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SÃO PAULO – Desde que o presidente Michel Temer anunciou a inédita intervenção federal na segurança pública do estado do Rio de Janeiro e deslocou a agenda do governo do ajuste fiscal, na imagem de uma proposta de reforma previdenciária que naufragava, para a tentativa do combate à violência, cresceram as especulações sobre as pretensões eleitorais do emedebista.
Recordista em impopularidade, o presidente tem tentado recuperar uma imagem um pouco mais favorável, o que despertou suspeitas em torno de uma possível candidatura à reeleição. Nos bastidores, Temer já disse diversas vezes que gostaria de um candidato à presidência que defenda o legado de seu governo. Com o cenário eleitoral ainda aberto e sem um nome governista que empolgue nas pesquisas, tudo ainda é possível, inclusive que este representante seja o próprio Michel Temer.
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Para muitos, a ação no Rio de Janeiro funcionou como uma espécie de “cortina de fumaça”, para manter o governo vivo mesmo em meio à incapacidade de aprovar sua principal agenda para o ano. Sem a reforma da Previdência, muitos analistas já comparavam o atual presidente ao seu correligionário José Sarney, cujo fim do mandato no Palácio do Planalto foi marcado por uma melancólica perda de capital político. Como o próprio emedebista afirmou recentemente, a decisão da intervenção foi uma jogada “de mestre”.
Na avaliação do pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Daniel Cerqueira, especialista em segurança pública, a iniciativa do governo foi de grande inteligência política, sobretudo quando se considera o combate à violência como uma das principais pautas da agenda eleitoral. Contudo, embora tenha servido para ofuscar uma derrota na reforma da Previdência, ele não acredita que a intervenção, caso foque em policiamento ostensivo e menos em inteligência, não surtirá os efeitos desejados a médio e longo prazos, o que também reduziria o potencial de recuperação da imagem de Temer junto ao eleitorado.
Ainda há muitas dúvidas sobre os reais efeitos das ações no Rio de Janeiro sobre a imagem do atual presidente. Ainda que haja uma recuperação expressiva, esta não seria a única condicionante para viabilizar sua candidatura a um segundo mandato à frente do Palácio do Planalto.
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“Há uma ambição de materializar um processo presidencial. Em sistemas presidencialistas, é um ponto fora da curva a não tentativa de reeleição. É um movimento razoavelmente natural. Há, inclusive, uma ambição por conta de incentivos como a manutenção do foro privilegiado. Mas é uma engenharia ainda muito complexa”, observou o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.
Para o especialista, a intervenção dá tempo ao presidente na tentativa de firmar sua candidatura. “Com a intervenção federal, o governo conseguiu ganhar alguns meses para tentar reverter avaliações negativas. A economia não foi suficiente para gerar algum dividendo eleitoral. [A segurança pública] É uma agenda mais positiva que a fiscal”, explicou. “Ainda assim, a engenharia ainda é muito complexa, diante de uma rejeição em patamar bastante significativa. Entramos no limite de um lame duck (pato manco)”.
Juntamente com a baixíssima popularidade, o presidente ainda teria que ganhar musculatura e costurar as alianças necessárias entre partidos que hoje integram a base aliada. A demonstração de força de sua candidatura está diretamente relacionada ao seu potencial de conquistar apoio. O risco de fragmentação da centro-direita é mais um fator a ameaçar a competitividade de Temer. Mesmo assim, com um cenário tão incerto, cabe a ressalva de que ainda há muito jogo pela frente.
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“Após trocar a reforma da Previdência pela intervenção verde-oliva na segurança pública do Rio de Janeiro, Temer entrou para valer na corrida presidencial. Colocou um pé firme na corrida manejando com senso de oportunidade e profissionalismo político – como lembrou Moreira Franco nesta semana, Temer e sua turma não são amadores – o instrumento mais poderoso de quem detém o poder e controla a máquina do Estado: a capacidade de definir a agenda política, ou no mínimo de manipulá-la, com vistas a viabilizar interesses eleitorais ou de governo”, observou Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores.
Apesar das indicações, o emedebista tem negado a possibilidade de participar diretamente do pleito. “Não sou candidato. Não serei candidato”, afirmou em entrevista concedida à Rádio Bandeirantes. Na ocasião, contudo, ele ponderou: “as circunstâncias é que ditam a conduta”, o que deixou uma fresta da janela aberta para a possibilidade de surpresas em outubro. Contudo, mesmo que a candidatura não vingue, os esforços de Temer para recuperar sua imagem têm impactos importantes do ponto de vista eleitoral.
O deslocamento da agenda governista impôs mudanças no tabuleiro do jogo pela sucessão de Temer. Com a intervenção federal, o emedebista assume posição mais assertiva em terreno mais interessante em um ano eleitoral, o que pode lhe render dividendos políticos. O presidente percebeu que só os sinais de recuperação econômica não são suficientes para uma recuperação mais expressiva de popularidade.
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Por mais que os efeitos da medida ainda sejam incertos e muitos riscos colaterais estejam no radar, é possível imaginar um aumento no poder de influência de Temer sobre o processo eleitoral que se aproxima, elevando a relevância do apoio do MDB na corrida, tendo em vista a potencial redução de desvantagens de associação a um nome tão impopular e a manutenção de vantagens como estrutura partidária, capilaridade, tempo de televisão e a própria máquina pública federal.
As movimentações de Temer afetam as estratégias de 5 dos principais candidatos à presidência. No caso de nomes governistas, contudo, as mudanças podem ser ainda maiores. Ao buscar uma melhora de imagem e mostrar ainda poder de determinar a agenda legislativa, embora a pauta da segurança pública já estivesse acordada (em outros termos, é verdade) entre as lideranças do parlamento desde o ano passado, o emedebista pode ampliar sua capacidade de influenciar na disputa por sua sucessão.
Candidato ou não, Temer terá grande poder de influenciar no processo eleitoral. Como bem observou o analista político Richard Back, da XP Investimentos, em entrevista publicada por este portal em janeiro, o emedebista será o “posto Ipiranga” da política em 2018. “Muita gente vai evitar aparecer com Temer, mas todo mundo tem que passar por ele em algum momento”, afirmou o especialista na ocasião.
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Avaliação similar têm os analistas da consultoria Pulso Público. “Caso seja bem sucedida eleitoralmente, a intervenção no Rio de Janeiro não deverá sozinha catapultar um candidato do Governo ao 2º turno, mas pode melhor a posição do MDB e das forças governistas na negociação de coligações – até mesmo para a presidência”, concluíram.