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O PSB aprovou, por aclamação, nesta sexta-feira (29), o nome de Geraldo Alckmin, ex-governador de São Paulo, para a posição de vice na chapa liderada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para concorrer à Presidência da República.
A decisão foi tomada em convenção nacional da sigla, que acontece em um hotel em Brasília. Antes, os filiados ao PSB aprovaram a participação do partido na coligação com PT, PCdoB, PV, PSOL, Solidariedade e Rede para a disputa ao Palácio do Planalto.
O evento conta com uma ampla estrutura − muito diferente do ato protocolar a portas fechadas que marcou a convenção nacional do PT uma semana atrás, sem a presença dos pré-candidatos, que cumpriam agenda em Pernambuco.
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Desta vez, Lula e Alckmin participam, ao lado das principais figuras dos partidos que integram a aliança. Politicamente, a convenção nacional do PSB é tratada como o verdadeiro marco para a oficialização da chapa para a corrida presidencial.
Pelo calendário da Justiça Eleitoral, os partidos têm entre 20 de julho e 5 de agosto para realizar as reuniões que definirão coligações e a escolha candidaturas à presidência, aos governos e aos cargos de deputado federal, estadual e distrital. Depois, as siglas têm até 15 de agosto para solicitar os registros de candidatura junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A aprovação da chapa Lula-Alckmin sela uma aliança antes vista como improvável no meio político, por envolver figuras que rivalizaram o debate nacional por anos.
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Um dos fundadores do PSDB e hoje no PSB, Geraldo Alckmin governou o estado de São Paulo por quatro vezes − e durante todo esse período sofreu oposição do PT à sua gestão.
Ele também disputou a Presidência da República em duas situações. Na primeira, em 2006, foi derrotado por Lula no segundo turno, por 58.295.042 (60,83%) votos a 37.543.178 (39,17%). Doze anos depois, obteve apenas 5.096.350 votos (4,76%) no primeiro turno, amargando a quarta posição, apesar de ter construído ampla coalizão e o maior espaço para propaganda no rádio e na televisão.
Após o fracasso, que contou com a traição de aliados dentro do próprio PSDB, Alckmin submergiu e teve sua “morte política” decretada por figuras influentes nos círculos de poder e observadores da política brasileira. Como vice de Lula, ele agora tenta a reabilitação.
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Conheça mais sobre a trajetória de Geraldo Alckmin clicando aqui.
A confirmação da chapa entre Lula e Alckmin também ocorre no momento em que a dupla busca ampliar sua base de apoio partidária, reforçar a rede de alianças nos estados e resolver disputas locais ainda pendentes entre as duas siglas (veja detalhes ao final da matéria).
O movimento de aproximação de figuras que por anos foram antagonistas na política nacional reforça a mensagem de construção de uma “frente ampla” em oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição – narrativa usada pela campanha para costurar alianças que vão além do campo da esquerda.
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A campanha de Lula e Alckmin tem intensificado as negociações com outras legendas. Na semana passada, eles conquistaram o apoio de lideranças do MDB em 11 estados – o que provocou um racha no partido, mas não evitou o lançamento da candidatura de Simone Tebet ao Palácio do Planalto, apesar das investidas da ala lulista pelo adiamento da convenção nacional.
Lula também tem flertou com o PSD em busca de novos aliados para a disputa. Ele tem argumentado que a construção de uma “frente ampla” seria fundamental para enfrentar Bolsonaro e poderia, inclusive, evitar a necessidade de disputa em segundo turno.
A bola da vez é o União Brasil, sigla criada a partir da fusão entre PSL e DEM, e que tem Luciano Bivar como pré-candidato ao Palácio do Planalto. O partido é o que conta com mais recursos do fundo eleitoral e a maior fatia no horário de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
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A possibilidade de êxito nas tratativas poderia dar a Lula 5 minutos e 16 segundos, e 12 inserções, por dia em rede nacional, contra 3 minutos e 7 segundos, e 7 inserções, de Bolsonaro. Mas o movimento é visto como complexo, tendo em vista a diversidade de perfis entre os filiados ao União Brasil.
Uma ideia de moeda de troca em discussão seria assegurar o apoio do PT à candidatura de ACM Neto ao governo da Bahia, retirando o nome de Jerônimo Rodrigues (PT) da disputa. Caso as conversas não avancem, a ideia dos petistas seria garantir a neutralidade da legenda na disputa presidencial – evitando, assim, o risco de uma aliança com Bolsonaro.
Esta será a sexta vez que Lula disputa a Presidência da República, cargo que ocupou por dois mandatos (2003-2010). O petista se candidatou ao posto em 1989, 1994, 1998, 2002, 2006 e 2018 – na última, porém, não conseguiu ir até o fim, por ser enquadrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na Lei da Ficha Limpa, em razão de condenação no âmbito da Operação Lava Jato.
Recordista em participações em eleições presidenciais desde a redemocratização, Lula também é o primeiro candidato lançado por uma federação partidária – a Brasil da Esperança, formada por PT, PCdoB e PV. O instrumento, introduzido no pleito de 2022, consiste na união de dois ou mais partidos, que deverão atuar como uma única legenda por menos pelo menos quatro anos.
A menos de dez semanas das eleições, Lula lidera nas principais pesquisas para a corrida presidencial. No último levantamento realizado pelo instituto Datafolha, divulgado na quinta-feira (28), o petista apareceu com 47% das intenções de voto em cenário estimulado de primeiro turno. Já Bolsonaro tinha 29%. Em terceiro lugar apareceu Ciro Gomes (PDT), com 8%, seguido por Simone Tebet (MDB), com 2%. Se a eleição fosse hoje e esse resultado se confirmasse, Lula estaria eleito em primeiro turno.
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“Frente ampla”
Em seu discurso, Geraldo Alckmin fez duras críticas ao governo Jair Bolsonaro e reforçou acenos para públicos mais distantes do eleitorado tradicional de Lula, ao falar sobre política econômica, mencionar dificuldades enfrentadas por empresários na atual conjuntura do país e ao confrontar o lugar de fala que o presidente alega ter na defesa dos “valores da família”.
“Estamos unidos, firmes e determinados a livrar o Brasil do fanatismo político, das ameaças do bolsonarismo ao estado democrático de direito, da ruinosa política econômica que pôs o Brasil de volta no mapa da fome, que trouxe de novo a inflação, que empobreceu (…), que marginalizou milhões de brasileiros, inviabilizou negócios, investimentos e empregos”, disse em discurso preparado.
“Já passou a hora de darmos um basta à incompetência e à irresponsabilidade de um governo que não sabe cuidar propriamente do seu povo, que é incapaz de prever, prover e promover, porque só improvisa, omite e destrói. É hora de darmos um basta às ameaças à nossa democracia”, sustentou.
O vice na chapa fez uma enfática defesa da democracia, em contraste com as preocupações geradas em meio a contestações de Bolsonaro ao sistema eleitoral, ataques a cortes superiores e à convocação de uma nova manifestação contra magistrados no 7 de Setembro (Dia da Independência).
“A ditadura nos tirou a liberdade, mas o povo brasileiro não vive sem liberdade, e quem não vive sem liberdade não vive sem democracia. Por isso, não vamos jamais abrir mão do nosso direito de escolher livremente quem deve governar o país. Quem alega fraude tem de provar e quem não prova tem de ser punido pela farsa de acusar. Não vamos cair no jogo da mentira, não vamos nos render às manhas e aos desvarios de um presidente que não quer voltar para casa”, afirmou.
“É hora de Bolsonaro ir embora por todo o mal que causou para o país. É hora de ir embora e, com ele, as ameaças, a bagunça e a incompetência. Quem menospreza o sofrimento alheio no meio de uma pandemia, quem faz apologia ao armamento, quem defende a tortura, quem hostiliza, agride e intimida não pode mesmo ter compaixão. Bolsonaro se vangloria de defender os valores da família, mas, de verdade, ninguém fez mais para arruinar a estabilidade da vida familiar neste país do que seu próprio governo”, atacou o ex-governador paulista.
Visto como o símbolo da “frente ampla” construída por Lula para essas eleições, Alckmin também buscou se comunicar com os eleitores de fora da base de apoio da chapa e com agentes econômicos. Não deixou de falar sobre empobrecimento e a volta da fome no Brasil, mas também tratou de negócios, investimentos e política econômica.
“O governo Bolsonaro trouxe nada mais que divisão e injustiça no Brasil. As despesas públicas aumentaram, os impostos continuam altos, o real se desvalorizou, o meio ambiente está exposto a devastação, e o que aconteceu em troca? Mais crescimento, mais desenvolvimento? Nada disso. Oportunidades desperdiçadas, chances perdidas, agressões estúpidas e inconsequentes a países parceiros, erros nas relações diplomáticas que só causaram prejuízo ao Brasil. E a pobreza agravada pela inflação se alastrou, a fome voltou e o sofrimento do nosso povo só se agravou. Enquanto isso, armas na mão, motociatas pelas ruas, gastos com cartões corporativos nas alturas e sob sigilo, verbas públicas despendidas sob segredo, negócios escandalosos em ministérios, sucateamento do serviço público. Este é o mundo fake do Bolsonaro”, frisou.
“Em 2023, o Brasil dará um basta a tudo isso. No ano que vem, o Brasil terá um novo comando, o Brasil terá um novo governo. E ao contrário do atual, o governo Lula trará responsabilidade, planejamento, previsibilidade, trará de volta a confiança e a segurança. É a esperança que se realiza. É a realidade que se aproxima de um futuro que está cansado de esperar”, concluiu.
Durante seu discurso, Lula enfatizou a importância da aliança construída por partidos políticos, centrais sindicais e movimentos da sociedade civil em torno da sua candidatura ao Palácio do Planalto. Sua fala também marcou defesas enfáticas à democracia e a memória de suas gestões – trabalhando com a ideia de comparação com a situação do eleitor hoje, governado por Bolsonaro.
“A dimensão do que nós estamos fazendo hoje é muito maior do que a gente poderia imaginar que poderia acontecer nesse país”, afirmou.
“Nós estamos fazendo a mais importante aliança feita entre todos os partidos de esquerda deste país e os partidos democráticos deste país. Estamos fazendo uma aliança com praticamente todas as centrais sindicais brasileiras”, disse.
Lula afirmou que sua missão, caso eleito, será “recuperar a normalidade do país”. “A experiência do Alckmin e a minha experiência vão significar a mais importante revolução pacífica deste país. Primeiro, porque nós conhecemos tudo por dentro e por fora. Segundo, porque nós já sabemos como funciona o emaranhado da burocracia. Terceiro porque vamos conversar seriamente… E espero que a gente consiga eleger muitas deputadas e muitos deputados para que a gente possa jogar fora o orçamento secreto.”.
“As pessoas precisam saber que esse país vai melhorar. Tem uma crise econômica, eu sei, é difícil. O Brasil está pior do que nós pegamos em 2003. O desemprego está pior, a massa salarial está menor, faz tempo que não aumenta o salário mínimo. Está tudo pior. Qual é a vantagem? É que eu e o Alckmin estamos melhores”, afirmou.
Logo no início de sua fala, Lula também fez acenos à classe empresarial, a intelectuais e professores que se engajaram na redação de um manifesto a favor da democracia e em defesa das urnas eletrônicas, que alcançou 400 mil assinaturas em menos de uma semana. A carta é uma resposta da sociedade civil aos ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral brasileiro.
“Eu nunca imaginei, aos meus 76 anos, aos meus 50 anos de participação política no movimento sindical e nos partidos, que nós iríamos ver um presidente da República cometer a idiotice de chamar os embaixadores de quase 70 países para fazer o pior papel que um presidente da República pode fazer, que é mentir para os embaixadores e vender uma ideia falsa de que no Brasil a democracia corre risco por conta das urnas eletrônicas”, afirmou Lula.
“O que a sociedade que fez o manifesto está dizendo é para ele tomar cuidado, que ele não tem que ter medo da urna eletrônica, porque ela já provou eficácia, seriedade na apuração das eleições e rapidez como nenhum outro país no mundo. O que ele tem que ter medo é que o povo brasileiro está saturado, está enojado e está cansado de tanta mentira, de tanta fake news e tanta destruição nesse país”, sustentou.
Lula também voltou a fazer acenos às Forças Armadas em seu discurso, organização tida como peça fundamental no contexto de tensão institucional do país.
“As Forças Armadas têm suas funções estabelecidas na Constituição. Elas nunca perguntam para quem, por quê, da decisão de um presidente da República. Eles cumprem. O que nós precisamos é estabelecer uma relação de respeito, em que cada um cumpra com a sua função. E não ter um presidente que trata as Forças Armadas como se fosse um objeto na mão dele”, disse.
Coalizão construída
Durante a convenção, lideranças de partidos que integram a coligação Lula-Alckmin ressaltaram o esforço de superar as diferenças em projetos nacionais para construir uma ampla aliança nestas eleições. Eles falaram em fortalecimento da democracia, promoção de políticas sociais e em evitar retrocessos.
O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, disse que o pleito deste ano configura essencialmente uma disputa “entre democracia e autoritarismo, entre civilização e barbárie”.
“Nesse contexto, em que pesem questões pontuais e projetos distintos em alguns estados, a luta em favor da plenitude democrática une de forma sólida os partidos que compõem o campo progressista no apoio incondicional a Lula e Alckmin”, disse.
Já Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente nacional do PT e deputada federal, lembrou do histórico de alianças entre seu partido e o PSB. Ela pontuou que nem sempre as duas siglas estiveram juntas em disputas de primeiro turno, embora tenham dividido trincheiras em diversas corridas de segundo turno. A dirigente, no entanto, vê peculiaridades no pleito de 2022, que exigiram uma construção diferente.
“Nesta eleição de 2022, ninguém titubeou. Apesar das divergências que trazíamos em nossos embates, vimos a necessidade de estarmos juntos para enfrentar o que o Brasil está passando. Não é possível a gente retroceder em uma luta que desde 1988 começou com o advento da Constituição e que a gente vem construindo: a nossa jovem democracia”, afirmou.
“Essa foi uma construção que expressa a maturidade de todos esses partidos, diante dos desafios deste momento político que estamos vivendo. Não é um momento simples, mas exigiu de nós uma cabeça aberta de construir essa unidade, que, mais do que tudo, é uma necessidade do Brasil e de quem tem amor ao nosso povo e ao nosso país”, destacou a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
A parlamentar, que é vice-presidente do PCdoB, também explorou a ideia de uma disputa entre “civilização” e “barbárie”, e ainda rechaçou o conceito de polarização, usado por diversas figuras políticas e analistas para classificar o estágio da disputa centrada nas figuras de Lula e Bolsonaro.
Aparando arestas
Apesar da aliança em nível nacional, PT e PSB ainda trabalham para aparar arestas em alguns estados, em uma tentativa de evitar divisões, “fogo amigo” e garantir palanques mais estruturados para as candidaturas das siglas.
Os acertos começaram em São Paulo, onde o ex-governador Márcio França (PSB) desistiu da disputa ao Palácio dos Bandeirantes para disputar um assento no Senado Federal, após a saída do apresentador José Luiz Datena (PSC) da corrida pelo cargo no Poder Legislativo. O movimento permitiu a aliança entre PT e PSB no maior colégio eleitoral do país.
No Espírito Santo, o PT retirou a pré-candidatura do senador Fabiano Contarato para apoiar a reeleição do governador Renato Casagrande (PSB). Enquanto em Santa Catarina, a tendência é que as duas siglas caminhem com a candidatura do ex-deputado federal Décio Lima (PT), e o senador Dário Berger (PSB) dispute um novo mandato na casa legislativa.
Um dos casos pendentes ocorre no Rio Grande do Sul, onde o ex-deputado federal Beto Albuquerque (PSB) é pressionado a desistir de sua candidatura ao governo estadual para apoiar o deputado estadual Edegar Pretto (PT). Durante a semana, circulou notícia que de Albuquerque abandonaria a disputa, mas ele logo desmentiu a informação.
Também há problemas no Rio de Janeiro, onde os partidos tinham um acordo em que o PT apoiaria a candidatura de Marcelo Freixo (PSB) ao governo estadual e o PSB defenderia um nome do partido aliado na disputa pela vaga ao Senado Federal.
O deputado estadual André Ceciliano (PT), presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), foi o escolhido pelos petistas, mas o deputado federal Alessandro Molon (PSB), que hoje aparece à frente nas pesquisas, resiste em sair da disputa. Com a aliança ameaçada, o PSB nacional passou a trabalhar para derrubar a candidatura de Molon.