Curva de juros invertida nos EUA preocupa investidores, mas especialistas divergem sobre prenúncio de recessão americana

Movimento tradicionalmente indica chance de retração da economia à frente, mas estímulos fiscais concedidos por BCs podem ter mudado a dinâmica

Bruna Furlani

(Shutterstock)
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Para além das notícias envolvendo a guerra entre Rússia e Ucrânia, quatro palavras estão causando frisson entre os agentes financeiros nesta semana: curva de juros invertida.

Na prática, o fenômeno ocorre quando os juros oferecidos por títulos de curto prazo ultrapassam o rendimento oferecido pelos papéis de vencimento mais longo. É um movimento contraintuitivo, pois usualmente papéis de prazo maior pagam retornos mais robustos, já que estão mais suscetíveis ao risco.

No Brasil, uma inversão da curva de juros aconteceu no final de 2021, quando manobras do governo para estourar o teto de gastos elevaram as preocupações com a situação fiscal do País.

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Agora, foi a vez dos Estados Unidos. Nesta segunda-feira (28), pela primeira vez desde 2006, o rendimento do título do Tesouro americano (treasuries) com vencimento em cinco anos alcançou 2,56% e superou a taxa oferecida pelo papel com vencimento em 30 anos, de 2,55%.

No mesmo dia, o rendimento oferecido pelo título com vencimento em dois anos também terminou maior do que o retorno pago pelo papel com prazo de dez anos – o que não ocorria desde agosto de 2019. Outras partes da curva de juros já tinham ficado invertidas no começo do mês.

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Apesar de o movimento não ser exatamente uma novidade, a grande preocupação de analistas está nos sinais que a inversão da curva pode indicar. Isso porque, historicamente, tal fenômeno indicou que uma recessão estava por vir. O ponto é que agora não há um consenso entre especialistas sobre essa visão.

Em entrevista à Bloomberg TV, Erin Browne, gestora de fundos na Pimco, defendeu que esses conceitos talvez sejam prematuros e que a inversão na curva pode não ser mais um indicativo confiável de que uma recessão se avizinha.

A razão, explicou a executiva, é que a enorme quantidade de dinheiro injetada por meio de políticas de afrouxamento quantitativo – compra de títulos pela autoridade monetária – durante a pandemia pode ter mudado essa dinâmica.

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No caso do Federal Reserve (Fed), banco central americano, por exemplo, a compra foi iniciada em 2020 e em novembro de 2021 e a autoridade monetária anunciou a redução do programa de compra de títulos.

“Há razões para acreditar que, desta vez, a inversão da curva de juros pode não ser um indicador tão bom quanto no passado, principalmente devido ao enorme afrouxamento quantitativo realizada pelos bancos centrais globais”, disse a gestora da Pimco. “O que provavelmente é mais crítico agora é realmente ver o porquê de a curva de juros estar se invertendo e algumas das peculiaridades em torno dessa inversão em relação aos períodos anteriores”, completou.

Os temores dos investidores cresceram nos últimos dias porque aumentou também a preocupação de que o aperto monetário que a ser feito pelo Fed terá que ser mais duro para controlar o rápido avanço da inflação, o que pode pesar sobre os gastos dos consumidores e sobre a atividade empresarial.

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Apesar das dúvidas em torno de qual será o impacto de políticas monetárias adotadas na pandemia e a sua relação com a curva de juros, Erin destacou que é bastante importante que o investidor esteja posicionado agora em ações de empresas de maior valor de mercado (large caps).

“Você quer estar em empresas que tenham alta geração de fluxo de caixa livre, que tenham balanços sólidos e que sejam capazes de resistir a períodos de fraqueza econômica”, disse Erin.

Ela não está sozinha. Em entrevista à rede americana CNBC na última segunda-feira (28), Mohamed El-Erian – economista, presidente do Queens’ College da Universidade de Cambridge e ex-CEO da Pimco – disse que o avanço dos juros pelo Fed pode direcionar os investidores para as ações, que têm se mostrado “incrivelmente resilientes”.

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Segundo ele, apesar do cenário mais complicado, as bolsas do país estão se segurando bem porque o consumo e o mercado de trabalho americanos estão sustentando a economia, além do que as condições financeiras seguiram favoráveis.

Ainda que considere as ações uma boa opção para o atual momento, apesar da inversão da curva de juros, El-Erian reconhece que a postura do Fed gera preocupação. “O mercado de títulos acredita que a inflação esteja muito alta e que o Fed esteja bem atrás da curva. Com isso, há um risco de que o Fed tenha que colocar a economia em recessão, enquanto ele tenta recuperar esse atraso”, destacou.

De acordo com o ex-CEO da Pimco, o banco central americano tentará conter a inflação por meio de altas de juros que poderão sufocar o crescimento econômico. Nesse sentido, El-Erian continua cauteloso por causa da grande incerteza que deve dominar os mercados, inclusive o de títulos.

Hora de comprar bancos

Com a inversão da curva de juros, o Bank of America (BofA), manteve a recomendação acima da média de mercado (overweight) para papéis do setor financeiro.

Em relatório, Savita Subramanian, estrategista do banco, afirmou que manteve a recomendação no setor porque ele oferece proteção contra a inflação, está mais focado no mercado doméstico do que outros setores mais cíclicos e apresenta baixo endividamento e volatilidade de lucros.

A especialista defendeu ainda que a correlação entre os lucros dos bancos presentes no S&P 500 e as curvas de juros eram de cerca de 80%, na década de 1990, mas que caíram para algo como 17%, desde 2000.

Savita chamou a atenção também para o fato de que, historicamente, o setor financeiro performou acima da média do mercado durante metade do tempo em que houve algum tipo de inversão na curva.

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