Pesquisa do instituto do economista Dan Ariely ajudou a desenhar regras de teletrabalho para servidores federais

Pesquisa mostrou que 82% dos servidores gostariam de passar ao menos um dia da semana em teletrabalho. Novas regras entraram em vigor em setembro

Equipe InfoMoney

(GettyImages/BongkarnThanyakij)
(GettyImages/BongkarnThanyakij)

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SÃO PAULO – O resultado de um estudo feito com cerca de 45 mil trabalhadores em diversos países (sendo 30 mil dos respondentes funcionários públicos brasileiros) mostrou que o trabalho remoto pode ser produtivo — tanto na esfera privada quanto na pública — e ajudou a estabelecer as regras a respeito do teletrabalho para servidores federais no país.

A pesquisa, feita a partir de uma parceria da Enap (Escola Nacional de Administração Pública) com o Center for Advanced Hindsight Government, do professor e economista Dan Ariely, nos Estados Unidos, ajudou o Ministério da Economia a desenhar a Instrução Normativa nº 65, que entrou em vigor em 1º de setembro.

As novas regras vieram poucos meses depois de o trabalho remoto se tornar realidade para mais da metade dos servidores públicos federais. Durante a pandemia, 360 mil dos 601 mil servidores federais adotaram o teletrabalho, resultando em uma economia de R$ 1 bilhão, entre abril e agosto.

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“Todos foram tomados de surpresa e precisaram fazer uma virada de chave rápida. A gente tinha alguns órgãos que já utilizavam o teletrabalho, mas era exceção. Conseguimos manter o equilíbrio entre a prestação de serviço público e a proteção da vida dos servidores públicos federais”, conta o secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Wagner Lenhart.

Uma descoberta importante sobre o trabalho remoto foi a opinião dos servidores federais sobre o home office. “A pesquisa trouxe essa percepção do desejo de manter o trabalho remoto, parcial ou integralmente, mesmo quando se voltar à normalidade”, fala Lenhart.

A pesquisa feita com os servidores mostrou que 82% dos entrevistados gostariam de passar ao menos um dia da semana (20% do tempo) em esquema de teletrabalho. Cerca de dois terços (65%) dos trabalhadores responderam concordar com a frase “No futuro, vou pedir permissão para teletrabalho”.

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A pesquisa ainda detectou que as pessoas estão um pouco menos produtivas durante a pandemia e que o autocontrole é um dos fatores que ajuda a ter sucesso.

O clima organizacional também é bastante importante. Aqueles que sentem um alto nível de apoio da organização para o trabalho remoto se tornaram mais eficientes durante a pandemia e os que percebem um alto nível de confiança do supervisor se mostraram mais eficientes e trabalharam mais.

“Nós perguntamos o quanto eles se sentiam apoiados por suas empresas. Uma implicação clara é que esse senso de apoio – oferecer ao empregado suporte, mostrar que a empresa está lá por ele navegando pelos desafios – tem grande impacto na produtividade. De uma maneira mais tangível, também perguntamos sobre a questão tecnológica e descobrimos que quanto mais recurso tecnológico a pessoa tem, maior a produtividade. Isso sugere que investir em bons aparelhos traz benefícios”, afirma Joseph Sherlock, pesquisador comportamental sênior e chefe do Center for Advanced Hindsight Government, responsável pela pesquisa.

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Mas o teletrabalho não tem apenas pontos positivos. Os dois maiores desafios que apareceram entre as respostas dos brasileiros foram distrações e falta de interação humana.

“Ambos são bastante correlatos à produtividade, mas também potencialmente diferentes no mundo pós-Covid. Atualmente as distrações envolvem as crianças em casa, o mundo se desfazendo na pandemia, estresse em um pico maior… Esse desafio tende a diminuir no mundo pós-Covid. Mas o oposto pode ocorrer com a interação humana. É provável que trabalhando em casa atualmente, haja interação com as crianças, algo que não acontecerá no mundo pós-Covid. Provavelmente o trabalhador ficará sozinho em casa. Por outro lado, pode ser que tenha mais interação humana ao encontrar amigos no fim de semana, algo que não pode ser feito agora”, afirma Sherlock.

As mudanças para servidores

O distanciamento social forçado ajudou em dois pontos, segundo Lenhart: conhecer as ferramentas tecnológicas que já estavam à disposição, mas ainda não eram muito usadas; e entender como as pessoas percebem o trabalho remoto.

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Antes da IN-65, o ministro de Estado precisava aprovar todo o programa estruturado, agora ele apenas autoriza e os secretários definem os aspectos técnicos e os procedimentos gerais. O fluxo de implementação também foi simplificado e a possibilidade de trabalho remoto, antes apenas possível para servidores com cargo efetivo, foi estendida para comissionados, empregados públicos e temporários também.

Um dos critérios a ser observado para que o teletrabalho possa ser adotado é o resultado. Além do controle de jornada presencialmente, haverá a medição das entregas para o trabalho remoto. Os funcionários terão um plano de trabalho para cumprir e o desenvolvimento das metas será registrado em sistema. A avaliação acontecerá em até 40 dias e com escala de 0 a 10. Para garantir transparência, as informações serão disponibilizadas em um portal e atualizadas semanalmente.

Entre os objetivos das novas regras estão potencializar a produtividade, acompanhar as inovações que acontecem em todo o mundo, garantir o bom atendimento à população e trazer mais eficiência para o uso do recurso público.

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O governo ainda não tem uma estimativa da economia que será feita quando o teletrabalho passar a ser adotado como uma alternativa, e não mais compulsoriamente como agora, porque a adesão dependerá de cada órgão.

“Atualmente, mais de 90% dos servidores de instituições de ensino superior estão em trabalho remoto e eles vão voltar a trabalhar presencialmente, devido a natureza da atividade. Nas demais áreas, 46,89% estão em trabalho remoto. Muitas atividades não podem ser por teletrabalho, como a de policiais rodoviários federais e profissionais da saúde, mas muito outras podem”, diz Lenhart.

Iniciativa privada também passa por mudança

A resistência ao trabalho remoto, antes da Covid-19, era uma realidade tanto no setor público como no privado. Mas, para especialistas, a pandemia trouxe uma rápida adequação ao home office, que veio para ficar.

Um estudo divulgado em maio pela Cushman & Wakefield mostrou que apesar de 42,6% das empresas nunca terem adotado o trabalho remoto antes da pandemia, 73,8% pretendem manter o teletrabalho quando todos puderem voltar ao escritório.

“A Covid forçou a mudança para o home office da noite para o dia, mas eu acho que apenas acelerou aquilo que muita gente já estava esperando, principalmente nos grandes centros”, diz Marcelo Pirani, diretor de Relações Institucionais da ABRH-SP (Associação Brasileira de Recursos Humanos de São Paulo) e diretor de Relações Educacionais da ABRH.

Para ele, houve uma rápida adequação tanto no setor público como no privado. “Tem uma vertente importante a se considerar: quando tudo voltar ao normal, ficarão contribuições muito interessantes no setor público. Ele não difere muito do privado quanto a isso”, afirma.

Pirani cita o exemplo do Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo). “Teve alguns problemas até conseguir se adequar, mas agora está atendendo todo mundo online”, conta. De acordo com o site do órgão, o cidadão pode realizar mais de 40 serviços remotamente.

Segundo Pirani, para que o trabalho remoto siga dando certo, é preciso aumentar a confiança. “É um fator primordial. As empresas precisam confiar que o funcionário vai dar seu melhor, não é preciso ficar monitorando o tempo todo. Isso impacta muito. O ambiente de confiança leva a trabalho mais produtivos. No Brasil, a gente viveu fortemente, até antes da pandemia, o modelo comando-controle. Os líderes precisam entender que as pessoas podem se desenvolver e o papel dele é ajudar nesse desenvolvimento pessoal”, diz.