Genocídio, minerais, embaixadas invadidas: entenda o que está acontecendo no Congo

Rebeldes reivindicaram do coração de uma região que contém trilhões de dólares em riqueza mineral praticamente inexplorada, agravando uma crise que já dura décadas

Gabriel Garcia

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Um grupo rebelde reivindicou o controle de Goma, cidade no leste da República Democrática do Congo (RDC) e centro de uma região que contém trilhões de dólares em uma riqueza mineral praticamente inexplorada.

Na terça-feira (28), autoridades da ONU relataram ter vistos corpos nas ruas, saques generalizados e interrupções no fornecimento de eletricidade, água e acesso à internet. Em protesto, nesta quarta-feira (29), diversas representações diplomáticas estrangeiras – dentre elas a Embaixada do Brasil – foram atacadas na capital da RDC, Kinshasa.

A situação marca uma escalada em uma das guerras mais longas da África, ameaçando agravar dramaticamente uma grave crise humanitária. Mais de 2 milhões de civis de Goma, incluindo um milhão já deslocados pela violência, corriam o risco de consequências humanitárias “catastróficas”, segundo grupos de ajuda humanitária.

Confira o que você precisa saber sobre o conflito:

Qual a origem do conflito?

A origem do ciclo de violência remonta ao genocídio de 1994, quando cerca de 800 mil Tutsis foram mortos em Ruanda. A fuga de um milhão de Hutus para a RDC após a ascensão dos rebeldes Tutsis intensificou as tensões étnicas na região. Grupos armados, como as Forças Democráticas de Libertação de Ruanda (FDLR), que incluem alguns responsáveis pelo genocídio, ainda operam no leste congolês, levando Ruanda a considerar uma intervenção militar para proteger sua segurança.

Facões abandonados na fronteira entre Ruanda e Tanzânia em 1994 (David Turnley/Corbis/VCG via Getty Images)

O que é o M23?

O M23, liderado por Tutsis étnicos, justifica sua luta como uma defesa dos direitos de sua minoria, alegando que acordos anteriores para encerrar os combates não foram respeitados. O grupo leva o nome de um tratado de paz assinado em 23 de março de 2009. Após uma rápida ascensão em 2012, o M23 tomou Goma, mas foi forçado a se retirar devido à pressão do exército congolês e de forças da ONU. Em 2021, o grupo retomou as armas, alegando que promessas de proteção não foram cumpridas.

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Membros do grupo rebelde M23 em uma caminhonete enquanto deixam sua posição para patrulhas em meio ao conflito entre eles e as Forças Armadas da República Democrática do Congo (FARDC), em Goma, no leste da República Democrática do Congo, em 29 de janeiro de 2025. REUTERS

Qual a importância da região?

A presença do M23 em Goma, que faz fronteira com Ruanda e está situada às margens do Lago Kivu, escalou as tensões na região. O local é estratégico, próximo a cidades mineradoras que fornecem metais e minerais valiosos, como ouro, estanho e coltan, essencial para a fabricação de celulares e baterias de veículos elétricos.

Mineiros trabalham em uma mina de coltan na República Democrática do Congo, 1º de dezembro de 2018 (REUTERS/Goran Tomasevic/Foto de arquivo)

Qual o papel de Ruanda?

Ruanda, embora tenha negado apoio ao M23, é acusada por especialistas da ONU e pelo governo congolês de fornecer armas e logística ao grupo rebelde. Um relatório da ONU indicou que até 4.000 soldados ruandeses estariam combatendo ao lado do M23. Recentemente, Ruanda caracterizou a luta perto de sua fronteira como uma “ameaça séria” à sua segurança, responsabilizando as autoridades congolesas pela escalada do conflito.

Civis congoleses que fugiram de Goma, no leste da República Democrática do Congo, após combates entre os rebeldes M23 e as Forças Armadas da República Democrática do Congo (FARDC), reagem no posto fronteiriço ao serem recebidos pelas autoridades ruandesas em Gisenyi, distrito de Rubavu , Ruanda, 28 de janeiro de 2025. REUTERS/Thomas Mukoya

Quais os fatores econômicos?

Além das questões étnicas, a luta pelo controle dos recursos minerais da RDC também é um fator crucial. Relatórios da ONU acusam Ruanda de usar o conflito como pretexto para explorar as riquezas minerais do país. O M23, em sua recente ofensiva, tomou áreas de mineração lucrativas, enviando grandes quantidades de coltan para Ruanda.

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Membros da Missão de Estabilização da Organização das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUSCO) andam em uma caminhonete enquanto garantem a evacuação de funcionários não essenciais da ONU, após a luta entre rebeldes do M23 e as Forças Armadas da República Democrática do Congo (FARDC), em Goma, província de Kivu do Norte, República Democrática do Congo, 25 de janeiro de 2025. REUTERS/Arlette Bashizi

Qual o papel da ONU?

A missão de paz da ONU, conhecida como Monusco, está presente na RDC desde 1999, mas enfrenta críticas por sua ineficácia. O presidente congolês Félix Tshisekedi pediu a retirada da missão, que foi adiada e recentemente estendida por mais um ano. Enquanto isso, forças militares da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) também foram enviadas à região, mas sem sucesso em deter os rebeldes.