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Braço direito do ministro Fernando Haddad (PT), o advogado Dario Durigan, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, acredita que as desonerações concedidas a 17 setores econômicos e a milhares de municípios − focos do mais recente desentendimento entre governo federal e Congresso Nacional − podem prejudicar o ciclo de cortes nos juros, contratar inflação maior no futuro ou até antecipar uma nova discussão sobre o sistema previdenciário brasileiro, caso sejam mantidas sem os ajustes defendidos pelo Poder Executivo.
Em entrevista ao InfoMoney, Durigan repetiu as críticas feitas pela equipe econômica a essas políticas públicas, que, segundo ele, geraram poucos resultados em termos de geração de empregos ou salários mais altos aos trabalhadores dos setores contemplados, e produziram elevado custo aos cofres públicos (cerca de R$ 150 bilhões em renúncias tributárias ao longo de mais de uma década) − conta que é paga pelo restante da sociedade.
“Quando damos o benefício fiscal para determinado setor, é o resto da sociedade quem arca, de variadas formas, com esse tratamento diferenciado para que o equilíbrio econômico aconteça. (…) Se temos um benefício fiscal que, por exemplo, corrompe a base de responsabilidade fiscal, pode ser que os juros no país não caiam como se espera − o que penaliza toda a cadeia produtiva, que vai ter que tomar crédito com juros mais altos. Se não fosse assim, o que poderia acontecer é inflação mais alta para a população, um juro indireto que é pago pelo consumidor”, argumentou.
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“A segunda consequência é de revés para a Previdência. Se pegarmos a mensagem da última reforma da Previdência, [é dito que] os trabalhadores têm que trabalhar um pouco mais, cumprir mais critérios para se aposentarem, mas as receitas para a Previdência, que também são pagas por empresas e municípios, não poderiam diminuir. (…) Se começamos a frustrá-las, a consequência imediata que vamos ter é a necessidade de se rediscutir a Previdência em breve, fazendo com que o trabalhador tenha que trabalhar ainda por mais tempo, para que o equilíbrio atuarial aconteça”, prosseguiu.
Durante a conversa, Durigan rechaçou a visão de que o recurso apresentado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão dos efeitos das desonerações representaria uma afronta ao Poder Legislativo e disse que o Ministério da Fazenda segue aberto ao diálogo com os parlamentares e setores beneficiados pela medida. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) já teve decisão liminar favorável ao governo concedida pelo ministro Cristiano Zanin, foi levada ao plenário virtual da Corte e recebeu outros 4 votos favoráveis, mas o julgamento acabou interrompido por pedido de vista do ministro Luiz Fux − o que levará a discussão para o plenário físico.
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O secretário argumenta que o movimento do governo é coerente com a agenda de responsabilidade fiscal pregada pelo Ministério da Fazenda e diz que medida provisória (MPV 1202/2023) editada por Lula no ano passado buscava atacar 4 pontos que “extravasavam” o Orçamento aprovado pelo próprio Congresso Nacional em 2023: 1) a prorrogação da desoneração da folha a 17 setores econômicos até 2027; 2) a redução de 20% para 8% da alíquota de contribuição previdenciária paga por um grupo expressivo de municípios; 3) o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse); e 4) o limite para compensação tributária de créditos oriundos de decisões judiciais.
Deles, uma versão desidratada das mudanças do Perse foi aprovada pela Câmara dos Deputados, na forma de projeto de lei, e o teto para créditos tributários, em comissão mista do Congresso Nacional. O restante não encontrou terreno fértil para avançar − o que, segundo o secretário-executivo da Fazenda, motivou a ofensiva no Judiciário. “A MPV1202/2023 trazia à luz 4 tópicos que extravasavam do Orçamento aprovado no ano passado. Nela, não havia afronta ao Congresso, e sim um pedido de reengajamento para que acomodássemos decisões importantes do Congresso à Lei de Responsabilidade Fiscal, ao Orçamento e à última reforma da Previdência feita no país”, disse.
“A medida provisória teve alterações. Retiramos o tema dos 17 setores e trouxemos para projeto de lei. A pedido do Congresso, retiramos a urgência do PL e iniciamos as tratativas com os relatores. Mas o que temos ouvido do Congresso é que não há grande espaço para mudança, que seria aprovado o mesmo texto do ano passado. À luz desta sinalização, a judicialização é devida”, prosseguiu Durigan.
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O movimento gerou reação imediata de parlamentares. Um dos mais vocais foi o próprio presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que disse que o governo errava em judicializar a questão, sinalizou que tomaria “providências políticas” e rapidamente entrou com recurso junto ao STF − que até o momento não produziu os efeitos desejados por parte dos congressistas. Nos bastidores, o risco de retaliações com o avanço de “pautas-bomba” começou a ser mencionado por parlamentares.
“Fomos ao Supremo não para rediscutir a política, mas para rediscutir os aspectos de inconstitucionalidade que as medidas possam ter − que, no nosso ponto de vista, têm”, pontuou Durigan na entrevista ao InfoMoney. O governo argumenta que as desonerações concedidas pelo Congresso Nacional desrespeitaram a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ao não apontarem fontes de compensação para a renúncia de receitas provocada como cada uma das medidas.
“Não acho que tenha havido, do ponto de vista de valorização e diálogo institucional, nenhum retrocesso. Vivemos as complexidades da democracia, com os posicionamentos diferentes, mas vejo avanços. E a decisão do Supremo − a liminar do ministro [Cristiano] Zanin, já referendada por outros 4 ministros − aponta para esse caminho do diálogo institucional e por premissas claras. Premissas de responsabilidade fiscal”, sustentou.
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Apesar do placar confortável construído no STF, Durigan diz que o governo está aberto a discutir caminhos com o Legislativo. E destacou uma série de medidas que o Ministério da Fazenda trabalha para a aprovação dos parlamentares ainda em 2024, como a regulamentação da reforma tributária, o novo marco de seguros e pautas relacionadas ao mercado de crédito e à transição ecológica.
Na conversa com a reportagem, o “número 2 de Haddad” também reforçou que, a despeito dos ajustes feitos nas metas de resultado primário, a agenda de equilíbrio das contas públicas continua. E estima necessidade de R$ 50 bilhões em medidas adicionais para cumprir o objetivo de déficit zero (mesma meta de 2024) no próximo ano.
“Não há mudança da nossa agenda e haverá perseguição dessas metas, que são colocadas de maneira ousada”, afirmou. “Estamos dosando as medidas que vamos ter que adotar, porque de fato serão necessárias novas medidas (…) para atingir uma meta crível, que seja sensível ao contexto político em que vivemos”.
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Veja os destaques da entrevista:
InfoMoney: O ministro Fernando Haddad (PT) costuma compartilhar com o Legislativo e o Judiciário os louros das medidas fiscais implementadas durante a atual administração, mas, de uns tempos para cá, atores políticos e econômicos têm chamado atenção para uma deterioração das relações entre Executivo e Legislativo, agravado pela decisão do governo de levar a discussão das desonerações ao Supremo Tribunal Federal (STF). Qual a sua avaliação sobre isso? E por que o governo deixou de lado as negociações dos projetos sobre desoneração para buscar o Judiciário?
Dario Durigan: Temos que olhar para um cenário mais amplo, e, fazendo isso, não podemos perder de vista duas premissas valorativas do projeto do governo federal e, em especial, do Ministério da Fazenda. A primeira é da responsabilidade fiscal, que tem um modo de ser feita. Não é uma responsabilidade fiscal de qualquer forma. Nós temos tratado de injustiças, de distorções, de benefícios ineficientes do ponto de vista econômico, e endereçado, de maneira muito franca, com o Congresso e com a opinião pública, que isso tem que ser refletido. A forma de fazer o ajuste fiscal, de ter responsabilidade fiscal, importa.
Por que fazemos ajuste fiscal? Por que precisamos reverter a trajetória de déficit primário dos últimos 10 anos? O Orçamento vai ser comprometido se não cumprirmos com uma trajetória de equalização de dívida… É um Orçamento que traz uma série de proteções sociais importantes. Então, é para prestigiar o Orçamento público que queremos manter a responsabilidade fiscal. Além disso, um país com as contas em ordem viabiliza crédito mais barato para suas empresas e seus cidadãos, e, em grande medida, tem inflação sob controle.
A segunda premissa é a da valorização institucional. Acreditamos que é valorizando as instituições que vamos fazer o Brasil se desenvolver. As duas premissas têm norteado nossas ações. No ano passado, foram várias medidas aprovadas pelo Congresso, a pedido e em negociação com o Ministério da Fazenda, que viabilizaram um ano de resultados muito positivos: o crescimento foi bom, a inflação ficou abaixo do esperado, a taxa de juros terminou o ano em um valor abaixo do projetado, a balança comercial teve superávit histórico, as agências de risco estão avaliando o Brasil positivamente.
Esse resultado positivo se deu graças a uma parceria muito bem-sucedida entre governo e Congresso. Não é uma parceria simples, fácil, mas é uma parceria que, com suas complexidades, e entendida a complexidade como devida dentro de uma democracia, conseguimos ter um bom projeto. O Congresso esteve conosco. Aprovamos as medidas de receita e o Orçamento, que é o plano de ação para 2024. O Orçamento aprovado nos dá a exata medida de quanto vai ser o déficit ou superávit neste ano. É preciso cumpri-lo.
A medida provisória nº 1202/2023 trazia à luz 4 tópicos que extravasavam do Orçamento aprovado no ano passado. Nela, não havia afronta ao Congresso, e sim um pedido de reengajamento para que acomodássemos decisões importantes do Congresso à Lei de Responsabilidade Fiscal, ao Orçamento e à última reforma da Previdência feita no país.
A medida provisória teve alterações. Retiramos o tema dos 17 setores e trouxemos para projeto de lei. A pedido do Congresso, retiramos a urgência do PL e iniciamos as tratativas com os relatores. Mas o que temos ouvido do Congresso é que não há grande espaço para mudança, que seria aprovado o mesmo texto do ano passado. À luz desta sinalização, a judicialização é devida − no mesmo itinerário de valorizar as discussões. Fomos ao Supremo não para rediscutir a Política, mas para rediscutir os aspectos de inconstitucionalidade que as medidas possam ter − que, no nosso ponto de vista, têm.
Sendo fiel a um projeto econômico, que tenha a responsabilidade como uma premissa de valor importante, era preciso avançar nessa direção. Do ponto de vista institucional, a Fazenda segue aberta. Seguindo a orientação do presidente Lula, estamos dispostos a negociar e discutir todos os temas. Mesmo agora, com a decisão do Supremo, seguimos muito abertos e à disposição para seguir o diálogo com o Congresso e com os setores. O que precisamos demonstrar em todo debate e com muito respeito institucional é que há um projeto bem-sucedido que precisa seguir. Esse projeto precisa se aprofundar, com a valorização institucional e o diálogo que cabe em cada um dos Poderes.
Não acho que tenha havido, do ponto de vista de valorização e diálogo institucional, nenhum retrocesso. Vivemos as complexidades da democracia, com os posicionamentos diferentes, mas vejo avanços. E a decisão do Supremo − a liminar do ministro [Cristiano] Zanin, já referendada por outros 4 ministros − aponta para esse caminho do diálogo institucional e por premissas claras. Premissas de responsabilidade fiscal.
IM: Lideranças do Congresso Nacional se sentiram ofendidas com o movimento, o que foi reforçado pelas manifestações do presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Qual a avaliação da pasta sobre as reações?
DD: Eu não vejo como desrespeito e não levaria por esse lado. Há um diálogo que tem posições − e que precisam ser claramente colocadas e vocalizadas. Nós temos dado transparência [às nossas avaliações]. Houve um estudo publicado pela Secretaria de Política Econômica (SPE), na sexta-feira (26), demonstrando parte das razões de mérito que nos levam a concluir que há defeitos na política de desoneração da folha. Defeitos econômicos que poderiam ser corrigidos − e temos apresentado alternativas a isso de maneira incansável.
Não vejo [o recurso ao STF] como afronta ou como desrespeito, porque o Congresso [também] exerce suas prerrogativas. Em vários projetos de lei aprovados pelo Congresso, não há necessariamente comunicação prévia ou alinhamento completo com o Executivo − e cabe ao Executivo reagir a algumas das medidas aprovadas. Faz parte de um diálogo institucional saudável.
Do ponto de vista da Fazenda, não há surpresa, porque está aderente a um projeto que temos enunciado desde o começo do governo. Nós vamos perseguir a responsabilidade fiscal, porque é positivo e importante para o país. Acreditamos que ela é premissa para o projeto de desenvolvimento que vamos discutir à frente.
Não vejo pelo lado mais imediato, dos sentimentos ou das reações, mas vejo com naturalidade, dentro de um processo de diálogo institucional, que é importante ser feito.
IM: O relatório divulgado pela Secretaria de Política Econômica na semana passada trouxe luz à avaliação do Ministério da Fazenda sobre as desonerações aos 17 setores econômicos enquanto política pública. Qual o impacto sobre a vida das pessoas deste benefício tributário e da redução de alíquota concedida a municípios? O que a manutenção dos dois gastos tributários pode provocar?
DD: Podemos apontar duas consequências para o cidadão comum. A primeira é que, quando damos o benefício fiscal para determinado setor, é o resto da sociedade quem arca, de variadas formas, com esse tratamento diferenciado para que o equilíbrio econômico aconteça. Pode ser que os juros não caiam. Se temos um benefício fiscal que, por exemplo, corrompe a base de responsabilidade fiscal, pode ser que os juros no país não caiam como se espera − o que penaliza toda a cadeia produtiva, que vai ter que tomar crédito com juros mais altos. Se não fosse assim, o que poderia acontecer é inflação mais alta para a população, um juro indireto que é pago pelo consumidor com preços mais altos.
Os [impactos sobre] juros e inflação arcados pela sociedade como um todo estão muito evidenciados na reforma tributária, que o Congresso Nacional aprovou no ano passado e apresentamos, na semana passada, a regulamentação. A reforma tributária tem um mecanismo de boa prática fiscal muito importante: quando for discutido nela o benefício pontual para algum setor, com alíquota reduzida ou zero, automaticamente a alíquota padrão para todos os outros contribuintes vai aumentar, porque essa é a dinâmica correta. O peso da decisão política vai ser colocado dessa forma: dado benefício para um setor, o resto da sociedade paga um tanto a mais. Essa ilustração que vemos projetada na dinâmica que vem à frente com o novo sistema tributário de bens e serviços também é replicável agora. Talvez não tenhamos essa consequência automática em mente, muitas vezes é dado um benefício para um setor sem ter clareza do quanto isso repercute para a população em geral. Mas isso é da dinâmica de uma política pública de benefício setorial.
A segunda consequência é de revés para a Previdência. Se pegarmos a mensagem da última reforma da Previdência, [é dito que] os trabalhadores têm que trabalhar um pouco mais, cumprir mais critérios para se aposentarem, mas as receitas para a Previdência, que também são pagas por empresas e municípios, não poderiam diminuir − não se pode abrir mão de receita previdenciária. Justamente com o desafio de as pessoas viverem por mais tempo, persegue-se uma equalização da Previdência. Se começamos a frustrar essas receitas, a consequência imediata que vamos ter, no segundo âmbito de perspectiva, é a necessidade de se rediscutir a Previdência em breve, fazendo com que o trabalhador tenha que trabalhar ainda por mais tempo, para que o equilíbrio atuarial aconteça.
Então, podemos ter, de um lado, uma perspectiva mais imediata de mais tributo para quem paga bem, de mais juros para o setor produtivo e de mais inflação para a população em geral, e, de outro, deflagrar um maior déficit previdenciário, que vai fazer naturalmente, como sempre aconteceu na história do Brasil, com que o trabalhador tenha que ser penalizado tendo que cumprir mais critérios, seja de idade ou tempo de trabalho para poder se aposentar.
IM: Apesar de o Ministério da Fazenda considerar essas desonerações políticas públicas caras e ineficientes, o que, ainda assim, a pasta identifica de resultados dessas medidas? Setores beneficiados costumam apontar para uma criação acima da média de postos de trabalho e um maior incremento de vencimentos ao longo do tempo.
DD: No Ministério da Fazenda, estamos abertos e temos olhado os argumentos que nos trazem de maneira muito racional. A conclusão que temos é que é uma política pública mal avaliada − e não [só] por um espectro ideológico ou por uma tendência política, mas por inúmeras perspectivas, seja de tradições de pensamento econômico, seja de ideologia política.
Pesquisadores de variados vieses apontam essa política como ineficiente, que não cumpriu com seu objetivo originalmente proposto. Temos que aprender com os erros do passado. É preciso rever, quando a política pública é mal avaliada, quando ela não gera os resultados a que se propôs, como geração de empregos, para canalizarmos os recursos públicos, seja gasto tributário (que é renúncia de despesa), seja despesa, com o que vale a pena, com o que traz benefícios para a sociedade, que é de interesse nacional.
Não podemos nos eximir de fazer essa avaliação o tempo todo e corrigir os rumos. Essa política pública da desoneração da folha é, de uma maneira acadêmica e científica, mal avaliada, e, portanto, deve ser revista.
IM: Apesar da avaliação negativa do Ministério da Fazenda sobre o resultado das desonerações, há grandes obstáculos políticos para limitar a política pública. Por que tal constatação de ineficiência das medidas não chegou à sociedade em geral? Por que ainda há no Congresso Nacional uma força tão grande da visão pela manutenção dos benefícios? O que faltou, em termos de comunicação, para construir um ambiente político para revogar ou ao menos redesenhar as desonerações?
DD: Acho que a sociedade tem compreendido a agenda do Ministério da Fazenda. Os bons resultados que colhemos são justamente frutos desta agenda que revê as políticas colocadas − em especial, os gastos tributários −, fazendo um debate franco com o Congresso Nacional. A agenda vitoriosa feita pelo Congresso Nacional em 2023 deveria ser aprofundada neste ano, trazendo os bons benefícios para a sociedade em geral que vimos no ano passado.
A sociedade tem entendido essa agenda econômica e aprofundado ela. Agora é um acerto, e é isso que temos enfatizado. Ainda que tenhamos que ir ao Supremo para abrir esse espaço de diálogo institucional, temos clareza de que isso vai trazer bons benefícios e, portanto, vai ser bem avaliado pela sociedade.
IM: Agora que o jogo está 5 a 0 a favor do governo no STF e o ministro Luiz Fux pediu vista, levando a discussão ao plenário físico, qual é a estratégia do governo: insistir em uma vitória no Judiciário ou haveria espaço para se sentar à mesa com lideranças do Congresso Nacional e desenhar uma solução para as desonerações?
DD: O que tenho insistido é que nossa agenda vai seguir. Temos feito a recomposição fiscal e vamos perseguir essa trajetória. Quando se diz sobre as previsões de meta [de resultado primário] para os próximos anos, quero deixar muito claro que nossa agenda segue. A meta continua ousada e nós vamos persegui-la, porque acreditamos na revisão da trajetória da dívida pública brasileira. É o nosso compromisso.
Quanto à agenda para 2024, temos clareza do que queremos, tanto que as metas estão colocadas e os projetos, anunciados. Nós vamos perseguir. Temos os 4 temas da MPV 1202/2023 e estamos abertos a discutir todos eles com o Congresso Nacional, com os setores, levá-los ao Judiciário em última instância, quando for preciso, para compormos os resultados que queremos. Vamos seguir discutindo reformas microeconômicas, que são muito importantes, como o marco de seguros, que é uma reforma importante para o ambiente negocial do país. Temos que regulamentar a reforma tributária, que foi um trabalho de fôlego intenso, e, uma vez validada pelo Congresso e na medida em que entrar em vigência, vai revogar regramentos de ICMS de 27 Estados e de ISS de milhares de municípios, simplificando muito a vida do empreendedor e do consumidor brasileiro, que vai ter muito mais transparência e controle de quanto de tributo está pagando.
Também vamos fazer uma agenda de desenvolvimento que tenha regulação inteligente, que faça linhas de crédito sem impacto fiscal, como foi o programa Acredita. A pessoa comum que não conseguiu ter seu negócio vai poder ter crédito orientado. A pequena empresa que está endividada vai ter o Desenrola Pequenos Negócios. A pequena empresa que está bem e pode aumentar seu negócio vai ter um crédito no Pronampe, que é o ProCred360. Isso tudo olhando para as várias etapas do crédito e sem impacto fiscal. O que fizemos foi reprogramar para que as garantias fossem bem colocadas onde elas faltam – onde as instituições financeiras, em diálogo conosco, apontam que há falta de garantia para que elas possam conceder os créditos.
Tem, ainda, a agenda de transformação ecológica. Há estudos que mostram que o mercado de carbono instalado, em pleno funcionamento no Brasil, pode fazer com que o PIB cresça mais de 2%, além de reduzir o desemprego do país. Hidrogênio verde. Há uma série de agendas que precisamos fazer com que avancem. Todas elas têm que partir de uma agenda fiscal. Se conseguirmos ancorar e dar credibilidade para o fiscal, que é o que temos tentado com essas medidas, elas vão poder gerar maiores resultados para o país, porque vão atrair mais investimento, com crédito mais baixo, com proteção cambial.
Essa agenda extensa que temos que cumprir ainda neste ano – para não falar da reforma da renda – precisa ter a segurança e credibilidade de uma ancoragem fiscal. É por isso que temos feito esforços variados com esses temas colocados na MPV 1202/2023. E por isso que temos que insistir, de maneira franca e respeitosa, com o Congresso, com o Supremo, com os setores produtivos, com a sociedade, para mostrar o quão elas são importantes. A agenda vitoriosa do ano passado deve ser replicada e aprofundada, se preciso junto ao Supremo. Como fizemos com o STJ, no caso da subvenção de ICMS, no ano passado, e no STF no caso da revisão da vida toda. Vamos de novo fazer agora, com o Congresso e com o Supremo, num grande esforço institucional em prol do país.
IM: Há duas semanas, com a revisão da trajetória da meta fiscal no PLDO 2025, houve uma reversão de expectativas relevante no mercado financeiro. Muitos especialistas em contas públicas dizem que são necessárias medidas fiscais adicionais para que a meta de déficit zero (ou no máximo de 0,25% do PIB, considerando a banda inferior do arcabouço fiscal) seja cumprida. O que vem por aí em incremento de arrecadação ou redução de despesas?
DD: Entendo as diferentes expectativas, mas insisto: não há mudança da nossa agenda e haverá perseguição dessas metas, que são colocadas de maneira ousada. É até incongruente haver críticas porque se reduziu a dosagem desse caminho e ao mesmo tempo dizer que não se vai conseguir ou que são necessárias novas medidas para o ano que vem. É justamente nesse hiato que estamos colocados.
Estamos dosando as medidas que vamos ter que adotar, porque de fato serão necessárias novas medidas. Novas medidas para atingir uma meta crível, que seja sensível ao contexto político em que vivemos. É um ano com uma série de peculiaridades. E vamos seguir perseguindo [as metas].
Serão necessárias novas medidas, que são cabíveis de serem dialogadas − seja com o Congresso, seja com o Judiciário −, para que cumpramos uma meta que segue ousada, de zerar o déficit no ano que vem. Como fizemos neste ano, surpreendendo positivamente, vamos fazer no ano que vem, aprovando as medidas necessárias a complementar as receitas ou cortar as despesas.
IM: Qual o espaço fiscal estimado pelo Ministério da Fazenda para essas medidas necessárias para o cumprimento da meta fiscal?
DD: Em torno de R$ 50 bilhões. Digo isso grosso modo. No ano passado, apresentamos no Projeto de Lei Orçamentária um acréscimo de mais de R$ 160 bilhões em termos de medidas adicionais. Neste ano, estamos dosando as medidas adicionais que vamos ter que apresentar para serem aprovadas e terem efeito no ano que vem. E é seguindo essa mesma agenda, nós não mudamos. Você pode dizer que há uma dosagem da agenda, mas é uma dosagem para justamente estabilizar as expectativas. Colocar uma meta crível que a gente consiga perseguir e cumprir, como fizemos neste ano. Com esse ajuste de medidas adicionais, seguimos com muito afinco perseguindo o cumprimento das metas.
IM: Há uma série de pautas com impacto fiscal negativo em tramitação no Congresso Nacional. Uma delas é a PEC dos Quinquênios. Com as declarações de insatisfação recentes de Rodrigo Pacheco e muitos analistas apontando para um ambiente mais hostil para o governo no parlamento, como a equipe econômica tem atuado para evitar o avanço deste tipo de agenda?
DD: Com muito diálogo e mostrando os números. Mostrando, do ponto de vista técnico, qual é o impacto para o Orçamento e a repercussão que medidas como essa podem ter para a população em geral. O quanto elas podem comprometer o espaço de despesas, seja do Judiciário, do Legislativo ou do Executivo, e o ambiente geral.
As agências de risco, por exemplo, olham para isso com muito cuidado. Estamos a caminho de uma progressão na nossa avaliação de país em termos de risco, credibilidade e diálogo institucional respeitoso. Precisamos seguir nessa agenda para que não tenhamos repercussão negativa no âmbito negocial, das empresas e da população.