Gestores criticam interferência na Petrobras, mas resistem a se desfazer das ações da estatal

Especialistas defendem que mudanças no comando e na política de preços podem ser difíceis de se efetivar, e estatal segue gerando bom caixa e dividendos

Mariana Segala Bruna Furlani

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Gestores de fundos que possuem ações da Petrobras (PETR3;PETR4) na carteira foram pegos novamente no contrapé por mais uma troca no comando da estatal, anunciada na noite de segunda-feira (23) – apenas 40 dias depois de José Mauro Coelho ter assumido o posto, em outra mudança intempestiva protagonizada pelo governo.

A leitura geral é de que os episódios recentes envolvendo a Petrobras são um movimento político de resposta à opinião pública, dado o aumento dos preços dos combustíveis nos últimos meses. E a governança da estatal, segundo Rodrigo Boselli, sócio e gestor da 3R Investimentos, “mais uma vez está sendo colocada à prova”.

Caio Paes de Andrade, atual secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital no Ministério da Economia, foi indicado para o lugar de Coelho. Próximo ao ministro Paulo Guedes, ele já tinha sido considerado para o posto anteriormente.

Neste momento, na visão de Boselli, é difícil estimar as chances de que a mudança no comando de fato se efetive. A razão é a Lei das Estatais, de 2016, que estabeleceu requisitos mínimos de vivência profissional para os postulantes a cargos de diretoria nas empresas públicas – como ter pelo menos dez anos de experiência na área de atuação da companhia ou um mínimo de quatro na direção ou chefia de organização de mesmo porte.

“Se o indicado da vez não for aprovado, será o segundo caso de amadorismo [do governo] em um espaço curtíssimo de tempo”, afirma o especialista.

Boselli se refere à indicação do consultor Adriano Pires para substituir o general Joaquim Silva e Luna na presidência da estatal, no fim de março. Na época, o Ministério Público do Tribunal de Contas da União chegou a solicitar apuração de possível conflito de interesse na indicação, já que Pires – sócio e dirigente da consultoria privada CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura) – presta serviços para as principais multinacionais de petróleo, gás e energia.

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O consultor acabou desistindo do cargo antes mesmo que o Comitê de Pessoas da Petrobras – que, segundo se noticiou à época, recebera pareceres contrários à indicação – emitisse uma recomendação. Em seu lugar, assumiu Coelho.

“Naquele episódio, o resultado acabou sendo positivo, porque o nome proposto não atendia aos requisitos e não foi aprovado. O candidato se retirou para evitar o constrangimento”, diz Boselli.

Vender ou não vender?

Embora pareça estar em curso uma tentativa de alterar a política de preços da estatal por meio das mudanças na diretoria e no Conselho de Administração, os gestores estão resistindo a se desfazer dos papéis da estatal. Boselli, por exemplo, afirma que manterá a posição em ações da Petrobras, que montou no fundo 3R Radix ainda em dezembro de 2020. Segundo documentos do fundo, o setor de petróleo e gás responde atualmente por 13% das alocações da carteira.

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Da mesma forma, a Vêneto deve “segurar” os papéis nos fundos por mais algum tempo. A posição foi montada no primeiro semestre de 2021 justamente na sequência de outro episódio de troca de comando na petroleira. Em fevereiro do ano passado, em circunstâncias semelhantes às atuais, o governo substituiu o então presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, pelo general Joaquim Silva e Luna.

O fundo da Vêneto chegou a ter 6% da carteira aplicada na estatal, mas dado o risco político – que se intensifica quanto mais se aproximam as eleições presidenciais de outubro – a expectativa era de zerar a posição neste mês. “Mas a empresa está tão barata e gerando tanto caixa que nos prendeu às ações”, explica Pessoa. Os papéis ainda representam 3,5% dos investimentos do fundo.

“Achamos que pode vir alguma coisa [sobre a política de preços da Petrobras, após a troca de comando], mas vamos levar a posição por mais algum tempo”, diz o gestor, ponderando que dificilmente seguirá com ela além de julho. “O risco eleitoral pode pesar demais”.

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Na visão de Boselli, não deverá ser simples mexer na política de preços da estatal. Além da aprovação do Conselho de Administração da estatal, uma mudança do tipo poderia despertar a atenção de outros órgãos, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e até o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “Acho que o ruído vai aumentar nos próximos dias, vamos ver como os dispositivos de governança se comportarão”.

A queda dos papéis no pregão desta terça-feira (24), segundo o gestor, assusta pouco. “O que me preocupa são as indefinições”, diz. De todo modo, sendo seu horizonte de investimento o longo prazo e considerando que a Petrobras permanecerá sendo uma grande geradora de caixa e de dividendos, vai optar por “não fazer nada” no momento.

A estatal apresenta um custo baixo de exploração do petróleo do pré-sal, que Pessoa calcula em torno de US$ 10 por barril. Ao mesmo tempo, os preços da commodity no mercado internacional estão no patamar de US$ 110 por barril atualmente.

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“O preço com que a Petrobras é negociada reflete mais do que o risco que ela tem, está completamente fora de lugar”, afirma. “Com as informações que temos hoje, a margem de segurança, que é a diferença entre o preço e o valor da ação, é muito grande”.

Quem também deve seguir com posições na empresa, pelo menos por enquanto, é a Kínitro Capital. Lucas Ribeiro, head de análise microeconômica da gestora, conta que o fundo de ações da casa possui uma posição antiga e relevante nas ações da Petrobras, mas diz que os gestores estão debatendo os acontecimentos recentes.

“Estamos muito no olho do furacão agora. Nesse curto prazo, veremos o que essa mudança de comando vai gerar”, observa Ribeiro.

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Segundo sua última carta mensal, a Kínitro acreditava que a Petrobras poderia distribuir dividendos entre 35% e 40% do valor de mercado da companhia, com o barril de petróleo negociando a preços tão elevados.

Queda poderia ser maior

Embora a notícia tenha penalizado as ações da Petrobras, houve quem questionasse que a queda poderia ter sido maior. Para Ribeiro, da Kínitro, a razão é que não há um fato exatamente novo. As mudanças vêm ocorrendo em “looping“, sem parar.

“O risco político nunca saiu da Petrobras. Quando o preço do petróleo explodiu, a Petrobras não andou tanto. Muito do risco político já está ali dentro”, afirma.

Ele não nega que os preços podem corrigir mais, mas diz que é cedo para afirmar que a política de preços está em risco. 

Augusto Lange, gestor de ações da Neo Investimentos, também questiona o comportamento da ação nesta terça-feira. Ele diz que o mercado não parece estar olhando tanto para o efeito prático que a mudança pode ter na política de preços da companhia. 

Os papéis, afinal, caíram, mas já despencaram mais em outras ocasiões envolvendo a governança da empresa. Por volta das 15h40 (horário de Brasília), os papéis preferenciais da petroleira recuavam 4,21%, aos R$ 31,18. Já as ações ordinárias recuavam 4,12%, aos R$ 33,95.

O gestor não possui atualmente nenhuma posição em Petrobras, mas não descarta montar uma alocação, porque a ação está com valuation (preço) bastante atrativo. 

“Se o preço da gasolina ficar onde está, a Petrobras está num valor muito baixo e gerando resultados”, afirma. Para ele, mesmo se a companhia não aumentar o preço da gasolina, ainda que haja alguma defasagem, efeito no preço dos papéis deve ser pequeno.

O valor de mercado e a rentabilidade entregues pela empresa, diz Lange, devem se sobrepor aos ruídos políticos.

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Mariana Segala

Diretora de Redação do InfoMoney