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O alerta do setor de crédito parece ter chegado ao mercado de fundos imobiliários, que viu nas últimas semanas uma série de problemas em certificados de recebíveis imobiliários (CRI). As ocorrências derrubaram cotações de FIIs que investem neste tipo de título e elevaram a desconfiança nos chamados fundos de “papel”.
Diante do cenário, o que esperar – e, principalmente, o que fazer com esta classe de ativo?
O tema foi destaque da edição desta terça-feira (28) do Liga de FIIs, que tem apresentação de Maria Fernanda Violatti, analista da XP, Thiago Otuki, economista do Clube FII, e Wellington Carvalho, repórter do InfoMoney. O programa contou ainda com a participação de Felipe Ribeiro, diretor de investimentos alternativos do Clube FII e autor do livro Guia Definitivo para entender FII de CRI.
“Infelizmente não tenho boas notícias”, disse o especialista ao analisar a inadimplência reportada em vários títulos presentes nos portfólios de fundos imobiliários. “Estamos vivendo uma crise financeira global e é natural que este tipo de problema apareça”, explica Ribeiro, que considera a crise mais de confiança do que necessariamente de crédito.
Nesta quarta-feira (28), por exemplo, os FIIs Hectare CE (HCTR11), Tordesilhas EI (TORD11), Versalhes (VSLH11) e Devant (DEVA11) comunicaram ao mercado atraso no pagamento de uma série de CRIs ligados a pelo menos sete projetos.
“Verificou-se que o cumprimento das obrigações pecuniárias dos certificados de recebíveis imobiliários de emissão da Forte Securitizadora S.A, abaixo listados, não foram honradas na data pactuada, dia 20 de março de 2023”, confirma fato relevante divulgado pelos fundos. Segundo o texto, até o presente momento, não há qualquer notícia do adimplemento de tais obrigações.
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De acordo com os fundos, os CRIs com pagamento da parcela de março pendente são de projetos ou empresas como Circuito das Compras, GPK, Resort do Lago IV, WAM Holging, Búzios Beach, EDA e Resort do Lago Park.
O comunicado sobre a inadimplência derrubou as cotas do fundo, que chegaram a registrar queda de mais de 12% ao longo do dia.
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“Temos, sim, um problema e há o risco de [a inadimplência] ocorrer mais vezes daqui para frente”, afirma Ribeiro. Por outro lado, lembra o especialista neste tipo de operação, os CRIs são operações estruturadas que oferecerem proteção aos investidores.
Como funcionam um fundo de “papel”, ou FII de CRI
O CRI é um título de dívida usado por empresas do setor imobiliário para captar recursos no mercado. Na prática, as companhias “empacotam” receitas futuras que têm para receber – como aluguéis ou parcelas pela venda de apartamentos, por exemplo – em um título (o CRI) vendido aos investidores.
Em geral, o papel embute um rendimento prefixado mensal e a correção por um indicador, que normalmente é a taxa do CDI (certificado de depósito interbancário) ou o Índice de Preços ao consumidor Amplo (IPCA).
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Com a elevação da inflação medida pelo IPCA ou da taxa básica de juros da economia, a Selic, que é referência para o CDI, a capacidade de pagamento das parcelas mensais se torna menor, elevando o risco de inadimplência.
Nesta semana, a Justiça já havia suspendido por 60 dias os pagamentos referentes ao CRI do grupo Gramado Parks, empresa que atua no segmento de turismo. O título faz parte da carteira do FII Serra Verde SRVD11, cujas cotas estão presentes no portfólio de outros FIIs.
Na ação iniciada na 2ª Vara Judicial da Comarca de Gramado, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, a empresa alega que condições macroeconômicas – como o aumento da inflação e dos juros – elevaram o volume de distratos e, consequentemente, reduziu as receitas da companhia, que já vinha sofrendo com as consequências da pandemia da Covid-19.
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Diante da exposição ao SRVD11, fundos de “papel” – que investem em títulos de renda fixa como os CRIs – amargaram fortes perdas nos últimos pregões.
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“Elevadas taxas de juros e pressão inflacionária corroem o bolso da pessoa física, mas também do empreendedor, que observa menos vendas e menor interesse no seu negócio”, lembra Ribeiro. “Há uns oito ou nove anos, já tivemos uma situação semelhante e uma série de CRIs de setores específicos também deram problema”, recorda.
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Paciência e atenção ao portfólio dos FIIs, sugerem especialistas
O pagamento mensal das parcelas do CRI compõe a receita dos FIIs de “papel” e, consequentemente, o recurso que será distribuído aos cotistas em forma de dividendos. Na prática, quanto mais altos os indexadores dos títulos, maior a receita da carteira e os rendimentos dos investidores – como tem ocorrido nos últimos anos de inflação e juros elevados.
No entanto, Maria Fernanda, da XP, pondera que é preciso avaliar até que ponto a elevação dos indicadores é sustentável para a outra ponta da operação, ou seja, de quem assumiu a dívida.
“É desafiador para quem está desenvolvendo um empreendimento manter as contas em dia com este atual patamar de juros”, pontua. “Por isso, neste momento, é importante o investidor ter uma atenção com a evolução das operações presentes no portfólio dos FIIs”, sugere a analista, lembrando que muitas informações podem ser obtidas nos relatórios gerenciais divulgados mensalmente pelos fundos.
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Otuki, do Clube FII, também destaca que, mais do que nunca, é importante neste momento a diversificação do portfólio – ou seja, a inclusão de diferentes tipos de ativos na carteira do investidor, inclusive levando em consideração os FIIs High Grade – de menor risco – e os FIIs High Yield – de maior risco.
Diante do cenário, Ribeiro recomenda ainda que o investidor tenha paciência e observar as garantias previstas na estruturação do CRI em caso de inadimplência. O mecanismo tem como objetivo compensar o fundo imobiliário vítima de um calote.
“É claro que a compensação demora e não ocorre no mês seguinte ao evento de inadimplência, mas ela tende a ocorrer”, explica o especialista, ponderando que é preciso sempre avaliar caso a caso.
Ele também faz um alerta para que o investidor não caia na velha armadilha do mercado de “comprar na alta e vender na baixa”, ao tomar decisões sem saber exatamente o que está ocorrendo com o ativo investido.
Os especialistas afirmam que o mesmo raciocínio vale para quem vê na situação uma oportunidade. Segundo eles, antes de comprar um FII com desconto, é preciso entender as razões da desvalorização e se o ativo está dentro do perfil de risco do investidor.
Confira mais análises e a entrevista completa de Felipe Ribeiro, do Clube FII, na edição desta terça-feira (28) do Liga de FIIs. Produzido pelo InfoMoney, o programa vai ao ar todas as terças-feiras, às 19h, no canal do InfoMoney no Youtube. Você também pode rever todas as edições passadas.
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