Lula assina projeto sobre direitos de motoristas de aplicativos: “Discussão não será moleza”

Em cerimônia no Planalto, presidente da República assinou projeto de lei que regulamenta o trabalho dos motoristas de aplicativos. Novas regras valem para transporte em veículos de quatro rodas

Fábio Matos

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou, nesta segunda-feira (4), em cerimônia no Palácio do Planalto, o projeto de lei que regulamenta o trabalho dos motoristas de aplicativos. As novas regras valem apenas para o transporte em veículos de quatro rodas (veja os principais pontos do texto).

O texto será encaminhado em regime de urgência ao Congresso Nacional. Desta forma, Câmara dos Deputados e Senado Federal terão 45 dias, cada um, para analisar o projeto.

Em discurso após assinar o Projeto de Lei Complementar (PLC), Lula disse que o dia de 4 de março de 2024 ficará marcado na história do país.

“É um dia muito importante. Vocês acabaram de criar uma nova modalidade no mundo do trabalho. Foi parida uma criança nova no mundo do trabalho. As pessoas vão ter autonomia, mas, ao mesmo tempo, precisam do mínimo de garantia”, afirmou.

“Há algum tempo, ninguém neste país acreditava que seria possível estabelecer uma mesa de negociação entre trabalhadores e empresários e que o resultado dessa mesa fosse concluir por uma organização diferente no mundo do trabalho”, prosseguiu Lula.

Em seu pronunciamento, o presidente da República projetou dificuldades para que o texto seja aprovado no Congresso Nacional, mas disse que o governo fará sua parte.

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“Vocês se preparem porque a discussão aqui não será moleza”, alertou. “Vocês terão de trabalhar com os deputados. É preciso procurar os líderes de cada bancada. Da parte do governo, a gente vai tentar fazer o máximo para o projeto ser aprovado o mais rápido possível. Mas é importante saber que vai aparecer gente contra. Sempre tem gente contra. A gente não pode ficar com raiva de quem é contra”, completou Lula.

Segundo o petista, o avanço da tecnologia sobre o mundo do trabalho não representa o fim dos sindicatos ou dos grupos organizados de trabalhadores. “É importante lembrar que toda vez que tem uma inovação tecnológica a gente pensa que o mundo vai acabar. Isso é uma bobagem. A própria categoria vai se organizando para encontrar um jeito de sobreviver”, disse.

Também presente à cerimônia de assinatura do projeto, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho (PT), demonstrou confiança de que o Congresso aprovará o texto em “tempo recorde”.

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“O presidente Lula assumiu um compromisso em campanha eleitoral. Nunca dissemos se seria pela CLT ou não. É um processo de debate sobre um novo momento no mercado de trabalho e também um processo de escolha”, afirmou Marinho. “É preciso observar o que está acontecendo, internacionalmente, na economia e nas relações de trabalho.”

De acordo com o ministro, o projeto serviu como um incentivo “ao diálogo, à conversa, aos acordos e às convenções coletivas”. “Mais do que participar da negociação, o governo organizou o grupo tripartite e provocou um diálogo entre as partes”, observou.

Luiz Marinho também chamou atenção para a necessidade de o governo construir com os aplicativos de entrega um acordo semelhante ao que foi pactuado envolvendo os aplicativos de transporte.

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“Não adianta o iFood mandar recado. E como manda recado, presidente… Nós conversamos um ano inteiro. O fato é que iFood, Mercado Livre e as demais [plataformas] diziam que o padrão dessa negociação não cabe no seu modelo de negócio”, criticou Marinho. “É preciso que essas plataformas possam sentar para conversar e saber que precisaremos estabelecer padrão remuneratório que ofereça condições dignas para esses trabalhadores.”

Principais pontos

O PLC é fruto das discussões no âmbito do Grupo de Trabalho Tripartite, criado em maio de 2023 e coordenado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, com representantes dos trabalhadores, das empresas e do governo federal.

Inicialmente, Lula tinha a intenção de enquadrar os trabalhadores em três categorias, uma das quais com base na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

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No entanto, a decisão final foi manter os trabalhadores como autônomos, mas com a previsão de uma contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de 7,5%. O projeto também determina o pagamento por hora trabalhada no valor de R$ 32,09 e a remuneração pelo salário mínimo (atualmente em R$ 1.412).

Além da contribuição do trabalhador ao INSS, as empresas terão de pagar 20% sobre a remuneração mínima do colaborador.

As regras valem quando o trabalhador prestar o serviço, desde que tenha total liberdade para decidir dias, horários e períodos de conexão com o aplicativo. As jornadas de trabalho devem ser de oito horas diárias e podem chegar, no máximo, a 12 horas, desde que haja acordo coletivo.

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O trabalhador poderá trabalhar para mais de uma plataforma, sem qualquer vínculo de exclusividade. Será instituída a categoria de “trabalhador autônomo por plataforma”, com um sindicato específico.

Dados do IBGE

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tinha, em 2022, 778 mil pessoas que exerciam o trabalho principal por meio de aplicativos de transporte de passageiros, o que representava 52,2% do total de pessoas que trabalhavam por meio de plataformas digitais e aplicativos de serviços — o equivalente a 1,7% da população ocupada no setor privado, na época.

O levantamento mostrou que, enquanto 44,2% dos ocupados no setor privado estavam na informalidade, entre os trabalhadores de aplicativos esse percentual chegava a 70,1%.

Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”