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Após uma semana de perdas, o Bitcoin (BTC) voltou a dar uma guinada na quarta-feira (26) e, embora tenha passado por alguns solavancos, está mais uma vez perto do patamar dos US$ 30 mil. Para alguns analistas, este é o nível chave para a criptomoeda: se rompê-lo com confiança, pode buscar novos ares rumo a preços não vistos há quase um ano.
Mas, mesmo que isso não aconteça agora, investidores de ativos digitais não podem reclamar do desempenho do BTC em 2023. Com o salto mais recente, sua valorização no ano ultrapassa mais uma vez a casa dos 70%, sustentando os ganhos do primeiro trimestre de 2023.
Nos primeiros três meses do ano, nenhuma outra classe de ativo, incluindo ouro, petróleo, dólar e diversos índices acionários, entregou tanto retorno quanto o Bitcoin. No entanto, isso significa que os investidores também voltaram? Segundo fontes e dados consultados pelo InfoMoney, o dinheiro de 2021 ainda não está de volta em produtos regulados, mas o ambiente interno do setor pode estar melhor do que se imagina após as turbulências do ano passado.
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Aportes secaram
Quem apostou em cripto durante o período de alta entre 2020 e 2021 fugiu desse mercado após as diversas crises de 2022. Após o colapso das criptomoedas TerraUSD e Luna (cujos fundadores começaram a responder na Justiça), a falência do relevante hedge fund Three Arrows Capital e a queda da FTX, pouca gente ficou para contar a história, e os que ficaram não colocaram a mão no bolso — ou pelo menos é o que mostram os números.
No primeiro trimestre do ano, nem a “rentabilidade de pirâmide” do Bitcoin no período fez os investidores recuperarem o apetite para alocar em produtos com exposição a criptoativos. Segundo levantamento realizado pela Economatica a pedido do InfoMoney, a captação líquida de fundos de investimento e fundos de índice (ETFs) que investem em criptos foi majoritariamente negativa nos primeiros meses do ano. Os produtos, portanto, tiveram mais resgates do que aportes enquanto o mercado subia.
Em dezembro de 2022, os 20 fundos e ETFs que mais perderam dinheiro registraram captação líquida combinada de quase R$ 100 milhões negativos, em movimento refletindo ainda o pessimismo em torno da derrocada da FTX e o ambiente de “caça às bruxas” que se instalou nos Estados Unidos após o episódio.
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As perdas, no entanto dispararam para praticamente R$ 140 milhões no mês seguinte, mesmo com o início da alta do Bitcoin. O movimento voltou a arrefecer em fevereiro, justamente quando a subida do BTC esfriou, mas deslanchou na sequência. Quando o Bitcoin chegou ao fim de março como o melhor ativo do mundo no trimestre em termos de retorno, os produtos de investimento no Brasil registraram perda líquida superior a R$ 108 milhões.
Os números não indicam uma preferência do investidor, já que os produtos que mais perderam foram os fundos e ETFs mais populares.
Oportunidade de saída?
O ritmo de resgates em descompasso com o desempenho chama atenção, levantando a possibilidade de os investidores terem visto na valorização do Bitcoin uma oportunidade de saída.
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“Esse é o principal, é engraçado. Acho que o investidor que tinha perdido 80% do dinheiro e, em situação apertada, viu o preço voltar e pensou: ‘agora só perdi 50%, deixa eu colocar um pouco no bolso'”, explica Alexandre Ludolf, diretor de investimentos da QR Asset.
Segundo o executivo, o cenário também pode ser explicado por uma tendência entre investidores brasileiros que dão demasiada atenção para o retorno anual dos investimentos na hora de compor a carteira. Quem tem uma visão de mais longo prazo, conta Ludolf, acaba vendo o Bitcoin ainda perdendo para a renda fixa nos últimos 12 meses.
“No Brasil, o que direciona os novos aportes é quando as janelas de 12 meses ficam positivas. E cripto ainda não está nisso. A gente está, talvez, no pior momento da janela. Apesar de ter subido muito agora no primeiro trimestre, a gente tem um movimento ruim ainda no passado”, ressalta.
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“O investidor brasileiro está cansadíssimo de perder dinheiro”, opina Alexandre Vasarhelyi, gestor e sócio da BLP Crypto. “O ano de 2022 foi muito ruim para o investidor brasileiro, então ele ainda está em um momento de ver o que tem para vender do portfólio. Quando você está com problemas, não é o momento de tomar mais riscos”.
Confira a captação líquida dos fundos e ETFs com exposição a criptoativos que mais perderam dinheiro entre dezembro de 2022 e março de 2023:
Nome | Produto | Capt. Líq. em Dez de 2022 (em milhares) |
Capt. Líq. em Jan de 2023 (em milhares) |
Capt. Líq. em Fev de 2023 (em milhares) |
Capt. Líq. em Mar de 2023 (em milhares) |
Hashdex Nasdaq Crypto Index Fundo Indice | ETF | -R$ 25.140 | -R$ 90.992 | -R$ 39.491 | -R$ 40.631 |
Hashdex Criptoativos I FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 16.220 | -R$ 11.865 | -R$ 10.285 | -R$ 13.732 |
Hashdex 20 Nasdaq Crypto Ind FICFI Mult | Fundo multimercados | -R$ 15.981 | -R$ 11.876 | -R$ 9.836 | -R$ 13.669 |
Hashdex 40 Nasdaq Crypto Ind FICFI Mult | Fundo multimercados | -R$ 10.602 | -R$ 7.530 | -R$ 6.084 | -R$ 10.392 |
Hashdex Criptoativos II FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 11.795 | -R$ 7.400 | -R$ 6.598 | -R$ 9.818 |
Qr Cme Cf Bitcoin Reference Rate Etf Ie | ETF | -R$ 2.564 | -R$ 1.381 | -R$ 1.858 | -R$ 5.579 |
Empiricus Criptomoedas Fc FI Mult Ie | Fundo multimercados | -R$ 3.472 | -R$ 1.800 | -R$ 2.440 | -R$ 2.313 |
Vtr Qr Cripto FI Mult Ie | Fundo multimercados | -R$ 5.464 | -R$ 914 | -R$ 958 | -R$ 2.095 |
Hashdex Bitcoin I FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 2.240 | -R$ 813 | -R$ 1.050 | -R$ 1.860 |
Hashdex Bitcoin Fc FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 2.293 | -R$ 697 | -R$ 1.117 | -R$ 1.677 |
Vitreo Cripto Metals Blend FIC Mult | Fundo multimercados | -R$ 1.259 | -R$ 1.873 | -R$ 1.360 | -R$ 1.635 |
Hashdex 100 Nasdaq Crypto Ind FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 3.502 | -R$ 1.059 | -R$ 1.820 | -R$ 1.001 |
Mercurius Crypto Value – FI Mult Ie | Fundo multimercados | R$ 1.246 | R$ 1.187 | R$ 149 | -R$ 816 |
Hashdex Criptoativos III FI Mult Ie | Fundo multimercados | -R$ 170 | -R$ 1.444 | -R$ 560 | -R$ 701 |
Hashdex Crypto Metaverse Fundo de Indice | ETF | R$ 0 | R$ 0 | R$ 0 | -R$ 651 |
Hashdex 40 Nasdaq Crypto I Prev FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 67 | -R$ 561 | R$ 17 | -R$ 539 |
Ivi Crypto Quant FI Mult Ie | Fundo multimercados | R$ 0 | R$ 20 | -R$ 10 | -R$ 500 |
Titanium Cripto Galaxy FI Mult Ie | Fundo multimercados | R$ 391 | R$ 20 | R$ 190 | -R$ 487 |
BTG Pactual Reference Bitcoin 20 FI Mult | Fundo multimercados | -R$ 171 | R$ 70 | -R$ 299 | -R$ 349 |
BTG Pactual Refer Bitcoin 100 FI Mult Ie | Fundo multimercados | -R$ 203 | -R$ 363 | -R$ 63 | -R$ 305 |
Total | -R$ 99.506 | -R$ 139.270 | -R$ 83.474 | -R$ 108.750 |
Domínio dos rentistas
Independentemente do motivo por trás da corrida de resgates em produtos de criptoativos, a explicação para a falta de mais aportes é simples: a Selic em seu nível mais alto desde 2016, a 13,75%, ainda atrai a maior parte dos investidores para a renda fixa, a despeito da disparada de preços dos ativos digitais.
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“O dinheiro ainda não apareceu porque ainda temos 14% de juros”, diz Ludolf, da QR Asset. “O brasileiro é muito sensível ao rentismo, essa ideia do CDI alto. Quando a percepção de juros cair, a gente não tiver aquele 1% ao mês mais no mercado, eu acho que as pessoas voltam a colocar dinheiro em risco. Mas isso é um pouco mais para o segundo semestre”.
A análise de Diogo Silvestre Scariot, head de criptoativos da Alta Vista Investimentos, é semelhante. O gestor ressalta a expectativa de agentes de mercado para que a Selic recue para 12,5% final do ano, e para 10% ao fim de 2024, segundo o relatório Focus do Banco Central. “O investidor brasileiro é ainda o da poupança, da renda fixa. A partir do momento que a gente tiver os juros caindo, estabilizando, vai haver um fluxo muito mais pesado do investidor brasileiro para ativos de risco”, avalia.
“O investidor estrangeiro tem um gatilho muito parecido, com a inflação na Europa e nos Estados Unidos pressionando por mais tempo do que se previa, então as taxas de juros tiveram uma pressão de subida mais forte do que se esperava. Logicamente, faz o comportamento do fluxo de dinheiro institucional e fluxo de dinheiro dos investidores pessoa física também ficarem mais tímidos para ativos de risco”, destaca.
Dinheiro não veio, mas setor cresceu
Os produtos regulados com exposição a criptoativos não estão vendo aportes, mas o número de cotistas dos principais ETFs do setor não caiu na mesma proporção do recuo nos preços em 2022. Embora ainda haja saída de investidores, o ETF de criptomoedas HASH11, por exemplo, se mantém como o segundo maior da B3.
Informações recebidas pela Receita Federal de corretoras de criptomoedas também apontam um crescimento substancial na quantidade de investidores brasileiros. Em fevereiro, último mês apurado pelo órgão, houve 1,1 milhão de CPFs envolvidos em negociações de ativos digitais — ligeiramente mais que os 1,06 milhão de dezembro, mas o triplo de um ano atrás.
Para especialistas, há vários sinais de que, apesar dos investimentos não terem ganhado tração em 2023, a indústria como um todo segue crescendo.
“Começamos a ter atividade de fusão e aquisição no mercado de cripto. Quando acabou a FTX, havia uma parcela não desprezível no mercado que achava que podia ser o fim da indústria, que ia ser uma bomba nuclear, que ia levar a indústria para uma Era do Gelo. Foi um inverno e, embora eu não diga que a gente já esteja no verão, estamos talvez entrando numa primavera”, destaca o diretor da QR Asset.
Segundo dados consolidados pela casa de research Glassnode, especializada em criptoativos, o ritmo de adoção de Bitcoin se mantém em níveis altos, em cerca de 122.000 novos usuários por mês. Esse volume só foi superado em dois momentos na história do ativo digital: nos picos de preço de 2017 e 2021.
Luz no fim do túnel
O retrato pintado pela situação dos fundos regulados pode não ser o mais fiel dado o caráter marginal da nova classe de ativos. Globalmente, a entrada líquida de stablecoins em exchanges de criptomoedas, um dos principais termômetros de apetite do investidor, atingiu em março seu maior nível desde maio de 2022, pouco antes do mercado iniciar sua derrocada: US$ 6,77 bilhões.
Não há dados segmentados especificamente do Brasil sobre os fluxos nas bolsas de ativos digitais. No entanto, números divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) também mostram tendência de alta.
Segundo levantamento do órgão, brasileiros importaram US$ 1,4 bilhão em criptomoedas nos primeiros dois meses deste ano, montante 40% superior ao registrado no mesmo período do ano passado. A importação de criptoativos, segundo o Ipea, ocorre quando a propriedade de um ativo digital passa de um não residente no país (vendedor) para um residente (comprador).
Esse volume vem crescendo ano a ano, mesmo diante da crise no setor no ano passado. Em 2021, as importações deram um grande salto de 80%, e chegaram a US$ 5,9 bilhões. Em 2022, o valor de criptos negociadas subiu mais 27% e bateu os US$ 7,5 bilhões, o maior já registrado.
“A gente passou por um bear market em cripto maior do que nos últimos ciclos, mas temos um potencial do halving no ano que vem, quando a remuneração dos mineradores de Bitcoin cai pela metade”, pondera o diretor de investimentos da QR Asset.
“Isso foi um driver de preço importante, provocou um ciclo de expansão um pouco mais longo. Então, eu não diria que essa festa já está perto do fim. Eu vejo [em breve] o movimento se estabilizando, cripto conseguindo continuar subindo, mais clientes entrando, e institucional voltando devagarinho. Nesse próximo trimestre, até meados do segundo semestre, isso vai mudar muito”.