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Para melhorar o ambiente de negócios e alcançar o crescimento em médio e longo prazo, governadores de diferentes correntes partidárias concordam que o Estado deve ser responsável pela implementação de políticas públicas em setores específicos, como saúde e segurança pública, e permitir que o capital privado possa investir em outras áreas, como grandes obras de infraestrutura.
Em painel na Expert XP 2023, quatro gestores estaduais apresentaram pontos de vista indicando que, ao transmitir à iniciativa privada a responsabilidade sobre serviços como transporte, saneamento e abastecimento de energia, a esfera pública consegue ter fôlego financeiro para se ocupar da proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos e do combate às desigualdades.
“O estado não deve ser máximo, nem mínimo. Ele tem que ser o necessário. Ele precisa compreender e avaliar aquilo que deve ser premissa do Estado, pela necessidade de proteção à sociedade”, indicou o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB).
“Depois que passou por uma crise do subprime e por uma pandemia, ninguém de bom senso nega a importância do Estado. Na hora que o bicho pega o Estado tem um papel extremamente relevante de salvaguardar os direitos do cidadão, inclusive até salvando bancos e empresas. É óbvio que o Estado é necessário e todo mundo de bom senso sabe que ele não pode avançar naquilo que ele não pode ser eficiente”, defendeu Rafael Fonteles (PT), governador do Piauí.
Para atrair investidores, os gestores públicos estaduais concordaram que é importante trabalhar por uma política fiscal sem solavancos, a partir da aplicação de medidas como a redução do comprometimento das receitas com o endividamento público. Neste processo, é preciso saber equilibrar o orçamento com os recursos destinados a custeio de pessoal.
“Todo mundo sempre questiona a capacidade do estado de investir, e que o Brasil deveria investir mais do que investe. É muito importante investir em infraestrutura. Temos uma limitação de ordem fiscal que é muito severa e aí não há outra alternativa. Se a gente quiser impulsionar os investimentos, nós temos que buscar o setor privado e, por isso, concessões e privatizações”, argumentou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
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No conjunto de boas práticas de gestão administrativa, a tomada de decisão deve ser pautada por previsibilidade, segurança jurídica e institucional, ainda que sofra pressões de setores que compõem a administração pública. Para o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), é preciso planejamento e entendimento em conjunto para elencar prioridades e priorizar soluções de problemas apresentados pela população.
O problema da alocação de recursos muitas vezes está na estrutura organizacional da administração pública, com diferentes secretarias desempenhando atuação semelhante, além de despesas altas com o pagamento de funcionários em cargos comissionados. Por isso, há necessidade de fortalecimento de processos regulatórios e monitoramento em nível interno, com o estabelecimento de metas para avaliação posterior. O governador paulista acrescentou que a compreensão também precisa partir dos prefeitos, e por isso tem priorizado, durante sua gestão, ações de regionalização de serviços públicos na interlocução com os gestores municipais.
“Governar é fazer escolhas, e você sofre pressões constantes dentro de corporações dentro do serviço público, e uma das funções do governante é resistir às pressões. Existem demandas que são legítimas, mas muitas fogem do razoável”, afirmou Leite.
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Reforma administrativa
A defesa de uma reforma administrativa dividiu opiniões. De um lado, de maneira mais firme por uma mudança na legislação, Eduardo Leite e Tarcísio de Freitas defenderam um enxugamento de cargos pela desburocratização e digitalização dos serviços públicos, nas áreas que não dizem respeito à atuação direta do Estado, como serviços de saneamento.
O governador gaúcho também é favorável à inclusão, na legislação, de punição a servidores que de alguma forma se comportem de maneira contrária ao previsto em lei, além de incentivos àqueles que cumprirem as metas estabelecidas.
“A gente tem que entender a mudança nos tempos. O Estado lá no passado pode ter tido um papel diante de uma situação econômica do país. Há 50 anos talvez faltasse ao setor privado dinâmica e capacidade para estar em determinado setor. O setor público avançou e esteve no setor energético e no saneamento. Nos tempos atuais a gente observa a capacidade do setor privado para operar nesses setores”, disse Eduardo Leite.
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“Eu defendo um Estado mais enxuto, que não é ausente, que se faz presente a partir de regulação, de fiscalização, mas que faz concessões, que privatiza e que tem uma maior racionalidade da estrutura administrativa e sem privilégios para determinados grupos de servidores públicos em qualquer um dos Poderes”, complementou o governador gaúcho após o painel, em entrevista coletiva.
Em 2020, foi enviada ao Congresso Nacional uma proposta de emenda constitucional que prevê alterações nos artigos da Carta Magna de 1988 que tratam da administração pública. A proposta ainda não foi analisada pelos parlamentares e, recentemente, o debate tem se pautado pelas opiniões favoráveis dos presidentes da Câmara (Arthur Lira) e do Senado (Rodrigo Pacheco) sobre a necessidade de revisão dos gastos públicos.
Para Rafael Fonteles, se a “reforma não combater privilégios, não vai adiantar muita coisa”. Ex-secretário estadual de Fazenda, o governador do Piauí lembrou que a Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2001, estabelece parâmetros para a boa aplicação dos recursos públicos, inclusive com faixas de limite de alerta e preferencial para gastos do Executivo com pessoal.
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“Se ela não for para combater privilégios, você vai ter um problema muito grave. A sociedade não vai compreender como você vai atacar alguns pontos e deixar outros de fora porque um grupo ou outro tem mais força política. Tem que fazer a regra correta. Acho que dá para aperfeiçoar vários pontos dessa estrutura de Estado, mas não podemos abrir mão de realmente cortar os privilégios do andar de cima, que tem que ser realmente decidido pelo Congresso Nacional”, explicou Fonteles em conversa com jornalistas após o painel.
Sobre a capacidade de a sociedade acompanhar o trabalho dos gestores, Barbalho sinalizou que a legislação não pode se tornar anacrônica e deve levar em consideração o avanço dos meios digitais para a fiscalização do trabalho das equipes que trabalham na administração pública.
“Nós vivemos um ‘big brother administrativo’ em que a população nos cobra em tempo real a eficiência e a competência do serviço público. Nós precisamos retratar isso para leis que possam modernizar. A reforma administrativa junto com a reforma política são decisivas como agendas de um futuro próximo para que possamos buscar um país e uma administração pública mais eficiente”, concluiu.