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O governo já está de prontidão para editar uma Medida Provisória (MP) liberando R$ 95 bilhões para quitar imediatamente os precatórios represados pela chamada “PEC do Calote”, que “pedalou” o pagamento dessas dívidas judiciais da União até 2026.
A injeção desse dinheiro na economia, na véspera do fim do ano, encerra um dos capítulos mais polêmicos da história recente da política econômica brasileira.
Trata-se da aprovação pelo Congresso, durante o governo Jair Bolsonaro, de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criou um limite anual de pagamento dos precatórios para abrir espaço no Orçamento e, assim, aumentar os gastos em ano eleitoral.
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Esse limite anual ficou conhecido tecnicamente como “subteto”. A parcela não paga da dívida se acumula, formando uma bola de neve que, pelas projeções do Ministério da Fazenda, chegaria a R$ 250 bilhões em 2027, quando venceria a regra criada pela PEC.
A MP será editada assim que o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) for concluído, mas o placar até agora já formou maioria para permitir a abertura de crédito extraordinário para quitar esses débitos represados, declarando inconstitucional o subteto.
Por enquanto, foram oito votos favoráveis ao atual governo (que defende a inconstitucionalidade da PEC) e um contrário, do ministro André Mendonça, indicado à Corte pelo ex-presidente Bolsonaro. Mendonça havia pedido vista (mais tempo de análise) no início da semana e só votou nesta quinta-feira. Agora, falta apenas um voto, do ministro Kássio Nunes Marques. O julgamento será encerrado às 23h59.
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Pagamento em 2023
O secretário de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Paulo Bijos, garantiu que a publicação da MP será “ato contínuo” à decisão final do STF para que o pagamento ocorra ainda em 2023. “Todas as equipes técnicas (do Planejamento, Tesouro Nacional e Poder Judiciário) estão conversando para que, até o fim do ano, haja o pagamento”, afirmou Bijos.
“O pagamento tem impacto na economia, é botar dinheiro na economia”, disse Eduardo Gouvêa, presidente da Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ).
Um dos mais atuantes advogados contra a PEC do Calote, Gouvêa comemora a decisão do STF. “O que ficou decidido é que o governo não pode submeter decisão judicial a limite de pagamento. Esse era o ponto que nós entendíamos desde o início”, ressaltou.
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Para ele, a iniciativa do governo Lula, de recorrer ao Supremo, pode até ter acelerado a decisão pela inconstitucionalidade; mas, tecnicamente, já estava claro em dois outros julgamentos que o governo não poderia modificar os prazos de pagamento dessas dívidas.
“Isso interfere na independência dos Poderes e é uma cláusula pétrea. O Supremo está se posicionando corretamente no sentido de impedir que essa bola de neve continue a ser construída”, ressaltou.
Ele ponderou que o governo precisa agora regulamentar o chamado encontro de contas para o uso de precatórios como pagamento, por exemplo, de imóveis e concessões.
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A conta de R$ 95 bilhões inclui tanto o passivo acumulado até 2023 quanto os precatórios que deixariam de ser pagos em 2024. Esse dinheiro será quitado por meio da abertura de crédito extraordinário, que ficará fora do limite de despesas e não impactará a meta fiscal.
Essa sistemática – de abertura de crédito extraordinário, sem infringir as regras fiscais – também valerá para 2025 e 2026, segundo o posicionamento dos ministros do STF até o momento. Ou seja, os valores que excederem o “subteto” dos precatórios nesses dois anos também poderão ser pagos sem serem computados no limite de gastos e na meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contas os juros da dívida).
Governo ganha tempo
O ministro relator, Luiz Fux, não aceitou o pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) para que parte dos precatórios fosse classificada como despesa financeira (sem impactar o resultado primário das contas públicas).
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Mas, na prática, a decisão do relator – de permitir o uso de crédito extraordinário até 2026 – dá tempo para governo e Congresso discutirem esse ponto, que foi motivo de grande controvérsia desde que o Ministério da Fazenda apresentou uma proposta para alterar definitivamente como esses pagamentos são computados.
Pela proposta da equipe do ministro Fernando Haddad, o valor principal da dívida seria tratado como uma despesa primária e entraria na lista de gastos submetidos ao teto de gastos. Já o que fosse referente ao pagamento de juros seria segregado e tratado como despesa financeira.