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O Banco Central adotou um tom cauteloso no comunicado que acompanhou a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa Selic em 13,75% ao ano, nesta quarta-feira (21). Mesmo assim, agentes do mercado ainda acreditam que o ciclo de queda dos juros iniciará no segundo semestre – e já estão tentando antecipar quais empresas poderão aumentar a distribuição de dividendos nesse novo cenário.
Não há consenso se a primeira redução da Selic será em agosto ou setembro, nem se a taxa básica terminará o ano em 12% ou 13%. Mas sabe-se que alguns segmentos e empresas tendem a ter um desempenho melhor em um ambiente de juros menores, como o financeiro, a construção civil, os serviços públicos (utilities) e a indústria.
O analista Ricardo Schweitzer destaca que a situação da empresa também pesa. Companhias muito endividadas se beneficiam com a queda da alavancagem e despesas financeiras, como é o caso de diversas empresas de setores conhecidos pelos proventos. “Energia elétrica, saneamento, concessões rodoviárias e telecomunicações são negócios cuja estabilidade de geração de caixa permite maior tomada de dívida”, afirma.
Para Gabriel Duarte, analista da Ticker Research, não é apenas o custo menor das dívidas que dá um respiro para este tipo de empresas. Elas também são favorecidas com investimentos com uma maior taxa interna de retorno (TIR). “Juros altos fazem com que projetos se tornem inviáveis, pelas baixas taxas de retorno. Por que a indústria vai investir em maquinário para ganhar 15% ao ano se ela pode ganhar 13% correndo muito menos risco?”, diz.
O analista lembra que mesmo que a Selic não caia rapidamente, a curva de juros futuros já reflete essa expectativa, afetando as taxas e as dívidas atreladas à taxa do CDI. O impacto se estende até sobre os bancos.
“A queda na taxa de juros permite que os bancos consigam emprestar mais recursos. Além disso, com uma melhora na economia, a inadimplência tende a cair, ampliando a rentabilidade das instituições financeiras”, diz Sergio Biz, analista do GuiaInvest.
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No setor elétrico, Neoenergia e Alupar
No setor elétrico há companhias com dívidas indexadas ao CDI que vão ser beneficiadas com a queda dos juros. A mais citada entre os analistas consultados pelo InfoMoney é a Neoenergia (NEOE3), uma empresa híbrida, que atua com geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia em 18 estados e no Distrito Federal.
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Duarte, da Ticker Research, explica que a Neoenergia vai ser beneficiar com a queda dos juros por ter mais de 50% da dívida atrelada ao CDI. A alavancagem também deve reduzir por conta de alguns desinvestimentos feitos pela empresa.
“Mas ainda devemos ter cuidado com os próximos investimentos que a companhia deve realizar”, aponta Duarte, fazendo referência a um leilão de transmissão no final de junho que será bastante concorrido. “Ainda é necessária muita disciplina financeira, mesmo com uma queda de juros batendo à porta”, reforça. Duarte espera que a Neoenergia entregue um dividend yield de 4,3% nos próximos 12 meses, com preço-teto de compra de R$ 22.
Para o analista da Ticker, a Neoenergia está descontada frente aos pares porque o mercado observa sua governança e alguns investimentos de rentabilidade duvidosa feitos no passado. “Mas aos poucos a companhia tem melhorado. Mesmo com a alta recente, ainda negocia abaixo do valor patrimonial”, diz.
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Daniel Nigri, analista da Dica de Hoje Research, tem a Neoenergia como top pick para um ciclo de queda de juros. Ele destaca que a empresa tem feito grandes investimentos e apresentado crescimento do seu lucro. “Ela ainda paga o mínimo de dividendos [25% do lucro], mas está começando a desalavancar”, pontua. Diante da alta recente da ação, projeta dividend yield de 5% a 6% nos próximos 12 meses.
Felipe Paletta, sócio-fundador e analista da Monett, acrescenta que a Neoenergia está focada no público residencial e comercial, com forte presença no Nordeste, movido pelo PIB brasileiro. “É um crescimento acelerado e a empresa pode se beneficiar”, destaca. Paletta calcula dividend yield de 6,2% para os próximos 12 meses, com preço-teto de R$ 17. Na visão do analista, a NEOE3 pode valorizar até o patamar dos R$ 20.
Outra companhia do setor elétrico bastante citada pelos analistas é a transmissora Alupar (ALUP11). Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, afirma que 32% da dívida da companhia é atrelada ao CDI, enquanto 48% segue o IPCA (indicador de inflação).
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Embora beneficiada pela queda do endividamento, os dividendos da Alupar também devem depender do tamanho dos investimentos nos leilões de transmissão neste ano. A regra vale para transmissoras como Isa Cteep (TRPL4) e Taesa (TAEE11), que têm 28% e 34% da dívida atrelada ao CDI, respectivamente, segundo Arbetman. “Se vencerem os leilões, devem ficar em processo de investimento e construção até 2026”, diz, lembrando que isso tende a reduzir os dividendos no período.
No caso da Alupar, contudo, o mercado enxerga um cenário mais confortável do que o dos pares, tendo em vista que a companhia passou anos investindo e agora consegue pagar dividendos maiores. Arbetman projeta dividend yield de 5,1% para ALUP11. Paletta, por sua vez, espera dividendos de 6% nos próximos 12 meses, com preço-teto de R$ 30. “Mas a ação pode valorizar até os R$ 35”, cita.
Ainda em transmissão, Arbetman espera que Taesa tenha dividend yield de 8,7% e a Isa Cteep, de 6,5%. “Para a Taesa a recomendação é neutra, quem tem a ação deve manter o papel”, reforça. Já no segmento de geração, ele destaca Engie (EGIE3) com dividend yield projetado de 8,1%.
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O analista da Ativa cita também a Copel (CPLE6), que tem 54% da sua dívida atrelada ao CDI e 34% ao IPCA e deve se beneficiar pelos juros baixos, além de uma possível privatização que poderia ocorrer até outubro. Para Arbetman, a companhia fará esforços para manter um payout de 50%, com distribuições estáveis. Ele espera dividend yield de 6,7% neste ano para as ações, com preço-alvo de R$ 10.
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Opções na construção civil?
Embora o segmento de construção civil não seja conhecido por ter boas pagadoras de dividendos, Nigri enxerga potencial na incorporadora JHSF (JHSF3), que diz ter na carteira desde 2018.
“A empresa tem fundamentos interessantes, ainda está barata e começou a pagar dividendos mensais”, aponta Nigri. A companhia, que tem como regra distribuir o mínimo de 25% por lucro, começou a fazer pagamentos todo mês em dezembro de 2022. Em 28 de junho, depositará R$ 0,048 por ação.
“A JHSF tem potencial de entregar dividend yield de 7% a 8% nos próximos 12 meses”, diz. O preço-alvo é R$ 7,80, mas Nigri recomenda comprar a ação abaixo desse valor para garantir uma margem de segurança por se tratar de um setor cíclico.
As melhores do setor financeiro
Entre os bancos, o Banco do Brasil (BBAS3) é o favorito. Duarte, da Ticker, reforça que os dividendos podem diminuir nos próximos anos, por conta de investimentos de tecnologia já anunciados pela CEO. “Ainda enxergamos boas avenidas de crescimento para o banco em 2023, mas o desafio é acertar a mão na concessão de crédito para evitar inadimplência futura”, defende.
Para 2023, Duarte espera dividend yield de 9% para o Banco do Brasil, com preço-teto de R$ 50.
Sergio Biz, do GuiaInvest, também está otimista com Banco do Brasil e projeta dividend yield de 10% com preço-teto de R$ 42,90. A estimativa considera R$ 4,50 de proventos por ação e um payout de 40%.
“O risco principal ainda é o seu controlador, a União, que pode tomar medidas para atender demandas sociais, subvencionando crédito e afetando os resultados do banco”, afirma. Por outro lado, Biz cita como vantagens a qualidade da carteira de crédito da empresa e os fortes resultados operacionais entregues até agora.
Além do Banco do Brasil, ele também recomenda o Banco ABC (ABCB4), mais focado em empresas de médio e grande porte. Ele considera que o banco está barato e deve entregar dividendos de 7% neste ano, com preço-teto de R$ 19,50.
“O banco ABC ainda deve acabar de provisionar 30% da perda gerada com Americanas, mesmo assim o lucro líquido não deve ser afetado, voltando a crescer para perto de R$ 220 milhões a partir do terceiro trimestre”, pontua.
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Na indústria , quatro alternativas
No setor industrial, Paletta destaca Tegma (TGMA3), que deve ser puxada pelo crescimento acelerado de novos veículos e incentivos ao segmento no governo atual. O dividend yield projetado é de 5,5%, com preço-teto de R$ 25, podendo valorizar até R$ 30.
Outra companhia é Itaúsa (ITSA4), que, segundo Paletta, se beneficia indiretamente pelas empresas do seu portfólio, que acompanham a retomada da atividade econômica com juros baixos. Ele projeta dividend yield de 5% e preço-teto de R$ 10, com possível valorização até R$ 12,50.
Duarte, da Ticker, destaca também duas empresas do setor industrial, que acabam sendo beneficiadas no novo ciclo: a produtora de silos Kepler Weber (KEPL3) com dividend yield estimado de 5,5%, e a Randon (RAPT4), com proventos de 5,7%. O preço-teto destas ações é R$ 12 e R$ 14, respectivamente.
“Kepler e Randon não possuem dívidas elevadas, mas a queda dos juros favorece a captação de empréstimos e financiamentos, principalmente para aquisição de bens duráveis como um silo ou um semirreboque”, comenta Duarte.