Americanas (AMER3) pede recuperação judicial e é atendida

Varejista alega ter R$ 43 bilhões em dívidas, com mais de 16 mil credores; é a quarta maior RJ do país

Rikardy Tooge

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A Americanas (AMER3) pediu na tarde desta quinta-feira (19) recuperação judicial (RJ) de uma dívida estimada em R$ 43 bilhões, distribuída por mais de 16 mil credores. No fim da tarde desta quinta, a 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro aceitou a RJ.

O escândalo contábil de R$ 20 bilhões reportado há uma semana se transformou no quarto maior pedido de recuperação judicial do país, atrás apenas da Odebrecht – atual Novonor – (R$ 80 bilhões), Oi (OIBR3) (R$ 65 bilhões) e Samarco (R$ 55 bilhões), de acordo com levantamento dos escritórios Lara Martins Advogados e Mingrone e Brandariz.

A Americanas aponta que, desde o anúncio do rombo, a empresa vem perdendo a capacidade operacional diante do rebaixamento de notas de crédito e bloqueio de recursos da empresa sob custódia de bancos.

“O que fez com que os bancos se negassem a adiantar recebíveis de cartão de crédito, operação rotineira e historicamente feita pelo grupo Americanas para capital de giro, drenando mais de R$ 3 bilhões do caixa da Companhia”, argumenta.

A empresa alega na petição ter apenas R$ 250 milhões em caixa, dos quase R$ 8 bilhões anunciados na quinta-feira passada. A quantia não é suficiente para manter a operação, lembra a Americanas. Já sobre o problema contábil, a varejista diz que “ainda é cedo para precisar o que aconteceu e quem são os efetivos responsáveis por esse infortúnio”.

A companhia diz ainda que está buscando proteger seu caixa de “danos irreversíveis”. “A atitude mostrou-se acertada, pois alguns poucos credores, sem pensar nos impactos para a coletividade, tomaram medidas precipitadas que culminaram no perigoso esvaziamento do caixa da companhia e, consequentemente, inviabilizaram a sua operação”.

Bilionários garantirão a operação

Em fato relevante após a divulgação do pedido de RJ, a Americanas afirma que há compromisso de seus acionistas de referência, os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, em manter a liquidez da companhia “em patamares que permitam o bom funcionamento da operação de todas as lojas, do seu canal digital, Americanas.com, da AME e suas coligadas”.

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O que pede a Americanas?

Na petição enviada à Justiça, a varejista solicita que sejam suspensas todas as cobranças de dívidas e bloqueios de recursos.

Além disso, pede a devolução dos valores que já foram congelados, a exemplo de R$ 1,2 bilhão retido pelo BTG Pactual (BPAC11) e R$ 470 milhões do Bradesco (BBDC4).

‘Promissora’ até semana passada, diz petição

A petição aponta que não existia desconfiança do mercado sobre a qualidade de gestão da Americanas até ela mesmo divulgar o rombo contábil, que culminou na saída do então CEO Sergio Rial e do CFO Andre Covre apenas nove dias depois de assumirem os cargos.

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“A operação sempre foi saudável, tendo se mantido dessa forma até uma semana atrás, quando a Companhia ainda era vista como uma sociedade sustentável e muito promissora. Porém, por razões inesperadas e que abalaram toda a estrutura do grupo, as Requerentes [Americanas] viram o seu caixa e expectativas de faturamento ruírem em questão de minutos”.

A empresa segue afirmando que espera apoio do judiciário e dos credores para evitar um problema maior. “A Americanas é, sem receio de se estar cometendo um exagero, uma gigante nos mercados brasileiro e mundial, que precisa do apoio e da compreensão do Poder Judiciário e dos credores para superar essa crise”, conclui.

Negociação será complexa

A discussão neste momento, apontam especialistas, é qual caminho os credores vão “perder menos”. A avaliação é de não existe uma equação em que os bancos não tenham que dar desconto às dívidas da Americanas. Um calote completo da varejista poderia tirar R$ 7 bilhões dos bancos, segundo apuração do Estadão.

“Se vai para uma RJ, aí o haircut [desconto] pode ser alto, já tiveram casos de corte de 80% do valor original em uma recuperação judicial. Às vezes, é melhor buscar uma saída negociada do que ir para a RJ”, avalia Max Mustrangi, da gestora Excellance, especializada em reestruturação de empresas.

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“Por isso é importante os acionistas aportarem recursos, pois isso mitiga o prejuízo dos bancos”, acrescentou Mustrangi, em entrevista concedida ao InfoMoney na última terça-feira (17).

Para ele, uma recuperação sindicalizada com os bancos seria a melhor alternativa. Neste caso, é possível discutirem um meio-termo que não prejudique o balanço dos bancos e nem “mate” a empresa.

Além do mais, dentro de uma recuperação judicial, os bancos terão de esperar os funcionários receberem seus direitos, ficando para o fim da fila junto com o governo, a depender da formatação das dívidas.

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“Não é negócio para ninguém a Americanas quebrar. Se arrastaria muito emprego, empresas pequenas e médias, além de travar o sistema financeiro. Os números de exposição de alguns bancos à Americanas é quase um lucro líquido trimestral da instituição, não é pouca coisa. Isso coloca em risco toda a economia”, conclui Mustrangi.

Venda de ativos

Como saída para o pagamento dos mais de R$ 40 bilhões em dívidas, a venda de ativos da Americanas se torna iminente.

A participação da varejista em controladas, como a Natural da Terra, a Uni.co (dona da Imaginarium e Puket) e a Vem – uma joint venture com a Vibra (VBBR3) para lojas de conveniência – está estimada no último balanço da empresa em R$ 3,3 bilhões.

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Neste quesito, Sérgio de Carvalho, da Match Capital, aponta que deverá haver um deságio importante na Natural da Terra. Comprada pela Americanas em 2021 por R$ 2,1 bilhões, hoje estaria valendo cerca de R$ 1,3 bilhão, seguindo um múltiplo otimista de cinco vezes o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, em inglês).

O que mais pode ser aproveitado?

Em uma hipótese de dissolução do negócio, a empresa teria disponível aos credores cerca R$ 26 bilhões em valores contábeis, sem considerar possíveis descontos e inadimplências. Os dados levantados se referem ao último balanço publicado pela Americanas, referente ao terceiro trimestre de 2022 (até setembro), que passará por ajustes e muitos números deverão ser revistos.

Partindo desta premissa, no curto prazo há R$ 21 bilhões, uma vez que a empresa possui R$ 8,6 bilhões em caixa e investimentos financeiros. Além disso, há uma expectativa de receber R$ 5,4 bilhões em pagamentos parcelados – em que há risco de inadimplência de uma parte relevante –, R$ 5,8 bilhões em estoques de produtos e R$ 1,6 bilhão em impostos a recuperar no curto prazo.

Já considerando recebimentos de longo prazo, há mais R$ 5,3 bilhões, sendo R$ 4,1 bilhões em créditos tributários e R$ 1,2 bilhão em títulos, investimentos e créditos a receber.

Entre ativos imobilizados e intangíveis, que exigem mais tempo para se materializar em dinheiro e com risco de forte deságio em função da necessidade de caixa, são R$ 13,5 bilhões. Sendo R$ 9,1 bilhões em ativos intangíveis, como marcas e patentes, por exemplo, e R$ 4,4 bilhões em imobilizados, como imóveis administrativos, galpões e equipamentos.

“São valores subjetivos e depende muito do contexto em que são negociados. Quando se fala em varejo, a marca por si só é valiosa, é o que passa credibilidade ao consumidor, em que ele decide se vai em uma loja ou outra”, explica Carvalho, da Match Capital.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br