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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou na noite desta terça-feira (27) uma medida provisória (MP) revertendo a reoneração da folha de pagamentos que havia sido imposta na véspera do Ano Novo, pela MP 1202/2023. A reversão é feita após pressão do Congresso Nacional e atende a acordo político firmado pelo governo com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
A nova medida torna sem efeitos todo o trecho da anterior que previa a reoneração dos 17 setores da economia atendidos pelo benefício. Ele gerou forte reação negativa e parlamentares e do setor privado, que se queixaram de o governo ter editado uma MP revertendo uma decisão do Congresso, de estender o benefício até 2027. Parte do Congresso chegou a pressionar Pacheco para que ele devolvesse a MP ao governo, sem nem sequer analisá-la.
O governo, porém, não desistiu da reoneração. Um projeto de lei (PL) será publicado no Diário Oficial da União com conteúdo idêntico ao da MP, ainda que parlamentares tenham avisado ao governo de que não há chance de a proposta de reoneração, como está, avançar no Congresso. Um PL, no entanto, amplia a possibilidade de o Legislativo alterá-lo, criando espaço para o debate, mesmo que ele seja enviado em regime de urgência.
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Como uma medida provisória tem efeito imediato a partir da sua publicação, a cobrança dos tributos sobre a folha retornaria já em abril. No caso de um projeto de lei, mesmo com urgência é necessária a aprovação do Congresso e sanção presidencial para começar a valer — e o prazo para isso é incerto.
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), responsável pela articulação política do governo, divulgou um vídeo hoje à noite para anunciar a decisão. Padilha disse que a nova MP vai ser publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (28), mas ressaltou que a 1202/2023 seguirá tramitando no Congresso para tratar da extinção do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), que vem sendo criticado pelo governo em função do impacto nas contas públicas.
Segundo Padilha, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), vai apresentar na próxima semana aos parlamentares dados sobre os impactos nas contas públicas tanto da desoneração da folha quanto do Perse. Mas o Congresso já indicou que também não pretende acabar com o programa criado durante a pandemia de Covid-19 para o setor de eventos. Mais de 300 deputados já assinaram um texto que pede a su retomada, em movimento que vai de encontro com os interesses do Poder Executivo (veja mais abaixo).
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Reoneração da folha
Os parlamentares aprovaram no fim de 2023 a prorrogação da desoneração até 2027 e ainda criaram um benefício a prefeituras de pequenas cidades, elevando o impacto fiscal para R$ 20 bilhões por ano. O projeto de lei chegou a ser vetado por Lula, mas o Congresso derrubou o veto e a lei foi promulgada. Na sequência, o presidente editou a MP 1202, que revogou a desoneração e a substituiu por uma reoneração gradual da folha — irritando os parlamentares, que viram um desrespeito à decisão do Legislativo.
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), e vem sendo prorrogada desde então. No auge, chegou a atender 56 setores, mas atualmente são 17 os beneficiados pelo programa. Ele permite que empresas substituam a contribuição patronal de 20% sobre a folha de pagamentos por uma tributação de 1% a 4,5% sobre a receita bruta.
Os 17 setores que voltarão a ser beneficiados com a desoneração são: confecção e vestuário; calçados; construção civil; call center; comunicação; empresas de construção e obras de infraestrutura; couro; fabricação de veículos e carroçarias; máquinas e equipamentos; proteína animal; têxtil; tecnologia da informação (TI); tecnologia de comunicação (TIC); projeto de circuitos integrados; transporte metroferroviário de passageiros; transporte rodoviário coletivo; e transporte rodoviário de cargas.
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O restante do conteúdo da MP que provocou controvérsia segue valendo. Além da extinção do Perse, também está mantida a limitação às compensações tributárias feitas pelas empresas em caso de vitória contra o Fisco na Justiça.
A equipe econômica diz que a extinção do Perse é importante porque produz uma economia de R$ 6 bilhões neste ano e porque este valor será a fonte de compensação do PL que será enviado ao Congresso propondo a reoneração da folha (o governo considera ser necessário um “desmame gradual” dos setores atendidos pela desoneração).
Negociação política
Uma das possibilidades de negociação que se tenta costurar é criar uma espécie de prazo de carência para o início da reoneração, transferindo o início da mudança para 2025 ou 2026, mas ainda não há acordo entre governo e parlamentares sobre isso. Como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo, o Ministério da Fazenda também aceitaria esticar o prazo da reoneração total por um ano, de 2028 para 2029.
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Mas mesmo a extinção do Perse enfrenta resistências na Câmara. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), diz que apresentará dados aos deputados mostrando que as renúncias superaram — e muito — o que havia sido acordado quando o programa foi aprovado. O objetivo inicial era que a renúncia ficasse em R$ 4 bilhões por ano, por quatro anos, mas só em 2023 o valor alcançou R$ 16 bilhões.
O governo também tem dito a líderes parlamentares que há suspeitas de lavagem de dinheiro no Perse, mas o meio político resiste em encerrá-lo. A relatora do programa na Câmara, deputada Renata Abreu (SP) — que também é presidente do Podemos — diz que possíveis fraudes no programa não justificam a paralisação do benefício e que é possível redesenhá-lo, com diálogo com o Congresso.
(Com Estadão Conteúdo, Reuters e Agência Brasil)