Colunista InfoMoney: O papa e a crise

A busca do lucro é inerente ao sistema e estará presente em todas as fases dos ciclos econômicos. Não é esta a causa das mazelas do planeta

João Alberto Brando

A mais recente encíclica do papa Bento XVI “Caritas in Veritate” (“Caridade na Verdade”) trata sobre o desenvolvimento humano. E como não podia deixar de ser, aborda temas contemporâneos como a atual crise econômica. Sobre ela, o papa é assertivo: a crise do sistema econômico é fruto da busca exacerbada do lucro.

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Sem dúvida que a busca do lucro gerou a crise, mas é inquestionável que a procura incessante pelo lucro também será a causa da recuperação econômica que ocorrerá. A busca do lucro é inerente ao sistema e estará presente em todas as fases dos ciclos econômicos. Não é esta a causa das mazelas do planeta.

O sistema provoca desigualdade e é injusto? Sem dúvida. Mas não se pode negar que continua sendo o melhor sistema. Qualquer mecanismo econômico que parta da premissa de ser igualitário é utópico e insustentável. Já é notório que mesmo com todos os ganhos de produtividade, os recursos do planeta não são suficientes para atender satisfatoriamente toda a população do mundo.

“É muito cômodo culpar os empresários e banqueiros pelas mazelas do planeta”

Só para exemplificar, caso dividíssemos de forma igual estes recursos entre todos os habitantes do globo, poderíamos chegar a uma situação na qual não sobrariam recursos, por exemplo, para as pessoas assinarem serviços de internet e acessarem este site que você está lendo agora. Só isto tornaria a manutenção de portais de internet algo sem sentido e os profissionais que trabalham nestes sites já perderiam seus empregos. Isto é sustentável?

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O papa, em sua encíclica, parece reconhecer isto e argumenta que falta ao sistema agir, na busca do lucro, de forma mais ética, caridosa e ambientalmente sustentável. Nada mais justo e oportuno. Mas ilude-se quem acha que este conselho deva ser acatado e seguido espontaneamente pela figura impessoal do “sistema” ou pelos líderes e dirigentes das grandes corporações capitalistas. Estes são meros maximizadores de lucro dentro dos limites impostos pelo mercado. E o mercado é formado pelos consumidores.

O conselho do papa deveria, então, ser seguido por todos. Nenhum capitalista passará a buscar o lucro de forma sócio-ambientalmente sustentável se ele não for incentivado para tanto. E este incentivo só surgirá quando isto for exigido por seus consumidores.

É muito cômodo culpar os empresários e banqueiros pelas mazelas do planeta. Mudar de atitude e reconhecer a parcela de culpa de cada um deve dar muito trabalho. Pois, parece ser mais fácil continuar jogando papel na rua e comprando DVD pirata…

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João Alberto Peres Brando é economista e escreve mensalmente na InfoMoney, às sextas-feiras.
joao.brando@infomoney.com.br