse. Para ele, a situação impõe um dilema aos gestores estaduais, que têm que escolher entre “sangrar mais” setores que estão passando por dificuldade ou abrir mão de muito dinheiro no futuro.

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De um lado, o que ele chamou de ética da convicção pressionaria as administrações a não elevar o percentual cobrado sobre o tributo. De outro, a ética da responsabilidade recomendaria o aumento para garantir uma situação mais favorável no futuro.

Mas entre as duas, Tarcísio disse que sua gestão optou por ficar com a primeira e buscar o relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e o Ministério da Fazenda por alternativas. “Decidimos ficar com a da convicção”, disse. “Vamos buscar outra forma para fazer essa transição da receita”, pontuou.

Durante o painel, o governador afirmou que, no exercício de equilibrar as contas públicas, é inevitável que os estados também se esforcem em cortar gastos. “A questão não é se é possível ou não cortar gastos, temos que cortar gastos”, disse.

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“É imperioso. Temos que cortar gastos e vamos cortar. Do contrário, o estado vai pagar uma conta muito salgada lá na frente”, enfatizou.

Entre as medidas nessa direção, ele mencionou iniciativas como a privatização de companhias com controle acionário do Estado, como a Sabesp, e o projeto que trata da reforma administrativa encaminhada por sua administração à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).

Para o governador, o inchaço da máquina pública tem inviabilizado volumes mais elevados de investimentos em saúde e infraestrutura.

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Entenda o que está em jogo

Três semanas atrás, secretários de Fazenda de seis estados das regiões Sul e Sudeste (incluindo Samuel Kinoshita, secretário da Fazenda e Planejamento de São Paulo) se manifestaram, em uma carta conjunta, indicando intenção de elevar suas alíquotas de ICMS como forma de preservar receitas.

A alegação dos entes subnacionais é que o movimento busca preservar receitas dos entes, tendo em vista as possíveis mudanças decorrentes da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição que trata da reforma tributária dos impostos sobre o consumo (PEC 45/2019) pelo Congresso Nacional.

Eles também apontam os efeitos de duas leis complementares aprovadas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) que reduziram sensivelmente a arrecadação subnacional, por estabelecerem limites de alíquotas para serviços considerados essenciais.

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No caso da reforma tributária, a preocupação dos Estados está relacionada às regras de distribuição dos recursos arrecadados na forma do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) − tributo que substituirá o estadual ICMS e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), cobrado pelos municípios − sobretudo durante a transição de sistemas (que será muito mais longa no caso dos entes subnacionais).

A PEC aprovada pelas duas casas legislativas estabelece três prazos distintos para a fase de transição do modelo atual para o novo, com previsão de migração completa em apenas 50 anos (conheça os detalhes clicando aqui). Uma dessas etapas se debruça justamente sobre a partilha dos novos tributos entre Estados e municípios.

Esta fase tem como objetivo assegurar aos entes, inicialmente, uma participação no montante total arrecadado no novo modelo similar à atual e, também de forma gradual, a transição para o modelo de cobrança baseado exclusivamente no princípio do destino (ou seja, grosso modo, o local onde o bem ou serviço é consumido ou usufruído é que tem direito sobre os tributos recolhidos na operação).

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Ocorre que os repasses levam em conta uma média, de 2024 a 2028, da arrecadação com ICMS para definir a divisão do bolo do IBS na transição federativa, que vai até 2078. Pela regra, em um primeiro momento (de 2029 a 2032), 80% do montante arrecadado com o tributo subnacional será distribuído com base nas participações do referido período. Em 2033, o percentual sobe para 90%. E depois (de 2034 a 2077), ele começa a ser reduzido gradualmente à razão de 1/45 por ano.

Durante o período, o montante repassado a cada ente pelo Comitê Gestor também é ajustado por um “fator de transição”. Nos primeiros quatro anos (2029 a 2033), ele será igual a 1. Já nos anos seguintes, ele é calculado a partir da divisão entre a razão entre: 1) o produto da arrecadação do imposto do ente e o produto da arrecadação do conjunto dos Estados, do DF e dos municípios nos 4 anos anteriores; e 2) o produto da arrecadação do imposto nos mesmos termos entre 2029 e 2032. Tal regra busca estimular a eficiência dos Fiscos em cada ente subnacional.

A PEC aprovada pelos senadores também determina que a parcela do produto da arrecadação do imposto não retida será distribuída a cada ente de acordo com os critérios estabelecidos em lei complementar, nela computada a variação de alíquota fixada pelo ente em relação à de referência. Durante a transição, é vedado aos entes subnacionais fixar alíquotas próprias do IBS inferiores às necessidades de garantir retenções estabelecidas.

Há, ainda, outra regra que estabelece que, do IBS apurado com base nas alíquotas de referência, deduzida a retenção, um outro montante correspondente a 5% será destinado à distribuição aos entes com as menores razões entre o valor apurado e receita média entre 2024 e 2028, sem a multiplicação pelos respectivos fatores de transição, limitada a 3 vezes a média nacional por habitante da respectiva esfera federativa.

Esses recursos serão distribuídos, sequencial e sucessivamente, aos entes com as menores razões, de maneira que, ao final da distribuição, para todos os entes que receberem recursos, seja observada a mesma a razão entre a soma do valor apurado e a receita média.

Uma lei complementar estabelecerá os critérios para a redução gradativa, entre 2078 e 2097, dos 5% reservados à distribuição aos entes que sofreram os maiores tombos em arrecadação, conforme a regra apontada na PEC e suas restrições.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.