Reforma tributária: Brasil poderá ter maior IVA do mundo, com alíquota de 28%

Texto sancionado em cerimônia no Palácio do Planalto traz as principais regras de funcionamento do IVA, que será dual

Estadão Conteúdo

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta quinta-feira, 16, com vetos, a primeira lei que regulamenta a reforma tributária dos impostos sobre o consumo, aprovada pelo Congresso em dezembro. O texto cria o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que, segundo estimativas do governo, pode ter uma alíquota-padrão de 28%, a maior do mundo, conforme ranking da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2022, o último disponível.

O texto sancionado em cerimônia no Palácio do Planalto traz as principais regras de funcionamento do IVA, que será dual: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o IVA federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o IVA de Estados e municípios. Eles vão substituir cinco tributos que hoje incidem sobre o consumo e estão embutidos nos preços dos produtos: IPI, PIS/Cofins, ICMS e ISS.

“A projeção dos dados que temos hoje apontam para alíquota (do IVA) de 28%. Não quer dizer que será essa”, disse o secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, em entrevista coletiva sobre os vetos à regulamentação da reforma tributária. Questionado sobre o teto da alíquota para o IVA estabelecido pelo Congresso no projeto, de 26,5%, Appy disse que essa questão só terá de ser revista em 2031, quando o governo terá de apresentar proposta para cortar benefícios fiscais para levar a alíquota para o limite aprovado pelo Legislativo.

A lei sancionada lista os itens que vão compor a cesta básica nacional, que terá alíquota zero; os alvos do Imposto Seletivo, chamado de “imposto do pecado”, que vai incidir sobre itens considerados nocivos à saúde e ao meio ambiente; as regras do cashback, a devolução de parte do imposto à baixa renda, e os produtos e serviços que contarão com alíquota reduzida, entre outros.

Refinaria

O governo manteve o benefício à Refinaria da Amazônia (Ream), da distribuidora de combustíveis Atem – um dos pontos de maior entrave na aprovação pelo Congresso. Appy afirmou que a decisão de não vetar o dispositivo foi para evitar que o benefício ficasse mais amplo – ou seja, que mais empresas acessassem a vantagem da Zona Franca. De acordo com ele, a decisão foi técnica.

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Na fase final da regulamentação da reforma tributária, durante a tramitação no Senado, o relator Eduardo Braga (MDB), que é do Amazonas, inseriu o setor de refino entre os atendidos pelos incentivos tributários da Zona Franca de Manaus, beneficiando uma única empresa da região Norte.

A forma como o benefício foi redigido criou uma armadilha para Lula, uma vez que, como não é possível vetar apenas um trecho de um artigo, o entendimento do Ministério da Fazenda foi de que o veto poderia alargar a brecha para mais incentivos tributários.

O que foi vetado

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Appy afirmou que os vetos do presidente Lula ao projeto mantêm a essência do que foi aprovado pelo Congresso. “Quinze blocos de vetos em um projeto de 544 artigos é muito pouco”, disse. Segundo Appy, a opção do Executivo foi respeitar as decisões do Legislativo.

Lula vetou um benefício adicional dado a empresas da Zona Franca. O texto original da Fazenda oferecia um crédito presumido de 6% a setores que tiveram o IPI reduzido a zero por decisão do governo. Como elas perderam a vantagem comparativa a empresas de outras regiões – que se dá em cima do IPI -, o crédito presumido foi oferecido como uma espécie de contrapartida.

O texto aprovado no Congresso estendeu esse crédito presumido a setores que hoje já têm IPI zero, ou seja, não dependem dele para ter vantagem sobre concorrentes. A Fazenda entendeu que conceder o benefício a esses setores seria extrapolar os benefícios existentes hoje na região – e, por isso, recomendou o veto a Lula.

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O presidente também vetou um trecho que proibia a cobrança do Imposto Seletivo sobre exportações de bens minerais, além de outro que isentava fundos de investimentos dos novos IBS e CBS.

Próximos passos

O governo ainda precisa aprovar o segundo projeto de regulamentação da reforma tributária, que trata do Comitê Gestor do IBS, o IVA de Estados e municípios. O projeto foi aprovado pela Câmara e agora está no Senado Federal. Ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que “o Senado está pronto para votar a outra regulamentação da tributária”.

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Além disso, o governo ainda irá enviar outros projetos ao Congresso, como o que define as alíquotas do “imposto do pecado”. Appy disse que o envio deste projeto “deve ocorrer nos próximos meses, mas não tem prazo ainda”.

Questionado sobre o prazo para instalação do Comitê Gestor, Appy disse que é de quatro meses, mas que dependerá da eleição dos representantes dos municípios para compor o órgão. “Como é um ponto crítico, a opção feita no Congresso, com nosso apoio, foi prever desde já a criação (do Comitê Gestor), temporariamente, em 2025, para que pudesse funcionar na operacionalização”, disse, ressaltando que as regras ainda virão no segundo projeto de regulamentação da tributária.

Tom político

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A cerimônia também teve um tom político. O presidente Lula disse que “um milagre aconteceu” no Brasil para permitir a aprovação da reforma tributária neste seu mandato.

“Quando fui eleito (no terceiro mandato), ouvia que era impossível governar este País, no momento em que o Congresso tinha roubado o Orçamento do presidente e que a direita tinha eleito mais gente que a esquerda. Muita gente dizia que seria impossível governar e aprovar a reforma tributária, porque o governo era muito minoritário”, afirmou, elogiando que o regime democrático permitiu o diálogo e debate sobre a proposta para que ela fosse aprovada depois de décadas.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi “decisiva” para a aprovação da reforma tributária e de sua regulamentação. “A eleição do presidente Lula, sua posse e sua priorização da reforma tributária foi decisiva para que hoje estivéssemos a exaurir essa grande jornada de décadas”, disse o senador.

Representando o Congresso, Pacheco disse que a reforma foi possível “pela compreensão recíproca de Câmara e Senado” e porque “a sociedade entendeu que o sistema atual não poderia mais vingar”.

O senador, que está de saída da presidência do Senado, disse se orgulhar de ter sido seu “último ato (no cargo) nesta longa jornada da reforma tributária entregar à sanção do presidente Lula”.