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Consolidados em outros países, os fundos imobiliários brasileiros focados na renda do aluguel de imóveis residenciais deram um susto quando a pandemia de coronavírus começou, em 2020. A inadimplência dos inquilinos aumentou rapidamente, assim como a vacância, com um maior número de unidades vazias. O segmento, ainda pouco disseminado no País, causou temor entre os investidores. Como se comportaria diante de tamanha crise?
O que se passou desde então indica que a recuperação operacional foi rápida, ainda que a valorização das cotas não tenha seguido no mesmo ritmo. As perspectivas para esse tipo de FII são positivas, apesar do cenário turbulento para a economia previsto para os próximos meses e ano. Na verdade, inflação e juros altos não se revelaram exatamente um problema para os negócios dessa categoria de fundos
“No próximo ano, com a subida das taxas de juros, comprar um imóvel de médio ou alto padrão não será tão simples como foi nos anos anteriores”, diz Gabriela da Costa Belo, head de relações com investidores do Luggo (LUGG11), que se intitula o primeiro fundo imobiliário 100% residencial do Brasil. É porque, neste caso, a locação seria a alternativa imediata de moradia.
“No caso consumidor de médio ou alto padrão, a cada um ponto percentual a mais na Selic [taxa básica de juros], você desestimula 200 mil famílias interessadas na compra de um imóvel”, calcula Gabriela.
Não à toa, a vacância dos fundos imobiliários residenciais – que normalmente investem em apartamentos de alto padrão, com serviços e facilidades incluídas – voltou aos níveis pré-pandemia em poucos meses. O Luggo, por exemplo, lançado em dezembro de 2019, chegou a ter uma taxa de ocupação de 80% dos seus imóveis no segundo e no terceiro trimestres de 2020. Hoje, está em 96%. Da mesma forma, os distratos, que subiram para 28%, estão em 5% atualmente.
A situação se repete em outros FIIs do segmento. A taxa de ocupação do fundo Yuca (YUFI11) vem em tendência de alta desde dezembro de 2020. Com algumas oscilações ao longo do tempo, o indicador saiu de 75% para os atuais 86%. “Se eu tivesse dois mil apartamentos, eu alugava os dois mil. Não tenho dúvida nenhuma sobre a grande demanda de inquilinos por esta solução”, disse Rafael Steinbruch, gestor fundo, em evento recente em São Paulo.
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Apesar da deterioração dos indicadores econômicos, a demanda por locação no condomínio Urbic Vila Mariana, que pertence ao fundo Rio Bravo Renda Residencial (RBRS11), aumentou. “Desde que foi entregue, em julho de 2021, o ativo obteve bons resultados, saindo de 60% de ocupação no lançamento e chegando em aproximadamente 80% em outubro”, afirma Alexandre Rodrigues, sócio e diretor da área de investimentos imobiliários da Rio Bravo.
Rodrigues reconhece que o aumento generalizado dos preços afeta as despesas de operação do fundo, que envolvem custos de condomínio e contas de consumo como água, energia e gás. No entanto, até o momento, foi possível compensar a diferença com uma diária média mais alta. As facilidades encontradas nos imóveis ajudam: o Urbic possui academia, coworking, espaço gourmet com churrasqueira, lavanderia, máquina de snacks, entre outras. Os hóspedes encontram apartamentos com kit de boas-vindas, mobília completa e limpeza contratada.
Cotações não refletem otimismo
Se a avaliação dos gestores estiver correta, é de se esperar que a demanda por locação de suas unidades residenciais se mantenha positiva. De acordo com o último Boletim Focus, do Banco Central, as projeções são de que o IPCA (Índice de Preço ao Consumidor Amplo) encerre o ano a 10,15% e fique em 4,96% em 2022. Com a pressão inflacionária, a Selic pode subir para 9,25% ao ano em 2021 e para 11,25%, em dezembro de 2022.
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Consequência deste cenário, levantamento da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) indica queda de 7% na intenção de compra de imóvel no terceiro trimestre deste ano. Segundo o estudo, 39% dos entrevistados querem adquirir uma casa em três anos, mas podem afetar a decisão de compra o aumento inflação (segundo 45% dos entrevistados), o cenário político complicado (31%) e a preocupação com o desemprego (24%).
Porém, se inflação e juros altos representam oportunidades para os FIIs residenciais na economia real, isso está custando a se refletir na Bolsa. Assim como outras classes de fundos imobiliários, o segmento acumula desvalorização – que, em alguns casos, chega a superar 30% no ano.
“As cotas do fundo foram afetadas pela alta de juros por causa da migração de recursos de ativos de risco para a renda fixa, apesar dos bons resultados operacionais”, afirma Rodrigues, da Rio Bravo.
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Na visão de Laercio Boaventura, diretor de investimentos da Vectis Gestão, responsável pelo fundo Vectis Renda Residencial (VCRR11), falta aos investidores entender as características dos produtos em que investem. “É preciso dar tempo para o fundo andar”, diz. Com patrimônio de R$ 196 milhões, o Vectis tem quatro imóveis nos bairros da Vila Mariana e Vila Clementino, em São Paulo, somando 348 unidades. Os prédios estão em obras que deverão ser concluídas entre 2022 e 2023 – até lá, o fundo pagará renda mínima garantida de 8% ao ano aos cotistas.
Segundo Boaventura, a “desconfiança”, que pressiona o valor das cotas, é natural e já atingiu outros segmentos de fundos imobiliários. “Os FIIs de renda residencial estão hoje como os de lajes corporativas e de shoppings estavam há uma década”, afirma.
Ticker | Fundo | Patrimônio Líquido (Milhões – R$) | Dividend Yield em 12 meses (%) | Variação acumulada em 2021 até XX/XX (%) |
RBRS11 | Rio Bravo Renda Residencia | 125 | 6,87 | -31,77 |
VCRR11 | Vectis Renda Residencial | 196 | 10,4 | -30,9 |
HOSI11 | Housi | 53 | 8,54 | -23,02 |
LUGG11 | Luggo | 112 | 6,9 | -20,47 |
YUFI11 | Yuca | 30 | 8,8 | -1 |
APTO11 | Navi Residencial | 41 | * | |
HGRS11 | CSHG Residencial | 160 | * |
Fonte: InfoMoney e relatórios gerenciais dos fundos
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(*) Fundos não iniciaram operação
Resiliência durante a pandemia
A pandemia do Covid-19 trouxe desafios para todos os setores da sociedade. Para os fundos imobiliários de renda residencial, que começaram a surgir meses antes ou durante o período, não foi diferente. Os gestores, no entanto, se mostram satisfeitos com o que viram nos últimos meses.
“Na pandemia tinha aquele medo de que todo mundo iria para o interior. Mas houve uma procura grande por imóveis no período”, diz Boaventura. Segundo ele, que monitorou a ocupação média do mercado de short stay (locação de pequena duração), a taxa se manteve em 86% nos últimos dois anos, considerando apartamentos de alto padrão com um dormitório em regiões nobres de São Paulo. O nível mínimo foi de 71%, no segundo trimestre de 2020, mas o índice logo voltou à média histórica.
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“Médicos que não queriam voltar para casa, gente que veio para se tratar em São Paulo e até as pessoas que se divorciaram elevaram a procura por locação”, diz o gestor.
A resiliência é considerada um dos atrativos dessa categoria de FIIs. “Acompanhamos nos Estados Unidos que o segmento que menos sofreu na pandemia e nas crises foi o residencial, em função da flexibilidade e da pulverização”, diz Boaventura, lembrando que os fundos costumam ter centenas de unidades que oferecem uma diversificação natural.
Além disso, as gestoras têm apostado em dispositivos para evitar a inadimplência, que pode crescer em períodos de maior instabilidade econômica. “Durante a pandemia, houve um aumento da inadimplência nos dois primeiros meses, mas o Luggo conta com um seguro que evita impacto da dívida na receita do fundo. Hoje a Inadimplência está na casa dos 3%”, afirma Gabriela.
No caso do fundo da Rio Bravo, Rodrigues explica que dos locatários de curta estadia se exige pré-pagamento da reserva, e para locatários de longa estadia há uma análise de crédito criteriosa, o que segura a inadimplência.
Recentes transações reforçam a aposta no segmento, mesmo com as incertezas econômicas e o futuro da pandemia. É o caso da realizada pelo CSHG Residencial (HGRS11), que investiu R$ 160 milhões em unidades localizadas em áreas nobres de São Paulo. Focado no long stay – locações de 3 a 24 meses – o fundo pagou R$ 51 milhões por 43 apartamentos do JML 747, na Rua José Maria Lisboa, no Jardim Paulista.
O fundo também investirá R$ 106 milhões em 67 unidades do Faria Lima, empreendimento localizado na Rua Henrique Monteiro, região da Rebouças. O contrato prevê a entrega das unidades mobiliadas, incluindo acabamento, mobiliário, enxoval e utensílios completos de alto padrão.
O modelo tem sido uma tendência no segmento, que procura oferecer uma estrutura de acordo com a necessidade de cada locatário. “O inquilino do Luggo pode escolher configuração do imóvel, móveis, eletrodomésticos. No condomínio, há loja de conveniência, que já cobra direto no cartão de crédito do cliente”, explica Gabriela. Há ainda serviços pet sitter e aluguel de carro compartilhado. Atualmente, a carteira do Luggo tem quatro prédios: um em Belo Horizonte (MG), um em Campinas (SP) e dois em Curitiba (PR), somando 452 unidades.
Vale a penar investir nos FIIs residenciais?
Gustavo Ribas, gestor do Navi Residencial (APTO11), fundo imobiliário que começa a operar em dezembro deste ano, calcula que os FIIs do segmento de renda residencial representam 1% do patrimônio líquido dos fundos imobiliários na Bolsa. Para ele, há potencial de crescimento – nos Estados Unidos, os fundos com essa estratégia somam 18%.
Em parceria com a startup Casai, o Navi Residencial captou R$ 41 milhões e já adquiriu 16 unidades de um empreendimento no Jardim Paulista e um prédio inteiro na Rua Oscar Freire, região de Pinheiros, ambos em São Paulo.
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Além do tamanho do mercado, o segmento tenta absorver as transformações da sociedade. “As gerações anteriores queriam ter um patrimônio, carros, imóveis e as novas gerações não têm ou diminuíram este desejo”, afirma Boaventura, da Vectis.
A mudança está em linha com o a tese de Gabriela, do Luggo, que vê o mercado de aluguel crescendo duas vezes mais do que o mercado de compra e venda nos próximos 40 anos. Os gestores afirmam ainda que os fundos imobiliários que focam na locação residencial atendem também o grupo de pessoas que, culturalmente, planejam a compra de imóveis para locação.
“Não faz sentido a pessoa entrar no stand, comprar um imóvel e colocar para alugar. A dor de cabeça para administrar a locação é insuportável”, pontua Boaventura. “E você ter uma gestão profissional para fazer isso faz todo sentido”.
Rodrigues, do Rio Bravo, cita ainda a possibilidade de comprar imóveis com preços mais competitivos. Os fundos adquirem um pacote de unidades e, desta forma, conseguem negociar valores e aumentar a chance de lucro em eventuais vendas futuras.
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