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No momento em que a equipe econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenta construir um acordo para um pacote de revisão de gastos que garanta a sustentabilidade do novo arcabouço fiscal, a vitória do republicano Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos provoca uma reviravolta no cenário internacional, com implicações no plano doméstico.
O retorno de Trump à Casa Branca com resultados contundentes nas urnas tem provocado avaliações distintas entre analistas políticos sobre seus impactos para a agenda fiscal no Brasil, embora a expectativa sob a ótica diplomática seja de um tom menos amistoso do que seria em caso de vitória da democrata Kamala Harris.
Veja a seguir duas leituras sobre os impactos da vitória de Trump para a agenda fiscal brasileira:
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Licença para gastar
Para o cientista político Leonardo Barreto, sócio da consultoria Think Policy, a vitória republicana soma-se a um conjunto de “razões objetivas” que podem colocar Lula “na defensiva”. “O PT, que ainda quebra a cabeça para entender por que se saiu mal das eleições municipais, agora tem outra esfinge à sua frente“, diz.
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Em análise distribuída a clientes, Barreto chama atenção para o contexto que marcou a vitória republicana nestas eleições. Alguns dos elementos destacados por ele são uma suposta preferência midiática pela candidatura da democrata Kamala Harris, os problemas enfrentados por Trump com a Justiça, o ambiente de polarização política e uma liderança envelhecida à frente do País. No plano econômico, ele apontou a inflação e os juros elevados para os padrões americanos.
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“Algo soa familiar para você? Com desempenho eleitoral ruim, popularidade morna, perspectiva de um novo ciclo de juros subindo e inflação fora da meta à frente, além desse sinal de mal agouro vindo dos EUA, como Lula vai reagir à proposta do seu ministro econômico de cortar gastos?”, indagou o especialista.
“Para Lula, olhando o contexto, deve parecer claro que o momento é de acelerar e não de frear”, apostou. “A vitória de Trump rifa o pacote de controle de gastos e reforça a preocupação de achar mais dinheiro para colocar em políticas de transferência. O governo pode até anunciar algo, mas seu objetivo não deve ser outro que não ‘tourear’ o mercado e a sociedade”, prosseguiu.
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Um dos caminhos para isso seria justamente o encaminhamento da discussão no formato de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ─ tipo de proposição mais complexo e com maior exigência de quórum ─ reforçando as regras fiscais, para ser aprovada em 2025 e ter vigência no ano seguinte, 2026. Neste caso, especula o analista, as sanções para a hipótese de descumprimento ficariam apenas para 2027.
“Tudo o que vier de ajuste estrutural dificilmente não será para depois da eleição geral. Conjunturalmente, medidas para evitar fraudes no BPC, controle biométrico de beneficiários”, projetou.
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Para Barreto, a conjuntura atual reforça a tendência de uma administração que tente suportar um cenário macroeconômico pior no Brasil, buscando uma compensação com medidas direcionadas de crédito, transferências e socorros setoriais, e doses de “malabarismo fiscal”.
Sem margem para erros
Por outro lado, o aprofundamento do movimento de desvalorização do real em relação ao dólar pode ampliar a pressão sobre o governo brasileiro por medidas de ajuste nas contas públicas. Assim como em outros episódios de tensão entre o Planalto e a Faria Lima, o dólar tem testado o poder de reação da atual administração.
Para Fábio Zambeli, vice-presidente da consultoria Ágora Assuntos Públicos, a desvalorização do real em um cenário externo adverso pode, justamente, ser
um fator de instabilidade para a economia nacional.
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O especialista vislumbra uma tendência de postura mais rígida do Federal Reserve diante de um contexto de inflação global possivelmente ascendente. Isso ampliaria a atratividade dos Treasuries (títulos públicos emitidos pelo Tesouro americano) ─ o que redirecionaria fluxos de capital globais aos Estados Unidos, afetando países emergentes.
“Nesse contexto, uma política fiscal rigorosa, pautada pelo controle das contas públicas, ganha importância estratégica para o Brasil”, observou em relatório distribuído a clientes.
“O tema ganha ainda mais relevância em um momento crítico, pois o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se encontra em intensas discussões com outras áreas do governo para a elaboração de um pacote de medidas de contenção de despesas”, prosseguiu o especialista.
A equipe econômica tem buscado medidas para conter o avanço de despesas obrigatórias, que respondem por mais de 90% dos gastos públicos e crescem a uma proporção superior aos limites previstos no novo marco fiscal. Tal agenda é considerada fundamental para garantir a sustentabilidade da regra a médio e longo prazo.
“Esse é um ponto de inflexão no debate fiscal brasileiro, marcado por divergências internas dentro do próprio governo sobre o escopo e a profundidade dos cortes de despesas, inclusive em áreas sensíveis socialmente”, pontuou Zambeli.
“Essas áreas representam uma base política importante para o presidente Lula e influenciam diretamente sua popularidade, além de impactarem as perspectivas para uma eventual tentativa de reeleição em dois anos”, prosseguiu.
Para ele, apesar dos desafios políticos colocados, a vitória de Donald Trump dá contornos ainda mais relevantes à agenda fiscal brasileira, já que reduz espaço para uma postura leniente com o desequilíbrio das contas públicas.
“A coincidência dessa conjuntura fiscal com a vitória de Trump acrescenta um peso extra ao compromisso com a responsabilidade orçamentária, que se torna uma frente de debate ainda mais crítica e politicamente sensível no governo brasileiro”, concluiu.