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SÃO PAULO – No ano passado, a renda da população 1% mais rica do país foi 33,7 vezes maior que a da metade mais pobre, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
Isso significa que a parcela de 1% dos trabalhadores com a maior renda arrecadou R$ 28,6 mil por mês, em média, enquanto os 50% menos favorecidos ganharam R$ 850.
Em um país ainda tão desigual, já é possível, aos investidores de alto poderio financeiro, aliar rentabilidade e, ao mesmo tempo, contribuir para uma sociedade um pouco mais justa.
Gestoras como Vox Capital e Mov Investimentos têm na prateleira Fundos de Investimento em Participações (FIPs) que apostam em empresas ainda em estágio inicial, cujo negócio gere um impacto social positivo direto à sociedade.
Apesar dos nobres objetivos, a ideia não é abrir mão do retorno financeiro, que pode começar a partir dos dois dígitos, embora seja importante ter em mente que a dispersão é bastante alta, já que as empresas no radar dos gestores estão dando os primeiros passos e podem ter sucesso estrondoso, ou não entregar exatamente o que se esperava delas.
Entre as companhias nas carteiras dessas gestoras, estão negócios de naturezas das mais distintas, como a Magnamed, especializada na produção de ventiladores pulmonares para UTIs, ou a Terra Nova, que atua no apoio à regularização fundiária de áreas urbanas.
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Com o amadurecimento e os resultados preliminares – e destacados – dos primeiros fundos de impacto do mercado local, surgidos em meados da década passada, as gestoras se preparam agora para iniciar novas captações.
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Outras iniciativas também têm surgido, como da Positive Ventures e também da Empírica, que fechou uma parceria para unir sua experiência na análise de risco de crédito com a da Vox em negócios de impacto.
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Esses fundos, contudo, não costumam ser para qualquer um. Os FIPs são destinados apenas aos investidores profissionais, com pelo menos R$ 10 milhões em aplicações financeiras.
Por ser classificado como um multimercado, o fundo da Empírica com a Vox é um pouco mais acessível, destinado ao investidor qualificado, com R$ 1 milhão em aplicações.
As maiores limitações de acesso aos produtos acompanham o maior nível de risco embutido, já que os fundos abrangem empresas que ainda não estão consolidadas e tampouco permitem a saída de recursos a qualquer momento. Pelo contrário.
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O produto de maior liquidez é o fundo Empírica Vox Impacto, com prazo de resgate D+120 e meta de retorno de 2% ao ano, além do CDI.
Os FIPs, por sua vez, têm prazos de dez anos, que abarcam os períodos de prospecção dos negócios, aporte, desenvolvimento da operação e venda.
Em geral, as companhias no radar dos fundos de impacto faturam ao redor de R$ 10 milhões por ano. Pelo tamanho, os veículos são classificados como de venture capital. Os FIPs abarcam também a modalidade chamada de private equity, que foca em empresas já mais consolidadas.
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Confira a seguir os fundos de impacto brasileiro e seu retorno histórico em comparação ao CDI.
Vale ter em mente que os resultados ainda podem sofrer alterações, já que, no momento, se baseiam em laudos de avaliação de auditorias e serão consolidados somente com a efetiva venda de todos os ativos, no encerramento dos fundos. Só então o investidor saberá de fato quanto vai receber de volta em relação aos valores aportados.
Sucessos e erros no caminho
Pelo alto potencial dos negócios, em alguns casos, ao longo do processo de amadurecimento dentro do fundo, a operação ganha uma proporção acima do previsto, diz Daniel Izzo, cofundador e CEO da Vox Capital.
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Ele cita como um dos exemplos de maior sucesso na carteira a Magnamed, que recebeu investimentos do primeiro fundo da gestora, em 2015.
O faturamento projetado para 2020, inflado pela pandemia, deve aumentar em mais de dez vezes em relação aos anos anteriores e beirar os R$ 350 milhões, prevê Izzo.
Os dois primeiros fundos de participações da Vox foram lançados em 2012 e 2016, com dez anos de prazo cada. O primeiro acumula valorização de 52% desde seu início, até 12 de novembro, contra quase 100% do CDI, dado os juros altos do período. O segundo fundo sobe 97%, contra 32,6% do CDI no intervalo, segundo dados da Economatica.
O terceiro fundo de participações da Vox foi protocolado há poucas semanas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas a gestora não pode comentar a respeito do novo produto por questões regulatórias.
“Investimos em startups que usam a tecnologia para entregar soluções nas áreas da saúde, educação e serviços financeiros”, resume o CEO.
A Celcoin, que permite que estabelecimentos comerciais em pequenas cidades no interior do Brasil atuem como correspondentes bancários, também foi apontada pelo executivo como um dos casos de maior sucesso no portfólio.
“Não investimentos em produtos para pobres, mas em produtos de qualidade que resolvem problemas que acabam sendo mais presentes na população de baixa renda.”
O primeiro fundo da gestora, que vence em 2022, já está em fase de venda das empresas no portfólio, sendo uma das desinvestidas a TEM Saúde.
A empresa cobra uma mensalidade, e, por sua escala, consegue negociar com hospitais e clínicas para oferecer aos usuários o agendamento de consultas e exames com preços mais acessíveis do que no balcão. A empresa foi vendida para o grupo segurador Generali.
No caso do segundo desinvestimento, da incorporadora Bille, Izzo diz que ganhou dinheiro, mas não considera o caso bem-sucedido. “Não gostamos do impacto social gerado.”
A empresa nasceu com a proposta de construir moradias populares no âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida. No entanto, em muitas situações, os empreendimentos eram afastados dos grandes centros, com pouca oferta de serviços públicos de qualidade, afirma o CEO da Vox.
Questão ambiental em alta
Na Mov, o primeiro FIP, lançado em novembro de 2015, investiu em sete empresas dos setores de educação, meio ambiente e “cidades resilientes”.
Esse último, explica Paulo Bellotti, cofundador e diretor executivo da gestora, se refere a empresas como a Terra Nova, especializada em mediação de conflitos para regularização fundiária em áreas urbanas ocupadas irregularmente, ou a Órigo Energia, que se propõe a popularizar o uso da energia solar em pequenos comércios.
“Se o Brasil tiver cidades mais resilientes, com educação de qualidade e uso inteligente do patrimônio natural, nos tornamos um país muito diferente”, diz Bellotti.
Desde o início, o fundo da Mov sobe 34,5%, segundo dados da Economatica até 12 de novembro. contra 40,2% do CDI.
Os primeiros desinvestimentos do fundo, que vence em 2025, devem começar a ser avaliados com mais afinco a partir do ano que vem. “Ainda precisamos amadurecer um pouco mais os negócios para conseguir boas saídas”, diz Bellotti.
Para o segundo fundo que deve ser lançado nos próximos meses, a questão ambiental é um tema que deve ganhar espaço na carteira, diz o fundador da Mov, que cita, como exemplo, iniciativas que contribuam na preservação do bioma brasileiro, como a agricultura regenerativa.
A gestora avalia se fará uma oferta para o público profissional ou para o qualificado, e também qual será o valor do tíquete mínimo, que foi de R$ 1 milhão no primeiro FIP.
Sem apego emocional
Negócios que buscam aprimorar a mão de obra em larga escala no país com vistas a um ganho salarial maior no futuro também estão no foco da Mov, e da Positive Ventures.
Uma das investidas do FIP Positive Ventures Impact Tech I é a Slang, projeto que nasceu no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos EUA, e se propõe a formatar cursos de inglês sob demanda para categorias de profissionais de áreas diversas, diz Andrea Oliveira, CEO da Positive Ventures.
Lançado em novembro do ano passado, o fundo tem como meta de retorno 20% ao ano. O portfólio da gestora já conta com seis empresas, como a Labi Exames, que oferece diagnósticos com valores mais acessíveis, a Letrus, que faz uso de ferramentas de inteligência artificial para combater o analfabetismo funcional, ou o banco digital Good Money.
“Um ponto importante que aprendemos ao longo da nossa trajetória é o de não nos apaixonarmos pelas causas. Conhecemos empreendedores muito sonhadores, jovens com ideias brilhantes, mas, se não tiver capacidade de execução, não adianta”, afirma Andrea.
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A experiência prévia dos empreendedores no ramo também é um ponto essencial para a chance de o negócio dar certo, acrescenta a especialista. Marcelo Barboza, ex-presidente da Dasa, é o executivo à frente da Labi, exemplifica.
“No passado, os investidores aportavam o capital em negócios tradicionais e faziam filantropia para alinhar os valores pessoais. Nos últimos anos, temos notado uma mudança de mentalidade, com a incorporação dos valores em todas as esferas”, diz Bruna Constantino, Chief Impact Officer da Positive Ventures.
Crédito de impacto
Especializada em fundos de direitos creditórios, a Empírica Investimentos lançou em fevereiro do ano passado o Empírica Vox Impacto FIC FIM CP.
O veículo compra cotas de FIDCs geridos pela Empírica, que passam pelo crivo da gestora no que tange ao risco de crédito, e pelo filtro de impacto social da Vox.
“Por meio da estrutura de FIDCs, o fundo fomenta empréstimos para microempreendedores que estejam gerando impacto positivo na base da pirâmide”, afirma Leonardo Calixto, CEO e responsável pela área de gestão da Empírica.
Atualmente o veículo tem cinco FIDCs no portfólio, que viabilizam empréstimos para empresas como a CredPopular, que oferece crédito para pequenos comerciantes que atuam na feira da madrugada no Brás, em São Paulo, ou a Empresta Capital, que atua com microcrédito consignado junto a funcionários de condomínios, como síndicos e porteiros.
“Quanto mais impacto o negócio proporciona, mais chance tem de ter um percentual maior na carteira do fundo, desde que tenha uma relação risco retorno que também seja boa”, explica Calixto.
Em 12 meses, até 12 de novembro, o fundo da Empírica sobe 3,6%, contra 3,1% do CDI. O objetivo de retorno no longo prazo é de 2% ao ano, além da variação do CDI.
O produto é para investidores qualificados e tem liquidez em D+90, com aplicação inicial de R$ 25 mil, que nas próximas semanas deve cair para R$ 5 mil, diz o CEO da Empírica.
Mudança geracional
Segundo Calixto, a ideia de estruturar o produto surgiu de uma “provocação” durante uma conversa com a gestora de patrimônio Wright Capital, que fez a ponte com a Vox e acabou sendo a primeira cotista do fundo.
Com aproximadamente R$ 4 bilhões sob gestão, a Wright Capital estruturou em 2016 um fundo exclusivo que compra cotas de fundos de impacto, como dos FIPs da Mov, da Vox e da Positive Ventures, além do fundo de crédito Empírica/Vox.
Aos clientes de alto patrimônio, a gestora sugere a alocação de 1% dos recursos no fundo de impacto, conta Fernando Camargo, sócia-fundadora da Wright. Desde seu início, o fundo acumula valorização de aproximadamente 50%, ante 40% do CDI.
Segundo a executiva, conforme a riqueza começa a mudar de mãos entre as gerações, a preocupação com o aspecto social relacionado ao investimento no mercado financeiro tem aumentado.
“Os millennials [nascidos a partir da década de 1980] fazem perguntas que as gerações passadas não faziam”, diz Fernanda.
Se antes a preservação e a rentabilidade do patrimônio eram os dois temas centrais nas conversas, hoje, entender como esse ganho foi gerado e qual seu impacto para a sociedade no futuro é uma camada adicional que tem gradativamente ganhado espaço nas reuniões, afirma a sócia da gestora. “Em um país como o nosso, as oportunidades para os investimentos de impacto são imensas.”
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