Projeto do governo autoriza BNDES a financiar obras no exterior e impõe trava a inadimplentes

Assunto divide opiniões: defensores apontam ganhos geopolíticos e econômicos, enquanto críticos alertam para custos, casos de corrupção e inadimplência

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) em cerimônia de posse do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante (PT), no Rio de Janeiro (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) em cerimônia de posse do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante (PT), no Rio de Janeiro (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

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Chegou ao Congresso Nacional, nesta terça-feira (28), o projeto de lei (PL 5.719/2023) do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que permite que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) volte a financiar atividades produtivas de empresas brasileiras no exterior e possa constituir subsidiárias integrais ou controladas.

Conforme pontua o Poder Executivo em mensagem encaminhada ao parlamento, o projeto tem como objetivo “permitir a retomada do apoio público a esta modalidade de exportação realizada pelas empresas brasileiras, nos moldes das melhores práticas internacionais”.

O texto é assinado pelo presidente em exercício, Geraldo Alckmin (PSB), que também exerce o cargo de ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, e pela ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck.

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O governo sustenta que programas públicos de apoio à exportação existem há mais de 100 anos em países desenvolvidos e começaram a ser implementados por economias em desenvolvimento nas últimas décadas. E alega que atualmente existem mais de 90 agências de crédito à exportação no mundo e quase todos os países industrializados contam com estruturas análogas para exercerem tal função.

“As instituições denominadas agências de crédito à exportação desfrutam de mandatos de governo para concessão de apoio oficial por meio de financiamentos (empréstimos) ou seguros e garantias aos financiadores privados, valendo-se, sobretudo, de recursos públicos, com o objetivo de gerar emprego e renda em seus países de origem”, sustenta o texto.

Como consequência, a expectativa é que a iniciativa contribua na oferta de empregos nacionais, através de uma fonte de demanda alternativa à doméstica, e na geração de divisas em moeda estrangeira − o que contribui no fortalecimento do balanço de pagamentos do país.

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O governo também menciona, entre as justificativas para a medida de promoção do apoio público à exportação, a existência de riscos que não são absorvidos pelo setor privado, como o risco político associado ao crédito para entes soberanos e tradicionalmente assumidos por instrumentos públicos de créditos à exportação, mediante cobrança da remuneração de risco.

“A carteira de crédito à exportação de projetos de grande porte e que requerem prazos longos de pagamento tendem a apresentar riscos concentrados, decorrentes do padrão de investimento do país importador (p. ex., concentração regional) e das próprias diferenças quanto à necessidade de financiamento do importador (países menos desenvolvidos) e da estrutura de determinadas indústrias”, argumentam os ministros no texto.

O governo também sustenta que o apoio às exportações de serviços normalmente traz benefícios ao longo de uma extensa cadeia produtiva que envolve fornecedores e subfornecedores de bens, materiais e equipamentos, além de outros serviços de apoio à operação.

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” Os financiamentos às exportações de serviços de engenharia realizados pelo BNDES entre 2007 e 2015 movimentaram uma rede de 4.044 fornecedores diretos no Brasil, sendo 2.785 microempresas e empresas de pequeno porte (MPME). Apenas essa parte imediata da cadeia de fornecimento incluiu, em cada um dos anos considerados, pelo menos 800 empresas e 400 mil trabalhadores empregados no Brasil. Esses números chegaram a mais de 1.000 empresas (em diversos anos) e mais de 750 mil empregos (em 2014), registrando ao final uma média de 1.001 empresas e 590 mil pessoas empregadas por ano”, pontuam.

“O apoio se mostrou um importante impulsionador do uso de fornecedores nacionais nas obras internacionais das construtoras brasileiras. Entre 2003 e 2012, as empresas brasileiras de engenharia e construção apoiadas exportaram 19 vezes mais bens brasileiros para mercados em que atuavam com apoio do BNDES do que para outros países onde atuavam sem financiamento do BNDES. Vale mencionar também o impacto financeiro das operações de crédito. Foram desembolsados pelo BNDES R$ 22,2 bilhões, que retornaram aos cofres públicos, incluindo o Fundo de Amparo ao Trabalhador, na forma de pagamentos de US$ 12,8 bilhões de principal e juros (equivalentes a R$ 39,3 bilhões, considerando o câmbio das datas dos repagamentos)”, prosseguem.

A participação do BNDES em empreendimentos de companhias brasileiras no exterior é assunto polêmico. De um lado, defensores da medida apontam potenciais ganhos às empresas nacionais e conquista de espaços relevantes no tabuleiro da política internacional. De outro, críticos apontam casos de corrupção revelados no âmbito de operações como a Lava Jato e problemas de inadimplência por outros países, que precisaram ser absorvidos com recursos nacionais.

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Já tramita no Congresso Nacional, em sentido contrário, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para sujeitar à autorização do Poder Legislativo operações de crédito pactuadas por instituições financeiras controladas pela União para operações que forem executadas fora do país.

O projeto encaminhado pelo governo determina que as operações de financiamento à exportação de serviços observem modos de prestação estabelecidos no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) e observem orientações em regulamento do Poder Executivo quanto à elegibilidade, ao reconhecimento e à comprovação das exportações.

Além disso, fica proibida a concessão de novas operações de crédito entre o BNDES e as pessoas jurídicas de direito público externo inadimplentes com o Brasil − exceto nas hipóteses em que houver a formalização da renegociação da dívida.

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De outro lado, o banco público brasileiro também tem o compromisso de apresentar à sociedade os resultados de suas atividades de apoio à exportação, especialmente em termos de objetivos, recursos utilizados e alcance dos resultados de política pública. E deverá apresentar à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, anualmente, relatório com informações sobre a carteira de financiamentos à exportação de serviços concedidos.

O texto encaminhado ao Congresso Nacional traz dispositivo prevendo que se estabeleça valor máximo do financiamento que o BNDES pode oferecer em uma operação de crédito às exportações de serviços, seguindo as melhores práticas internacionais. Pelo texto, a participação máxima será um percentual do valor total a ser pago pelo importador pelos bens e serviços exportados, incluindo exportações realizadas a partir de terceiros países e excluindo gastos locais.

Mas o projeto permite que os custos incorridos pelo exportador com bens e serviços adquiridos no país do importador e as exportações realizadas a partir de países terceiros sejam financiados. “Não obstante o BNDES tradicionalmente não financiar o custo incorrido pelo exportador com bens e serviços adquiridos no país do importador ou em terceiros países, foi incluída essa possiblidade com o objetivo de equiparar o apoio brasileiro às práticas de elegibilidade de concorrentes ou cofinanciadores públicos estrangeiros, haja vista que o financiamento a parte dos gastos locais necessários à viabilidade dos projetos é prática usual de Agências de Crédito à Exportação estrangeiras”, explicam.

“É sabido, por meio de diferentes estudos sobre práticas internacionais, que apoiar uma determinada parcela de gastos locais em projetos envolvendo exportações nacionais é prática difundida entre Agências de Crédito à Exportação. Ao não apoiar determinados gastos locais previstos como necessários para a realização de projetos que geram demanda para exportações brasileiras, diminui-se a competitividade nacional, em benefício de exportações a partir de outros países cujas Agências de Crédito à Exportação estrangeiras permitem tal apoio combinado”, justificam.

Além do apoio à exportação de serviços, o texto trata da possibilidade de o BNDES criar subsidiárias, com vistas ao cumprimento de atividades do seu objeto social. Atualmente, o banco público só possui autorização para constituição de novas subsidiárias no exterior. Mas o governo entende que a ampliação desta permissão para território nacional pode ajudar na eficiência do banco.

“A autorização em questão é oportuna especialmente no momento em que o BNDES se estrutura para reforçar suas fontes de captação internas e externas, de maneira complementar ao FAT, para suas operações de financiamento, o que permitirá reduzir sua dependência em relação ao Tesouro Nacional e ao próprio FAT. Trata-se de algo usual para os Bancos de Desenvolvimento no exterior, a exemplo do alemão Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW), cuja principal fonte de recursos é sua própria captação, e que adequou a sua estrutura operacional para atender áreas de negócios específicas, tais como exportações e negócios internacionais, transição climática, startups e pequenas empresas, habitação, dentre outras”, argumentam.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.