De BB a Unipar e Taurus, mas longe do varejo: 9 acertos na Bolsa do investidor Luiz Barsi, que completa 84 anos

Atuando há 54 anos no mercado, Luiz Barsi Filho fez escolhas enfáticas - e polêmicas, em alguns casos - que renderam bons frutos (e algumas perdas)

Katherine Rivas

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Paciência, disciplina e prioridade. Adotando esses mantras, Luiz Barsi Filho, considerado um dos maiores investidores individuais da Bolsa brasileira, deixou para trás a pobreza da infância – no cortiço Quintalão do Brás, em São Paulo – para se tornar um bilionário que recebe algo como R$ 1 milhão em dividendos por dia das ações em que investe, conforme já declarou.

Conhecido como o “Rei dos Dividendos”, Barsi completa 84 anos de idade nesta sexta-feira (10), dos quais 54 foram operando no mercado – apenas um a menos que a “idade” do Ibovespa, criado há 55 anos.

Nesse tempo, Barsi já viveu épocas e governos diversos, viu o mercado acionário sofrer com crises e empresas quebrarem. Mas também viveu os tempos de bonança, de fartura de IPOs (ofertas públicas iniciais de ações), de desenvolvimento do mercado de capitais.

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Barsi começou a comprar ações no final da década de 1960, quando ainda não existia pregão eletrônico e todos os negócios ocorriam no “viva-voz”. Enquanto a maioria dos investidores se focavam nos ganhos de curto prazo, o megainvestidor colocou em prática a teoria em que acreditava: “ações garantem o futuro”.

Ele buscava comprar “boas ações, a bons preços e que pagassem bons dividendos”. Com esta estratégia, Barsi se descobriu milionário em 1976. O que considera sua maior conquista foi ter alcançado a “aposentadoria” aos 40 anos, com os dividendos de suas ações gerando renda suficiente para que ele não precisasse trabalhar. Seu patrimônio era de quase R$ 4 bilhões em 2022.

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Carteira de Luiz Barsi

Embora procurasse “acertar sete em cada dez compras de ações”, nem sempre essa proporção se manteve. Barsi acreditou em teses que se provaram acertadas no longo prazo – mas, da mesma forma, perdeu dinheiro com alguns ativos. Quais foram suas tacadas mais certeiras? E quais deram errado? Confira abaixo:

O maior acerto: Unipar Carbocloro

Segundo analistas, investir na Unipar Carbocloro (UNIP6;UNIP5;UNIP3) foi provavelmente um dos maiores acertos de Barsi, que comprou ações da companhia por R$ 0,25. Quase uma década depois, elas valiam R$ 100.

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Em entrevista ao InfoMoney em 2022, Barsi declarou que a Unipar era a maior posição da sua carteira, ocupando em média 40% do portfólio. Na sua biografia, ele afirma que foi o sucesso com Unipar que o levou a conquistar seu segundo bilhão de reais.

O megainvestidor começou a montar posição na Unipar em 2006, quando a ação custava R$ 2,10. Daniel Nigri, fundador e analista da Dica de Hoje Research, lembra que a companhia passou por uma reestruturação e transformação do seu modelo de negócios. “Em 2007, Unipar era uma empresa petroquímica, com um modelo que competia com a Braskem. Em 2010, houve uma mudança no segmento de atuação e hoje a empresa vende soda cáustica, cloro e PVC”, afirma.

Barsi já tinha acompanhado a Unipar como petroquímica e viu a companhia sofrer na crise do subprime e ser reduzida apenas a produção de cloro e soda. Nesse mesmo período, as ações caíram até o patamar de R$ 0,25. Mas ele, que considerava cloro e soda duas matérias-primas preciosas, enxergava uma distorção nesse valor.

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Nessa época, Barsi aumentou a posição, comprando ações entre R$ 0,25 e R$ 0,40, chegando a acumular 10% do capital da empresa – e, alguns anos depois, 20%.

A participação acionária lhe permitiu ter voz na Unipar e impedir uma Oferta Pública de Ações (OPA) para fechar o capital da empresa em 2017. “A Unipar tentou oferecer um valor baixo, de R$ 7,50 por ação, e Barsi falou que os papéis valiam pelo menos R$ 30”, diz Fábio Sobreira, analista da Ivest Consultoria. Como havia outros investidores insatisfeitos, a OPA não foi para frente.

Luiz Barsi Neto, assessor do MMBarsi Investimentos e um dos filhos do megainvestidor, lembra que a proposta da OPA reforçou no pai a tese de que “se alguém quer fechar capital da empresa é porque o negócio é bom”.

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Barsi não vendeu as suas ações na turbulência, e elas levaram quase uma década para valorizar, segundo sua biografia. Em 2020, a ação chegou ao patamar de R$ 100. Em 2021, os dividendos da Unipar superaram R$ 15 – e ele recebeu mais de R$ 160 milhões apenas dessa empresa.

Atualmente, Barsi tem uma participação de 20,11% nas ações da companhia. No ano passado, ele foi investigado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por suposta responsabilidade pelo uso de informação privilegiada por administrador da Unipar. O megainvestidor afirma que nada de errado foi praticado.

Banco do Brasil, empresa à prova de crise

Barsi tem ações do Banco do Brasil desde os anos 1970, quando comprou o papel a R$ 0,60. Naquele tempo, o banco tinha uma base acionária pequena, com dividendos polpudos e  bonificações que chegavam a 200%, relata em sua biografia.

Na visão do megainvestidor, nada poderia abalar um banco criado pela família real portuguesa em 1808, que por séculos acompanhou o desenvolvimento do País. Fora isso, o interesse da Previ – fundo de pensão dos funcionários da instituição – no bom desempenho do BB também era um recado. “Se o banco tinha que distribuir dividendos para manter a Previ, também era obrigado a beneficiar os outros acionistas”, diz no livro.

O banco estatal provou sua resistência nos anos 1990. Diante dos efeitos da hiperinflação que afetavam o Brasil, muitos bancos privados quebraram, mas o Banco do Brasil foi salvo.

“O BB não teve dificuldades maiores porque o Tesouro Nacional colocou o dinheiro que fosse preciso para recapitalizar o banco”, lembra Barsi Neto.

O filho do megainvestidor conta ainda que, na mesma época, seu pai fez uma reclamação ao presidente do BB em uma reunião da Apimec (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais) porque muitos bônus de subscrição que haviam sido emitidos acabaram virando pó. “Foi depois disso que o banco passou a ter uma postura mais profissional e menos política, mesmo com interferências governamentais”, aponta.

Apesar das dúvidas sobre a possibilidade de interferência política, até o momento, a aposta de Barsi no Banco do Brasil segue firme. Em 2023, mesmo após a troca de comando, com Tarciana Medeiros assumindo a presidência, a instituição manteve o payout (parcela do lucro líquido destinada a proventos) em 40%, divulgou um calendário com datas de pagamento de proventos e agradou investidores com dividendos volumosos.

“O Banco do Brasil é blindado e com menor risco de interferência do que a Petrobras. Isso porque o governo tem outros dois bancos com que brincar: a Caixa Econômica Federal e o BNDES”, afirma Flávio Conde, analista da Levante Investimentos. Para ele, o BB ainda é uma boa escolha para receber dividendos, embora as ações ainda precisem recuperar valor.

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Uma “queda” por papel e celulose

O interesse de Barsi por empresas de papel e celulose, como Klabin (KLBN4) e Suzano (SUZB3), é outro acerto identificado por analistas.

Ele começou a comprar ações da Klabin em 1970, também por centavos – ele chegou a pagar R$ 0,14 por papel. Na sua biografia, Barsi conta que sempre se sentiu atraído pela resiliência da companhia a crises inflacionárias, equilibrando exportações com o mercado interno, e também por ser uma empresa sólida, inovadora e bem gerida.

Fora isso, como a família Klabin-Lefer tinha ações e recebia dividendos, o investidor acreditava que toda a base acionária poderia ser beneficiada.

Barsi comprou ações da Suzano quando custavam R$ 3,80. Mesmo pagando dividendos menos generosos que a Klabin, ambas permanecem na carteira do investidor.

“A Klabin é uma empresa muito lucrativa apesar dos ciclos. Há anos em que ela lucra mais ou menos, paga mais dividendos ou destina mais recursos para investimentos, tem um endividamento maior ou menor. Mas a companhia cresceu ao longo do tempo”, afirma Nigri.

Barsi também viveu boas histórias com empresas do setor que já não existem. É o caso da Papel Simão, conhecida como Simon Paper, que comprou nos anos 1970 e manteve por mais de uma década. O lucro que obteve com a valorização e dividendos permitiu que o megainvestidor comprasse um apartamento em Mongaguá, no litoral paulista, transformada em pousada que recebeu o ticker da empresa – PSI4 – como nome, recorda seu filho.

Eletrobras, Eternit, Taurus e Cielo

Barsi também é conhecido por abraçar teses controversas. Conde lembra o caso da Eletrobras, cujas ações tombaram de R$ 26 para R$ 3,50 quando, no governo de Dilma Rousseff, foram antecipadas as renovações de concessões das geradoras de energia. Barsi aumentou a posição na companhia, brincando que “Dilma merecia um beijo na boca por deixar a ação tão barata”.

Mesmo depois de privatizada, Barsi ainda tem algo como 3 milhões de ações da Eletrobras, segundo sua biografia. Para Conde, a empresa ainda tem potencial a se provar nos próximos cinco anos.

Já quando se fala de reestruturação, outras grandes conquistas de Barsi foram Eternit e Taurus. A primeira, ele começou a comprar nos anos 2000, quando a companhia era conhecida como “ação de viúva”, de tantos dividendos que pagava. Até 2010, a Eternit distribuía 10% do valor das ações em proventos, conta Barsi na biografia.

Mas a empresa sofreu com a proibição do amianto e chegou a entrar em recuperação judicial em 2017, tendo que reformular seu modelo de negócios. Diante da queda dos preços, Barsi aumentou a posição, comprando a ação por R$ 2.

Depois que saiu da RJ, o papel da companhia chegou aos R$ 34. Barsi vendeu uma parte, mas manteve 4% de participação na empresa, que também voltou a pagar dividendos.

No caso da Taurus, a história foi semelhante. Ele investiu na companhia quando as ações custavam centavos e se beneficiou dos dividendos até 2013. Depois, passou por um processo de reestruturação, mas Barsi seguiu acreditando na companhia.

Em 2022, a Taurus pagou $ 1,62 por ação. Para 2023, Nigri afirma que a fabricante de armas deve ser uma das maiores pagadoras de dividendos da Bolsa. O mercado espera que novos proventos sejam anunciados no balanço de 21 de março.  A Taurus também promete criar uma política de dividendos trimestrais.

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Sobreira lembra que a Cielo (CIEL3) foi outro caso de sucesso de Barsi. Ele explica que a companhia tinha praticamente o monopólio do mercado de “maquininhas” de cartão, mas na pandemia viu concorrentes avançarem, o que afetou a receita e os dividendos.

A companhia precisou se reinventar, inovando nas soluções, mas também baixando os preços dos seus serviços para se tornar mais competitiva.

Barsi começou a comprar ações da Cielo em 2016, mas acelerou as compras em 2021, quando a cotação tinha tombado de R$ 24 para R$ 2. Sua meta era ter 20 milhões de papéis da companhia, e até o ano passado tinha alcançado 13 milhões. “Na Cielo, confio na capacidade inovadora da empresa e seu potencial de deixar a concorrência para trás”, diz na biografia.

Nada de varejo na carteira

Desde que começou a investir na Bolsa, Barsi mantinha distância de alguns setores que considerava sensíveis, como varejo, companhias aéreas, turismo, saúde e até transportes.

Embora tenha acumulado críticos por desprezar empresas como Magazine Luiza (MGLU3), tida como “queridinha” do mercado até poucos anos atrás, ter deixado o varejo fora da carteira parece ter sido uma boa escolha. A recente crise da Americanas (AMER3), que revelou uma fraude contábil em janeiro deste ano, ajudou a contaminar a percepção sobre a saúde financeira de outras empresas do setor.

Exatamente no aniversário do “Rei dos Dividendos”, o dia é de mercado em polvorosa com empresas do varejo. A Magazine Luiza informou que apura uma denúncia anônima sobre desvios de conduta em práticas comerciais, especificamente envolvendo bônus relacionados a compras de fornecedores. A denúncia menciona três deles, que representaram cerca de 3,5% do valor total de compras de mercadorias pela empresa em 2022.

Já a Via (VIIA3) teve de lidar com as consequências da renúncia de Helisson Lemos, vice-presidente de Inovação Digital, também anunciada hoje. As notícias derrubaram os preços não apenas das duas empresas, mas do setor como um todo.

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O “Rei dos Dividendos” também erra; mas quando?

Mesmo com grandes acertos no currículo de investidor, Barsi acumula também algumas escolhas ruins.

Barsi Neto lembra que o pai era conhecido como o “bancólogo da Bolsa”, porque tinha vários bancos na carteira – além de BB e Santander, também investiu em Banco Econômico, Banco Nacional, Banco do Progresso e Banco Bandeirantes.

Nos anos 1990, todos esses bancos quebraram ou deixaram de existir. Na sua biografia, Barsi conta que foi a primeira vez que sentiu que precisava “cortar gastos” e teve sua renda mensal afetada.

Apenas o Banco Econômico pode ainda render algo ao megainvestidor: após 26 anos, a instituição saiu da liquidação extrajudicial ao ser adquirido pelo BTG, e suas ações estão em vias de ser canceladas, o que deve devolver alguns reais aos antigos investidores como Barsi, explica seu filho.

Ele também não teve muita sorte no setor de telecomunicações. Em 2012, quando a Oi (OIBR3) fez a promessa de pagar R$ 2 bilhões em dividendos e mais R$ 8 bilhões até 2015, Barsi comprou papéis da companhia. Só depois percebeu que a empresa não tinha resultado suficiente para tantos proventos.

“Ele soube que a Oi iria fazer empréstimo para honrar com os dividendos e aquilo acendeu um sinal de alerta”, conta Barsi Neto, filho do investidor. Em 2014, Barsi se desfez das ações da Oi com prejuízo. Mas o dano foi limitado, dado que as ações quase viraram pó com os dois processos consecutivos de recuperação judicial anos depois. 

Barsi teve prejuízo também com as ações da Telmex, as quais se recusou a vender em uma OPA, mantendo 171 ações de uma empresa de capital fechado.

Recentemente, Barsi acreditou em outras duas teses controversas, ainda questionadas pelo mercado: a resseguradora IRB (IRBR3) e a Paranapanema (PMAM3), do segmento de cobre. A primeira teve um escândalo contábil desvendado em 2020 e está processo de reestruturação.

No começo de 2022, Barsi tinha 2% de participação na resseguradora. “A IRB pode ser a Unipar do futuro, mas não é o tipo de ação que se enquadra no perfil da maioria de pessoas físicas”, comenta Nigri. Barsi conseguiu indicar sua filha Louise Barsi para o Comitê de Auditoria da resseguradora. Apesar da desconfiança do mercado, Barsi se mantém firme: “Quem não comprar IRB vai se arrepender”, costuma dizer.

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A Paranapanema, que pediu recuperação judicial em dezembro de 2022, também enfrenta maus bocados. Barsi tem 5,33% das ações da empresa.

Ambas as teses ainda não tiveram um desfecho e, segundo analistas, embora pareçam erradas, ainda precisam se provar nos próximos anos. Será que o “Rei dos Dividendos” acertou?

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Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.