Lula deve contar com base minoritária no Congresso, mas negociações podem garantir apoio necessário para aprovar agenda, dizem analistas

Especialistas estimam 222 deputados e 39 senadores ao lado de Lula na largada, mas entendem que governo terá força para pautar ações do parlamento

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conversa com os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), durante cerimônia de   diplomação no TSE (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conversa com os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), durante cerimônia de diplomação no TSE (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

Publicidade

No mês em que o Congresso Nacional retomou suas atividades com o início de uma nova legislatura, analistas políticos projetam base de apoio minoritária para o governo entre os parlamentares, mas veem condições de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negociar e aprovar algumas das proposições de seu interesse no Poder Legislativo.

É o que mostra a 42ª edição do Barômetro do Poder, levantamento mensal com consultorias e analistas independentes sobre alguns dos principais temas em discussão na política nacional. Clique aqui para acessar a íntegra.

O levantamento, realizado entre os dias 15 e 17 de fevereiro, mostra que, dividindo a nova configuração da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em três grandes grupos (alinhados com o governo, de oposição e incertos), a média das estimativas dos especialistas para a base do governo no Poder Legislativa aponta para 222 deputados federais e 39 senadores.

Continua depois da publicidade

No cenário mais otimista para o governo capturado pelo estudo, as projeções chegam a 290 e 49 em cada uma das respectivas casas legislativas – o que corresponde a 56,53% dos assentos na Câmara e 60,49%% no Senado. Já no mais pessimista, seriam 130 e 25 – ou seja, 25,34% e 30,86%, na mesma ordem.

A dispersão é tão grande que, no primeiro cenário, o governo teria capacidade de aprovar com boa margem projetos de lei complementares, que exigem quórum qualificado (maioria absoluta, ou seja, 257 deputados e 41 senadores).

Já no segundo, não teria garantida base de apoio contra processos de impeachment. Apesar de estar distante do cenário de largada do novo governo, toda administração deve ter em mente a marca de 172 deputados e 28 senadores para momentos difíceis do mandato.

Continua depois da publicidade

Dos 13 participantes do levantamento, dois estimaram uma base de largada do governo abaixo do quantitativo mínimo para barrar eventuais pedidos de afastamento – o que não necessariamente significa risco significativo de um processo desta natureza prosperar, mas indica expectativa reduzida de alinhamento automático de parcela expressiva dos congressistas em relação à nova administração.

As estimativas para o tamanho da oposição, por sua vez, variam de 106 a 216 deputados e 15 a 32 senadores. Na média, são 144 e 23, respectivamente. Já os incertos somam 147 deputados e 19 senadores na média das projeções.

Este grupo, cujas estimativas variam em até 121 deputados e 7 senadores para cima e 89 e 10 para baixo, será fundamental para a construção de governabilidade na nova gestão. Quanto mais habilidoso for o Palácio do Planalto em avançar sobre estes parlamentares, mais tranquilidade terá o governo na sua relação com o parlamento.

Continua depois da publicidade

O Barômetro do Poder mostra, contudo, que a maioria dos entrevistados (85%) apostam em uma relação positiva entre Executivo e Legislativo. Apenas 15% esperam uma deterioração no ambiente nos próximos seis meses.

Apesar das dificuldades postas ao novo governo, a maioria (85%) avalia como alta a capacidade de o Poder Executivo pautar o debate no Congresso Nacional e aprovar agendas de seu interesse. Considerando uma escala de 1 (muito baixa) a 5 (muito alta), a média das projeções sobre a força do governo no parlamento ficou em 3,92.

A título de comparação, em agosto de 2022, dois meses antes das eleições, a média das respostas para o governo de Jair Bolsonaro (PL) era de 3,13 neste quesito. O grupo de analistas que viam elevado poder de influência do Executivo sobre a pata do Congresso somava 40% dos respondentes, contra 20% que viam sérias limitações nesta capacidade.

Continua depois da publicidade

Naquela época, contudo, a média das projeções para a base governista no parlamento era de 245 deputados federais e 29 senadores – ou seja, um número de largada mais favorável do que para Lula na Câmara e mais desafiador no Senado.

“Os indicadores de governabilidade ainda se beneficiam da solidariedade interinstitucional derivada do 8 de janeiro, assim como do esperado período de lua de mel do novo governo. Após o Carnaval, este cenário começará a ser testado para valer”, disse um analista. Conforme acordado previamente, o levantamento preserva o anonimato das respostas de cada participante.

Pesam a favor do governo neste pontapé inicial as reconduções de Arthur Lira (PP-AL) e de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, respectivamente. Os dois receberam apoio do Palácio do Planalto.

Continua depois da publicidade

No caso do segundo, a postura do governo foi fundamental para o resultado alcançado. Já o primeiro conquistou nível recorde de apoio ao construir um arco de alianças que foi do PT de Lula ao PL de Jair Bolsonaro. O pragmatismo do governo deve evitar maiores rusgas no início dos trabalhos.

“O resultado da eleição das presidências de ambas as Casas foi positiva para o governo, com alinhamento entre as prioridades (reforma tributária, regulação das plataformas), mas ainda há longo caminho a se trilhar para consolidação da base de apoio. Tudo indica que, nos próximos anos, o governo terá de conduzir acordos votação a votação”, pontuou um participante.

A manutenção de uma relação profícua com o parlamento será fundamental para o sucesso de Lula. Logo nos primeiros meses, o governo tem uma agenda ousada que depende do aval dos parlamentares para ser implementada.

No campo econômico, as atenções estão voltadas para a proposta de novo arcabouço fiscal, que substituirá o teto de gastos e deverá ser apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em março. A reforma tributária, debatida há décadas no Brasil também está na lista de prioridades da nova gestão.

Mas antes disso, o governo terá importantes testes com uma série de medidas provisórias em tramitação no Congresso Nacional — 17 são herança de Bolsonaro, enquanto outras 9 foram editadas nos primeiros 45 dias de gestão.

Deste grupo, a MPV 1.160/2023, que altera uma série de disposições do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) é vista como o principal teste, dadas as perspectivas de resistências entre os parlamentares.

“A âncora fiscal será o teste mais importante do governo no Congresso”, destacou um analista político ouvido pelo levantamento.

“A aprovação de parte das medidas do Pacote Fiscal do governo é bastante provável, mas haverá desidratação. Em casos como a volta do voto de qualidade do Carf, a questão é menos se a medida será aprovada (deve ser), e mais qual será o nível de desidratação e o custo envolvido nas negociações desse processo”, pontuou outro especialista.

“Parece-me pouquíssimo provável que o governo tenha êxito em aprovar, já no primeiro semestre, as três pernas da prometida agenda fiscal. Vejo a reforma tributária como a candidata mais forte a ter o seu desfecho adiado”, projetou um terceiro participante.

Esta edição do Barômetro do Poder ouviu 11 consultorias políticas: BMJ Consultores Associados; Control Risks; Dharma Political Risk & Strategy; Empower Consultoria; Eurasia Group; Medley Global Advisors; Patri Políticas Públicas; Ponteio Política; Prospectiva Consultoria; Pulso Público; e XP Política. E 2 analistas independentes: Carlos Melo (Insper); e Thomas Traumann.

Conforme acordado previamente com os participantes, os resultados são divulgados apenas de forma agregada, sendo preservado o anonimato das respostas e dos comentários.

Clique aqui para acessar a íntegra.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.