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Treasuries dos EUA têm maior alta em 42 anos: por que cenário alia temor de crise com oportunidade

Spread de títulos curtos em relação aos de dez anos é o maior desde 1981 — e analistas seguem esperando mais altas de juros para conter inflação

Monique Lima

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A diferença (spread) entre as taxas dos títulos do Tesouro norte-americano de dois e dez anos atingiu o maior nível desde 1981 na última segunda-feira (03). O spread chegou a 125 pontos-base, uma inversão mais profunda do que em março (108,30 pontos-base), quando houve a crise bancária regional dos Estados Unidos.

No fechamento, o rendimento do Tesouro dos EUA de dois anos estava em 4,625%, enquanto as taxas do título de dez anos estavam em 3,375%. Entretanto, os títulos de quase um ano apresentavam os maiores juros: de 5,454% para o vencimento em 30 de abril de 2024.

Segundo analistas, os juros pagos nos títulos curtos acompanham os movimentos do Federal Reserve (banco central dos EUA) e o momento é de precificação de taxas altas por mais tempo. Os últimos indicadores econômicos mostram que o mercado de trabalho ainda tem força, assim como o consumo das famílias e alguns setores, como o imobiliário.

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Na semana passada, a divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos no primeiro trimestre surpreendeu o mercado. Os números vieram maiores do que o esperado, com revisão de 1,3% na taxa anualizada para 2,0%.

Em resposta à economia resiliente, as taxas das Treasuries subiram ao longo de toda a curva de vencimentos. “O rendimento dos títulos de dois anos está cerca de 1,1 ponto percentual acima de seu ponto mais baixo em maio e o mercado já precifica mais de 80% de chances de uma nova alta de juros pelo Fed em julho devido à economia aquecida”, diz relatório da XP Investimentos.

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Em abril, os mercados futuros mostravam que os investidores esperavam alguns cortes nas taxas antes do final de 2023, devido à crise bancária que forçaria o Fed a segurar uma economia em declínio. Agora, no entanto, os investidores estão apostando que a taxa terminará o ano acima do nível atual de 5% a 5,25%.

Segundo o FedWatch do CME Group, em dezembro, 52,5% dos investidores esperam que as taxas fechem na faixa de 5,25% a 5,50% – apenas um aumento de 0,25% no segundo semestre. Entretanto, 26,7% dos investidores apostam que a faixa de juros chegue ao nível entre 5,50% e 5,75% – resultado de dois aumentos de 0,25%.

Recessão vem aí?

A expectativa por juros mais altos acompanha a resiliência da inflação no país. Embora a margem do PCE (principal indicador de inflação acompanhado pelo Fed) tenha arrefecido dos 5% observados no início do ano para 3,8% em maio, o núcleo desde janeiro oscila entre 4,7% e 4,6%.

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“Uma parte da economia, ligada a bens e manufatura, desacelerou. Mas o setor de serviços continua forte e está impulsionando o mercado de trabalho. Essa parte da inflação vai continuar incomodando e segurando a economia americana por algum tempo”, diz Luiz Eduardo Portella, gestor de juros e renda fixa na Novus.

Segundo ele, o Fed vai precisar aumentar os juros para segurar essa ponta. O gestor acredita na possibilidade dos juros próximos a 6% no fim de 2023. “Não se encontra na história dos EUA uma queda da inflação para o nível de 2% sem aumento de desemprego e declínio da economia. A recessão não veio até agora, mas em algum momento virá”, diz Portella.

Essa possível recessão está sendo precificada nos títulos de curto prazo do Tesouro americano. Os rendimentos de dois anos estão desde julho de 2022 acima dos rendimentos de dez anos, uma inversão de curva que normalmente precede uma recessão, segundo analistas.

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Alerta com renda variável

Embora o momento seja de incerteza sobre a economia dos Estados Unidos, uma coisa é certa: os títulos do Tesouro americano não pagam taxas tão atrativas há pelo menos 15 anos. A renda fixa, que não costuma ser o carro-chefe dos investimentos no país, está sugando investimentos no país.

“Estamos falando da economia mais segura em termos de risco de crédito do mundo. Quanto os títulos pagam taxas muito elevadas lá, fica menos atrativo arriscar em outros países”, diz Camilla Dolle, head de renda fixa da XP. “Se você consegue ganhar rendimentos altos num país de economia extremamente forte, o fluxo corre para lá.”

No último mês, o presidente Joe Biden conseguiu aprovar no Congresso o aumento do teto da dívida dos Estados Unidos. Com isso, o Tesouro americano terá que fazer uma série de emissões de títulos públicos para captar recursos e restabelecer seu caixa, que foi esvaziado enquanto os parlamentares não chegavam a um consenso sobre a dívida.

Segundo comunicado do Tesouro, as novas emissões começaram em junho. A expectativa era aumentar o caixa de US$ 70 bilhões para US$ 425 bilhões somente neste primeiro mês. Até setembro, as emissões devem restabelecer o valor histórico de US$ 600 bilhões do caixa americano.

Até o momento, as Bolsas estão surpreendendo com os fortes fluxos. O S&P 500 subiu 15,7% no acumulado do ano. Em partes por causa do ânimo com as ações atreladas a inteligência artificial, mas também por causa da atividade econômica que segue forte no país. No entanto, o cenário pode virar.

“Os últimos meses foram de rali, mas isso deve mudar com a nova leva de títulos. As taxas estão muito atrativas e os juros ainda vão subir mais. O custo de capital vai ficar muito caro para a maior parte das empresas e a expectativa de rentabilidade vai diminuir. É uma questão de tempo”, diz Vyctor Tavares, sócio e head da Valor Internacional.

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Oportunidade para renda em dólar

Segundo analistas, apesar de ameaçarem a renda variável, os altos spreads dos treasuries dão a investidores uma grande oportunidade na renda fixa norte-americana.

Rodrigo Jolig, co-CEO e diretor de investimentos na Alphatree Capital, vê o cenário como particularmente atrativo para os brasileiros, que estão acostumados a investir em renda fixa. “A expectativa é de corte na taxa de juros do Brasil no segundo semestre. Isso vai diminuir o diferencial de juros e o investimento em dólar fica ainda melhor”, diz.

A maior parte dos títulos emitidos são as T-Bills, os títulos de curto prazo dos EUA. Para Jolig, neste momento, as opções de curto prazo são as ideais. “Os títulos longos apresentam muito risco neste momento e estão remunerando pior. O curto prazo acompanha as taxas do Fed agora e vão acompanhar quando tiver novos aumentos dos juros”, diz o diretor.

As Treasuries-notes, de dois anos a cinco anos, têm taxas que variam dentro da faixa de 4%, enquanto as Treasuries-bills, de até um ano, apresentam juros na faixa dos 5%. Dolle, head da XP, afirma que é importante escolher um investimento que seja possível carregar até o vencimento, para garantir a taxa contratada.

“Esses títulos americanos são na grande maioria pré-fixados e mais sensíveis à marcação a mercado”, diz. Com a possibilidade de aumento dos juros, os preços dos títulos já emitidos tendem a cair. “É importante estar confortável com a taxa escolhida para o investidor ficar com aquele título até o final.”

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