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SÃO PAULO – As críticas proferidas pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao seu próprio partido explicitaram uma disputa pelo comando da sigla a um ano das eleições municipais e em meio a novos episódios da novela envolvendo as suspeitas do uso de candidaturas laranjas no pleito de 2018.
No episódio mais recente, Bolsonaro foi abordado por um apoiador pré-candidato pelo PSL no Recife (PE) que, na saída do Palácio da Alvorada, gravou um vídeo dizendo “Eu, Bolsonaro e Bivar juntos por um novo Recife”.
Contrariado, o presidente respondeu: “Cara, não divulga isso não, pô. O cara tá queimado para caramba lá. Vai queimar o meu filme também. Esquece esse cara, esquece o partido”.
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O caso deixou claro um movimento interno de descontentamento com o presidente pesselista, Luciano Bivar (PE), que se organizava há algumas semanas.
Para alguns parlamentares, a fala do presidente foi encarada como como uma atitude concreta de que ou Bolsonaro assume a liderança do partido ou procurará outra sigla.
“Bolsonaro quer mais espaço para protagonizar internamente no partido, mudança de integrantes da Executiva Nacional e controle da burocracia partidária por meio de seus aliados”, observam os analistas da XP Política.
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A avaliação de aliados do presidente é que as demandas de Bolsonaro por uma “reformulação” no partido não foram resolvidas, o que fez com que ele adotasse postura mais contundente — e pública. Paralelamente à pressão interna, ganham força especulações sobre migração partidária.
Analistas políticos ouvidos pelo InfoMoney avaliam os incentivos e as consequências associados a uma possível saída de Bolsonaro da sigla — o que já chegou a ser ventilado anteriormente.
Neste caso, não está descartada a possibilidade de criação de um novo partido. Um dos caminhos seria a reedição da antiga UDN (União Democrática Nacional), processo que está em fase final de criação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
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De um lado, o presidente poderia buscar o afastamento da crise dos laranjas, que ameaça abalar sua reputação junto à fatia mais fiel de eleitores, e construir uma base mais coesa. Do outro, há riscos de aprofundamento na divisão da direita e mais turbulências na gestão da governabilidade.
“A eventual saída representaria mais um efeito negativo em termos de estabilidade do processo decisório. Haveria certamente uma mudança na balança de poderes”, observa Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria.
Na avaliação do especialista, o movimento “atrapalharia a agenda de reformas”. Se confirmado, demandaria um olhar atento para o grau de migração de pesselistas para o novo partido. Nos cálculos de bolsonaristas, o grupo contaria com cerca de 30 deputados da bancada de 54 parlamentares pesselistas na Câmara.
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Apesar da força de Bolsonaro, a adesão à migração precisaria ser monitorada com atenção, dados os incentivos contrários advindos de recursos do fundo partidário e riscos de perda de mandato — caso a sigla escolhida não seja nova.
“Do ponto de vista positivo ao presidente, é que ele conseguiria uma legenda que pudesse dar mais coesão ao seu projeto político, a despeito de ter um risco de começar um partido do zero, sem distribuição de recursos eleitorais (que são distribuídos a partir do resultado eleitoral)”, diz Cortez.
“Vamos ver se esse cenário vai gerar alguma acomodação ou se eventualmente haverá mais uma manifestação de um problema político relevante”, complementa.
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O analista político Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores, lembra que, por ter formado a segunda maior bancada na Câmara dos Deputados, o PSL teria direito a fatia expressiva do Fundo Partidário.
Além disso, a proximidade das eleições municipais e os riscos de retaliação vindos do atual controle da sigla jogam contra movimentos mais ousados pelo presidente.
Para Carlos Eduardo Borenstein, analista político da Arko Advice, há uma tentativa de Bolsonaro em organizar um partido orgânico, que seja 100% fiel a ele. Mas a empreitada carrega riscos.
“O PSL não demonstra ter hoje um comando partidário, como tiveram PT e PSDB no auge, no sentido de ter uma disciplina interna. É bom frisarmos que esse movimento que acabou desaguando na eleição de Bolsonaro é muito fragmentado e heterogêneo. Não é uma operação fácil”, diz.
Caso a decisão seja pela nova UDN, o analista chama atenção para os riscos de disputas no bolsonarismo por posições de destaque no partido, o que pode dividir novamente a base e provocar atrasos na articulação em torno de agendas de interesse do governo.
Já Leopoldo Vieira, analista político da Idealpolitik, observa no episódio um grande teste ao presidente. “A decisão de Bolsonaro significa realmente o rumo a seguir da ala antiestablishment, olavista, e não o conjunto da nova direita no governo ou que ajudou a eleger ele. O deslocamento vai testar a força atual de Bolsonaro como pólo de atração ideológica”.
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