STF avalia acabar com “orçamento secreto”, mas Congresso busca formas de manter poder sobre emendas

Dispositivo ganhou importância na gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) e passou a ser alvo de críticas e questionamentos judiciais

Reuters

O Supremo Tribunal Federal (Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil)
O Supremo Tribunal Federal (Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil)

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BRASÍLIA – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) avalia acabar com o chamado orçamento secreto em julgamento previsto para começar nesta quarta-feira (7) ao mesmo tempo em que a cúpula do Congresso já discute formas de manter o poder sobre a alocação bilionária de verbas de emendas parlamentares, afirmaram à Reuters fontes ouvidas nos últimos dias.

As emendas de relator ou RP-9 –conhecidas como orçamento secreto– ganharam importância na gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL) e passaram a ser alvo de críticas e questionamentos judiciais.

A validade do expediente foi contestada no Supremo por integrantes da oposição a Bolsonaro porque ela esconde os reais beneficiários de emendas indicadas pelo relator-geral do Orçamento.

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O uso desses recursos –para compra de ambulâncias ou outros serviços e obras, por exemplo– tampouco seguem qualquer critério de necessidade e são repassadas de forma alheia ao governo federal, sendo uma espécie de orçamento paralelo.

No Orçamento do próximo ano, está prevista a distribuição de 19,4 bilhões de reais em emendas de relator, metade dos valores reservados para as emendas parlamentares de maneira geral.

Segundo fontes, o eventual fim ou restrição do expediente já tem causado impacto, com maior apoio parlamentar à PEC da Transição, e ao facilitar a correlação de forças do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Congresso Nacional, em especial com o centrão.

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O doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP) Renato Ribeiro de Almeida, disse que o Poder Legislativo está puxando para si a responsabilidade de administrar e alocar recursos da União, o que é uma “anormalidade”.

“Não faz parte das funções do Poder Legislativo ter essa modalidade de emendas, ainda mais quando elas têm essa outra natureza, popularmente chamada de “secreta”, sob critérios que não são muito bem colocados, colocados de forma impositiva”, disse à Reuters.

“Então, o Poder Executivo perde sua força e características que lhe são próprias para abrir espaço ao Poder Legislativo. Entendo, portanto, que o STF deverá declarar inconstitucional as chamadas emendas do relator”, destacou.

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No STF, segundo duas fontes, há quem aposte que no julgamento que começa nesta quarta o plenário poderá acabar com o expediente considerando-o inconstitucional por contrariar princípios da transparência e da moralidade pública.

Contudo, as mesmas fontes não cravam o resultado do julgamento porque não se sabe qual será o teor do voto da presidente do Supremo e relatora das ações sobre o caso, Rosa Weber. No ano passado, Weber já tinha dado uma liminar, confirmada posteriormente pelo plenário do STF, determinando ao Congresso uma maior transparência da execução delas. Contudo, especialistas têm dito que houve apenas uma melhora parcial na identificação dos “padrinhos” das verbas.

Uma terceira fonte do STF disse que ainda há a possibilidade de algum ministro pedir vista do caso durante o julgamento, o que adiará para o próximo ano a definição.

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Se ocorrer, a medida poderia beneficiar os atuais presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que vão disputar no início de fevereiro a reeleição para seus cargos. Nos bastidores, os dois têm ascendência sobre as negociações que envolvem as emendas de relator.

Durante a campanha, Lula criticou duramente o orçamento secreto, dizendo que se trata da “maior bandidagem feita em 200 anos de República”. Eleito, ele moderou o discurso e passou a defender transparência na execução das emendas ao mesmo tempo em que buscou se aproximar de Lira, outrora aliado de Bolsonaro e que tem papel fundamental para o avanço da PEC da Transição e propostas do novo governo na Câmara.

No texto da PEC aprovado pela CCJ do Senado e que vai ao plenário, foi incluída uma emenda que abre espaço fiscal já no Orçamento deste ano. Essa medida permite a liberação de recursos que poderão ser usados para o pagamento de emendas de relator de 2022, que estão bloqueadas por cortes orçamentários. Uma fonte aliada a Lula disse que a mudança acaba ajudando no clima para aprovar a proposta.

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Reação

Diante da expectativa do julgamento, segundo uma fonte com conhecimento direto das tratativas, lideranças do Congresso articulam uma proposta para manter o poder sobre os bilhões de recursos em caso de eventual derrubada ou restrição do orçamento secreto.

Uma das ideias em discussão é, após o julgamento do Supremo, conversar com os ministros da corte para atender aos critérios para repasse dessas emendas de relator, conforme a fonte. Outra possibilidade é redistribuir os 19,4 bilhões de reais previstos no Orçamento do próximo ano em emendas de comissão e de bancada, outras modalidades de emendas parlamentares.

Essas tratativas envolvem Lira, Pacheco, o relator-geral do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), e outras lideranças, segundo a fonte. Na segunda-feira pela manhã, durante reunião na residência oficial do presidente da Câmara em que discutiram acordo para votar a PEC da Transição, o assunto foi discutido por lideranças.

Na manhã desta quarta, o Senado e a Câmara encaminharam ao STF um memorial conjunto em que pedem a rejeição das ações que contestam as emendas do relator. Argumentam que foram tomadas “sucessivas medidas para ampliar a publicidade, a transparência e os mecanismos de controle institucional e social na indicação das emendas de relator-geral, em especial quanto à obrigatoriedade de identificação do parlamentar solicitante ou apoiador”.

Segundo os parlamentares, não há qualquer “violação de preceito fundamental, tendo-se demonstrado que as programações incluídas por emendas de relator representam a síntese de decisões de política orçamentária no âmbito do Congresso Nacional que observam os pressupostos constitucionais, legais e regimentais”.