Fernando Henrique Cardoso: o sociólogo que virou presidente do Brasil com o Plano Real

Sucesso no controle da inflação tornou FHC líder do Executivo durante dois mandatos seguidos

Nome completo:Fernando Henrique Cardoso
Data de nascimento:18 de junho de 1931
Local de nascimento:Rio de Janeiro
Formação:Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP)
Vida pública:Senador por São Paulo nos anos 80, líder do PMDB no Senado, participante da Constituinte, ministro das Relações Exteriores e da Fazenda no governo Itamar Franco, Presidente da República de 1994 a 2002.

Elevado déficit fiscal, hiperinflação e planos econômicos fracassados formavam o cenário da pós-redemocratização do Brasil nos anos de 1980. Somadas à frágil situação política, acusações de corrupção derrubaram Fernando Collor de Mello em outubro de 1992, quando então seu vice, Itamar Franco, assumiu a Presidência da República.

Consciente da gravidade dos problemas que herdara, Itamar tinha pressa. Precisava urgentemente de um plano que, além de controlar a inflação, trouxesse estabilidade econômica de forma sustentável. Para isso, o primeiro passo foi chamar Fernando Henrique Cardoso, então ministro das Relações Exteriores, para liderar o Ministério da Fazenda.

(Foto: Divulgação/Gabriela Bil)

A missão parecia impossível. O novo ministro tinha pouco tempo para recrutar sua equipe e apresentar a solução para a inflação, algo que os governos anteriores tinham tentado por cinco vezes no período de 8 anos, de 1986 a 1994. Em meio à pressão de Itamar, Fernando Henrique conseguiu negociar duas condições para o seu trabalho: carta branca para formar e conduzir seu time (o que foi parcialmente cumprido) e não congelar preços, como fizeram planos econômicos anteriores.

Entre tropeços, pausas e adaptações na estratégia, o Plano Real cumpriu com o seu propósito. A popularidade das medidas econômicas não só deram a FHC o mérito do plano – ofuscando Itamar – como também o levaram à Presidência da República por duas vezes, sendo a primeira delas em uma eleição vencida no primeiro turno, com 53% dos votos.

Esta publicação faz parte da série 30 anos do Plano Real: Passado, presente e futuro da moeda que mudou o país, especial do InfoMoney com reportagens, entrevistas, vídeos e artigos sobre a trajetória da moeda brasileira de sua criação aos dias de hoje.

Quem é Fernando Henrique Cardoso?

Nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 18 de junho de 1931, Fernando Henrique Cardoso é filho de Leônidas Fernandes Cardoso e Naíde Silva Cardoso. 

Seu pai vinha de uma tradicional família de militares, e também seguiu a carreira. Isso fez com que a família mudasse para a cidade de São Paulo quando Fernando Henrique tinha 10 anos de idade. 

Em São Paulo, FHC cursou Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP), tendo seguido carreira acadêmica assim que se formou, em 1952. Na faculdade, conheceu sua esposa, a antropóloga Ruth Vilaça Correia Leite, com quem se casou em 1953. Juntos, tiveram três filhos: Paulo Henrique Cardoso, Beatriz Cardoso e Luciana Cardoso.

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Em 1961, Fernando Henrique concluiu o doutorado em Ciências Sociais, com a tese “Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional”. No início de sua carreira acadêmica, era bastante próximo de movimentos estudantis, e isso o fez ir para o exílio logo depois do golpe que deu início à ditadura militar no Brasil. Primeiramente, foi para o Chile, e depois para a França, onde fez uma especialização na Universidade de Paris.

Em 1968, FHC retornou ao Brasil, mas, com o Ato Institucional n.° 5 (AI-5), foi precocemente aposentado como professor da USP e, com isso, começou a lecionar em algumas universidades estrangeiras, nas quais desenvolveu diversos estudos sociais premiados. 

Junto com outros intelectuais brasileiros, participou da fundação do CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), entidade que tinha o propósito de analisar a realidade socioeconômica brasileira.

O início na política

Fernando Henrique Cardoso começou a carreira política em 1970, no Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Pela sigla, candidatou-se a senador pelo estado de São Paulo, tendo ficado em segundo lugar, atrás de Franco Montoro. Em 1982, com a eleição de Montoro para o governo de São Paulo, FHC assumiu a vaga de senador e, logo em seguida, começou a participar do movimento pelas Diretas Já.

Em 1985, perdeu as eleições para a prefeitura de São Paulo. Um ano depois, foi reeleito senador do estado, com mais de 6 milhões de votos, agora sob a nova legenda – PMDB. Fernando Henrique tornou-se líder do PMDB no Senado, e teve participação ativa na Constituinte, que resultou na Constituição Federal de 1988 – a primeira depois do término da ditadura militar.

Crédito: Reprodução

Durante a Constituinte, viria a surgir o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), fruto de um racha do PMDB. Na ocasião, Fernando Henrique filiou-se ao novo partido, no qual permanece até hoje.

Quando as denúncias de corrupção contra Fernando Collor de Mello motivaram a abertura do impeachment, FHC e o vice Itamar Franco se aproximaram, com o objetivo de trabalhar em uma nova agenda para o Brasil. No governo de Itamar Franco, foi ministro das Relações Exteriores entre 1992 e 1993, para, posteriormente, assumir o Ministério da Fazenda, em maio de 1993. Comandou a pasta até abril de 1994, quando se afastou para trabalhar na campanha à Presidência da República. 

O Plano Real e a eleição de FHC

Boa parte do sucesso inicial do Plano Real foi atribuída à sua forma de implementação. Diferentemente dos planos de estabilização anteriores, impostos da noite para o dia e que contemplavam congelamentos de preços, as novas medidas econômicas contemplaram  três fases: a do ajuste fiscal, a da URV (indexador de conversão dos preços) e a efetiva implementação do Real, moeda brasileira vigente desde então.

“Ao invés de você acordar um dia e ler no jornal que tem uma nova moeda, nós explicamos antecipadamente o que iria acontecer. Isso fez a população sentir que, dali para frente, as coisas mudariam e seriam mais estáveis”, disse FHC anos depois, em documentário sobre o Plano Real.

Fernando Henrique Cardoso (PSDB) governou o Brasil entre 1995 e 2002 (Foto: Reprodução/Fundação FHC)

As medidas de estabilização econômica conseguiram de fato acabar com a hiperinflação, que assolava o Brasil desde os anos 80. Para manter os preços sob controle, o governo de FHC promoveu a abertura econômica brasileira, reduzindo tarifas de importação para fomentar as compras internacionais.

Por outro lado, a âncora cambial foi enfraquecendo a indústria nacional, que não tinha condições de competir com produtos estrangeiros mais baratos. Aos poucos, o que se viu foram exportações caindo enquanto as importações aumentaram a taxas exponenciais.

Para o economista Paulo Gala, embora o Plano Real tenha controlado os preços, não conseguiu colocar o Brasil em uma rota de crescimento sustentado. Com o passar do tempo, o governo precisou gastar um grande volume de reservas cambiais para honrar a paridade entre real e dólar, mesmo com a Selic tendo chegado a 45%.

Tudo isso levou o governo a abandonar a política cambial já nos primeiros dias do segundo mandato de FHC. Em janeiro de 1999, depois de uma maxidesvalorização do real, o Banco Central adotou o câmbio flutuante, o que ajudou a retomar as exportações e reduzir a Selic.

Lula e Fernando Henrique Cardoso, durante encontro em 2022; tucano declarou apoio ao petista no segundo turno das eleições presidenciais (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Além de crises internacionais, FHC viria a enfrentar uma crise energética no Brasil – o famoso “apagão”, ocorrido entre junho de 2001 e março de 2002. O fato desgastou muito o governo, que vinha sendo alertado há tempos por autoridades sobre a necessidade de obras de infraestrutura para lidar com a falta de chuvas prevista para determinadas regiões. 

Às vésperas do pleito presidencial de 2002, a imagem de FHC estava bastante enfraquecida pela crise. Como resultado, o seu partido não seguiu para a reeleição, e Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), conquistou o seu primeiro mandato para a Presidência da República.