Menor alívio no IPCA e Bitcoin fraco pintam “cenário de terror” para fundos de criptos, que perdem cotistas

Fundos de criptos perderam investidores mesmo com alta de preços no setor, indicando que cenário pode piorar com IPCA resiliente e BTC virando para queda

Paulo Barros

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O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) desacelerou em abril, mas não como o mercado esperava — em especial os gestores de fundos que alocam em ativos de risco, que não veem a hora de o Banco Central começar a cortar a Selic.

A inflação oficial do País desacelerou novamente em abril, para 0,61%, mas veio mais alta que os 0,54% projetados pelo consenso Refinitiv. O IPCA na base anual também veio acima do esperado: 4,18%, ante a expectativa de 4,10%

Criptomoedas são ativos considerados globais e que, por isso, não sofrem impacto de dados econômicos regionais para além dos registrados nos Estados Unidos. Desse modo, o IPCA não muda a perspectiva de preço dos ativos digitais em si, como acontece com o CPI (índice de preços ao consumidor, em português) americano, mas afeta diretamente o apetite dos investidores locais por ativos de risco.

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Segundo especialistas, diante dos novos dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os brasileiros ainda devem demorar para olhar de volta para ativos de risco na composição das carteiras. E mais ainda para considerar exposição a criptomoedas após um 2022 de fortes perdas que deixaram os investidores calejados.

“Esses ativos têm muita volatilidade e ainda estamos com as carteiras muito machucadas por todos os ativos de risco, como ações, fundos imobiliários, etc.”, conta Rodrigo Marcatti, sócio-fundador e CEO da Veedha Investimentos.

Perda de investidores

Os fundos de criptomoedas tiveram em abril seu pior mês de 2023, com o mais bem-sucedido avançando apenas 2,5%. Em janeiro, o melhor fundo encerrou com valorização de mais de 45% nas cotas. No entanto, mesmo nos meses de ganhos, os produtos vêm majoritariamente perdendo investidores.

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Segundo dados da Economatica, os fundos brasileiros que alocam em criptoativos tinham 126,4 mil investidores em janeiro, número que caiu para 123,4 mil em fevereiro e para 119,1 mil em março. Em abril, os cotistas já eram 118 mil.

Desse modo, é possível que nem mesmo um IPCA mais baixo que o esperado fosse suficiente para estimular o investidor brasileiro a tomar mais risco.

“Em tese, um IPCA mais baixo significa menor correção dos preços e mais dinheiro sobrando, mas a inflação do IPCA ainda está longe da inflação das ruas”, avalia Rodrigo Sgavioli, chefe de alocação e fundos da XP.

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“Mesmo em níveis atuais do IPCA, que já estão mais baixos que alguns meses atrás, todos ainda estão espantados com os preços no mercado, no restaurante, então minha percepção é que a disponibilidade no bolso do brasileiro não está em linha com o índice”, pondera.

Evolução do número de cotistas dos 20 fundos de criptomoedas com mais investidores no País em 2023:

Nome Qtde cotistas
jan 23
Qtde cotistas
fev 23
Qtde cotistas
mar 23
Qtde cotistas
abr 23
Hashdex 20 Nasdaq Crypto Ind FICFI Mult 41.667 39.987 37.674 36.369
BTG Pactual Reference Bitcoin 20 FI Mult 19.766 19.483 19.101 18.422
Empiricus Coin Cripto FI Mult 17.391 17.091 16.736 16.477
Empiricus Criptomoedas Fc FI Mult Ie 17.063 16.777 16.402 16.132
Vitreo Cripto Metals Blend FIC Mult 11.320 10.970 10.581 10.284
Warren Cripto Fc FI Mult Cred Priv 5.633 5.339 5.032 4.350
Empiricus Cripto High Beta Fc FI Mult Ie 2.984 2.953 2.900 4.313
Trend Cripto Dolar FI Mult 3.038 2.999 2.928 2.908
Hashdex 100 Nasdaq Crypto Ind FI Mult 2.781 2.787 2.787 2.828
Hashdex Ouro Bitcoin Risk Pa FICFI Mult 910 983 979 1.923
Blp Crypto 20 FI Mult 1.246 1.227 1.224 1.239
Hashdex Ethereum FI Mult 690 786 735 711
BTG Pactual Referenc Ethereum 20 FI Mult 598 576 567 560
BTG Pact Refer Bitcoin 100 Fc FI Mult Ie 571 564 539 529
Blp Crypto 100 FI Mult – Ie 169 171 173 169
BB Mult Criptoativos Full Ie LP Fc FI 146 160 162 166
Mercurius Crypto Value – FI Mult Ie 136 139 130 130
Titanium Cripto Structure FI Mult Ie 105 109 114 123
Hashdex Crypto Top P Fc FI Mult Ie 59 95 104 112
Itau Index Bitcoin Usd Fc em Acoes * * * 74

*Sem dados para o período

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Fonte: Economatica

Bitcoin perde força

O investidor brasileiro pode ter um motivo a mais para ser cauteloso com as criptomoedas, com preços possivelmente menos atrativos a partir daqui. Após forte alta de cerca de 70% nos primeiros meses do ano, analistas começam a apontar esgotamento de fôlego do Bitcoin (BTC).

Por volta das 10h45 desta sexta-feira (12), o Bitcoin acumula queda de 3,8% nas últimas 24 horas e mais de 9% na semana, a US$ 26.430. Durante a madrugada, o criptoativo chegou a encostar em US$ 26.100, o preço mais baixo em dois meses.

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O movimento seria, em parte, consequência de perda de força da narrativa em torno da criptomoeda como alternativa ao sistema financeiro tradicional. “O retorno de algum nervosismo bancário ao PacWest não foi capaz de desencadear uma forte demanda por criptos desta vez”, disse Edward Moya, analista sênior da formadora de mercado Oanda, em nota.

Além disso, com a queda, o Bitcoin aumentou sua descorrelação com a Nasdaq, porém de maneira negativa.

“É curioso observar como o BTC perdeu a correlação com o mercado acionário nos últimos dias. Enquanto a Nasdaq opera em claríssima tendência de alta, que deve fazer com que o ativo entregue ao menos mais 2% de alta nos próximos dias, o BTC já iniciou sua reversão”, avalia Fernando Pereira, gerente de conteúdo da corretora de criptomoedas Bitget. “Minha expectativa é que voltemos para US$ 25 mil em breve”.

Renda fixa ainda reina

Diante da maior fragilidade do Bitcoin e de inflação real ainda persistente, dificilmente a renda fixa perderá força nas carteiras e nas recomendações dos gestores brasileiros.

“Nosso foco tem sido aproveitar justamente o momento para comprar mais renda fixa, que ainda conta com taxa interessante, apostando em um fechamento da curva e de spread no segundo semestre”, explica Marcatti, da Veedha.

Para o time de economia da XP Investimentos, no melhor dos cenários, a expectativa é que o BC corte a taxa de juros para até 12% no final do ano, e 11% no fim de 2024, algo que ainda representaria um retorno atrativo, mesmo descontada uma inflação de 5% a 6%, considerando que o investidor não seria exposto aos riscos associados a uma classe nascente como os criptoativos.

“Ainda estamos falando de uma Selic de dois dígitos, que vai fazer com que o CDI médio fique perto de 11,5% nos próximos 24 meses”, pontua Sgavioli. Até lá, aposta, o investidor de cripto será mais pontual, caracterizado principalmente por quem enxerga potencial de longo prazo na classe e já deseja se posicionar com antecedência aproveitando os preços mais atrativos.

“A propensão a tomar risco vai voltar gradativamente, apenas no momento em que não só o Brasil, mas o mundo, estiver em uma reversão de ciclo”, conclui.

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Paulo Barros

Editor de Investimentos