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O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou, na segunda-feira (23), que a equipe econômica não abre mão da “compensação integral” da desoneração da folha de pagamento de empresas e municípios e sinalizou que o governo voltará ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso os valores esquecidos em contas bancárias não sejam considerados uma contrapartida válida.
“Se isso não for entendido como compensação válida, será preciso voltar ao Supremo e dizer que ficou faltando parte da compensação. Simples assim. A gente nunca vai abrir mão da compensação da desoneração. Não vamos compensar R$ 8 bilhões a menos”, afirmou Durigan, durante a apresentação do mais recente relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas do governo. Ele não detalhou, porém, se, nesse caso, o governo enviaria uma nova medida ao Congresso nem que medida seria essa.
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Trata-se de um novo capítulo do embate entre Ministério da Fazenda e Banco Central em torno da forma de se contabilizar esse dinheiro esquecido em instituições financeiras, que totaliza R$ 8,6 bilhões, segundo o Sistema de Valores a Receber (SVR) do BC.
Em nota técnica enviada a parlamentares na semana passada, o BC afirmou que a incorporação dessas cifras no resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem considerar os juros da dívida pública) estava “em claro desacordo com sua metodologia estatística, indo de encontro às orientações do TCU (Tribunal de Contas da União) e ao entendimento recente do STF sobre a matéria”.
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Divergência
O texto aprovado pelo Congresso e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no entanto, prevê que, mesmo não computada como receita primária pelo BC, a cifra será considerada pelo Tesouro Nacional para fins de cumprimento da meta fiscal do governo. Ou seja: abriu-se uma divergência entre a autoridade monetária e a Fazenda, que, na realidade, não é de hoje.
Como mostrou o Estadão, no acumulado em 12 meses até julho o rombo fiscal calculado pelo BC é R$ 39,7 bilhões superior ao informado pela Fazenda. Em valores corrigidos pela inflação, essa discrepância chega a R$ 41,1 bilhões – a maior da história.
“Não queremos usar artifício nenhum. Estamos querendo respeitar a decisão do Congresso e fazer uma harmonização de entendimento técnico”, afirmou Durigan, frisando que a incorporação desses valores esquecidos foi uma sugestão do Senado, e não da equipe econômica.
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“Primeiro, os recursos esquecidos não foram uma opção do governo. Nós queríamos ter compensado a desoneração da folha com corte de benefício de PIS/Cofins, cuja medida provisória foi parcialmente devolvida pelo Congresso”, disse, tentando colocar o governo a uma distância segura da medida, que vem sendo chamada de confisco pela oposição nas redes sociais.
Para governo, existe ‘irracionalidade’ em críticas à política fiscal
Durigan também afirmou ontem que há “incômodo” na equipe econômica com as críticas de uma “contabilidade criativa” feitas por analistas à condução da política fiscal. “Temos o equilíbrio fiscal como fundamento da política econômica. Por isso, temos feito esforço maior para ajustar as contas do País e cumprir as metas. Há um incômodo quando a gente percebe alguma irracionalidade da repercussão. O fato é que o fiscal se recuperou e tem superado as expectativas”, disse ele, acrescentando que o ajuste está sendo feito “sem nenhum tipo de criatividade ou artifício”.
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A equipe econômica detalhou os dados do relatório de receitas e despesas relativo ao quarto bimestre, divulgado na sexta-feira passada, 20. O governo surpreendeu os analistas ao reduzir em R$ 1,7 bilhão o congelamento de recursos no Orçamento deste ano. Com isso, o total congelado passou de R$ 15 bilhões para R$ 13,3 bilhões, gerando críticas por parte de economistas, que falaram, inclusive, em “matemágica fiscal”.
O anúncio de sexta-feira, segundo os analistas, também evidenciou que o governo segue perseguindo o piso da meta fiscal (que permite um déficit de até R$ 28,8 bilhões), e não o centro (que seria um déficit zero). A equipe econômica alega, porém, que as leis fiscais impedem que o governo contingencie recursos do Orçamento quando há sinais de que ao menos o piso da meta será alcançado.
Essa interpretação, porém, também já levantou questionamentos. “Esse entendimento de que o governo não pode contingenciar se estiver cumprindo o limite inferior da banda de resultado primário não parece ser compartilhado pelo TCU (Tribunal de Contas da União), caso contrário não caberia o alerta sobre os riscos da estratégia de buscar o limite inferior da banda pela Corte”, afirma Jeferson Bittencourt, head de macroeconomia do ASA e ex-secretário do Tesouro Nacional.
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Para o economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, a leitura das leis fiscais, de fato, permite essa interpretação. Ele alega, contudo, que a decisão não é prudente dentro de um cenário de déficit ainda elevado. “O problema não é da letra da lei. Elas, de fato, permitem a interpretação que levou a descontingenciar R$ 3,8 bilhões e bloquear R$ 2,1 bilhões, mesmo na base de uma série de receitas incertas. Ocorre que não é prudente nem recomendável que se liberem gastos discricionários ou de outra natureza em um contexto de déficit ainda elevado projetado pelo próprio governo”, disse. E ponderou: “Ou é meta zero ou não é”.