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A Stellantis, quarto maior grupo automotivo do mundo e fabricante de marcas como Fiat, Jeep e Peugeot, está colocando em prática uma nova estratégia para a América do Sul: a verticalização das suas operações, com investimentos que podem chegar à produção de matérias-primas. O primeiro passo nesse sentido foi dado há pouco mais de um mês, com a aquisição de uma fatia de uma mineradora na Argentina. Outras operações de verticalização, inclusive no Brasil, devem ser anunciadas ainda no primeiro semestre.
“Nosso negócio é automotivo, mas precisamos assegurar o fornecimento da matéria-prima”, diz Antonio Filosa, presidente-executivo do grupo para a América do Sul, ressaltando a importância da região na produção dos materiais básicos.
Os planos são grandes para a América do Sul. O valor de investimentos da companhia para a região é de R$ 16 bilhões entre 2018 e 2025. Serão 43 lançamentos de veículos no período 2021 a 2025. Nos dois primeiros anos (2021 e 2022) já foram feitos 24 e há previsão de outros 12 este ano. A marca Fiat, por exemplo, que tinha carros para o segmento de entrada e picapes, começa 2023 com dois modelos SUV, o Fastback e o Pulse.
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Além da operação automobilística, fazem parte do plano de investimentos os novos negócios na cadeia de valor. Na Argentina, que registrou recentemente inflação superior a 100% ao ano, a montadora optou por investir US$ 155 milhões na compra de uma participação de 14,2% na McEwen Copper, uma mineradora de cobre no país. “Isso é importante para o futuro da empresa”, diz Filosa, em entrevista ao InfoMoney.
O cobre é um material estratégico para a produção de veículos elétricos que, segundo estimativas do setor, podem carregar até 80 quilos do minério. Com o investimento, a Stellantis garante a cobertura de sua própria demanda e abre espaço para novos negócios. “Queremos assegurar a nossa cota de cobre primeiro e olhar o mercado para o futuro”, diz Filosa.
Com o investimento, a Stellantis passou a ser a segunda maior acionista da mineradora argentina e deu mais um passo em direção ao seu plano de descarbonização que, na maior parte do mundo, prioriza veículos elétricos.
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No Brasil, o cenário é outro. “Aqui, os custos impedem que exista um carro de entrada 100% elétrico. E o Brasil já tem a indústria do etanol. Por isso, nosso foco será nos híbridos, combinando o etanol e o elétrico”, afirma, sem dar uma data específica para lançamentos.
Para colocar o plano em prática, Filosa tem buscado conversas com fornecedores de etanol e busca defender uma agenda em torno da produção nacional. Em outra frente, visitará, nesta quinta-feira (6), uma grande usina de cana-de-açúcar de São Paulo. Além disso, a empresa está acompanhando um grande projeto de mineração de lítio em Minas Gerais, mais de 80 na Argentina e outros nove no Chile. “O Brasil é uma potência e a América do Sul é o berço do futuro. No final, estamos atentos a toda possibilidade de verticalização do ponto de vista estratégico, para assegurar as matérias-primas que precisamos”, diz.
A matriz energética brasileira, em que se destacam os biocombustíveis e a energia gerada por fontes renováveis, é uma vantagem competitiva do Brasil. Em testes realizados pela Stellantis em parceria com a Bosch, foi constatado que, quando considerado o saldo total de emissões do ciclo energético completo, o veículo movido a etanol no Brasil apresenta vantagens inclusive na comparação com um veículo elétrico abastecido com energia gerada na Europa. Na conclusão, o etanol reduz em mais de 60% a pegada de carbono do automóvel na comparação com veículo movido a gasolina. “O resultado coloca o Brasil na frente do debate de descarbonização na cadeia de mobilidade”, diz.
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Corrida elétrica
A Stellantis não é a única do setor automotivo em uma corrida para garantir os componentes que precisa para a produção dos veículos elétricos. A montadora, em conjunto com a BMW, estaria em negociações com a Panasonic para construir fábricas para veículos na América do Norte. Enquanto isso, a GM anunciou, em fevereiro de 2023, um investimento de US$ 650 milhões em um projeto de mineração de lítio nos Estados Unidos. Já a Tesla, do bilionário Elon Musk, estaria sondando a mineradora brasileira Sigma Lithium, com produção no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.
Esses investimentos em verticalização aparecem ao mesmo tempo em que Stellantis, Hyundai, Volkswagen e GM anunciam paralisação de produção para ajustar o volume à demanda e à oferta de componentes.
As rupturas no fornecimento de uma série de peças e materiais afetam a indústria em nível global desde meados de 2021, como uma das consequências da pandemia que desarranjou as cadeias logísticas. Segundo a AutoForecast Solutions (AFS), 1,25 milhão de automóveis deixaram de ser fabricados no mundo por falta de componentes. A verticalização, portanto, seria uma forma de mitigar esse risco no futuro.
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A rota da Stellantis
A Stellantis reúne marcas centenárias, mas é uma empresa nova: foi desenhada em 2020 e nasceu em 2021, da união de dois grandes grupos, PSA e FCA, e agrega 14 marcas entre Fiat, Alfa Romeo, Chrysler e Peugeot até Citroën, Maseratti e Jeep (8 delas em operação na América do Sul). “Com a união das empresas, buscamos sinergias em todos os pontos. Um exemplo foi o uso de motores GSE Turbo no Peugeot 208, que levou a um aumento nas vendas”, diz Filosa. Para o executivo, as sinergias e a busca de eficiências industriais têm contribuído para minimizar o impacto de um cenário macroeconômico de juro alto e de alto endividamento dos consumidores.
Líder no mercado nacional com um market share de 34%, a montadora planeja um lançamento por mês para 2023 e têm alta expectativa. “O ano começou ruim, mas março já veio com números mais fortes. Esperamos que, se abril e maio mantiverem essa tendência, teremos um ano bom”, afirma Filosa.
Com três fábricas no país, a Stellantis, também vai investir na reciclagem de veículos. Até o fim do ano, segundo Filosa, um projeto de do tipo será oficializado no Brasil, inclusive para reciclar produtos de concorrentes. O novo negócio não tem o objetivo específico de geração de receita – ainda–, mas pode ajudar a compor o caixa da montadora.