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As eleições municipais deste ano têm ganhado contornos nacionais nas últimas semanas, após as operações da Polícia Federal (PF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados, ao mesmo tempo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensifica viagens pelas principais capitais do Nordeste e do Sudeste. Apesar da polarização nacional crescente, ela deve disputar com fatores locais a atenção dos eleitores − e o efeito do contágio deve variar em cada pelito.
Em sete dias, Lula visitou os três maiores estados do país, que são liderados por aliados de Bolsonaro, e se encontrou com os respectivos governadores – em São Paulo e em Belo Horizonte, ele inclusive trocou afagos com Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Romeu Zema (Novo), dois nomes cotados para enfrentá-lo em uma eventual tentativa de reeleição em 2026. Semanas antes, o presidente iniciou seu “giro pelo Brasil” visitando as três principais capitais do Nordeste: Salvador, Recife e Fortaleza.
Outras influências nacionais também estão se movendo nas disputas locais, como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em Belo Horizonte – onde Lula esteve na quinta-feira (8) e se encontrou não só com Zema e o senador, mas também com o prefeito (e candidato à reeleição) Fuad Noman (PSD), apesar de o PT ter um pré-candidato melhor posicionado nas pesquisas. Já o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) vai apoiar a “terceira via” na capital paulista e tem se movimentado para ampliar a influência do partido, como a filiação de Cid Gomes e 40 prefeitos no Ceará. Ele afirmou recentemente que “eleição municipal é local” e que o candidato ter apoio político “ajuda”, “mas não é o fator decisivo”.
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O analista político Carlos Eduardo Borenstein, da consultoria Arko Advice, diz que o componente nacional está ganhando importância nas eleições de outubro, mas destaca também a importância dos elementos locais nas disputas. Ele diz que, de um lado, o PT está preocupado em melhorar seu péssimo desempenho nas eleições de 2016 e 2020 – quando não elegeu nenhum prefeito nas 26 capitais, pela primeira vez desde a redemocratização. Do outro, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto (preso por porte ilegal de arma na operação de ontem da PF), tem a “previsão otimista demais” de chegar a mil prefeitos, usando Bolsonaro como cabo eleitoral – estratégia que será testada pelo avanço recente de investigações contra ele. “Mas isso não vai eliminar o debate municipal, porque no fim é uma eleição para prefeito”.
Veja abaixo um panorama da disputa em algumas das principais capitais do país:
Sudeste
São Paulo
Em São Paulo, o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), conta com apoio de Tarcísio, mas ainda busca o de Bolsonaro. Para isso, ofereceu a vaga de vice em sua chapa, e o ex-presidente indicou o nome de Ricardo de Mello Araújo, ex-comandante da Rota e presidente da Ceagesp em seu governo. Mas Bolsonaro não escondeu que sua vontade “de coração” era apoiar o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), agora fora da disputa. Para analistas, Nunes tem o desafio de se aproximar do bolsonarismo, para conquistar votos do eleitorado de direita, mas manter distância suficiente para evitar o contágio da rejeição a Bolsonaro na capital paulista.
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O maior concorrente de Nunes é o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), que ficou em segundo lugar na eleição de 2020, quando o atual prefeito se elegeu como vice de Bruno Covas (PSDB), vitimado por um câncer aos 41 anos. Outros dois deputados federais “correm por fora”: Tabata Amaral (PSB), que é apoiada por Alckmin e recentemente foi elogiada por Lula; e Kim Kataguiri (União Brasil), que ainda tenta convencer seu partido a apoiá-lo, contra a vontade do influente Milton Leite.
A disputa é a mais nacional de todas: Lula a todo momento cola a figura de Bolsonaro em Nunes. Em entrevista a uma rádio de Salvador no mês passado, disse que “na capital de São Paulo, é uma coisa muito especial, porque é uma confrontação direta entre o ex-presidente e o atual presidente. Entre eu e a figura”. O presidente também conseguiu um reforço de peso para a candidatura de Boulos ao convencer a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) a deixar o cargo de secretária de Relações Internacionais da gestão Nunes e voltar ao Partido dos Trabalhadores, para ser candidata a vice na chapa.
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Rio de Janeiro
No Rio, o prefeito Eduardo Paes (MDB) é favorito à reeleição. Mas a cidade é o berço do bolsonarismo, e o candidato do ex-presidente (até o momento) é o deputado federal Alexandre Ramagem (PL), ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que foi alvo de uma operação da Polícia Federal em janeiro. Para Borenstein, o fiel da balança vai ser a evolução das investigações sobre a existência de uma suposta “Abin paralela” da gestão Bolsonaro.
O analista político destaca o peso simbólico da cidade para o ex-presidente (e o bolsonarismo) e lembra a dificuldade histórica enfrentada pelo PT, que pode indicar o vice de Paes e herdar a prefeitura em 2026, caso ele decida concorrer para governador. “O PT teria o prefeito da cidade no reduto do bolsonarismo”, aponta.
A disputa envolve também o governador Cláudio Castro (PL), que se reelegeu com facilidade em 2022, com o apoio do ex-presidente, e é apontado como um possível candidato ao Senado em 2026. O bolsonarista passa por um desgaste político devido às chuvas no estado e às investigações sobre o seu irmão e pode ter dificuldade em fazer o seu sucessor, em uma eventual disputa contra Paes daqui a dois anos. Mesmo assim, também recebeu afagos de Lula – no mesmo evento em que o presidente atacou Bolsonaro e o chamou de “maluco” e “aloprado”.
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Belo Horizonte
Na capital mineira, a eleição será crucial para o PSD e para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que pode disputar o governo de Minas Gerais em 2026 (quando vencerá o seu mandato parlamentar). Pacheco é do mesmo partido do atual prefeito, Fuad Noman (PSD), que registrou apenas 5,5% das intenções de voto na pesquisa Atlas Intel divulgada em 31 de dezembro. O líder é o deputado estadual Bruno Engler (PL), que foi chamado por Bolsonaro de “nosso futuro prefeito de Belo Horizonte” e marcou 31,4% das intenções de voto na mesma pesquisa. Na sequência aparecem o deputado federal Rogério Correia (PT), com 21%, e Mauro Tramonte (Republicanos), com 11,6%.
O PSD concorreu com uma “chapa pura” em 2020 e Fuad era vice-prefeito de Alexandre Kalil. Ele assumiu a prefeitura em 2022, com a renúncia de Kalil para disputar – e perder para Zema – a eleição para o governo do estado no 1º turno. Lula apoiou Kalil na eleição e se encontrou com Fuad no aeroporto, na visita à capital mineira nesta semana, mesmo que o pré-candidato do PT esteja muito melhor colocado nas pesquisas.
Nordeste
A região é o bastião do PT, mas os dados da eleição de 2022 mostram que a disputa entre Lula e Bolsonaro foi bastante equilibrada nas capitais – o petista inclusive perdeu em Maceió (AL), onde o então presidente teve 57,2% dos votos. “O peso da eleição do Lula foi muito nas cidades pequenas e médias, apesar de todos os governadores do PT terem sido eleitos no Nordeste”, afirma Borenstein. “O PT passa por um desgaste, fruto dessa inflexão política à direita que o brasileiro fez – inclusive no Nordeste”.
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Salvador
A capital baiana é o símbolo disso. O favorito é o atual prefeito, Bruno Reis (União Brasil), que foi vice de ACM Neto (do mesmo partido) por dois mandatos. Ele se elegeu no 1º turno em 2020, com 64,2% dos votos, e está entre os prefeitos de captais mais bem avaliados do país. Reis tem 59% de aprovação e 29% de rejeição e 52% das intenções de voto para a eleição de outubro, segundo pesquisa Atlas Intel de 31 de dezembro. “A Bahia é governada pelo PT há 5 mandatos consecutivos, mas o partido não consegue eleger o prefeito de Salvador”, destaca o analista da Arko Advice.
Lula deve apoiar a candidatura do vice-governador, Geraldo Júnior (MDB), que tem apenas 12% das intenções de voto. Apesar do cenário desfavorável ao PT em Salvador, o presidente é bem avaliado na cidade (57% de aprovação e 37% de reprovação) e a situação do bolsonarismo é pior. Em um levantamento do Paraná Pesquisas de 24 de janeiro, Reis tem 59,9%, Geraldo tem 11,2% e João Roma (PL), ex-ministro da Cidadania de Bolsonaro, apenas 6,1%. A avaliação de Borenstein é de que, nesse cenário, Lula até deve marcar presença na capital baiana, mas olhar mais para as cidades médias e pequenas do estado (onde teve 72% dos votos em 2022 e venceu em 415 dos 417 municípios).
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Recife
No Recife (PE), a esquerda vai muito bem, obrigado. O prefeito João Campos (PSB) tem a melhor avaliação do país (81% de aprovação e 18% de reprovação, segundo a Atlas Intel) e ainda poderá ter o apoio de Lula (que nasceu em Pernambuco e é extremamente popular no estado). Pesquisa Ipespe do fim de dezembro mostra que o prefeito de apenas 30 anos tem 62% das intenções de voto. O candidato bolsonarista Gilson Machado (PL), ex-ministro do Turismo, marca apenas 3% e fica atrás de 2 nomes ligados à governadora Raquel Lyra (PSDB): Daniel Coelho (Secretário de Turismo e Lazer do estado) e Priscila Krause (vice-governadora), que são do Cidadania e marcaram, respectivamente, 5% e 4%.
Fortaleza
Na capital cearense, a disputa entre Lula e Bolsonaro será latente. O atual prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), deve concorrer à reeleição, mas sua gestão não é muito bem avaliada: ele é o 4º pior no levantamento da Atlas Intel (25% de aprovação e 45% de desaprovação). Além disso, o partido passa por um racha no estado, fruto de uma briga entre os irmãos Ciro e Cid Gomes (que saiu do PDT e voltou para o PSB). Outro ponto favorável ao ex-presidente é que o bolsonarismo tem um forte candidato no terceiro maior colégio eleitoral do Nordeste: o capitão Wagner (União Brasil), figura que ganhou notoriedade política ao liderar um motim da PM estadual em 2011 e bateu na trave em 3 das últimas 4 eleições na capital e no estado.
Outras regiões
No Sul, a eleição está mais indefinida em Curitiba (PR). A candidatura do vice-prefeito Eduardo Pimentel (PSD) ainda não engrenou, apesar do apoio do prefeito Rafael Greca (PSD) e do governador Ratinho Jr. (PSD), que estão em seus segundos mandatos e têm gestões bem avaliadas pela população. Em Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC), os atuais prefeitos – Sebastião Melo (MDB) e Topázio Neto (PSD), respectivamente – são favoritos à reeleição e não deve haver surpresas. Borenstein acredita que, mesmo com o cenário já desenhado nas 3 capitais, Lula dará “uma grande atenção” às campanhas na região, “porque são capitais onde a rejeição ao Lula e ao PT são muito grandes”.
No Centro-Oeste, onde o bolsonarismo tem forte presença, o ex-presidente deve ter muita influência sobretudo em Cuiabá e Campo Grande. Mas a eleição ainda está bastante indefinida nas duas capitais e também em Goiânia (GO), sem nenhum candidato favorito até o momento. Na capital goiana, o PT tem a sua melhor situação, com a Delegada Adriana Accorsi (PT) na 2ª posição, numericamente à frente do bolsonarista Major Vitor Hugo (PL), segundo o agregador de pesquisas Ipespe Analítica. O prefeito Rogério Cruz (Republicanos) aparece apenas em 4º lugar, e o líder do levantamento é o senador Vanderlan Cardoso (PSD), que é de direita mas tem se distanciado do bolsonarismo e tentado se desvincular da imagem do ex-presidente.
Na região Norte, a principal disputa deve ocorrer em Belém (PA), onde o atual prefeito, Edmilson Rodrigues (PSOL), deve tentar a reeleição, apesar da elevada rejeição. Ele ganhou por estreita margem em 2020 – 51,8% a 48,2% do Delegado Federal Oguchi (então no Patriota, hoje no PL) – e agora está atrás nas pesquisas do candidato bolsonarista da vez, o deputado federal Delegado Eder Mauro (também do PL). Levantamento do Paraná Pesquisas de novembro mostra o parlamentar com 24% das intenções de voto, contra 16,6% de Edmilson e 9,6% de Oguchi, Além disso, pesquisa Atlas Intel de 31 de dezembro aponta o prefeito de capital com a pior avaliação do país (88% de rejeição e apenas 6% de aprovação).
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