Bolsonaro vê “histeria” com coronavírus e diz que “economia não pode parar”

Em entrevista à Rádio Bandeirantes, presidente diz que há um "superdimensionamento" dos efeitos do novo coronavírus e que caos será maior se economia parar

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou, nesta segunda-feira (16), que há um “superdimensionamento” da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus e que “a economia não pode parar” em função do avanço da doença. As declarações foram dadas em entrevista ao jornalista José Luiz Datena, da Rádio Bandeirantes.

Um dia após endossar manifestações em defesa de seu governo e descumprir recomendação médica de isolamento, para cumprimentar um grupo de apoiadores em frente ao Palácio do Planalto, o presidente disse que há uma “histeria” por parte de atores políticos que criticaram sua conduta.

No último domingo (15), simpatizantes de Bolsonaro se reuniram em algumas capitais e cidades do país para manifestar apoio à atual administração e criticar a atuação de outras instituições, como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.

Os atos ocorreram à revelia da recomendação de autoridades médicas e governantes, que pediram para que aglomerações fossem evitadas, e de sugestões feitas pelo próprio presidente três dias antes, em rede nacional. Bolsonaro, apesar de ter recomendado o adiamento dos atos, compartilhou vídeos e fotos de manifestações em diversas cidades e inclusive participou de parte dos protestos em Brasília.

“Tenho obrigação moral de saudar o povo que ficou na frente do Palácio do Planalto. Se eu me contaminei, é responsabilidade minha. Agora, tudo continua funcionando no Brasil. Está havendo uma histeria”, afirmou Bolsonaro na entrevista concedida nesta manhã.

“Mesmo que o povo erre, você tem que respeitar a vontade popular. Isso é democracia”, pontuou.

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Um dos principais críticos da conduta do mandatário foi o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que, nas redes sociais, disse que, ao encorajar aglomerações, Bolsonaro comete um “atentado à saúde pública” e contraria as recomendações do próprio governo.

O deputado foi um dos principais alvos dos manifestantes no último domingo, juntamente com o presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-RJ), que também criticou o comportamento do presidente; e o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli.

“Não houve protestos. Eles estavam, em grande parte, fazendo um movimento pelo Brasil. Ponto final. Resolveram ir. Eu não convoquei ninguém para esse evento, muito menos falei que seria um movimento contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Isso não existe na minha boca”, disse Bolsonaro à Rádio Bandeirantes.

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“Para os que estão me criticando, agora, no dia 9 de março, houve um grande evento em São Paulo, na Oca do Parque do Ibirapuera, com lotação máxima. Presentes ali o presidente da Câmara, o presidente do Senado, os governadores de São Paulo, do Rio de Janeiro, aqui do Distrito Federal. Uma aglomeração enorme de pessoas. Que exemplo elas estavam dando para todo o Brasil no tocante a essa preocupação que eles dizem que têm por ocasião do dia 15? O que está em jogo? É uma disputa política por parte desses caras. Estou sozinho no canto apanhando de todo mundo”, completou.

Na entrevista, Bolsonaro disse que o governo está “trabalhando para minimizar o máximo possível os efeitos do coronavírus caso venha a se alastrar pelo Brasil”, mas também afirmou que há um “superdimensionamento” dos impactos da doença neste momento. “Não vamos superdimensionar essa questão. Não pode algumas autoridades começarem a proibir isso ou aquilo”, afirmou. “Está havendo uma histeria”.

Para ele, apesar dos efeitos da pandemia, é preciso observar o funcionamento da economia, que, em suas palavras, se perder o passo, pode provocar consequências mais severas do que a própria doença. “Nos não podemos parar a economia”, alegou. “Você terá um caos muito maior do que pode ocasionar esse vírus aqui no Brasil”.

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“Se a economia afundar, afunda o Brasil. Se afundar a economia, acaba qualquer governo, acaba o meu governo. É uma luta de poder. Há por parte de alguns, não estou dizendo todos, irresponsabilidade nisso daí”, disse Bolsonaro. O presidente se reunirá com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para avaliar quais medidas deverão ser tomadas em resposta ao avanço da doença.

O presidente acredita que, a despeito das indicações de evolução nos casos de coronavírus ao longo dos últimos dias, o Brasil não deverá enfrentar uma crise tão severa como a que atingiu a Europa recentemente.

“Quando você pega a população da Europa, o que ouvimos sobre esse vírus? Atinge mais os idosos. Por que os idosos? É natural, vamos chegando a uma idade em que ficamos mais fracos. A população da Europa é mais velha do que a nossa, então mais gente vai ser atingida com o vírus do que nós. Nossa população é mais jovem”, disse. “Lugares diferentes, diagnósticos diferentes”.

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Disputa com o Congresso

O presidente voltou a negar que os atos de domingo tiveram como mote a crítica ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal, mas expôs suas insatisfações com o parlamento ao lembrar de proposições suas que não avançaram e o próprio episódio do Orçamento impositivo – que acabou servindo de gatilho para as manifestações.

“Até as coisas simples que mandamos para a Câmara não vão para frente”, reclamou, citando o aumento de cinco para dez anos do prazo de validade para a CNH e a Medida Provisória que tratava da carteirinha estudantil digital, que caducou.

Durante a entrevista, Bolsonaro afirmou que está no centro de uma “disputa de poder” e que qualquer tentativa de isolá-lo seria um golpe de estado. “Não pode um chefe do Poder Executivo viver ameaçado o tempo todo”, afirmou. “Seria um golpe isolar o chefe do Poder Executivo por interesses outros que não sejam os republicanos”.

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O mandatário disse ser ameaçado “o tempo todo” de sofrer impeachment, embora alegue não haver nenhuma justificativa formal para embasar tal processo. “Eu não abuso e não tenho qualquer envolvimento com corrupção. E terceiro fato: um impeachment só pode haver, no meu entender, se o povo estiver favorável a isso. Não existe nenhum ingrediente no tocante a isso daí”.

O presidente também disse não ter firmado acordo com os parlamentares sobre a divisão do bolo orçamentário. “Não tem acordo. Acordo tem que ser entre nós e o povo brasileiro”, disse.

Para ele, o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), responsável pela articulação política da atual administração, foi posto “contra a parede” pelos congressistas. “O defeito dele é ser bastante inexperiente ainda”, disse. “Talvez ele tenha se perdido um pouco pela sua inocência e honestidade”.

Mesmo diante de tantas críticas, Bolsonaro disse que pretende se aproximar dos Líderes do Legislativo. “Não quero ser melhor que o Maia ou o Alcolumbre. Eu quero que nós aprovemos as questões que interessam a população”.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.