Após declaração de apoio a Lula, Amoêdo é pressionado a deixar o Partido Novo

Fundador da legenda afirmou que votará no petista contra Jair Bolsonaro

Fábio Matos

A declaração de João Amoêdo, fundador e ex-presidente do Partido Novo, de que votará em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições provocou uma nova crise na legenda. Neste fim de semana, horas depois da manifestação de Amoêdo, dirigentes, parlamentares e integrantes da agremiação reagiram e alguns até defenderam a expulsão do empresário.

Em entrevista publicada pelo jornal Folha de S.Paulo no sábado (15), Amoêdo – candidato à Presidência da República pelo Novo em 2018 – revelou que votará no PT pela primeira vez.

“Infelizmente, a escolha que agora se apresenta na urna não é sobre os rumos que desejo para o Brasil, mas sobre a possibilidade de limitar danos adicionais ao nosso direito como cidadão. E é só isso que espero manter com essa eleição: o direito de ser oposição”, afirmou. “Os fatos, a história recente e o resultado do 1º turno, que fortaleceram a base de apoio de Bolsonaro, me levam à conclusão de que o atual presidente apresenta um risco substancialmente maior.”

Pouco depois da declaração de apoio, o Novo se manifestou em nota e repudiou o endosso de Amoêdo a Lula, classificando o ato como “absolutamente incoerente e lamentável”. Segundo a legenda, o posicionamento do empresário “não representa o Partido Novo e vai contra tudo o que sempre defendemos”.

“A triste declaração constrange a instituição, que se mantém coerente com seus princípios e valores e reforça que Amoêdo não faz mais parte do corpo diretivo do partido desde março de 2020”, diz o texto assinado pelo presidente nacional do Novo, Eduardo Ribeiro.

Luiz Felipe D’Ávila, candidato do Novo ao Planalto nas eleições deste ano, também foi às redes sociais para criticar Amoêdo e defender sua saída da legenda. Para D’Ávila, apoiar o candidato petista “é uma traição aos valores liberais, ao Partido Novo e a todas as pessoas que criaram um partido para livrar o Brasil do lulopetismo que tantos males causou ao Brasil”. “Amoêdo: pega o boné e vai embora. Você não representa os valores liberais”, escreveu o cientista político.

O deputado federal reeleito Marcel van Hattem (Novo-RS), uma das principais lideranças da sigla, também pediu que Amoêdo deixe o partido – se não por vontade própria, por decisão da legenda. “Declarar voto em Lula, ex-presidiário que ataca todos os valores liberais e conservadores, confirma quão longe Amoêdo está dos meus valores e do Partido Novo. Se ainda lhe falta dignidade para se desfiliar, que seja expulso”, escreveu o parlamentar em sua conta no Twitter.

Em meio a uma série de críticas, Amoêdo rebateu, também por meio das redes sociais, e acusou a direção do Novo de utilizar “meios oficiais para atacar a liberdade de expressão e política de um filiado”. “Ao responder o questionamento acerca do meu voto em segundo turno, apenas exerci um direito que me é conferido pela nossa Constituição”, afirmou.

No segundo turno das eleições presidenciais, o Novo optou pela neutralidade na disputa entre Lula e Bolsonaro e liberou, em tese, seus filiados a votarem “de acordo com sua consciência”. Entretanto, em nota, o partido fez uma sinalização a Bolsonaro, ao dizer que é “totalmente contrário ao PT e ao lulismo”.

O encolhimento do Novo

Nas eleições de 2018, João Amoêdo foi o quinto candidato mais votado no primeiro turno, com quase 2,7 milhões de votos em todo o país (2,5% dos votos válidos). Ele terminou à frente de nomes como o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (1,2%) e a ex-ministra do Meio Ambiente e ex-senadora Marina Silva (1%).

Quatro anos depois, o Novo foi um dos seis partidos que não conseguiram cumprir a chamada cláusula de barreira. A agremiação elegeu apenas três deputados federais – a bancada atual tem oito parlamentares. Nas Assembleias Legislativas, foram apenas cinco deputados estaduais eleitos, sete a menos do que em 2018 (12).

De acordo com a cláusula que vigorou nas eleições deste ano, as legendas teriam de obter ao menos 2% dos votos válidos nacionais para a Câmara dos Deputados, distribuídos em pelo menos nove estados e no Distrito Federal (com mínimo de 1% dos votos válidos em cada um), ou eleger 11 deputados federais em um terço dos estados brasileiros.

Fundado em 2011 e registrado oficialmente em 2015, o Novo é o único partido do país que abre mão das verbas públicas destinadas às legendas, como os fundos partidário e eleitoral. Nos bastidores, a direção da sigla vem discutindo a possibilidade de fusão com o Partido Liberal (PL), atual legenda de Bolsonaro, mas até agora as conversas não prosperaram.

Maior liderança nacional do Novo atualmente e cotado para disputar o Planalto em 2026, o governador reeleito de Minas Gerais, Romeu Zema, admitiu em entrevista recente à Folha de S.Paulo que a fusão vem sendo analisada. “Como não tivemos nenhum grande puxador de votos, nossa bancada se reduziu. Mas o partido tem plena ciência disso, está atento e deve fazer alguma fusão com outro partido para poder não perder algumas prerrogativas que a cláusula de barreira estipula”, disse.

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Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”