36 ações mais baratas que um cafezinho: Marisa, Méliuz, Enjoei e Pine custam menos de R$ 2; vale a pena?

Em comum, ações da lista são de companhias que o mercado penalizou porque não houve entrega de resultado e geração de valor aos acionistas, dizem analistas

Bruna Furlani

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Na contramão do principal índice da Bolsa brasileira, que sobe mais de 7% nos dez meses completos de 2022, as ações de algumas empresas brasileiras – como Lojas Marisa (AMAR3), Méliuz (CASH3), Banco Pine (PINE4) e Enjoei (ENJU3) – estão em situação delicada neste ano.

O que todas essas empresas têm em comum? A resposta é o preço dos papéis, que estão abaixo de R$ 2, bem menos do que custa um cafezinho – que, aliás, anda com os preços inflacionados. Os dados são de levantamento feito pelo TradeMap a pedido do InfoMoney. Confira a lista:

Ações com preço abaixo de R$ 2

Empresa Classe Código Segmento Bovespa Preço da ação Retorno  em 12 meses (%) Preço máximo em 12 meses Preço mínimo em 12 meses Valor de mercado (em milhares)
Springs ON SGPS3 Fios e tecidos R$ 2,00 -61,24 R$ 6,12 R$ 1,85 R$ 100.000
Recrusul ON RCSL3 Material rodoviário R$ 1,96 -74,94 R$ 11,40 R$ 1,82 R$ 45.318
Renova PN RNEW4 Energia elétrica R$ 1,95 -8,02 R$ 2,93 R$ 1,30 R$ 474.867
Renova ON RNEW3 Energia elétrica R$ 1,94 -17,09 R$ 2,91 R$ 1,67 R$ 474.867
Estapar ON ALPK3 Serviços diversos R$ 1,92 -51,27 R$ 5,27 R$ 1,38 R$ 411.413
Coteminas PN CTNM4 Fios e tecidos R$ 1,91 -45,27 R$ 4,27 R$ 1,85 R$ 124.741
Dommo ON DMMO3 Exploração refino e distribuição R$ 1,88 218,64 R$ 1,94 R$ 0,44 R$ 958.069
Pine PN PINE4 Bancos R$ 1,75 3,55 R$ 1,90 R$ 0,99 R$ 326.272
Pet Manguinh ON RPMG3 Exploração refino e distribuição R$ 1,71 -39,58 R$ 3,01 R$ 1,71 R$ 115.741
Azevedo ON AZEV3 Construção pesada R$ 1,64 -53,53 R$ 5,18 R$ 1,53 R$ 122.525
Azevedo PN AZEV4 Construção pesada R$ 1,56 -44,29 R$ 4,37 R$ 1,54 R$ 122.525
Le Lis Blanc ON LLIS3 Tecidos vestuário e calçados R$ 1,56 28,93 R$ 2,00 R$ 1,18 R$ 1.323.804
Dotz SA ON DOTZ3 Programas de fidelização R$ 1,53 -52,48 R$ 4,24 R$ 1,51 R$ 202.065
Kora Saude ON KRSA3 Serviços médico-hospitalares análises e diagnósticos R$ 1,45 -69,15 R$ 5,30 R$ 1,32 R$ 1.111.915
Neogrid ON NGRD3 Programas e serviços R$ 1,45 -46,33 R$ 3,05 R$ 1,38 R$ 331.359
Lojas Marisa ON AMAR3 Tecidos vestuário e calçados R$ 1,42 -54,88 R$ 4,40 R$ 1,42 R$ 486.557
Hoteis Othon PN HOOT4 Hotelaria R$ 1,35 -55,30 R$ 3,00 R$ 1,33 R$ 24.802
Aeris ON AERI3 Máq. e equip. industriais R$ 1,32 -82,95 R$ 8,01 R$ 1,32 1.006.569
Bombril PN BOBR4 Produtos de limpeza R$ 1,25 -27,75 R$ 1,80 R$ 1,20 R$ 325.636
Triunfo Part ON TPIS3 Exploração de rodovias R$ 1,25 -30,49 R$ 2,10 R$ 1,07 R$ 216.884
Espacolaser ON ESPA3 Produtos diversos R$ 1,24 -83,44 R$ 8,98 R$ 1,24 R$ 448.165
Inepar ON INEP3 Máq. e equip. industriais R$ 1,23 -13,99 R$ 1,88 R$ 0,52 R$ 215.223
Atmasa ON ATMP3 Serviços diversos R$ 1,19 -65,51 R$ 3,50 R$ 1,01 R$ 31.783
Haga S/A PN HAGA4 Produtos para construção R$ 1,15 -41,03 R$ 2,30 R$ 1,11 R$ 20.944
Inepar PN INEP4 Máq. e equip. industriais R$ 1,11 -20,14 R$ 1,72 R$ 0,52 R$ 215.223
Meliuz ON CASH3 Programas e serviços R$ 1,11 -58,11 R$ 3,85 R$ 1,01 R$ 960.066
Enjoei ON ENJU3 Programas e serviços R$ 0,97 -65,60 R$ 3,80 R$ 0,97 R$ 194.236
Westwing ON WEST3 Programas e serviços R$ 0,96 -69,03 R$ 3,78 R$ 0,86 R$ 105.917
Recrusul PN RCSL4 Material rodoviário R$ 0,81 -68,60 R$ 2,90 R$ 0,80 R$ 45.318
Irbbrasil Re ON IRBR3 Resseguradoras R$ 0,70 -83,17 R$ 4,44 R$ 0,70 R$ 1.718.701
Joao Fortes ON JFEN3 Incorporações R$ 0,70 -31,37 R$ 1,70 R$ 0,69 R$ 73.643
Oi PN OIBR4 Telecomunicações R$ 0,52 -62,04 R$ 1,76 R$ 0,49 R$ 1.241.328
Viver ON VIVR3 Incorporações R$ 0,50 -61,24 R$ 1,40 R$ 0,40 R$ 82.205
Nexpe ON NEXP3 Intermediação imobiliária R$ 0,29 -64,76 R$ 1,23 R$ 0,29 R$ 38.506
Oi ON OIBR3 Telecomunicações R$ 0,20 -76,47 R$ 1,07 R$ 0,16 R$ 1.241.328
PDG Realt ON PDGR3 Incorporações R$ 0,17 -87,68 R$ 1,90 R$ 0,17 R$ 54.674

Fonte: TradeMap. Dados referentes ao fechamento de 01/12/22.

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As ações da lista são de companhias que o mercado penalizou porque não houve entrega de resultado, na avaliação de Fabiano Vaz, sócio e analista de ações da Nord Research.

Ele acrescenta que o mercado está atento a empresas que conseguem reportar crescimento do Ebitda (lucro antes de juros, amortização, impostos e depreciação) e do lucro para gerar valor aos acionistas, o que não parece ser o caso na lista em questão.

Vaz chama atenção também para o fato de muitas das empresas serem de setores afetados pelo cenário de juro elevado, como varejo e consumo. “Muitas delas estão alavancadas [endividadas], o que pode piorar com a Selic alta”, pondera. O aumento dos juros afeta a despesa financeira das companhias, que podem se ver na situação de ter que rolar a dívida em um cenário em que ela tende a ficar mais cara.

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Pesa também o fato de que as companhias possuem uma estratégia financeira muito fraca e que não há justificativa econômica para a manutenção de margem em períodos mais adversos como é o caso agora, em que a atividade econômica tende a enfraquecer, o juro está alto e há troca de governos, acrescenta Phil Soares, analista-chefe do research da Órama Investimentos.

Lojas Marisa e Pine

Conhecida por ser um dos nomes mais tradicionais do varejo, as ações da Lojas Marisa custam atualmente R$ 1,42 na Bolsa, segundo dados do fechamento da última quinta-feira (1). Soares, da Órama, afirma que a companhia está em processo de reestruturação há muito tempo e que não vem entregando resultado.

No último balanço divulgado em novembro, a companhia reportou um prejuízo líquido de R$ 97,5 milhões no terceiro trimestre de 2022. Com isso, reverteu o lucro de R$ 44,4 milhões obtido no mesmo período do ano passado.

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Em parte, o pior desempenho reflete a queda de 5,1% da receita líquida, que saiu de R$ 530,1 milhões para R$ 503,1 milhões.

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Em relatório divulgado após a apresentação dos resultados da Marisa, analistas do Bradesco BBI destacaram que a companhia deve ser mais afetada do que as demais varejistas listadas em Bolsa e por isso estão mais cautelosos com os papéis.

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Eles citaram que o canal digital da loja registrou contração expressiva por mais um trimestre, o que a companhia atribuiu a uma base de comparação mais alta devido ao forte aumento nas vendas online registrado no mesmo trimestre do ano passado, período marcado por restrições mais intensas da pandemia.

Apesar disso, para os especialistas do BBI, os números atuais da companhia levantam dúvidas sobre o potencial da parte digital da Marisa. Dessa forma, os profissionais mantiveram a recomendação neutra para as ações e o preço-alvo dos papéis em R$ 2,00.

Outra ação que foi bastante afetada nos últimos meses é a do Banco Pine, que vive uma situação mais delicada. Em setembro deste ano, a instituição informou que iria absorver os prejuízos acumulados em anos anteriores e no primeiro semestre de 2022, e que daria início a um novo ciclo de crescimento e alta.

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Em comunicado à época, Norberto Pinheiro Jr, diretor de relações com investidores, disse que o movimento era meramente contábil e estava alinhado à estratégia de aumento da rentabilidade da companhia, sem impacto fiscal sobre o negócio. Além disso, ressaltou que não alteraria os índices de capitalização, o valor patrimonial, o número de ações nem o valor intrínseco dos papéis.

A notícia, porém, não parece ter animado muito os analistas de mercado nos últimos meses. As ações estão cotadas a R$ 1,75, segundo fechamento da última quinta-feira (1). Vaz, da Nord, explica que a instituição tem a carteira de crédito focada em médias e grandes empresas com capital a partir de R$ 50 milhões e valores acima de R$ 500 milhões.

Por causa da pandemia, empresas desse setor passaram por períodos complicados, o que se refletiu em um balanço pior para o banco desde o início da crise sanitária.

Como o papel costuma ser pouco acompanhado de perto por bancos e casas de análise, o relatório mais recente que trata sobre a instituição é de maio deste ano. Nele, a agência Moody’s ressalta que iniciou a cobertura das ações com rating estável e de longo prazo BBB-, ou seja, com grau especulativo e portanto, maior risco.

No documento, a agência comentou que a classificação de risco de crédito reflete o modelo de negócios em fase de consolidação, baseado em empréstimos de curto prazo, como capital de giro e antecipação de recebíveis, para empresas de médio porte. Adicionalmente, o banco possui uma estrutura de captação granular e confortável gestão de liquidez, acrescentou a Moody’s.

IPOs recentes

Além de empresas que abriram capital tempos atrás, a lista engloba companhias que iniciaram a listagem em Bolsa entre os anos de 2020 e 2021, caso de Méliuz (CASH3), Enjoei (ENJU3), Espaço Laser (ESPA3) e Westwing (WEST3), por exemplo.

Vaz, da Nord, observa que Enjoei, Espaço Laser e Méliuz não entregaram o que prometeram. “São empresas que prometeram crescer para os acionistas e não entregaram isso. Houve queda de lucro e de Ebitda”, avalia.

No último balanço da Méliuz divulgado em novembro, a companhia reportou um prejuízo líquido consolidado de R$ 18 milhões. Até melhorou o resultado em 36% trimestre contra trimestre, quando teve perdas de R$ 28,2 milhões, mas não foi o suficiente para animar os investidores. Afinal, na comparação com terceiro trimestre de 2021, as perdas foram seis vezes maiores do que os R$ 2,95 milhões de prejuízo registrados no período.

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A empresa informou ainda que o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) foi negativo em R$ 40,3 milhões no terceiro trimestre de 2022, uma melhora de 23% em relação ao segundo, quando ficou negativo em R$ 52 milhões. Já na comparação anual, o Ebitda negativo subiu 333%, uma vez que era de R$ 9,3 milhões no terceiro trimestre de 2021.

Analistas do Bradesco BBI ponderaram que a empresa continua com desafios de curto prazo para mostrar sua lucratividade, especialmente com a pressão de custos ainda pesando sobre o balanço.

A casa também observou que o Ebitda da companhia está sob pressão e que a empresa apresenta riscos de execução altos. Para eles, uma reprecificação ou reavaliação do ativo deve depender de fatores que podem ocorrer apenas mais pra frente.

Apesar disso, o Bradesco BBI informou no documento que estava com uma recomendação acima da média de mercado para as ações, com preço-alvo de R$ 1,70.

Para Soares, da Órama, um dos principais desafios da empresa, que envolve um negócio de pontos e cashback, é a competição. Ele explica que alguns dos serviços oferecidos pela companhia já são ofertados por varejistas, caso do programa da Ame Digital, que pertence à Americanas, ou o programa de cashback do Mercado Livre, por exemplo.

Com o objetivo de se tornar mais competitiva, a Méliuz vem investindo em ampliar a gama de serviços financeiros como conta digital, cartão de crédito e a política de cashback. Neste ano, por exemplo, o Banco Central aprovou a aquisição da fintech Bankly, o que deve ajudar no crescimento dessa área.

Outro caso é o da Enjoei, que reportou prejuízo líquido de R$ 10,2 milhões no terceiro trimestre de 2022, 56% inferior ao reportado no mesmo intervalo de 2021, segundo informou a companhia em balanço divulgado em novembro.

Na ocasião, o Ebitda ajustado foi negativo de R$ 9,6 milhões, ante R$ 17 milhões do terceiro trimestre de 2021.

Já o volume bruto negociado (GMV, na sigla em inglês) total atingiu R$ 277,9 milhões no terceiro trimestre de 2022, o que representa uma elevação de 40% na base anual.

Os analistas do Bradesco BBI destacaram que a companhia ainda é deficitária. Eles afirmam que a Enjoei apresentou aumento da margem bruta e do GMV, mas que o volume bruto negociado tem desacelerado.

Diante do momento atual, os profissionais chamam atenção para o fato de que o cenário não é favorável para companhias deficitárias, ou que não apresentam geração de caixa positiva. Para eles, a empresa deve alcançar o chamado breakeven do Ebitda apenas em 2025. Ou seja, apenas a partir desse ano é esperado que a receita e as despesas totais se tornem equivalentes e não haja prejuízo nem lucro para o negócio.

“Com os investidores cada vez mais focados em métricas de avaliação tradicionais, em vez de múltiplos de vendas e GMV, a visibilidade de como os investidores avaliarão as ações [da Enjoei] é limitada”, destacaram os especialistas do BBI.

Ainda vale a pena entrar?

Embora as empresas apresentem alguns desafios no curto prazo, há algumas oportunidades no radar, na visão de Soares, da Órama. Ele cita o caso de Neogrid (NGRD3), Estapar (ALPK3), Inepar (INEP4) e TPI Triunfo Participações (TPIS3).

No caso da Neogrid, por exemplo, o analista-chefe avalia que a companhia está montando um banco de dados cada vez mais valioso ao agregar mais varejistas à sua carteira. “Ela tem um grande patrimônio tecnológico, que é um diferencial”, diz.

Atualmente, a companhia é conhecida por usar dados e tecnologia para sincronizar e automatizar indústrias, distribuidores, operadores logísticos, varejos, instituições financeiras e governo. Na lista de clientes, há empresas como Lupo, Unilever, Pernambucanas, por exemplo.

Outro negócio em que Soares vê potencial de crescimento é o da Estapar, maior operadora de estacionamentos do Brasil. Ele defende que a empresa está inserida em um setor em que as empresas são tidas pelo mercado como mais seguras ao apostar bastante em contratos mais longos, com margens maiores e proteção contra perdas.

O especialista observa que o setor foi bastante afetado pela Covid com a diminuição do fluxo de mobilidade urbana, mas pondera que empresas de propriedades, como é o caso da Estapar, devem ser analisadas pelo valor da propriedade descontando o que a companhia possui e que nesse caso, o valor dela continua atrativo.

Inepar e Triunfo completam a lista, na visão de Soares. O profissional resume que ambas são companhias de infraestrutura e que pertencem a um setor que é naturalmente gerador de caixa. “Há um risco regulatório, mas é mais fácil de calcular o retorno, porque ele já existe. Não é igual a empresas de crescimento em que esse retorno não existe ainda”, defende.

Já Vaz, da Nord, por outro lado, acredita que não há oportunidades na lista de empresas com ações abaixo de R$2. O especialista afirma que a Bolsa atualmente está com múltiplos baratos e que não vale a pena arriscar em papéis com perspectivas menos favoráveis, sendo que há empresas com crescimento e com múltiplos atrativos.

“Quando comparamos essas companhias com outras que estão conseguindo crescer e tem uma perspectiva favorável, vemos que não faz sentido entrar em empresas mais arriscadas. Não é possível focar apenas no preço de tela”, alerta o profissional da Nord.

Segundo ele, o investidor precisa entender bem do negócio, verificar os riscos, quais são as estratégias e como a empresa pretende superá-las. Não basta verificar o preço de tela, é preciso olhar e calcular os múltiplos, finaliza.