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Se 2022 foi o ano em que grandes economias voltaram a encarar a inflação e a necessidade de subida dos juros, o ano que acaba de começar deve ser marcado por taxas ainda em níveis não vistos há muito tempo, recessão em alguns países e volatilidade nos mercados.
Com a Selic em 13,75% e a piora das expectativas de inflação para os próximos anos, a resposta para se preparar para cenários de maior incerteza passa por reservar uma parte considerável da alocação para ativos pós-fixados atrelados à inflação, ao CDI ou à própria Selic, na avaliação de especialistas ouvidos pelo InfoMoney.
Outra aposta para navegar melhor nos períodos de oscilação está nos multimercados. O segredo, afirmam os especialistas, é mesclar posições em fundos dos tipos macro e quantitativos, além de long and short – em que o gestor monta posições comprando um ativo (long) e vendendo outro (short), para lucrar com o desempenho relativo entre eles.
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Investimentos no exterior não devem ficar de fora para perfis moderados e agressivos. Para Rodrigo Sgavioli, chefe de alocação e fundos da XP, a primeira metade de 2023 não deve ser muito construtiva para ativos de renda variável, mas produtos de renda fixa global podem se destacar.
Confira as sugestões de alocação de alguns especialistas ouvidos pelo InfoMoney para 2023:
Pós-fixados: maior parte da carteira
Em um cenário de busca pela segurança, ativos pós-fixados entram como componente importante do portfólio. Patrícia Palomo, head de investimentos da Unicred do Brasil, lembra que o mercado tem um consenso de que os juros devem se manter elevados por mais tempo, o que favorece esse tipo de posição.
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De acordo com o Relatório Focus divulgado nesta segunda-feira (2), o ponto médio das estimativas para a Selic está em 12,25% em 2023, acima dos 11,75% vistos quatro semanas antes.
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Se o investidor deseja carregar o investimento por mais tempo, a sugestão de Dan Kawa, CIO da TAG Investimentos, é mesclar títulos do Tesouro Direto e papéis privados pós-fixados. Segundo ele, atualmente há alternativas isentas de Imposto de Renda, como Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e Imobiliário (CRIs), oferecendo a taxa do CDI mais 1% a ano, uma remuneração que considera atrativa.
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Além de mesclar papéis, Arley Junior, estrategista de investimentos do Santander, acredita que o investidor deve pensar na liquidez dos produtos. CDBs (Certificados de Depósito Bancário) e fundos DI devem ser priorizados para recursos que precisam estar disponíveis para resgate a qualquer momento.
Eventualmente, diz Junior, o portfólio pode incluir também Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e Imobiliário (LCIs), que possuem carência de 90 dias para resgate.
Alocações em papéis atrelados à inflação também devem responder por boa parte da carteira dos investimentos como forma de proteção, diante de perspectivas de piora nas projeções para este e os próximos dois anos. Segundo Junior, o Santander tem preferido vencimentos em torno de 2035, no caso de títulos públicos. Já no caso de papéis privados, há títulos isentos com taxas a partir de IPCA mais 7% ao ano.
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Conforme trouxe o Focus desta semana, economistas ajustaram novamente para cima as expectativas para a inflação em 2023, 2024 e 2025 para os patamares de 5,31%, 3,65% e 3,25%, respectivamente. Cerca de um mês antes, as estimativas estavam em 5,08%, 3,50% e 3,00%, nessa ordem.
Prefixados também têm vez – mas com cautela
Ainda que não haja consenso entre agentes financeiros de que o Banco Central poderá iniciar o ciclo de cortes da Selic neste ano, prefixados não devem ficar de fora das carteiras – mas sim responder por uma parcela menor dos portfólios.
“Achamos que o balanço de riscos é menos favorável para prefixados neste momento. A incerteza não nos deixa aumentar a posição agora. À medida em que o cenário fiscal for ficando mais claro, é uma posição que pode ser melhor explorada”, avalia Patrícia, da Unicred. Nesse sentido, a alocadora acredita que o investidor também deve priorizar prazos curtos, de um a dois anos, menos suscetíveis a oscilações de mercado.
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Junior, do Santander, também acredita que alocações prefixadas podem ser bons trunfos, mas prefere posições em prazos intermediários entre 2028 e 2029. Na visão da casa, a Selic deve encerrar este ano em 12% e recuar para 9% em 2024.
O profissional defende que a curva de juros tem mostrado taxas acima de 13% ao ano para prazos longos, de sete anos. Logo, retornos a partir de 13,5% ao ano são considerados interessantes, mas não nega que o investidor precisa estar preparado para a forte volatilidade que pode afetar os títulos neste ano.
A razão está na chamada marcação a mercado. Por conta dela, a elevação das taxas tem como consequência a queda nos preços – e, portanto, a desvalorização dos papéis.
Isso ocorre porque os juros oferecidos por um título de renda fixa têm uma relação inversa com o seu valor de negociação pelos investidores. Quando as taxas sobem, seu preço tende a cair. O contrário também é verdadeiro.
Como o mercado tem sucessivamente reajustado para cima as expectativas para os juros futuros, a tendência é que os preços de papéis antigos recuem neste ano, podendo apontar retorno negativo no curto prazo. Porém, carregando o título até o vencimento, a rentabilidade pode voltar para o campo positivo.
Multimercados podem brilhar novamente com forte volatilidade
Outra classe de ativos que deve se beneficiar neste ano é a de multimercados. Tais produtos terminaram 2022 como o grande destaque entre os investimentos, ao avançar 13,31%, acima dos 12,33% do CDI, e podem manter o brilho em 2023, na visão de Junior.
A recomendação do Santander se concentra em fundos de fundos, que tendem a apresentar risco pulverizado e menor nível de volatilidade. A casa sugere ainda mesclar estratégias macro (produtos que alocam em várias classes de ativos, como Bolsa, câmbio e juros) com fundos quantitativos, que fazem a gestão da carteira a partir de algoritmos, com complexos modelos matemáticos.
Kawa, da TAG, também acredita que o investimento em multimercados com estratégias que sejam descorrelacionadas entre si é uma boa pedida para 2023. Para além de produtos do tipo macro e quantitativos, ele recomenda uma alocação em fundos do tipo total return, que costumam fazer uso de arbitragem no mercado de renda variável.
Fundos imobiliários: manter, mas não ampliar
Enquanto os multimercados devem se destacar, a maior parte das casas preferiu apenas manter a recomendação em fundos imobiliários para este ano – e não ampliá-la.
Nessa classe de ativos, Maria Fernanda Violatti, analista da XP, afirma que o cenário tende a ser mais favorável para os chamados fundos de “papel”, que investem em ativos de renda fixa ligados ao setor imobiliário.
Em relatório, a especialista ressalta que tais fundos devem manter o pagamento de dividendos em níveis atrativos neste ano, já que as projeções apontam para um cenário de juros elevados e de manutenção das pressões inflacionárias.
Ela alerta, no entanto, que o investidor precisa estar atento ao risco de crédito dos ativos que integram a carteira dos FIIs. Por essa razão, o ideal é buscar fundos do tipo high grade, ou seja, de menor risco e consequentemente, com potencial de retorno menor.
Bolsa local e externa: seletividade é o nome do jogo
Mesmo em um ano de juros elevados e menor crescimento econômico, gestores acreditam que os investidores precisam ter uma posição na Bolsa brasileira. A reabertura provocada pela flexibilização das medidas contra a covid-19 na China pode favorecer ações locais de commodities.
Na carteira recomendada de ações do Santander para este mês, há dois exemplos: Vale (VALE3) e Petrobras (PETR3). Os demais papéis estão relacionados ao setor de saúde, shoppings, bancos, elétrico e atacarejo, com apostas em empresas como Eletrobras (ELET6), Multiplan (MULT3), BTG Pactual (BPAC11), Assaí (ASAI3) e Hypera (HYPE3).
Patrícia, da Unicred, também acredita que o cenário é favorável para ações de commodities, mas prefere se manter distante de estatais como a Petrobras, já que não é possível precisar o futuro da companhia com possibilidade de ingerência política do novo governo. Segundo ela, o destaque deve estar nas chamadas junior oil.
Após a cerimônia de posse neste domingo (1), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou despacho em que determinou a retirada da Petrobras do processo de desestatização iniciado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Além disso, o novo presidente da empresa, Jean Paul Prates (PT), avisou que deve modificar a política de preços praticada pela estatal.
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Já no cenário externo, a sugestão de Patrícia é optar pela montagem de posição em renda variável via índices. “Não estamos com tanta clareza setorial. O desconto na Bolsa americana está muito grande. Preferimos alocar em um índice de setores mais tradicionais, como o S&P 500”, exemplifica.
Para a especialista, o Nasdaq – índice que possui exposição elevada ao setor de tecnologia – deve ter uma recuperação mais longa, já que depende de condições de juros favoráveis. “Se a China voltar e puxar o crescimento global, atividades mais tradicionais devem retomar primeiro”, defende Patrícia.
De olho em um cenário de recessão e de desaceleração das principais economias mundiais, a XP também prefere papéis do setor de óleo e gás na renda variável internacional. Telecomunicações e saúde completam a lista de setores preferidos, segundo relatório da corretora. Por outro lado, segmentos cíclicos, como consumo, materiais e imobiliário, devem ser evitados.
Renda fixa global também anima especialistas
A renda fixa global – e não apenas a brasileira – pode brilhar no segundo semestre. Sgavioli, da XP, defende que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) deve provocar uma recessão entre suave e mediana neste ano.
A casa também argumenta que há chance de corte na taxa de juros pelo Fed a partir do segundo semestre – mas não certeza. Nesse sentido, o profissional sugere que o investidor aumente aos poucos a alocação em títulos de empresas brasileiras e americanas, que estão oferecendo taxas entre 6% e 10% ao ano em dólar.
Outra opção é acessar a renda fixa global via fundos. Sgavioli afirma que o investidor pode ser beneficiado pela nova regulação, que permitirá que produtos voltados para o varejo possam alocar até 100% do capital no exterior.
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A sugestão do especialista é aplicar em fundos de renda fixa global com crédito na carteira e hedge cambial, que evita expor o investidor à variação do câmbio. A estratégia, porém, deve ser equilibrada com investimentos em outras classes de fundos, sem hedge cambial.
“Uma reabertura da China poderia beneficiar o real. Mas há forças contrárias. Se o cenário para o Brasil se deteriorar, o dólar pode valorizar”, observa. “Estou reequilibrando o portfólio entre fundos com e sem hedge, porque podemos ver o real depreciando em relação ao dólar”, pondera.
Para Sgavioli, o ano de 2023 deve ser lido como um período em que o investidor não deve entrar “de peito aberto”. “Ele precisa entender se este ano é o ponto de chegada, ou seja, se é quando deseja resgatar os investimentos, ou se é uma travessia para sacar o valor mais à frente”, alerta.
No primeiro caso, o ideal é manter a carteira focada em opções conservadoras, como a renda fixa pós-fixada. Já se o perfil for mais parecido com o segundo exemplo, o investidor pode tomar mais risco com alocações em ativos atrelados à inflação, pós-fixados, multimercados e um pouco de exposição global, porque possui um horizonte mais longo, diz Sgavioli.