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Texto de Guilherme Kolberg, planejador financeiro pessoal com certificação CFP®(Certified Financial Planner), concedida pelo Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros.
A bolsa de valores é algo fascinante. Todas as pessoas que hoje trabalham no mundo de investimento e planejamento financeiro que conheço, foram seduzidas, em algum momento, pelo mercado de renda variável. Ele é dinâmico, cheio de teorias e análises, aguçando sempre nosso lado mais instintivo de querer estar certo e acertar as previsões. No entanto, quando falamos em “viver da bolsa de valores” entramos em um ponto mais delicado. Meu primeiro conselho é: se quiser viver da bolsa de valores e isso o fizer feliz, viva! Porém, não sobreviva da bolsa de valores.
Se você possui um patrimônio diversificado, que o permite ter uma renda mínima de maneira garantida, você pode pegar parte desse patrimônio e do seu tempo, e investir na bolsa de valores. Isso o permitirá ter uma renda maior ou menor, dependendo dos seus erros e acertos. Se você fizer isso, está vivendo da bolsa de valores, buscando uma qualidade de vida maior através dessa atividade. Por outro lado, se você acorda diariamente e busca na bolsa uma maneira de pagar as suas contas, tome muito cuidado. E para mostrar algum dos erros mais comuns, vou contar a história de uma pessoa chamada Pedro (nome fictício), que conheci no mercado financeiro em 2007.
1º erro: Confundir disposição e capacidade de correr riscos
Pedro tinha 47 anos e trabalhou grande parte da sua vida diretamente com o mercado financeiro. Acumulou um patrimônio financeiro de aproximadamente 800 mil reais e montou em casa sua mesa de operações particular. Pedro gostava de realizar operações de curtíssimo prazo, especialmente em mercados futuros (índice e boi, mais precisamente), as quais tinha grande sucesso quando trabalhava de maneira remunerada no mercado. E o mais importante: Pedro gostava de risco. Ele era apaixonado por tomar cada vez mais riscos e se alavancar, buscando sempre operações com alta volatilidade. No entanto, no planejamento financeiro existe um conceito importante que diferencia a disposição de correr riscos e a capacidade de correr riscos.
Disposição: se refere ao apetite pessoal de Pedro por risco, isto é, se ele queria ou não correr riscos. No caso dele, essa disposição era altíssima.
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Capacidade: a capacidade tem a ver com as condições financeiras e realidade econômica do indivíduo para correr tamanho risco. Alguém jovem, sem altos custos fixos e com um emprego estável, tem alta capacidade de correr riscos, enquanto alguém desempregado, de maior idade e com uma saúde financeira questionável, tem baixa capacidade de correr riscos. Esse segundo caso era exatamente o que acontecia com Pedro.
Assim, seu primeiro grande erro foi querer assumir risco total com seu patrimônio, enquanto na verdade, ele não teria a capacidade necessária para suportar tal risco. Erro extremamente comum, especialmente entre os mais apaixonados pelos mercados de renda variável.
2º erro: Excesso de confiança
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Pedro era conhecido por criar estratégias de trade que funcionavam muito bem. Foi assim grande parte da sua vida. Ele detinha um conhecimento muito grande, tinha o feeling de mercado e confiava cegamente nos números. Em finanças comportamentais, o viés de decisão chamado de “excesso de confiança” é algo comum entre os investidores, mas no caso de Pedro, visto a sua história, era extremamente acentuado. Ele gostava de ter flexibilidade em suas decisões, deixando as ordens de stop loss muitas vezes de lado, erro grave! Pedro confiava cegamente também nas estatísticas dos seus backtests, que diziam que a maior sequência de perdas em uma determinada estratégia, havia sido de “x” vezes. Isso o levava a assumir riscos maiores, com a velha máxima de “não pode cair mais”. O ano de 2008, com o início da crise financeira, foi o “cenário perfeito” para ele colocar em prática toda a sua confiança. Resultado final: após um ano como trader, seu capital havia caído de 800 mil para 500 mil.
3º erro: não saber a hora de parar
O 2º erro levou Pedro a um 3º erro comum: ao contrário de uma empresa normal, onde quanto mais se trabalha, mais se tem sucesso, no mercado financeiro a recíproca não é necessariamente verdadeira. Quando viu seu capital diminuir, Pedro passou a “trabalhar mais”, operando maiores volumes e com mais frequência, já deixando de lado parte da sua racionalidade. Imaginem, então, o cenário: crise financeira, irracionalidade total dos investidores, intervenções por parte de órgãos governamentais em todos os mercados do mundo, e Pedro já balançado pelas fortes perdas que havia realizado em seu patrimônio total. Resultado: mais erros e outras perdas de patrimônio.
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Desfecho
A vida de Pedro como trader profissional teve um desfecho interessante. Após ver seu capital ser consumido em grande parte nos primeiros meses, Pedro criou uma consultoria em trade, realizando coach para pessoas que quisessem conhecer melhor o mercado. Seu negócio trouxe frutos, permitindo assim que ele tivesse uma renda sem depender do mercado financeiro. Ao final, Pedro conseguiu viver da bolsa de valores, sem necessariamente sobreviver dela.
Bons negócios.
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O texto reflete as opiniões do autor. O Infomoney não se responsabiliza pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.