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A contradição até surpreende, pelo menos 4811 cotistas que buscam produtos ESG (ambiental, social e de governança) estão investindo em Americanas (AMER3) – consciente ou inconscientemente – por conta da exposição dos ETFs (fundos de índices) escolhidos.
Os dados são fruto de um levantamento feito pelo InfoMoney, com base no número de cotistas que os ETFs classificados como ESG apresentavam até dezembro, segundo o Boletim Mensal da B3.
Entre estes figuravam o ESGB11, gerido pelo BTG Pactual Asset Management, com 704 investidores – entre institucionais e pessoas físicas. O fundo replica o desempenho do índice S&P/B3 Brasil ESG e até o dia 17 de janeiro a cesta do ETF tinha a presença de Americanas, com 0,27% de peso. O peso da companhia na carteira do ETF já apresentou uma redução considerável desde o dia 12 de janeiro, quando sua participação era de 1,65%.
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No ETF ISUS11, do Itaú, eram 1854 cotistas que estavam aplicando seus recursos em uma empresa anti-ESG sob o slogan de ESG. O motivo é que o fundo replica o desempenho do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que ainda possui Americanas na carteira, mas que está avaliando a sua exclusão, conforme explicaremos no decorrer da reportagem.
No dia 17 de janeiro, o peso da AMER3 na cesta do ISUS11 era de 0,33%. Das 100 mil cotas que integram a cesta do ETF, 5300 representavam Americanas.
Quando o assunto é apenas o pilar de Governança Corporativa, o ETF GOVE11, também do Itaú, também oferece Americanas aos seus cotistas, embora com participação ínfima de 0,06%. O fundo possui 2187 investidores e replica o desempenho do Índice de Governança Corporativa Trade – IGCT, calculado pela B3.
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Por meio deste ETF, os investidores estariam alocando seu dinheiro em empresas do Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2 de governança corporativa, reconhecidas pelas boas práticas de governança.
Ainda na lista tem o novato ELAS11, com 11 meses de vida. O ETF gerido pelo Banco Safra, replica o índice Teva Mulheres na Liderança e tem como foco escolher empresas com maior presença feminina na diretoria e nos Conselhos e Comitês.
No rebalanceamento do dia 6 de janeiro, a ação da Americanas (AMER3) ingressou na carteira do índice, com peso de 0,6%. Mas no dia 17 de janeiro, o peso era de 0,01%. O ELAS11 ainda tem poucos cotistas, até dezembro eram 66.
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À primeira vista os investidores parecem estar comprando gato por lebre, afinal faria sentido investir em Americanas quando os ETFs se destacam por empresas que respeitam os pilares ESG?
Fabio Alperowitch, sócio fundador da Fama Investimentos e uma das vozes ativas no debate ESG, afirma que Americanas é protagonista de um dos maiores escândalos da história do mercado de capitais, com dimensão relevante na escala global.
Para ele, o ocorrido com a companhia é um fraude, provocado por uma cultura tóxica e “obcecada por resultados”, um dos valores da Americanas. Mas ele destaca que embora discrepante, os gestores destes ETFs pouca coisa podem fazer, dado que por se tratar de uma estratégia passiva eles precisam replicar exatamente os índices escolhidos. “Enquanto Americanas fizer parte destes índices, o ETF vai precisar replicar, gostando do que tem lá ou não”.
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O InfoMoney procurou as gestoras responsáveis pelos ETFs, a Itaú Asset e BTG Pactual Asset. Ambas confirmaram que, por se tratar de fundos de gestão passiva, não haveria muito o que fazer.
A reportagem solicitou ainda aos gestores um posicionamento, com questionamento sobre o quanto estariam confortáveis em oferecer exposição a Americanas aos seus cotistas nestes ETFs ESG. Em relação a esse ponto, os gestores também preferiram não se manifestar a respeito.
ETFs ESG com AMER3 na carteira
ETF | Índice Replicado | Participação de Americanas na cesta | Nº cotistas | Gestão | Desempenho em 2023 |
ESGB11 | Índice S&P/B3 Brasil ESG | 0,27% | 704 | BTG Pactual Asset | 2,62% |
ISUS11 | Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) | 0,33% | 1854 | Itaú Asset | 0,06% |
GOVE11 | Índice de Governança Corporativa Trade (IGCT) | 0,06% | 2187 | Itaú Asset | 1,51% |
ELAS11 | Índice Teva Mulheres na Liderança | 0,01% | 66 | Safra Asset | 0,80% |
Fonte: Levantamento InfoMoney com B3, Economatica e informações dos ETFs. Dados até 17 de janeiro de 2023
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Na mão dos índices
Como os ETFs são fundos de gestão passiva, a responsabilidade recai sobre os índices ESG e os provedores destes, no caso a B3, S&P Dow Jones Índices e Teva Índices.
Em relação ao Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da B3, o presidente da Bolsa, Gilson Finkelsztain destacou, em conversa com jornalistas, que o processo de avaliação para possível exclusão de Americanas já começou. A companhia já foi notificada, segundo Finkelsztain, e terá um prazo de até 15 dias para responder, depois a B3 deve avaliar se a empresa fica ou não fica no índice.
O ISE seria o único índice da Bolsa que permite fazer essa avaliação de casos controversos, de acordo com o presidente da B3. Na sua nova metodologia, que entrou em vigência em 2022, o ISE conta com apoio de monitoramento do RepRisk, um fornecedor internacional que coleta dados e informações públicas sobre riscos ambientais, sociais e de governança corporativa.
A metodologia destaca ainda que se uma empresa vir a ser excluída do ISE, não poderá integrar a carteira do índice pelos dois anos seguintes, contados a partir do primeiro rebalanceamento de sua exclusão. Caso a empresa solicite e mostre evidências de melhoria na gestão dos seus riscos, o prazo pode ser reduzir a um ano.
Além do ISE, a empresa está presente em 4 índices de Governança Corporativa, que tem como provedora a B3, são eles:
- Índice de Ações com Governança Corporativa Diferenciada (IGC);
- Índice de Ações com Tag Along Diferenciado (ITAG);
- Índice de Governança Corporativa Trade (IGCT) – seguido pelo ETF GOVE11;
- Índice de Governança Corporativa – Novo Mercado (IGC-NM).
Em todas as metodologias destes índices não existe uma avaliação ou comitê que permita a exclusão da companhia se comprovado casos de fraude ou posturas que infrinjam a governança corporativa das empresas.
O único critério que faria com que Americanas abandone estes índices de governança imediatamente seria a companhia entrar em Recuperação Judicial. De acordo com as metodologias, neste caso ela precisaria ser excluída ao final do primeiro dia de negociação nesse novo enquadramento.
A companhia também não pode ser excluída do Novo Mercado, segmento da Bolsa conhecido por ter as melhores práticas de governança, explica Finkelsztain da B3.
“Não cabe ao Novo Mercado avaliar se o comitê de auditoria é bom ou ruim. O Novo Mercado não se propõe a ser invasivo e sim dar um patamar mínimo de governança aos acionistas”, apontou em conversa com jornalistas.
Segundo o presidente da B3, em caso de recuperação judicial, a companhia também deixaria o Novo Mercado, mas não há uma regra que prevê exclusão por escândalos ou fraudes.
“Esse é um assunto que pode ser discutido na próxima reforma das regras do Novo Mercado”, disse o presidente da Bolsa, salientando que ainda não há uma data para isso acontecer.
Para Fábio Alperowitch é importante o investidor ter claro que os Índices de Governança não são compostos necessariamente por empresas que têm uma boa governança, assim como os índices de sustentabilidade, não são sinônimos de empresas com boa sustentabilidade.
“A gente precisa chamar as coisas pelos nomes. O problema é que as pessoas têm um entendimento errado sobre os índices”, afirma.
Segundo o gestor da Fama Investimentos, é um absurdo ainda considerar que o Novo Mercado é um selo de virtude e boa governança, algo errado.
Em relação as regras de exclusão dos índices, ele destaca que apesar de não serem coerentes com os pilares ESG são as regras existentes, desta forma se não está prevista a exclusão de companhias em caso de fraude ou escândalos, Americanas não poderia ser excluída. “Eu acho que é a regra dos índices que está errada”, avaliou.
Fora os índices dos quais a B3 é provedora, tem também o Índice S&P/B3 Brasil ESG, de responsabilidade da S&P Dow Jones Índices, que também tem Americanas na sua composição.
Diferente dos pares, este índice não considera a liquidez das ações nem a capitalização das empresas para fazer a avaliação. A metodologia é baseada em critérios dos pilares sociais, ambientais e de governança, uma espécie de índice ‘sangue puro’. Cada pilar tem um peso diferente no índice a depender do setor.
O índice também conta com apoio do RepRisk, para filtrar, selecionar e analisar diariamente incidentes de risco e atividades controversas das empresas dentro dos índices, que possam ser incoerentes com os pilares ESG.
O InfoMoney procurou a S&P para questionar se a avaliação da Americanas já estaria acontecendo.
Por meio do seu representante global de comunicação, April Kabahar, a S&P apontou, que em casos de riscos observados, será publicada uma Análise de Mídia e Partes Interessadas (MAS, pela sigla em inglês) – que inclui uma série de questões como crimes econômicos, de corrupção, fraudes, práticas comerciais ilegais, conflitos trabalhistas, questões sobre direitos humanos, entre outros.
Depois desta análise, acrescentou, o Comitê de Índices vai avaliar a empresa e o possível impacto das atividades controversas na composição dos índices.
“Em caso de que o Comitê de Índices decida remover uma empresa específica, esta não poderá ser incluída novamente no índice durante um ano-calendário, a partir do seguinte rebalanceamento”, destacou.
Segundo Kabahar, a S&P Dow Jones Indices não comenta possíveis mudanças no índice, mas segue uma metodologia transparente e baseada em regras. O provedor manterá informado o mercado sobre novos desdobramentos do caso Americanas.
Índice de mulheres
Em relação a Teva Mulheres na Liderança, a Teva Indices apontou ao InfoMoney que o índice, composto por 67 empresas, escolhe para a sua composição companhias bem-posicionadas no Score Teva Mulheres na Liderança que leva em consideração presença de mulheres em conselhos, diretorias e comitês.
“No último rebalanceamento do índice em 02/01/2023 o peso na carteira da empresa Americanas S.A. é de 0,6%. Outros critérios de governança são observados para elegibilidade dos ativos na metodologia do índice, entre eles: adimplência de entrega de informes regulatórios e recuperação judicial ou extrajudicial”, destacou.
Segundo a Teva, caso Americanas deixe de atender os critérios da metodologia, acima citados, a ação poderá deixar de fazer parte da carteira do índice no próximo rebalanceamento, que deve ocorrer em abril.
Questionada pela reportagem se o rombo contábil seria considerado no item “adimplência de informes regulatórios”, a Teva destacou que não, desta forma não é um fator até o momento que configure a exclusão de Americanas do índice. Uma outra saída seria a recuperação judicial.
Segundo noticiado pelo O Globo, na coluna de Lauro Jardim, a decisão de Americanas entrar na Justiça com pedido de recuperação judicial já está tomada e o mais provável é que o pedido seja impetrado entre segunda-feira e terça-feira da próxima semana, de acordo com advogados envolvidos na operação. A expectativa de recuperação judicial já estaria mexendo com o desempenho dos ativos da varejista.