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As despesas “já contratadas” para o exercício de 2023 tornam o cumprimento do teto de gastos – regra fiscal que limita o crescimento de despesas públicas à inflação do ano anterior – tarefa inviável para qualquer um dos candidatos que assumir a Presidência da República.
Na avaliação do economista Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda e pai do chamado “Novo Regime Fiscal” – que instituiu o teto em 2016 –, o futuro presidente, seja Jair Bolsonaro (PL) ou Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deveria abrir uma “excepcionalidade” na regra fiscal limitada ao próximo ano para acomodar as novas despesas.
Em outro flanco, ele defende que sejam feitas reformas, como a administrativa, para que o país possa retornar ao rigor da regra fiscal no ano seguinte e manter credibilidade junto a agentes econômicos. Meirelles sustenta que somente a retomada da agenda de reformas poderá garantir uma rota de crescimento sólida para o Brasil nos próximos anos.
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“É possível absorver isso criando uma excepcionalidade para o ano que vem, para acomodar esses R$ 60 bilhões – que são necessários hoje, as famílias estão precisando mesmo. Desde que haja um compromisso firme de respeito ao teto logo a partir de 2024. Como vai respeitar o teto para a despesa cair? Simples: faça a reforma administrativa durante 2023”, afirmou.
Para ele, as reformas não terão vida fácil no Congresso Nacional, mas podem ser aprovadas se conduzidas por uma liderança determinada e com capacidade de dialogar com os parlamentares. “Quando propus o teto de gastos, todos me diziam: ‘isso nunca vai ser aprovado. Como o Congresso vai aprovar algo que limita sua capacidade de gastar à vontade?’. Foi aprovado. Quando eu apresentei a reforma da previdência, foi a mesma coisa”, disse. A segunda foi aprovada já na gestão de Bolsonaro.
“Eu sempre dizia: ‘eu respeito o Congresso Nacional, ele é soberano, mas vamos conversar. O que é mais importante para o congressista: levar algumas emendas ou o país crescer, ele participar disso, gerar emprego e renda, cortar despesas desnecessárias, fazer os investimentos necessários? Acho que o Congresso não é necessariamente conservador. (…) Há uma tendência de [o novo parlamento] ser mais pragmático, menos ideológico. Não necessariamente com ideologia radical, de um lado ou de outro. Agora, não há dúvida de que o país se moveu um pouco mais para a direita, independentemente de quem ganhar a eleição. É um fenômeno que acho que veio para ficar”, observou.
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Meirelles recebeu a equipe do InfoMoney em sua casa na última quarta-feira (12). Assista à íntegra da entrevista pelo vídeo acima ou clicando aqui.
Tanto o presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, quanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já sinalizam a continuidade de um programa de transferência de renda com repasses mensais de R$ 600,00, além de novos incrementos ao benefício.
O Auxílio Brasil “turbinado” tem impacto adicional na casa de R$ 59 bilhões aos cofres públicos. Soma-se a isso despesas como o pagamento de precatórios, estimadas em algo como R$ 56 bilhões no ano que vem, o novo piso de profissionais de enfermagem, auxílio a setores da cultura e até possíveis reajustes a servidores públicos. Isso tudo em um Orçamento que deverá reservar menos de R$ 120 bilhões para despesas discricionárias (aquelas que, em tese, garantem maior possibilidade de remanejamento pelo gestor público), sendo que especialistas estimam um mínimo necessário de R$ 84 bilhões para o funcionamento da máquina pública.
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Ao contrário do que defendem alguns colegas economistas, Meirelles acredita que, apesar dos desafios, o teto de gastos deve ser mantido como a âncora fiscal do país. Para ele, a regra foi exitosa em seus quase seis anos de existência, por ter explicitado conflitos distributivos e forçado gestores públicos a definirem prioridades na alocação de recursos finitos – o que também abriu caminho para reformas como a da Previdência.
“O teto foi bem-sucedido porque tirou o Brasil da maior recessão da história. Agora, na medida em que não foram feitas as reformas fundamentais, com as despesas obrigatórias crescendo, foram comprimidos os investimentos em infraestrutura. É preciso abrir espaço para os investimentos em infraestrutura, sim. Como? Não aumentando despesa indefinidamente, mas cortando despesas para abrir espaço para as despesas necessárias. A vantagem do teto é essa: forçar a definição de prioridades. Nós temos que pagar as despesas públicas”, disse.
“De 1991 a 2016, em 25 anos, a despesa pública do Brasil cresceu 6% ao ano acima da inflação. Isso dobrou a percentagem do PIB gasta com governo. É insustentável. Não era possível continuar nessa tendência. O país precisa exatamente de responsabilidade fiscal para crescer”, complementou.
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Henrique Meirelles foi presidente do Banco Central durante os governos de Lula, comandou o Ministério da Fazenda na gestão Michel Temer (MDB) e mais recentemente esteve à frente da Secretaria da Fazenda e Planejamento do governo de João Doria (PSDB), em São Paulo.
Duas semanas antes do primeiro turno, manifestou apoio à candidatura de Lula ao Palácio do Planalto, destacando resultados obtidos pelo ex-presidente na economia em seus dois mandatos. Mas isso não o afasta de tecer críticas a determinadas posições da campanha petista, sobretudo às promessas de maior participação do Estado na economia e ao aumento de gastos públicos em uma conjuntura de maior restrição fiscal. Leia mais clicando aqui.
O futuro do teto de gastos é uma das questões em aberto nessas eleições. De um lado, a campanha de Lula promete revogar a regra fiscal, mas não sinaliza com clareza o que entraria em seu lugar. Do outro, a equipe econômica do atual governo discute a criação de um “novo teto de gastos”. A ideia seria desenvolver mecanismos que permitissem um crescimento real das despesas públicas (portanto, acima da inflação), dependendo do nível e da trajetória da dívida pública, a uma taxa a ser definida a cada dois anos.
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As indicações não agradam a Meirelles, que vê riscos de as despesas crescerem em um momento de bonança e dificuldades para reduzi-las em um contexto de maior restrição fiscal.
Para o ex-ministro, independentemente do desfecho destas eleições, o próximo presidente enfrentará um quadro desafiador no plano internacional, o que reforçará a necessidade de “arrumar a casa” com reformas econômicas.
Apesar de o Brasil ser uma economia mais fechada em comparação com pares internacionais, ele avalia que a combinação de possível recessão em grandes economias, inflação elevada e altas taxas de juros terá impactos importantes sobre a atividade a nível doméstico.
Na avaliação de Meirelles, a baixa abertura da economia brasileira, observada por uma participação tímida do comércio exterior sobre o PIB, é uma desvantagem durante boa parte do tempo. Mas, em momentos de crise internacional, ela pode reduzir a exposição do país a choques externos.
“Nós não vamos ficar fechados, pouco produtivos, só esperando o dia em que vier uma crise. Mas, no momento em que há, é positivo. O Brasil depende menos do mundo. Agora, evidentemente, algumas coisas afetam [o país]: custo do dinheiro, taxas de juros internacionais”, pontuou.
“É um período de dificuldades, não há dúvida. E só tem uma saída para isso: o Brasil precisa estar com a casa em ordem. É o momento, mais do que nunca, de fazer a reforma administrativa, a reforma tributária, garantir a responsabilidade fiscal, e, a partir daí, estarmos preparados para enfrentar um ambiente externo mais hostil”, concluiu.