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As debêntures foram o grande destaque no quesito captações neste ano, respondendo por metade das emissões vistas no mercado de capitais brasileiro, conforme dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).
Até novembro, as ofertas encerradas desses papéis totalizavam R$ 234,9 bilhões, volume 5,2% maior relação a igual período de 2021. Para 2023, as perspectivas seguem positivas, dada a conjuntura econômica e o horizonte de avanços na regulação, dizem especialistas.
Para os investidores, muitos papéis foram bons negócios. Dada a demanda também no mercado secundário – ambiente em que investidores compram e vendem ativos entre si – as debêntures mais rentáveis chegaram a valorizar 27%, conforme levantamento da Quantum Finance feito a pedido do InfoMoney (leia mais ao longo dessa reportagem).
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“Na medida em que os juros se mantenham elevados, uma sinalização que temos ouvido dos economistas, é de se esperar que 2023 seja um ano, se não tão forte, pelo menos muito parecido com 2022 para as debêntures”, diz Guilherme Maranhão, vice-presidente do Fórum de Estruturação de Mercado de Capitais da Anbima.
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Segundo ele, além da própria disposição das companhias em buscar novos recursos, será preciso monitorar a concorrência com outras alternativas de mercado, incluindo os bancos de fomento. “Outra questão no radar é como ficará o ambiente para emissões no exterior.”
No BV, que está entre os dez maiores bancos do país no ranking Anbima de renda fixa e híbridos, a perspectiva é de manutenção ou redução no volume de ofertas de debêntures em 2023. Isso porque os juros elevados também tendem a diminuir investimentos e, assim, a busca por captações, afirma Yuri Ramos, superintendente de Corporate & Investment Banking.
De acordo com ele, muitas companhias já anteciparam as necessidades para 2023. “Em contrapartida, o cenário econômico aumenta o número de novas operações para refinanciamento de passivo e permanece a tendência de desintermediação financeira e maior simplificação dos ritos regulatórios”, diz Ramos.
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Maranhão, da Anbima, concorda que o juro maior eleva os gastos das empresas, mas observa que o spread (remuneração adicional) sobre a taxa Selic melhorou ao longo de 2022. Isso representa o prêmio que as companhias têm que oferecer para atrair investidores.
“No auge da pandemia, quando o País tinha juros muito baixos, os spreads eram de dois a três pontos percentuais acima da Selic”, relembra o executivo. “Agora, com a Selic a 13,75% ao ano, vemos captações de empresas AAA [com baixíssimo risco de crédito] pagando 1,2 ponto percentual acima do juro básico.”
Maranhão ressalta ainda que, de maneira geral, os juros altos atraem recursos de investidores para fundos de renda fixa – cujos gestores, por sua vez, precisam aplicar esse dinheiro. “Isso faz com que haja um apetite maior por parte desses investidores [os fundos], que, para garantir uma alocação, acabam aceitando um spread um pouco mais baixo do que existia no passado.”
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Nova regulação no radar
Em 2023, entra em vigor a resolução 160 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que tende a beneficiar as debêntures, conforme avaliação de especialistas. O texto dispõe sobre ofertas públicas de distribuição primária ou secundária de valores mobiliários.
Atualmente, existem duas regulamentações no mercado que abrangem as debêntures: a instrução 400, para ofertas registradas na autarquia, e a 476, para as operações não registradas. Por esta última, permite-se a procura de, no máximo, 75 investidores profissionais (com mais de R$ 10 milhões em aplicações) para o lançamento dos papéis, sendo que a alocação fica limitada a 50.
Com a nova regra, que combina os dois normativos, essas amarras desaparecem. “Sem a limitação no número de investidores, a tendência é de que os lançamentos fiquem mais pulverizados, o que pode se refletir em custos melhores para os emissores, pois haverá mais concorrência na ponta”, afirma Maranhão.
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Entre outros avanços, ele cita também facilidades para emissores frequentes e a possibilidade de calibrar o volume de informações obrigatórias, dependendo do tipo de investidor.
Histórico explica desempenho de debêntures
Para entender o ambiente que permitiu números tão expressivos no mercado de debêntures neste ano, é preciso relembrar o que aconteceu em 2020 e 2021, diz o executivo da Anbima.
Há cerca de três anos, quando o novo coronavírus começou a chacoalhar as economias mundo afora, houve uma aversão a risco em escala global. Por aqui, o volume total de emissões desses títulos caiu fortemente – fechando 2020 em R$ 121 bilhões, um recuo de 34% em base anual.
Já no ano seguinte, em meio ao início do ciclo de alta da Selic, foram estabelecidos novos recordes no segmento de debêntures, tanto na originação (parcela emitida pelas empresas) quanto na distribuição (o que é comprado no mercado primário), lembra o executivo. Ao fim de 2021, o volume captado via debêntures atingiu R$ 250,4 bilhões, mais que o dobro do ano anterior.
Diante disso, o desempenho ao longo de 2022 surpreendeu a Anbima. “Não esperávamos que esse número [de 2021] se replicasse, porque o ano passado foi um período em que a renda fixa cresceu muito, em razão da elevação dos juros, que acabou direcionando um bom volume de investimentos para essa modalidade.”
Maranhão conta que o ano começou pouco animador, mas depois o ritmo acelerou. Ele observa que as debêntures são papéis normalmente emitidos por grandes empresas, um segmento que, neste ano, não acessou o mercado externo em função de alta volatilidade e do custo mais elevado.
“Companhias que usualmente captavam no mercado internacional passaram a emitir no Brasil, o que é muito positivo”, afirma. “Demonstra que estamos mais maduros para absorver essa mudança de conjuntura.”
Segundo ele, as operações seguiram em níveis elevados até aproximadamente a primeira quinzena de outubro. Em novembro, porém, as ofertas de debêntures somaram apenas R$ 8,6 bilhões, com queda de quase 60% em relação ao mês anterior, mostra o balanço da Anbima.
Maranhão explica que tal movimento ocorreu porque muitas empresas anteciparam as operações, vislumbrando uma possível turbulência por conta da eleição presidencial, além de incertezas ligadas à política econômica do próximo governo.
No recorte por setores, o banco BV destaca a participação do segmento de infraestrutura (energia, saneamento e transporte/logística) ao longo deste ano, que respondeu por aproximadamente 33% do total de emissões. Ramos afirma que o volume de novos lançamentos ainda está concentrado em grandes grupos, mas notou uma leve mudança entre as companhias menores.
“Houve um pequeno aumento no volume de operações abaixo de R$ 100 milhões, de 18% do total em 2021, para 20% em 2022 [até novembro], incluindo novos entrantes [primeira emissão]”, revela o superintendente.
Perguntado se o risco de calote em operações com debêntures seria uma questão delicada, ele avalia que a inadimplência no mercado de capitais de renda fixa é reduzida em comparação ao segmento de crédito corporativo em geral, considerando o perfil de governança dos emissores, a estrutura das operações e a exigência de qualidade de crédito pelos investidores.
As debêntures mais rentáveis de 2022
A pedido do InfoMoney, a Quantum Finance fez um levantamento das debêntures mais rentáveis em 2022. O estudo considerou apenas os ativos com PU (preço unitário) indicativo na Anbima, incluindo os que foram emitidos ou venceram durante o ano. A rentabilidade foi compilada até 7 de dezembro.
O acompanhamento revela que a taxa média de retorno desses papéis, levando em conta os 20 títulos com maior rendimento, é de 17,5%.
Confira abaixo a lista completa:
Debênture | Emissor | Emissão | Série | Data de Emissão | Data de Vencimento | Remuneração (ao ano) | Retorno em 2022 (até 07/12) |
CBAN22 | CONCESSIONÁRIA ROTA DAS BANDEIRAS | 2 | 2 | 15/11/2019 | 15/07/2027 | DI + 2% | 27,01% |
MEAL21 | INTERNATIONAL MEAL COMPANY ALIMENTAÇÃO | 1 | 2 | 15/03/2019 | 15/03/2026 | DI + 5,30% | 19,89% |
MEAL12 | INTERNATIONAL MEAL COMPANY ALIMENTAÇÃO | 2 | 1 | 10/09/2019 | 10/09/2025 | DI + 5% | 19,27% |
VNTT11 | VENTOS DE SÃO TITO HOLDING | 1 | 1 | 15/09/2015 | 15/06/2028 | IPCA + 9,24% | 18,72% |
CBAN52 | CONCESSIONÁRIA ROTA DAS BANDEIRAS | 2 | 5 | 15/11/2019 | 15/07/2034 | IPCA + 5,20% | 17,22% |
CBAN72 | CONCESSIONÁRIA ROTA DAS BANDEIRAS | 2 | 7 | 15/11/2019 | 15/07/2034 | IPCA + 5,20% | 17,18% |
MEAL11 | INTERNATIONAL MEAL COMPANY ALIMENTAÇÃO | 1 | 1 | 15/03/2019 | 15/03/2024 | DI + 4,85% | 17,05% |
AGRU12 | GRU AIRPORT | 2 | 1 | 15/10/2014 | 15/10/2026 | IPCA + 6,40% | 16,98% |
CBAN32 | CONCESSIONÁRIA ROTA DAS BANDEIRAS | 2 | 3 | 15/11/2019 | 15/07/2034 | IPCA + 5,20% | 16,98% |
AGRU21 | GRU AIRPORT | 1 | 2 | 15/02/2014 | 15/06/2025 | IPCA + 7,86% | 16,98% |
CBAN12 | CONCESSIONÁRIA ROTA DAS BANDEIRAS | 2 | 1 | 15/11/2019 | 15/07/2034 | IPCA + 5% | 16,92% |
CVCB14 | CVC VIAGENS | 4 | 1 | 18/04/2019 | 18/04/2023 | DI + 6% | 16,91% |
CCPRA3 | CYRELA COMMERCIAL PROPERTIES | 13 | 1 | 15/03/2021 | 15/03/2024 | DI + 1,75% | 16,87% |
AGRU11 | GRU AIRPORT | 1 | 1 | 15/02/2014 | 15/03/2025 | IPCA + 7,86% | 16,79% |
AGRU31 | GRU AIRPORT | 1 | 3 | 15/02/2014 | 15/09/2025 | IPCA + 7,86% | 16,50% |
UNDAC3 | UNIDAS | 13 | 3 | 10/04/2019 | 10/04/2029 | 112% do DI | 16,29% |
AGRU41 | GRU AIRPORT | 1 | 4 | 15/02/2014 | 15/12/2025 | IPCA + 7,86% | 16,11% |
VLID28 | VALID SOLUÇÕES | 8 | 2 | 10/05/2021 | 10/05/2025 | DI + 4,25% | 15,99% |
SAPR28 | SANEPAR – COMPANHIA SANEAMENTO PARANÁ | 8 | 2 | 21/06/2018 | 21/06/2023 | 108% do DI | 15,80% |
CSRN39 | COSERN – COMPANHIA ENERGÉTICA RIO GRANDE NORTE | 9 | 3 | 17/04/2019 | 15/04/2024 | 107,25% do DI | 15,79% |
Fonte: Quantum Finance
A liderança é ocupada pelas debêntures da Concessionária Rota das Bandeiras que vencem em julho de 2027, de forma isolada, com retorno estimado em 27%. A empresa administra as rodovias do chamado Corredor Dom Pedro, no Estado de São Paulo.
As duas posições seguintes no ranking são dos títulos da International Meal Company Alimentação, dona de marcas como Frango Assado, Viena e Pizza Hut. Para os papéis da empresa com vencimento em março de 2026, o rendimento é projetado em 19,9% e, nas duas emissões que vencem em setembro de 2025, a rentabilidade prevista fica em 19,3%.
Do quarto ao vigésimo lugar, os retornos variam de 18,7% a 15,8%, respectivamente, com predominância de grupos de infraestrutura, conforme pesquisa da Quantum.
Mesmo excluindo o retorno de 27% da debênture campeã, que destoa dos demais resultados, a média das 19 melhores permanece elevada, em 17% no ano.