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SÃO PAULO – A pandemia deixou marcas profundas no setor de turismo: as atividades somam prejuízos que passam dos R$ 395 bilhões desde março do ano passado. O volume de receitas dessas atividades ainda se encontra 22,8% abaixo do registrado em fevereiro de 2020, segundo os dados deste mês divulgados pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Diante deste cenário, somando ao avanço da pandemia e preocupação com a variante Delta, a CNC acredita que setor turístico só deve recuperar o nível médio de geração de receitas mensais que tinha no período pré-pandemia ao fim de 2022.
A CNC destacou, em nota sem seu site, que as baixas registradas pelo setor também têm relação com o mercado de trabalho. Nos 12 meses encerrados em junho, o turismo segue com retração no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), com -1,1%, ou saldo negativo de -30,9 mil ocupações. Dentro do setor, as atividades mais afetadas são de transporte rodoviário (-62,6 mil) e aéreo (-8,2 mil).
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A boa notícia, porém, é que as perdas do turismo diminuíram pelo terceiro mês consecutivo e a entidade projeta avanço de 18,2% no volume de receitas do segmento do turismo para 2021, revisando para cima o percentual anterior, de 17,8%, graças ao avanço da vacinação e fim das medidas restritivas – que podem incentivar as pessoas a viajarem mais.
O InfoMoney contatou os principais agentes envolvidos no setor de turismo e especialistas da área da saúde para entender as expectativas de recuperação e se variante Delta do coronavírus podem impedir um recomeço para o setor.
Panorama do setor
a) Expectativa positiva
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João Augusto Machado, vice-presidente de marketing e eventos da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav), pontua que há uma demanda reprimida no setor.
“As pessoas estão querendo muito viajar. Depois de ficar praticamente um ano em casa, e com o avanço da vacinação uma retomada por viagens, principalmente, nacionais está acontecendo”, afirma.
O pico de vendas registrado na Abav foi entre maio e junho deste ano, quando o volume de vendas nas agências atingiu 70% do volume que registrado pré-pandemia, de acordo com os dados da associação.
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“Há muitos desafios e uma instabilidade constante na demanda pelo receio que, naturalmente, muitas pessoas ainda têm, mas acredito que a retomada já começou”, avalia Machado.
Os dados do Viajala, buscador de voos e hoteis, mostram que realmente há sinais de que as pessoas estão buscando mais por viagens.
O site compartilhou sua taxa de conversão, ou seja, do total de usuários que fazem buscas no site (por voo, hotel ou ambos) quantos deles clicam no site parceiro com a intenção de finalizar a compra. Essa taxa, que teve uma queda brusca assim que a pandemia começou, vem aumentando de forma constante.
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A taxa média de conversão do Viajala era de 30% a 35% pré-pandemia. O pior mês foi abril do ano passado, quando essa taxa de conversão foi para 10%. Depois subiu para 12% em maio e 18% em junho. No terceiro trimestre de 2020, a taxa foi para 24%, enquanto no quarto subiu para 27%. Em 2021, a média até fim de julho foi de 32%.
“As pessoas estão aprendendo a viajar com segurança. Com máscara e os cuidados de distanciamento e higiene das mãos, viajar de avião oferece o mesmo risco que outras atividades que muitas vezes são comuns no dia a dia. Acredito que, com o avanço da vacinação e os protocolos de segurança o setor deu início à retomada”, avalia Thomas Allier, CEO e fundador do site.
Do lado das companhias aéreas, que divulgaram os resultados recentemente, a Azul (AZUL4) informou que sua capacidade no segundo trimestre chegou a 75% dos níveis encontrados no mesmo período de 2019. A empresa registrou lucro líquido de R$ 1,2 bilhão no segundo trimestre, revertendo boa parte do prejuízo de R$ 1,6 bilhão sofrido um ano antes.
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A Gol (GOLL4), por sua vez, afirma que a média das vendas de julho alcançou o maior nível desde de março de 2020, superando a Black Friday do ano passado.
Apesar do prejuízo de R$ 1,2 bilhão, a Gol afirma que a demanda corporativa está começando a se recuperar e deve aumentar de forma mais significativa no primeiro trimestre de 2022, enquanto os voos internacionais retornarão neste ano, com tíquetes já disponíveis online.
Em linha, a operadora de viagens CVC também reportou prejuízo líquido de R$ 175,570 milhões no segundo trimestre deste ano, perda 30,4% menor que a registrada um ano antes, de R$ 252,129 milhões. Apesar disso, a empresa acredita na retomada. “Permanecemos otimistas com os prognósticos para o segundo semestre e início de 2022 e atentos aos eventuais desdobramentos da pandemia”, disse a empresa CVC.
b) Alta dos preços
Assim, o clima de otimismo em relação à retomada paira no ar. Outro ponto destacado pelos especialistas é o potencial aumento dos preços em diversos segmentos do turismo devido à alta temporada, com a chegada do verão no segundo semestre, mas também devido à tentativa de recuperação de prejuízos para as empresas do setor.
“Os preços vão subir para o que tínhamos pré-pandemia. Não tem como manter nos níveis atuais. As empresas precisam sobreviver”, afirma Alexandre Sampaio, diretor da CNC e presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA).
No segundo trimestre, a Azul já informou que os preços das passagens aéreas subiram 8,9% na base anual, por exemplo. Analistas também apontam que a Gol terá que subir os preços – principalmente para viajantes a lazer – para compensar os prejuízos (saiba mais aqui).
Tradicionalmente, no setor de turismo as empresas trabalham com um ponto de break even (ponto de equilíbrio, na tradução livre): enquanto a oferta é alta há preços atrativos, depois de um determinado patamar de vendas alcançados – que garante o pagamento das contas – os preços sobem para que as empresas aumentem as margens, conforme explica Sampaio.
“Com a pandemia, os preços caíram consideravelmente porque a demanda despencou, bem como a oferta de voos. Agora, com mais pessoas viajando e mais ofertas no mercado, a tendência é o preço voltar a subir e com a demanda forte pode até ficar mais caro que o encontrado pré-pandemia”, afirma o diretor da CNC.
Machado, da Abav, acrescenta que os a demanda no turismo doméstico também está inflando os preços. “A grande maioria das vendas ainda é para dentro do Brasil, muitas fronteiras estão fechadas. Então, alguns destinos populares no Nordeste, por exemplo, estão com os preços bem altos porque a procura está grande. Hoje temos voos de Brasília para Salvador por R$ 5,8 mil para dois adultos e duas crianças, no início de dezembro do ano passado esse mesmo pacote era encontrado por menos de R$ 3 mil”, exemplifica.
De acordo com o Viajala, os destinos mais procurados na plataforma, saindo de São Paulo são: Recife (15% do total de buscas), Salvador (12%), Fortaleza (8%), Maceió (7%) e João Pessoa (6%).
Ainda, segundo Machado, passagens entre São Paulo e Porto Alegre, por exemplo, que hoje giram entre R$ 1.500 e R$ 1.800, ano passado foram encontradas por R$ 400.
Não tem como cravar que a alta dos preços vai afetar a demanda, mas é um cenário que já podemos esperar, diz Sampaio.
Variante delta é um risco
Diante do cenário do turismo atualmente, uma das maiores preocupação em relação à retomada plena é o avanço da pandemia, especialmente a variante delta. Afinal, essa variante e o avanço da pandemia pode impedir uma recuperação do setor de turismo?
Para Sampaio, o problema tem relação com a incerteza que a variante traz. “A vacinação está avançando, mas as variantes acendem um sinal de alerta por ainda não sabermos a proporção que podem tomar. Pode sim afetar a movimentação interna, que é praticamente a única agora já que não tem entrada de estrangeiros, de forma significativa afetando a comercialização de voos, hospedagens, passeios, etc.”, diz Sampaio.
Para Machado, a variante também representa um risco, mas já houve uma adaptação dos passageiros e das empresas que fazem os negócios.
“O risco da pandemia é constante e vai ficar assim, até que alguma autoridade diga que a situação está sob controle. Entendo que o setor aprendeu que é possível ofertar seus serviços diante desse cenário, sendo necessário seguir os protocolos de segurança e as novas regras para receber pessoas, não tem como fugir”, avalia.
“Do lado dos passageiros, muitos estão assumindo o risco para ter momentos de lazer”, avalia Machado. Nesse sentido, ele entende que destino abertos, menos povoados e de contato com a natureza vão continuar sendo mais demandados.
“A situação atual é: estamos otimistas, mas cautelosos. Precisamos esperar para ver o desenrolar da vacinação versus as infecções por novas variantes. Não tem como desvincular o desenvolvimento da pandemia da retomada do turismo”, complementa Sampaio.
Do ponto de vista dos especialistas da saúde, a variante delta é motivo para as pessoas ficarem em casa.
“É uma variante mais contagiosa, que foi muito bem-sucedida. Ela entrar na célula com mais facilidade, bem como se reproduz mais rápido. Assim, aumenta a carga viral e se transmite de pessoa para pessoa com mais eficácia. Se no início da pandemia, com o vírus da linhagem original, uma pessoa infectava três, com a delta, uma pessoa pode infectar até sete pessoas. É preocupante”, diz Natalia Pasternak, microbiologista.
Segundo Luiz Almeida, coordenador do Instituto Questão de Ciência, as variantes surgem de forma aleatória fruto de mutações que o vírus faz. “Não é uma variante mais letal, mas como tem alta transmissibilidade, infecta mais pessoa ao mesmo tempo, aumentando o número de internações”, avalia.
Por isso, segundo os especialistas, as recomendações seguem sendo as mesmas: evita aglomerações, usar máscara e tomar as duas doses da vacina – que são cruciais para evitar a proliferação do vírus. E viajar, portanto, estaria fora dos planos – pelo menos por enquanto.
“Uma única dose não resolve, nem protege por completo. Então, tomar uma dose não é uma liberação para a vida normal. Pelo contrário, mesmo após a segunda dose a cautela é necessária”, diz Almeida.
Na prática, se a variante sair do controle e infectar cada vez mais pessoas, tudo vai parar novamente – inclusive o turismo, conforme explica Almeida. “O momento é de muita cautela”, diz.
Mas inevitavelmente, com a vacinação, as pessoas estão começando a se sentir mais seguras para voltar a viajar e ter momentos de lazer após muitos meses em casa.
Natalia pontua não podemos deixar que esse avanço na vacinação gere uma sensação irreal de segurança.
“Ainda não acabou, as medidas sanitárias de proteção, todas elas, deveriam estar vigentes. Os números melhoraram, mas não é sinônimo de pandemia resolvida. Essa variante não permite a gente colocar a luz no fim do túnel, mas ela está, só precisamos caminhar mais”, avalia.
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