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A escolha de um fundo imobiliário de “papel” – que investe em recebíveis e títulos de renda fixa ligados ao setor imobiliário – exigiu menos esforço do investidor nos últimos anos. Diante da inflação e dos juros elevados, a maior parte das carteiras desse tipo entregou dividendos turbinados no período sem grandes dificuldades.
Com o IPCA negativo em julho e agosto, porém, o cenário mudou. “Em geral o impacto da deflação em fundos de recebíveis é negativa”, avalia Gabriel Fiorillo Nunes Pereira, sócio e head de fundos imobiliários da Acqua Vero Investimentos. “A tendência é uma redução dos dividendos distribuídos, embora isso dependa das características de cada fundo”.
Agora, se faz necessária uma análise mais detalhada das carteiras. Aspectos como proteção contra deflação e reservas acumuladas pelos FIIs devem entrar no radar do investidor.
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Os FIIs de “papel” costumam comprar títulos como certificados de recebíveis imobiliários (CRIs). Na prática, as empresas do segmento imobiliário “empacotam” receitas futuras que têm para receber – como aluguéis ou parcelas pela venda de apartamentos, por exemplo – no formato de CRIs, vendidos aos investidores. Em geral, o papel embute um rendimento prefixado e a correção monetária por um indicador, que normalmente é a taxa do CDI (certificado de depósito interbancário) ou o IPCA.
Nos últimos anos, a rentabilidade dos FIIs de “papel” acompanhou a elevação dos preços e dos juros no País e os fundos chegaram a ostentar valorização de quase 30% em 12 meses.
Em agosto, porém, o IPCA registrou deflação de 0,36%, de acordo com dados divulgados nesta sexta-feira (9) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em julho, o índice já havia registrado resultado negativo de 0,68%, acendendo uma luz amarela entre os investidores de fundos de “papel”. E assim como os rendimentos dos CRIs comprados pelos FIIs de “papel” são reajustados para cima quando o indicador aponta avanço nos preços, também são revisados para baixo quando o contrário acontece.
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Diante da correlação dos FIIs de recebíveis com os indicadores macroeconômicos, Pereira, da Acqua Vero, recomenda ao investidor que tem fundos de “papel” ou que pretende adquirir essas carteiras atenção redobrada com as características dos portfólios.
“Um fator muito importante é o quanto do patrimônio do fundo está indexado a índices de inflação e à taxa do CDI”, pontua. “Outros fatores que devem ser considerados são os resultados e correção monetária acumulados e não distribuídos, além da quantidade de títulos com proteção contra a deflação”, detalha.
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FIIs com proteção contra a deflação? Sim, eles existem
O impacto da deflação na distribuição de dividendos dos FIIs de “papel” será de acordo com o regime de pagamento de cada fundo, afirmam especialistas ouvidos pelo InfoMoney. Nem todas as carteiras distribuem mensalmente a correção monetária dos CRIs para os cotistas – modelo que atenua o impacto da queda do índice de inflação nos repasses de rendimentos para os investidores.
A situação mais complexa é a dos FIIs que consideram a correção monetária como lucro e distribuem a atualização nos rendimentos pagos aos investidores. Neste caso, o próprio rendimento prefixado do CRI cobriria o resultado negativo do IPCA, reduzindo o repasse de dividendos.
Para evitar a redução, alguns fundos procuram investir em CRIs que possuem uma proteção contra deflação. Por meio dessa espécie de mecanismo de segurança, mesmo quando o indicador de inflação fica negativo, a parcela do rendimento que o FII recebe é igual a, pelo menos, a taxa prefixada acordada quando o CRI foi adquirido (ou prêmio de risco).
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O Devant Recebíveis Imobiliários (DEVA11), por exemplo, manteve o objetivo de distribuir dividendos equivalentes a 1% ao mês, apesar dos meses recentes de deflação, conforme sinaliza relatório gerencial divulgado em agosto. A principal aposta dos gestores para driblar os efeitos do IPCA negativo é justamente a proteção contra deflação nos títulos da carteira.
“Essa proteção contra a deflação que possuímos nos CRIs se mostra muito assertiva e importante em momentos como esses. Com isso, mesmo nesse cenário de deflação, o fundo permanecerá buscando o target [objetivo] de 1% de dividend yield [retorno com dividendos] nesses meses de deflação”, sinaliza o documento.
De acordo com o relatório gerencial, 99% dos CRIs do Devant Recebíveis Imobiliários contam com a proteção contra a deflação, garantindo o repasse integral do rendimento prefixado dos títulos aos cotistas – mesmo em momentos de IPCA negativo, como o atual.
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Estudo recente da Eleven Financial aponta que a maior parte dos fundos imobiliários do mercado – cerca de 70% – possuem um volume abaixo de 40% de títulos privados com proteção contra deflação mensal. Apenas 15% dos FIIs contam com mais de 70% dos papéis protegidos, detalha o levantamento.
“Quanto menor é o nível de risco dos CRIs, mais difícil é embutir mecanismos como o de proteção contra a inflação”, explica Guilherme Antunes, gerente da área de crédito imobiliário da RBR Asset. “Não basta olhar apenas o percentual de títulos protegidos, o investidor deve olhar também aspectos como resultados e inflação acumulados e não distribuídos pelos fundos”, recomenda.
Alguns FIIs possuem reservas contra a deflação
André Masetti, gestor do Maxi Renda (MXRF11), afirma que apenas 1% do patrimônio líquido do fundo tem proteção contra a inflação. O percentual pequeno, no entanto, não parece preocupar o executivo, que aposta em outros mecanismos para atravessar o atual período de deflação.
O Maxi Renda, assim como outros FIIs de “papel”, optam por formar reservas com parte dos recursos, de modo que possam evitar reduzir os rendimentos distribuídos aos investidores em situações específicas, como é o caso dos períodos de deflação.
“Tivemos vários meses em que a inflação esteve na casa de 1% e o fundo distribuiu uma parcela muito menor do que a inflação acumulada nos últimos meses”, explica. “Claro que a deflação come um pouco dessa gordura, mas a distribuição de dividendos do fundo segue de forma recorrente”, prevê.
De acordo com Masetti, o Maxi Renda terminou o mês de julho com uma correção monetária acumulada equivalente a R$ 0,20 por cota. O montante, diz o gestor, seria suficiente para o fundo se blindar neste período de deflação.
Na mesma linha, Antunes, da RBR, afirma que a inflação acumulada e não distribuída pelo RBR Rendimento High Grade (RBRR11) chega a R$ 1,33 por cota. Além da correção monetária, o gestor cita ainda o montante de R$ 0,42 por cota de lucro acumulado e ainda não repassado aos cotistas.
Ainda de acordo com o estudo da Eleven Financial, 40% dos FIIs de “papel” tem até R$ 0,50 por cota de lucro acumulado e não distribuído. 30% das carteiras não apresentam qualquer reserva.
Em relação ao saldo de correção monetária não distribuída – variação da inflação retida – 65% dos fundos dizem possuir o recurso e 35% admitem que distribuíram o montante como dividendos, conforme mostra o gráfico abaixo:
Participação do IPCA no portfólio do fundo
Além das reservas acumuladas e não distribuídas – tanto de inflação como de resultados – e da proteção de títulos contra a deflação, o investidor também deve ficar atento ao percentual do portfólio do fundo que está indexado ao IPCA.
Diante da influência da variação do índice no rendimento do fundo – ou seja, se o indicador sobe, aumenta o dividendo e, se cai, reduz o provento – quanto mais títulos atrelados ao indicador, maior será o impacto da deflação.
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Gabriel Barbosa, sócio e membro do Comitê de Investimentos da TRX, lembra que o alto dividendo distribuído no último ano pelos fundos de “papel” foi estimulado pela inflação muito acima do esperado, gerando resultados extraordinários para os fundos com portfólios indexados ao IPCA.
Natural, segundo ele, que o rendimento seja reduzido em um momento de queda dos preços. No entanto, Barbosa reforça o discurso de que o arrefecimento da inflação é temporário. Para reforçar a tese, o gestor lembra do relatório Focus, do Banco Central, que mantém a expectativa para a inflação dos próximos dois anos acima da meta do governo federal.
“Com a redução [temporária] da inflação, os dividendos devem sofrer no curto prazo, mas depois devem voltar a aumentar”, avalia Barbosa, que prevê também um cenário mais “pé no chão” no médio prazo. “Ou seja, [um dividendo] nem tão alto como no primeiro semestre de 2022, nem tão baixo como atualmente”, projeta.
Onde buscar as informações sobre os FIIs?
As informações sobre o peso de cada indicador no portfólio dos FIIs podem ser encontradas no relatório gerencial, documento divulgado mensalmente pelos gestores. No caso dos fundos de “papel”, o texto detalha as principais características dos CRIs presentes na carteira, como classificação de risco, inadimplência, participação no patrimônio líquido do FII, segmento, vencimento, além das taxas e indexadores.
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Em relação à proteção dos títulos contra a deflação, o investidor pode ter um pouco mais de dificuldades de encontrar dados sobre o mecanismo nos relatórios gerenciais, lamenta Barbosa, da TRX.
“Sim, quanto mais informações disponíveis para o investidor melhor”, afirma. “Porém, deflação no Brasil é algo tão inusitado, que passa longe das discussões entre gestores e investidores normalmente”, pondera.
Diante da mudança de cenário, fundos como o Hectare CE ([ativo=HCTR]) – que diz ter 100% dos CRIs protegidos contra a deflação – passaram a incluir a informação no relatório gerencial.
“A expectativa para os próximos meses é de termos variações negativas no IPCA. Ainda assim, todos os CRIs do fundo consideram para efeito de cálculo apenas a variação positiva, o que significa que 100% da carteira está protegida contra deflação”, diz o documento divulgado em agosto.
Com 10% dos CRIs protegidos contra a deflação, o Iridium Recebíveis Imobiliários (IRDM11) também aposta na reserva acumulada para atravessar os meses de IPCA negativo.
“Essa reserva de resultado agora atua como um “colchão” para minimizar qualquer impacto de uma inflação mais baixa ou até mesmo negativa”, destaca relatório do fundo, que estima uma reserva equivalente a um mês de rendimentos.
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