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Temores de desaceleração na China com as restrições devidas à nova onda de Covid e de um aperto monetário mais duro nos Estados Unidos penalizaram os mercados nos últimos dias. A Bolsa brasileira também não escapou da forte correção dos ativos de risco.
Embora não seja possível descartar novos movimentos de queda diante do ambiente de grande incerteza, as ações de empresas de qualidade estão “em nível jamais visto”, na avaliação de Walter Maciel, CEO da gestora AZ Quest.
Em entrevista ao InfoMoney, Maciel afirmou que “o desconto que há agora na Bolsa não faz sentido”. Ele defende que ao olhar a relação entre o preço e lucro das companhias, é possível ver que os níveis estão perto do patamar registrado em abril de 2020, quando não se tinha expectativa qualquer de vacina. Logo, diz, o momento atual abre grandes oportunidades.
“Pode cair mais, sempre pode. Mas o fato é que agora é para comprar e se cair um pouco mais, é para comprar mais”, reforça o executivo.
Entre os nomes que estão descontados, o CEO cita o caso de Bradesco (BBDC4), Itaú (ITUB4), BTG Pactual (BPAC11), XP (XPBR31), Localiza (RENT3) e Arezzo (ARZZ3), por exemplo, além de outros nomes ligados a concessões públicas e ao setor de energia elétrica.
Apesar de ver os descontos, ele não esconde que o aumento dos juros nos Estados Unidos vai impactar os ativos de risco sem distinção, em um primeiro momento.
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Depois, argumenta o CEO, os investidores vão “começar a fazer as contas”. Em sua visão, os países que mais serão afetados negativamente possuem quatro características: apresentam déficit em conta corrente; são importadores de energia e de commodities; não fizeram ajustes nos juros ainda; e possuem fragilidade externa porque não detêm reserva cambial.
“Brasil tem reserva cambial. Se o dólar se valorizar contra o real, o governo diminui a dívida”, diz. “Preço das commodities subindo, melhora a balança comercial e entra mais dólar. O Brasil não está atrás da curva e nem tem dependência de energia”, acrescenta Maciel.
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Tais fatores, segundo ele, podem ajudar a fazer com que o País vire um local estratégico em termos de capital estrangeiro, especialmente agora em que deve haver uma regressão no processo de globalização, o que pode beneficiar bastante a América Latina.
O executivo acredita que a reação negativa da Bolsa brasileira aos juros americanos é algo mais de “curto prazo” e que o estrutural do Brasil é “bastante positivo”, já que fatores internos como a produção agrícola e de pré-sal devem avançar ainda mais nos próximos anos.
Maciel, no entanto, não esconde que a visão do estrangeiro sobre o Brasil é “péssima”, impulsionada por notícias envolvendo possibilidade de golpes militares e de conflitos entre as instituições. Apesar disso, acredita que o País está bem melhor do que os demais emergentes e que pode se beneficiar das mudanças geopolíticas provocadas pela guerra.
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Crédito privado no foco
Ao falar sobre alocação, Maciel destaca que a maior parte da posição dos investidores deve ficar agora em crédito privado, especialmente aquele do tipo high grade (com maior grau de investimento).
A preferência, conta o especialista, é por papéis com remuneração atrelada ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e ao CDI acrescido de um spread (taxa que é oferecida pelo risco que o investidor corre ao adquirir um título de dívida de empresa, em relação a um título público).
Segundo ele, as empresas de maior qualidade ganharam ainda mais espaço na pandemia em detrimento das pequenas, e estão com boa saúde financeira, porque captaram dinheiro de forma mais barata. Para investidores com maior disposição a risco, ele sugere que cerca de 50% esteja alocado em crédito privado.
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Bancos, empresas de concessão rodoviária e elétricas são alguns dos setores que Maciel vê com maior atenção quando o assunto é crédito. “Brasil está crescendo bem, já fez o ajuste de juros e a inflação deve cair bem no ano que vem”, afirma. “É bem possível que o Banco Central comece a ensaiar o recuo dos juros a partir do meio do ano que vem. Acho que é um cenário super favorável [para tomar crédito privado]”, defende.
Empresas ligadas ao varejo, por outro lado, são fonte de maior preocupação na casa. O CEO reconhece que o aumento de custos impulsionado pela guerra e pelas restrições na China, juntamente com a dificuldade de repasse ao cliente podem pesar contra essas companhias no cenário atual.
Para além do crédito privado, ele diz que o investidor deve focar em fundos multimercados. Ele observa que 2021 foi um ano difícil para boa parte dessa classe de fundos porque não havia visibilidade em relação à inflação e aos juros.
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“Hoje, tem uma série de temas como a inflação lá fora que são bons para usarmos. O multimercado vai bem nesse cenário”, argumenta, dizendo que esse tipo de alocação deve corresponder a cerca de 30% da carteira de um investidor, que estiver mais disposto a correr risco.
Fundos de ações também devem entrar no portfólio. Ele destaca que a Bolsa pode seguir sofrendo com novas correções, mas afirma que o preço está “barato demais” para ficar de fora.
“Se a pessoa estiver buscando preço barato, cenário claro e céu de brigadeiro, isso não vai ocorrer. Quando o cenário estiver de brigadeiro, o preço já estará lá em cima”, avalia Maciel.
Um dos setores que podem se valorizar é o de empresas estatais, que podem ser beneficiadas por processos de privatização, segundo Maciel. Embora boa parte do calendário proposto pelo atual governo esteja atrasado, o executivo acredita que uma eventual reeleição do presidente pode favorecer uma agenda mais liberal voltada para privatizações.
Apesar de o presidente Jair Bolsonaro (PL) ter se envolvido em algumas polêmicas recentes sobre a Petrobras, Maciel destaca que o novo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, é uma pessoa “técnica” e que está comprometida com o cuidado da máquina pública. Mesmo assim, ele não nega que mudanças são ruins e que geram ruídos para a empresa.
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Visão internacional
Ao ser questionado sobre a alocação internacional da casa, Maciel diz que a gestora segue com posições vendidas (que se beneficiam da queda) das Bolsas americanas, como a Nasdaq. A razão, explica, é que ativos de risco devem ser fortemente afetados pela alta dos juros nos Estados Unidos, que devem subir para no mínimo 4% para chegar a um nível, de fato, restritivo, avalia o especialista.
“O Fed vai ter que machucar o investidor ao ponto de as perdas de capital em Bolsa levarem as pessoas de volta para o mercado de trabalho. Para termos uma ideia do tamanho do movimento que terá que ser feito e como ele deve machucar a economia americana [com esse movimento]”, afirma.
Embora já tenha obtido boa performance com a posição tomada (que se beneficia da elevação dos juros) nos Estados Unidos, ele diz que segue com a alocação porque as chances de ganhar com esse tipo de exposição ainda são grandes, já que o Fed deve elevar ainda mais os juros. A casa também possui alocação que se beneficia do aumento dos juros na Europa, que devem ser elevados diante das fortes pressões inflacionárias que atingem o continente.
Exposições vendidas em euro contra o dólar também fazem parte dos portfólios. Em sua análise, o executivo diz que as proibições de importação do gás natural russo devem pesar e fazer com o que o Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro seja bastante afetado, o que deve impactar também a moeda.