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SÃO PAULO – A flexibilização do teto de gastos do governo por meio da PEC dos Precatórios, em tramitação na Câmara dos Deputados, gera receio de que a extrapolação do limite de despesas públicas possa ir além do necessário para financiar o Auxílio Brasil, nova versão do Bolsa Família que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pretende criar, e aprofundar o desequilíbrio fiscal. A avaliação é do CEO da gestora Verde Asset Management, Luis Stuhlberger. Para ele, rompida a barreira do teto, parlamentares podem ver uma oportunidade para mais aumentos de gastos às vésperas de um ano eleitoral.
“Rompemos o teto, agora vale tudo”, disse Stuhlberger, referindo-se à possível lógica dos políticos caso a PEC seja aprovada. Essa perspectiva, somada à inflação em aceleração, contribui para o aumento e manutenção dos juros em patamar elevado. “Vamos ter juro alto por um ano”, destacou o executivo. Ele falou sobre o tema “A agenda econômica que queremos” em painel realizado nesta quarta-feira (27) no Anbima Summit, conferência promovida pela Associação Brasileira das Entidades do Mercado Financeiro e de Capitais.
“Não adianta só subir os juros [para conter a inflação]”, observou Stuhlberger. De acordo com o executivo, com a flexibilização do teto, não há garantia de que uma explosão de gastos não possa ocorrer, pressionando ainda mais a inflação.
Demanda justa
Ao justificar a proposta do governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que prefere tirar nota “8” na seara fiscal do que “10” na área fiscal e “zero” no social. Para o CEO da Verde Asset, os parlamentares podem considerar que tanto faz a nota depois que o teto for furado.
Stuhlberger julga importante conciliar a demanda social com as necessidades fiscais, afinal o Brasil ainda tem cerca de 14 milhões de desempregados. Nesse sentido, defendeu que o governo continue a pagar o auxílio emergencial da pandemia de Covid-19 por mais alguns meses.
Ele ressalta que até agora o histórico fiscal do governo “era muito bom”, com a relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB) estável e aumento na arrecadação, de 22,3% no acumulado do ano. Ou seja, haveria espaço para o auxílio por mais algum tempo.
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O problema, em sua opinião, é que o governo quer aumentar o Bolsa Família e destinar mais recursos para emendas parlamentares por meio do furo do teto, inscrito em emenda constitucional. Na tese governista, as mudanças pretendidas criariam um espaço de R$ 83 bilhões no orçamento de 2022, ano eleitoral. Em parte, este espaço se abriria com a criação de um limite para o pagamento de precatórios, como são chamadas as dívidas judiciais do poder público. A outra parte, porém, depende da mudança do cálculo do teto de gastos.
“É preciso separar uma demanda social justa de uma demanda eleitoreira de quem está no poder”, observou Stuhlberger. O Auxílio Brasil, de cerca de R$ 400 mensais até dezembro de 2022, é visto como a aposta governista para tentar viabilizar a reeleição, e as emendas parlamentares, uma tábua de salvação no Congresso. O Bolsa Família paga hoje, em média, R$ 190 por mês. Parte do aumento imaginado para o Auxílio Brasil seria permanente, mas a maior parte valeria apenas até logo depois da eleição.
Para o CEO da Verde Asset, a afirmação de Guedes de que prefere abrir mão do “10” no fiscal para não tirar “zero” no social é uma “falácia”. “É populismo eleitoral. Se pensasse no social mesmo, daria auxílio emergencial por mais um ano”, declarou. Em sua avaliação, da maneira como as modificações estão sendo feitas, haverá um aumento “perpétuo” de gastos que “rompe o teto da pior maneira”.
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“O mercado reage e passa a questionar se o Brasil consegue pagar suas dívidas”, afirmou Stuhlberger sobre as reações negativas quando do anuncio do furo do teto. Aberta a porteira, ele teme que a limitação de despesas seja deixada de lado não só agora, mas também pelo próximo governo. Ele lembrou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), favorito nas pesquisas eleitorais, já disse que seu partido defende o aumento do Bolsa Família para R$ 600.
Títulos públicos
Diante deste cenário, comprar títulos públicos com vencimento após 2022 seria seguro? “Nenhum país quebra em sua própria moeda”, respondeu Stuhlberger, acrescentando que as contas externas do Brasil estão bastante boas, portanto não há grande preocupação nesse front.
Ele ressaltou, no entanto, que os papéis com prazos mais curtos, com vencimento a partir de 2024, estão pagando juros reais superiores a 5,5% ao ano, o que “parece exageradamente alto”, tendo em vista que investimentos semelhantes no exterior, especialmente de países desenvolvidos, estão com juros reais negativos.