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SÃO PAULO – Neste domingo, a Argentina vai às urnas e, a não ser que haja uma reviravolta de contornos épicos, o resultado sacramentará a volta da esquerda ao comando do país.
Caso a derrota do atual presidente argentino, Mauricio Macri, se torne mesmo uma realidade, a direita moderada sofrerá um revés importante na região e a fragmentação política na América do Sul aumentará, em um momento em que diversos países da região enfrentam momentos de ebulição social, apontou em entrevista ao InfoMoney Oliver Stuenkel, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em relações internacionais.
“Com a maior fragmentação de países com governos de centro-esquerda e direita, há pouquíssimo espaço para cooperação nos próximos anos na região. Assim, dificilmente haverá um avanço no debate regional de como lidar com desafios comuns. Resumindo, o cenário é de fragmentação e pouca cooperação”, acrescentou Stuenkel, lembrando dos protestos que eclodiram recentemente no Chile e no Equador.
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A expectativa é que o presidente Jair Bolsonaro não tenha vida fácil na relação com muitos de seus vizinhos. “Ele não vai ter o ‘luxo’ que o Lula teve de lidar com governantes de orientação ideológica parecida. Bolsonaro terá que lidar com Fernández, [Evo] Morales, [Nicolás] Maduro – e isso afeta a capacidade brasileira de exercer liderança regional”, avalia.
Para o professor, a baixa popularidade geral dos presidentes latino-americanos está relacionada ao baixo crescimento econômico da região, e o novo governo argentino já deve começar com a perspectiva de que não será popular por conta da crise no país.
Confira os destaques da entrevista:
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Argentina: desejo por mudança – seja ela qual for
Conforme aponta Stuenkel, a população da Argentina quer mudança em meio ao ambiente bastante negativo para a economia mas, ao mesmo tempo, enfrenta uma forte desilusão com relação à política nacional.
Porém, ao contrário do Brasil de 2018, a desilusão dos argentinos é mais “passiva”, o que faz com que políticos como Cristina Kirchner – acusada de corrupção – voltem ao poder (ela é vice-presidente do candidato Alberto Fernández, favorito nas pesquisas).
Como há uma percepção de que é preciso mudar uma vez que Macri não conseguiu entregar o que prometeu, a população vota no outro polo como uma tentativa de estancar a crise.
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Chile remete ao Brasil de 2013
A turbulência mais recente na América do Sul acontece no Chile, com intensos protestos irrompendo no País desde o dia 19 de outubro após o governo anunciar aumento em 30 pesos (cerca de R$ 0,17) no preço das tarifas de metrô de Santiago.
A repressão dura aos protestos fez com que eles se intensificassem, levando à maior revolta social no país das últimas décadas. Os manifestantes fizeram protestos contra a degradação das condições sociais e as desigualdades, uma vez que as áreas da saúde e da educação são quase totalmente controladas pelo setor privado.
O presidente Sebastián Piñera pediu perdão, reverteu as medidas e anunciou um pacote social para acalmar os manifestantes – mas ainda há grandes manifestações pelo país, que pedem inclusive a renúncia do governante.
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De acordo com Stuenkel, a situação chilena se remete muito às manifestações difusas realizadas em diversas cidades no Brasil em 2013 e que, coincidentemente, também eclodiram com um aumento nos preços das passagens de ônibus em São Paulo.
Além das tarifas de ônibus, as reivindicações no Brasil também se estenderam para a melhoria do transporte público em geral e em relação ao pagamento de altos impostos sem uma contrapartida na melhoria dos serviços – fazendo com que a então presidente, Dilma Rousseff, também anunciasse um pacote para conter a ira da população.
“No caso chileno houve uma dualidade: há um reconhecimento de que o Chile avançou muito ao longo dos últimos 30 anos mas, ao mesmo tempo, criaram-se expectativas que foram frustradas. Então é uma situação interessante de que o que os números mostram não se traduz no que a população jovem sente, tanto pela falta de perspectiva quanto pelas altas dívida por conta do alto custo da educação”, avalia o professor.
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Assim, por mais que haja a retórica de que o Chile é um país de renda média que está em ascensão, uma parcela relevante da população encara muitas dificuldades e os avanços na sociedade não ocorreram de maneira igual.
O Equador e a inviabilidade do acordo com o FMI
Em outubro, o Equador enfrentou 11 dias de violentos protestos após o presidente Lenín Moreno anunciar o fim de um subsídio aos combustíveis que já durava 40 anos, o que levou a um aumento de até 123% nos preços como parte de um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
O governo decretou “estado de exceção”, transferiu a sede do governo de Quito para Guayaquil de forma a conter o impacto das manifestações. Porém, elas continuaram, com um saldo de sete mortos e 1.340 feridos, fazendo com que Moreno revogasse a medida.
O caso do Equador é curioso: antes aliado de Rafael Corrêa, Moreno foi eleito com uma plataforma mais ligada à esquerda, mas deu uma guinada liberal assim que assumiu o poder, em 2017, vendo o seu antigo aliado virar um inimigo político.
Conforme destaca Stuenkel, Corrêa foi o padrinho político de Moreno justamente de olho em uma volta ao poder, já que o atual presidente não possui grandes ambições de seguir na política. Porém, o ex-presidente saiu em um momento difícil para o Equador, em que a estratégia para a economia já havia se deteriorado, com aumento da dívida e queda das commodities.
Moreno adotou medidas consideradas impopulares, mas o ambiente de tensão chegou a tal ponto que ele não conseguiu mantê-las, criando um ambiente de dúvidas.
“No curto prazo, revogar o aumento dos combustíveis gera estabilidade, mas, no médio prazo, gera incerteza, inclusive para os investidores, porque não fica claro como o Equador lidará com a crise econômica”, avalia Stuenkel.
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