PT comete erros “inacreditáveis”, mas tirar Dilma a todo custo não resolve, diz Maílson

Para ex-ministro da Fazenda, governo está cavando sua própria cova, mas uma reversão do quadro econômico brasileiro não se daria por meio de um impeachment; é preciso um novo líder para o Brasil virar, e isso não virá antes de 2018

Paula Barra

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SÃO PAULO – O PT está cavando sua própria cova diante de uma sucessão de erros “inacreditáveis”, mas apesar disso o impeachment não seria capaz de reverter o quadro político e econômico atual: apenas uma nova liderança política provocaria a mudança necessária. A opinião é de Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda entre 1988 e 1990, um dos períodos mais difíceis da economia (época do governo de José Sarney).

Em entrevista exclusiva ao InfoMoney para o “Especial Cenários para 2016”, Maílson classificação a gestão atual de Dilma Rousseff como desastrosa e cada passo dado por ela só tem ajudado à condução do processo de impeachment. “O próprio governo está se enredando e se autocondenando, de tão ruim que é a articulação”. No entanto, embora veja essa crise como a pior crise desde o Plano Real, ela está longe de ser maior que a capacidade do Brasil de superá-la.

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Confira abaixo a entrevista com Maílson da Nóbrega:

InfoMoney – Como o senhor, que atuou na Fazenda durante um dos períodos mais difíceis da economia brasileira, está vendo a situação atual do País? 
Maílson da Nóbrega – Esse ainda não é o pior cenário do Brasil dos últimos tempos. Podemos dizer que é a pior crise desde o Plano Real, mas o pior cenário ocorreu no fim do governo Sarney, quando o Brasil estava claramente enfrentando um processo hiperinflacionário, sem acesso aos mercados internacionais de capitais, com restrição às importações e uma enorme incerteza quanto ao rumo do País no pós-eleição. Hoje, o Brasil é muito diferente: você tem um agravante da crise, que é o campo político, mas encontramos um País completamente transformado em relação ao período imediatamente anterior ao Plano Real. 

Certo que o PT deteriorou muito as instituições, mas em áreas localizadas. As instituições que protegem o País do retrocesso do campo político estão consolidadas e preservadas, que são a democracia e o sistema judiciário independente. A investigação da Operação Lava Jato tem mostrado que esse campo, que é vital para a democracia, está preservado. Eu diria que a Lava Jato é um grande êxito, não tem mais como detê-la. 

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IM – Então na sua visão, apesar de todos os problemas que enfrentamos hoje, o Brasil está em um patamar melhor? 
MN – O Brasil mudou e as pessoas, como as que vemos no PT, não perceberam isso, a ponto de acharem que se trocar Joaquim Levy [ministro da Fazenda] por Henrique Meirelles o País voltará a crescer. O Brasil de hoje é muito melhor. Quando colocamos os avanços e o tamanho da crise atual, vemos que ela não é a pior que já tivemos. Ela pode ser mais intensa em alguns aspectos, mas as vantagens que temos hoje para detectar e corrigir os erros já nos colocam em outro patamar. 

IM – Quais são as diferenças do Brasil de hoje e o do passado que te garantem essa confiança?
MN – Há duas enormes diferenças em relação ao passado. A primeira está no menor risco de uma crise cambial, que era o que agravava o cenário anteriormente. A reserva cambial se exauria e o País deixava de pagar sua dívida externa, mas hoje, com o câmbio flutuante e uma reserva de US$ 370 bilhões, é muito difícil que ocorra uma crise cambial, a não ser em uma catástrofe. 

Em segundo lugar, as crises no passado eram intensificadas com crises bancárias, quebras de bancos e contração do crédito, e estamos longe disso no Brasil. Então, o País hoje está muito mais protegido de um agravamento dessa situação. 

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IM – Mas teria como piorar?
MN – O quadro pode se agravar pelo processo de impeachment. O processo tem sido conduzido de maneira muito tumultuada, podendo culminar com transgressão de regras. É difícil provar que houve um fato que justifique o impeachment, mas o Congresso, crescentemente, acha que Dilma mereça sair.

Não que ela não mereça sair pela desastrosa gestão do País, mas o importante é que ela saísse seguindo as regras do jogo. Esse é o lado negativo de como esse processo está sendo encaminhado, por um presidente da Câmara ausente de qualquer legitimidade. Ele [Eduardo Cunha] está usando sua posição para melhorar sua situação perante ao Conselho de Ética e se aliar à oposição e outros grupos para derrotar o governo, diante de uma expectativa de que desvie a atenção do público para o seu problema grave, do qual ele não tem muita saída ou não tem nenhuma. 

Cunha enfrenta três riscos: perder a presidência da Câmara, o mandato e ir para a cadeia. Eu acho que esses três riscos podem se materializar. Hoje, ele é um cão raivoso, tentando sobreviver de qualquer forma. Ele é um elemento de instabilidade do sistema político. Uma situação que casa com um governo desarticulado. Estamos então no pior dos mundos.

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IM – Diante da situação que o processo de impeachment está correndo, o senhor acha que isso vai se arrastar ainda por um bom tempo?
MN – Tudo indica que será um processo longo. Só seria curto se Dilma fosse vitoriosa na Câmara, mas deve demorar de seis meses a um ano. Diferentemente do que ocorreu com Fernando Collor, que era um presidente particularmente destroçado, sem partido político e com prova de crime. O processo dele acabou em menos de 4 meses. 

Por esse processo de agora indicar ser tumultuado e longo, devemos presenciar uma paralisia no País em decisões de investimentos e no sistema político. Um cenário em que o governo encaminharia projetos para o Congresso, mas conseguiria aprovar apenas o essencial, o que aprofundaria a crise. Realmente é um mau momento. 

IM – Há atualmente um pessimismo exagerado em relação ao desdobramento da crise?
MN – Eu vi um diretor do Banco Central falar semanas atrás que a sociedade não aguenta mais um ano. Claro que é uma forca de expressão, mas a questão é: o Brasil vai acabar? Não tem nenhuma razão para acreditar nisso. Vamos pagar um preço altíssimo se esse governo ficar, mas o Brasil não acaba. Você não vai ter hiperinflação, o sistema financeiro não vai quebrar.

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Contudo, nos tornaremos um País medíocre, que não se prepara o futuro, pois o governo atual não tem condições de propor, conduzir reformas e se mobilizar. Esse pessimismo se combina com a percepção de que a saída da Dilma geraria uma nova era para o Brasil.

IM  – E o senhor discorda disso?
MN – Completamente. Há inclusive nos jornais já a ideia de que [José] Serra iria para o PMDB e seria o candidato de 2018, enquanto [Michel] Temer seria o novo Itamar Franco. Serra então seria o novo FHC, viraria presidente lá na frente. Mas nada disso corresponde à realidade. 

O que fez a diferença no governo Itamar Franco foi o Plano Real, porque ele como presidente caminhava para um desastre. Ele mudava o ministro da Fazenda a cada 2 meses. O mercado só começava a funcionar depois que ele fazia uma declaração desastrosa pela manhã. FHC e o Plano Real que fizeram a diferença.

Agora, se você olhar, o Plano Real não descontentava ninguém. Todo mundo dava valor, a não ser o PT, que reclamava por achar que era estelionato eleitoral. A população estava inteira em acordo com o programa. Por isso, FHC foi eleito em 1º turno três meses depois.

IM – Com ou sem Dilma, o que o Brasil precisa fazer?
MN – O que o Brasil precisa fazer agora é um conjunto de reformas complexas, mas isso contraria poderosos interesses no sistema político e nos segmentos da sociedade. Não é fácil. Para isso, você precisa ter liderança, capacidade de mobilização, apoio de segmentos da opinião pública, mas isso não vai acontecer agora. Como o Brasil pode aprovar a idade mínima [na Previdência] se tem uma parte dos políticos que se elegem com o voto dos aposentados? 

IM – Apesar do amplo debate que vem sendo construído em torno do impeachment, poucas propostas surgiram para tentar colocar o Brasil de volta nos trilhos do crescimento…
MN – O Plano Real era algo relativamente simples. Transitar de uma moeda inflacionária para uma moeda estável. Isso não exigiu passeatas, movimentos de ruas, pressões nas galerias do Congresso, aposentados fazendo pressão em Brasília ou sindicatos indo contra. Mas como fazer isso em um País em crise? Isso só vai acontecer com a renovação de lideranças em 2018. Eu não vejo Temer, se virar presidente, com essa liderança, força política e capacidade de mobilização para enfrentar todos esse grupos e dotar o País das reformas que ele precisa. 

Diferentemente do Plano Real, que mudou radicalmente a situação política e chance do FHC, que impôs uma derrota ao Lula, agora é uma coisa trabalhosa, demorada, de resultados a longos prazo. Eu não consigo imaginar Temer e Serra como os novos Itamar e FHC.

IM – Então podemos concluir que, assim como temos um pessimismo exagerado com a crise atual, também vemos um otimismo exagerado em relação à eficácia de uma mudança de governo?
MN – Isso mesmo. Eu acho que uma mudança de governo melhoraria o clima, desbloquearia o impasse e abriria novas expectativas. O governo seria mais homogêneo, articulado, mas não a ponto de levar o Brasil para as reformas que ele necessita. Acho que você evitaria uma continuidade da degradação que temos assistido nos últimos tempos, tanto na parte econômica quanto social, mas não é uma reversão para dar ao Brasil novamente um crescimento de 3% de PIB ao ano.

Nesse caso, se aplica a imagem de que: depois de um pileque de crédito, de gastos, de desonerações tributárias, você acordaria no outro dia e já começaria a correr uma maratona. Não dá. Tem que ter um período de convalescença para absorver todos esses equívocos. As medidas adotadas vão demorar um tempo para produzir resultados.

O Brasil contratou com a clamorosa gestão do governo Dilma de três a cinco anos de mediocridade. Mesmo assim, acho que não dá para prolongar o pessimismo para um prazo mais para frente. Eu tenho a impressão de que o Brasil pode estar se aproximando de um período de grande virada.

IM – Essa virada viria quando?
MN – De uma mudança de liderança nas eleições de 2018, com o encerramento do ciclo do PT no governo. Ela não vem antes de 2019.

IM – O senhor trabalha com um cenário-base em que Dilma se mantém no governo?
MN – Esse era meu cenário até umas semanas atrás. Mas agora com essa deterioração e esse rosário de erros que eles estão cometendo, o governo começa a cavar sua própria cova. A sucessão de erros é inacreditável e vem na condução do processo, na articulação, nas declarações. O próprio governo está se enredando no processo e se autocondenando, tão ruim é a articulação.

Agora meu ponto é outro. Se você olhar a história dos últimos 60 anos, o Brasil teve duas grandes crises: a primeira do final do governo de Juscelino Kubitschek até o golpe militar [1961-1964]; e a segunda é a fase anterior ao Plano Real e governo FHC. Nesses períodos, o Brasil fez importantes reformas. E isso graças a três importantes fatores: a criação de ideias de como enfrentar os problemas; apoio crescente do povo para essas ideias; e liderança de chefe do governo. 

Hoje, estamos presenciando uma enorme geração de ideias e um amadurecimento da sociedade. Falta apenas a liderança política. Mas ela não vai surgir do processo de impeachment. O pós-impeachment é uma crise. Essa liderança vai surgir de uma renovação promovida pelo processo eleitoral de 2018.

IM – Nos preparando para essa possível reversão do quadro econômico de 2019, o caminho que vamos ter que trilhar agora deve trazer um 2016 ainda pior do que 2015?
MN – Acho que não. A não ser que o processo de impeachment gere um efeito na economia ainda pior, mas acho que a partir do segundo semestre de 2016 a economia vai começar a reagir. Acredito que 2017 e 2018 podem ser anos de crescimento muito baixo, mas terá algum. Claro, já tem gente falando em recessão em 2017, mas esse ainda não é o meu cenário. 

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Mas tudo indica que sera o processo longo, so sera curto se dilma for vitoriosa na Câmara. Esse processo vai demorar de 6 meses a 1 ano. Diferentemente do Collor, que era um presidente particularmente destroçado, sem partido politico, com prova de crime, o stabishment contra ele. Então o processo dele acabou em menos de 4 meses. No caso de Dilma é diferente.  

 

Esse processo tem tudo para ser tumultuado e longo. Se ela não vencer essa primeira etapa, da Câmara, é um processo que deve se prolongar por 6 a 12 meses. Isso tudo vai gerara uma paralisia no pais, em decisões de investimentos, no sistema politico, o governo encaminha e consegue aprovar apenas o essencial, o que aprofunda a crise. Realmente é um mau momento. Por isso, mto provável que o PIB caia 3% ano aque vem. A única expectativa é que se não agravar mto no front politico, os primeiros sinais de recuperação começam a aparecer no segundo semestre do próximo ano, a começar pelo setor externo, diante da forte depreciação cambial.