SÃO PAULO – Foi assistindo a vídeos de games e jogos de basquete no YouTube que Mateus Gusmão, 13 anos, se viu influenciado por um anúncio de investimentos. Títulos atraentes que remetiam a estratégias com possibilidade de ganhos rápidos chamaram a atenção do menino, e despertaram seu interesse no universo financeiro.
“Passei a pesquisar sobre o assunto e, quando comecei a investir, a entender na prática como a Bolsa funcionava e a ver que era possível fazer o que eu via no YouTube, gostei mais ainda”, conta.
Com um montante poupado de presentes de aniversário, Gusmão, que é natural de Natal (RN), fez seu primeiro investimento em 2018, aos 11 anos. O ativo escolhido foi o fundo imobiliário Shopping ABC Paulista (ABCP11). A avaliação de menor oscilação de preços na comparação com ações e o pagamento de dividendos mensais contaram a favor da escolha.
O estudante, que acompanha o trabalho de influenciadores do mercado financeiro, como Primo Rico e Nathalia Arcuri, também assina relatórios com recomendações de investimentos.
À medida que foi aprendendo sobre as aplicações financeiras, ganhou confiança e partiu para a compra direta de ações, classe que hoje representa 75% da carteira do investidor mirim. “Prefiro as ações porque posso me tornar sócio de empresas que podem crescer”, diz.
Entre os setores preferidos estão os de consumo não-cíclico, elétrico e financeiro. Atualmente, a carteira é formada por 11 ações, um fundo de índice (ETF), o IVVB11, que replica o índice americano S&P 500, “para ter uma diversificação geográfica”, e 5% em FIIs, conta.
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Na escola, o estudante do oitavo ano que trocou o videogame pelo home broker é tido como “louco” pelos amigos. “Os professores também me acham maluco”, diz, emendando uma risada.
No futuro, Gusmão, que tem como inspiração Florian Bartunek, sócio-fundador e CIO da Constellation Investimentos, pretende tirar a Certificação Nacional do Profissional de Investimento (CNPI) e a Certificação de Gestores Anbima (CGA). “Quero empreender no mercado financeiro, seja com uma gestora ou casa de análise.”
Mateus faz parte das 12.154 crianças e adolescentes de até 15 anos que investem atualmente na Bolsa brasileira e respondem por um valor detido de R$ 45 milhões, de acordo com a B3.
Isso porque corretoras já permitem a abertura de contas com o CPF da própria criança. O adulto responsável se torna o administrador da conta até a maioridade do investidor, permitindo o acesso a aplicações em ações, fundos e fundos imobiliários, por exemplo.
Também nesse grupo, Felipe Molero, 12 anos, de São Paulo, começou a investir por volta dos dez anos. O motivo? Curiosidade.
“Sempre usei muito as redes sociais, via pessoas mostrando dinheiro, mansões e carros luxuosos, e queria saber como comprar tudo”, diz. Começou, então, a ler sobre investimentos e a seguir influenciadores do mercado para aprender mais sobre o assunto.
Autointitulado “Kid Investor” e com cerca de 55 mil seguidores no Instagram e 17 mil em seu canal do YouTube, Molero também deu o primeiro passo por meio de fundos imobiliários, com o FII de shopping centers HSI Malls (HSML11), pelo fato de ter ativos próximos de sua casa.
A compra de ações começou neste ano, durante a pandemia, após a queda dos preços dos papéis na Bolsa. “Vi que tinham muitas empresas descontadas, então aproveitei”, conta.
No começo, Molero recebia cerca de R$ 50 por mês dos pais para investir. Hoje, o montante para os investimentos parte de seu canal do YouTube e de proventos recebidos das aplicações financeiras.
Na Bolsa, o setor preferido é o elétrico, como as companhias Taesa e EDP Brasil, que representam, juntas, 25% da carteira. O restante do portfólio é formado por outras 11 empresas, três fundos imobiliários e um ETF.
Apesar de hoje não ter uma parcela alocada em renda fixa, Molero conta que está pensando em montar uma reserva de emergência para quando estiver mais velho.
Ele lembra que no início foi difícil convencer os pais a deixá-lo investir. “Eles pensavam que só quem era rico podia investir e que era coisa para adultos. Mas depois que eu mostrei que entendia pelo menos o básico, eles deixaram.”
Segundo ele, o objetivo das aplicações financeiras é garantir a independência financeira, para viver de renda dos investimentos.
No mercado, tem como inspiração figuras como o investidor Luis Barsi, considerado o “rei dos dividendos”, e Ray Dalio, gestor e fundador da Bridgewater Associates, a maior e mais lucrativa gestora de hedge funds do mundo.
Quando crescer, o menino quer ter o seu próprio fundo de investimentos: “Quero ser o Ray Dalio 2.0”, brinca.
“Gostaria de ter começado antes”
O professor de programação Dhyan Carlos começou a aplicar em ações em 2017. “Investia antes, mas de forma errada, com loteamento e consórcio, porque achava que não tinha patrimônio para investir na Bolsa”, conta.
Quando abriu uma conta em corretora, começou a analisar empresas, buscar informações de relatórios, de vídeos no YouTube e outros sites. “Queria ter descoberto mais cedo como é simples”, conta Carlos, que mora em Gurupi, no Tocantins.
Por isso, quando a filha Giovana completou sete anos, Carlos não perdeu tempo e abriu uma conta para que ela começasse a investir.
Todos os meses, Giovana recebe uma mesada entre R$ 200 e R$ 300, com uma parte destinada para aplicações financeiras.
No começo, conta o pai, a menina ficou sem entender o motivo pelo qual sua mesada não chegava a ela de maneira integral. “Comecei a explicar, contando o que eram participações em empresas, que seria uma forma de investir para o futuro dela.”
Na mesa de cabeceira, destaque para livros no estilo “Pai Rico, Pai Pobre”, de Robert Kiyosaki e Sharon L. Lechter. Todo mês, Carlos senta com a filha para mostrar as ações que comprou e analisar com ela o portfólio.
“Sempre mostro a evolução patrimonial, não a rentabilidade. Acho que é mais importante pensar em ter um patrimônio que aumente durante os anos pra que ela possa viver de renda”.
Atualmente, a carteira de Giovana é formada por nove ações e três fundos imobiliários, e é dos dividendos que ela mais gosta, porque pingam frequentemente na carteira. Com os investimentos, o objetivo é custear, no futuro, o sonho de estudar fora do país.
“Investir não é fácil. Você começa de baixo e não pode desistir, ou então não vai conseguir realizar o seu sonho”, alerta a pequena investidora.
Com a família ao telefone com o InfoMoney, a filha mais nova de Carlos, Clarissa, de seis anos, escutava impaciente. Quando recebeu o celular, não pode deixar de participar. “Eu também tenho um cofrinho. Coloco moedinhas para quando eu crescer, poder investir”, contou a futura investidora.
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