“Hawkish” ou “dovish”? Mercado questiona menção a inflação ao “redor da meta” em comunicado do Copom

Economistas também destacam o fato de a autoridade monetária estar já observando o horizonte de longo prazo, até 2024

Katherine Rivas

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A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, passando de 12,75% para 13,25% ao ano nesta quarta-feira (15), surpreendeu poucos agentes de mercado. Para a maioria, a decisão veio em linha com o esperado.

Contudo, o fato de o Banco Central ter citado no seu comunicado a expressão “para o redor da meta” para a convergência da inflação, mencionado o ano de 2024 na sua análise e deixando a porta aberta para um ajuste de igual ou menos magnitude no encontro de agosto, chamou atenção. Estaria a autoridade monetária tateando o fim do ciclo ou apenas ganhando tempo para ter mais certeza de que as medidas tomadas até agora terão efeito sobre a inflação?

O tom do comunicado foi considerado hawkish (preocupado com a inflação), mas o termo “ao redor da meta” indicaria uma postura dovish (menos preocupada com a inflação)?

No comunicado, o Banco Central também deu destaque para o risco fiscal, o cenário global e até mesmo arrefecimento dos preços das commodities e combustíveis, embora o impacto das medidas recentes discutidas no Congresso sobre a redução do ICMS ainda não tenham sido inclusas nas projeções.

A postura contracionista também ganhou destaque, reforçando a preocupação do Banco Central de ancorar a inflação. Para a maioria de economistas e especialistas consultados pelo InfoMoney, o BC até poderia ter a intenção de encerrar o ciclo de alta da Selic nos 13,25%, mas a realidade ainda cobra uma postura diferente.

Tateando o fim

Luca Mercadante, economista da Rio Bravo defende que o tom do comunicado do BC foi hawkish. Contudo, ao utilizar o termo “ao redor da meta” – alterando a frase rotineira dos comunicados, que costuma ser “na meta” – a percepção pode ser contrária. “Essa alteração no texto, junto com a aparição da projeção de inflação de 2024 abaixo da meta, pode ser mais um indicativo de que o BC pretende encerrar o ciclo nas próximas reuniões”, afirma.

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Para Marilia Fontes, economista e sócia da Nord Research, o uso do termo “ao redor da meta” no comunicado indica que o BC está tateando o fim do ciclo de juros. A leve mudança de linguagem sugere que, para 2023, a autoridade monetária está disposta a aceitar uma inflação que não seja a meta, mas próxima disso.

Segundo a economista, a expectativa para a inflação em 2023 presente no relatório Focus, do BC, é de 4,7%, sendo que a meta é 3,25%. Já a projeção do Banco Central é de 4%, bem menor que a do mercado.

No comunicado divulgado após a reunião de hoje, o Copom diz o seguinte:

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O Comitê entende que essa decisão [de elevar a Selic em 0,5 ponto percentual] reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2023.

Caio Megale, economista-chefe da XP também chama a atenção para a citação da inflação de 2024 no comunicado, algo que considera antes do esperado. “Historicamente a autoridade monetária passa a divulgar as projeções para dois anos à frente apenas no segundo semestre. Isso pode ser considerado dovish, já que a projeção para o IPCA de 2024 está abaixo da meta”, analisa.

Já em relação à projeção de 4% para o IPCA de 2023, Megale considerou a postura hawkish dado que as medidas de desoneração ainda não foram incorporadas. Na visão da XP, a Selic terminal será de 13,75% ao ano. “Acreditamos que ele acabará dando um outro aumento de 0,50 pp, uma vez que as atuais pressões inflacionárias não devem diminuir o suficiente até lá”.

Marília, da Nord, diz que enquanto o mercado estima inflação de 3,25%, o BC projeta 2,7%. “O BC está otimista, porque na visão dele, se jogar a inflação de 2023 para a meta, há o risco de ficar abaixo da meta em 2024”, destaca. “Então, tudo bem trabalhar um pouco acima da meta em 2023, para ficar tranquilo em 2024. Ele está indicando o fim do ciclo”.

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Está na hora de fechar o ciclo…

Para alguns economistas consultados pelo InfoMoney, já está na hora de fechar o ciclo de aperto monetário e provavelmente não devemos esperar mais do que uma alta para a Selic terminal.

Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo Investimentos, destaca que não há motivos para o Banco Central ir muito mais longe, dado que a política monetária já está em terreno contracionista a partir das últimas decisões. “O juro real já é muito alto e isso vai impactar na economia, desacelerar crescimento e, ao longo do tempo, trazer a inflação para a meta”, avalia Costa.

Na visão dele, o próximo ajuste deve ser de 0,25 ponto percentual para finalmente encerrar o ciclo. O economista destaca que o fato de o BC estar buscando convergência em 2024 já sinaliza, de forma sutil, a proximidade do fim do ciclo.

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Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, destaca que o melhor que pode acontecer para o Banco Central é que boa parte dos agentes de mercado e economistas comecem a manifestar, nas próximas semanas, que acreditam não ser necessário continuar subindo a taxa de juros. “Diante de tudo o que foi elevado, agora é aguardar o efeito desses aumentos no primeiro semestre”, aponta.

Na visão dele, não é impossível que o BC encerre o ciclo daqui há 45 dias em 13,25% mesmo. “Se tivermos um IPCA desacelerando, as medidas fiscais trazendo impacto grande na inflação, a China reabrindo e as pressões externas cessando, é possível”, aponta.

…ou ainda há questões em aberto?

Para outros agentes de mercado, ainda é cedo para falar do fim de ciclo e é melhor ficar atento aos sinais da economia nos próximos dias.

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Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, compartilha desta visão e acredita que o BC até quis encerrar o ciclo, mas a realidade cobrou um cenário diferente. “São dois anos seguidos de uma inflação muito próxima de 10%, colocando tensão em um Banco Central que está cada vez mais sozinho frente a uma política fiscal diversa”.

Na visão dele, com a pressão do preço do petróleo, câmbio e combustíveis, ainda há riscos sobre a inflação de 2023. Embora na visão da MB Associados a Selic possa encerrar em 13,75% ao ano, Vale não descarta que seja possível ver a taxa de juros em 14% ainda em 2022.

Esta visão de incerteza ainda é compartilhada por casas como Levante Investimentos, SVN e Somma Investimentos.

Pedro Tiezzi, analista de investimentos da SVN, acredita que a postura do BC de prolongar o ciclo foi correta por conta das discussões fiscais, assim como ICMS dos combustíveis, que tem impacto indireto na inflação. Ele considera difícil e distante um arrefecimento no preço das commodities e melhorias por conta das discussões no preço dos combustíveis e petróleo. “O Banco Central precisa dar um direcionamento firme”, aponta.

Já Eduarda Korzenowski, economista da Somma Investimentos, prefere deixar a porta aberta, embora acredite que mais uma alta de 0,50 pontos seja provável. Ela cita que falta ver o impacto das medidas do ICSM na redução da inflação deste ano, que não foi inserido nas projeções.

Com cenário externo e inflação global pressionando, além do fiscal no radar do BC, Rafael Bevilacqua, estrategista-chefe da Levante também avalia que boa parte do ciclo de aperto não teve efeito, e é preciso cautela para verificar o impacto na convergência da inflação.

Quando será a hora da reversão?

Em live do InfoMoney, Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC e sócio da Mauá Capital, se mostrou otimista com o fim do ciclo dos juros e o começo de uma redução nas taxas.

Na visão dele, o momento da virada poderia ocorrer até mesmo em dezembro, desde que haja conjunção de dois fatores. O primeiro seria que o Federal Reserve comece a mudar de postura trazendo tranquilidade aos mercados nos próximos 3 ou 4 meses. O segundo fator seria a possibilidade de o Brasil ter um próximo presidente comprometido com a real sustentabilidade fiscal.

Com melhorias no fiscal, Figueiredo enxerga que o câmbio pode reduzir e trazer alívio aos juros. “A chance da próxima reunião ser a última alta é enorme, acho que para qualquer padrão os juros que temos são altos”, destaca observando a curva.

Já Mário Schalch, gestor da Neo Investimentos, enxerga um cenário de reversão apenas no segundo semestre de 2023. Ele defende que o Banco Central ganhou tempo para ter mais certeza e conforto em colocar um fim ao ciclo de aperto monetário.

“A inflação precisa indicar que está indo na direção da meta e as expectativas dos agentes de mercado estarem alinhadas com a meta do BC para tudo normalizar”, aponta.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.